Acórdão nº 704/20.1GAVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Março de 2022
Magistrado Responsável | PAULO SERAFIM |
Data da Resolução | 21 de Março de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, os Juízes desta Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO: ▪ No âmbito do Processo Comum (Tribunal Singular) nº 704/20.1GAVNF, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga –Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – Juiz 3, foi proferida sentença no dia 02.11.2021, depositada no mesmo dia, onde se decidiu (referências 175880058 e 174888369): “Em face de todo o exposto, o Tribunal decide julgar improcedente a acusação pública e, consequentemente, decide: “
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Absolver o arguido M. C.
da prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo n.º 152/1, alínea a) e n.º 2, do Código Penal.
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Absolver o arguido do arbitramento de reparação à vitima, peticionado na acusação.
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Julgar improcedente o PIC deduzido contra o arguido.
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Condenar a demandante nas custas cíveis devidas.” ▪ Inconformado parcialmente com a sobredita sentença, dela veio a assistente M. G.
interpor o presente recurso, que contém motivação e culmina com as seguintes conclusões e petitório (referência 12304074): A. Vem o presente recurso da sentença que absolveu o arguido da prática de um crime de violência doméstica do arbitramento de reparação à vitima e julgou improcedente o PIC, porque não se mostram preenchidos todos os elementos objectivos do tipo legal desse crime, e por não o poder condenar por injúria, face à ausência de acusação particular.
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Ora, atenta a matéria de facto dada como provada, concretamente no ponto 5, o recorrido teria de ser condenado pelo crime de injúria e no pagamento de uma indemnização.
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É certo que não ficou provado o n.º de vezes que o arguido apelidou a recorrente de “vaca, puta e porca”, embora tais factos tenham sucedido “em data não concretamente apurada mas situada entre o ano de 2018 e o dia 19.11.2020”, porém, nesse caso, conforme refere o Ac. RP de 13/01/21 (proc. 799/18.8GBPNF.P1), disponível em www.dgsi.pt “deverá o arguido ser condenado apenas pela prática de um desses crimes”.
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De facto, tal como decorre do acórdão acima referido, a que aderimos na integra “. É certo que os crimes de injúria e difamação têm natureza particular (ver artigo 188.º n.º 1, do Código Penal) e não foi deduzida acusação particular pela assistente. Nem o poderia ter sido face à acusação pública pela prática de crime de violência doméstica (que a assistente acompanhou).” E. Acrescenta o referido acórdão que : “Impedir neste caso a condenação pela prática de crimes de injúria e difamação por ausência de acusação particular quando essa ausência se ficou a dever à dedução de uma acusação pública pela prática de crime de violência doméstica que englobava tais crimes numa relação de concurso aparente, acusação que a assistente acompanhou, frustraria as legitimas expetativas da assistente e representaria uma inaceitável injustiça e uma inaceitável (embora não propositada) “deslealdade processual”.
– nesse sentido, Ac. RP de 30/01/13, proc. n.º 1743/11.9TAGDM.P1, e de 27/04/16, proc. n.º 780/13.3GALSD.P1, Ac. RL de 17/06/15, proc. 48/13.5PFPDL.L1-3, e o acórdão da Relação de Guimarães de 25/09/17, proc. n.º 505/15.9GAPTL.G1, todos em www.dgsi.pt.
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Afirma-se ainda nesse acórdão: “Podemos dizer que a ratio da exigência, nos crimes de natureza particular, de uma iniciativa do/a assistente como a dedução de acusação particular é satisfeita num caso como o que está em apreço pela circunstância de o/a assistente acompanhar a acusação pública pelo crime de violência doméstica onde se integram, numa relação de concurso aparente, crimes particulares de injúria e difamação.
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Logo devia o arguido ter sido condenado pelo crime de injúria e consequente indemnização. (…) A alteração de qualificação jurídico-criminal da conduta do arguido não influi na responsabilidade civil dela decorrente. Mantém-se a ilicitude dessa conduta (decorrente da prática de crimes), os danos não patrimoniais dela decorrentes e os demais pressupostos dessa responsabilidade.” H. Dado que o acórdão acima transcrito é suficientemente esclarecedor, deveria o arguido ter sido condenado pelo crime de injúria, bem como a pagar uma indemnização à aqui recorrente.
TERMOS EM QUE, deve ser concedido provimento ao presente recurso, com as consequências legais, designadamente revogando a decisão recorrida e substituindo-a por outra que condene o arguido pelo crime de injúria e consequentemente a pagar à recorrente uma indemnização, tudo com as consequências legais, assim se fazendo a devida JUSTIÇA.
▪ Na primeira instância, o Digno Magistrado do Ministério Público, notificado do despacho de admissão do recurso formulado pelo assistente, nos termos e para os efeitos do artigo 413.º, n.º 1 do CPP, apresentou douta resposta, na qual, citando pertinente jurisprudência, pugna pela improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida (referência 12418003).
Para tanto, alega, em síntese, que: - Em caso de absolvição pela prática de crime de violência doméstica só será de condenar o arguido neste crime (o referido “minus” em relação ao crime de violência doméstica), quando estão verificados os restantes requisitos de legitimidade e procedibilidade do crime de injúria – designadamente a tempestividade da apresentação de queixa, constituição de assistente e adesão à acusação pública deduzida pelo M.P.
- No caso vertente, relativamente à factualidade susceptível de integrar a prática do crime de injúria, apenas ficou provado que: “5. Em data não concretamente apurada, mas situada entre o ano de 2018 e o dia 19.11.2020, o arguido, no interior da residência comum e na sequência de discussões com a ofendida, apelidou-a de vaca, puta e porca.” - matéria de facto não impugnada pela Recorrente. Apesar de se ter apurado que o arguido apelidou a Assistente com expressões susceptíveis de integrarem a prática do crime de injúria, não foi possível determinar a data em que as mesmas ocorreram, ou a quantos episódios se reportam. Em consequência, também não é possível afirmar-se, com a certeza exigida pelo nosso ordenamento jurídico-penal, que a queixa apresentada pela assistente foi tempestiva.
- Não se apurando concretamente a data da prática dos factos integradores do crime de injúria, e havendo a possibilidade de os mesmos terem ocorrido mais de 6 meses antes da apresentação da queixa criminal, não poderá o arguido ser condenado pela prática do aludido crime, em obediência estrita do princípio in dúbio pro reo.
Igualmente deduziu douta resposta o arguido M. C., defendendo a improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida (referência 12393648).
Em defesa da sua tese, apresentou as seguintes conclusões:
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Toda a tese da recorrente se apoia no decidido no Ac. RP de 13.01.2021, proferido no processo 799/18.8GBPNF.P1, omitindo porém que a situação de facto dos autos é diversa da ali apreciada.
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Aliás, a...
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