Acórdão nº 075/21.9BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Março de 2022
Magistrado Responsável | GUSTAVO LOPES COURINHA |
Data da Resolução | 23 de Março de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações I.
A…………., S.A. - SUCURSAL EM PORTUGAL, melhor identificada nos autos, inconformada com a decisão arbitral proferida no processo nº 276/2020-T no dia 27 de Abril de 2021 que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), julgou improcedente o pedido de pronuncia quanto à anulação do ato de indeferimento da Reclamação Graciosa por ela deduzida contra a autoliquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) relativa ao ano 2017, efetuada através da declaração periódica apresentada com referência ao período de dezembro desse ano, e a consequente anulação (parcial) desta autoliquidação, por não ter incluído IVA dedutível no valor de € 410.429,68, vem dela apresentar Recurso para Uniformização de Jurisprudência, para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do disposto no art. 152º, nº1 do CPTA (Código de Processo dos Tribunais Administrativos) e do nº 2, do art. 25º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo DL nº 10/2011, de 20 de Janeiro), com a alteração introduzida pela Lei nº 119/2019, de 18/09, por considerar que a referida decisão arbitral recorrida colide com a decisão arbitral proferida no processo nº 11/2019-T do CAAD, – datado de 18 de novembro de 2019, o qual transitou em julgado.
II. Por despacho a fls. 868 do SITAF, o Ex.º Relator junto deste Supremo Tribunal veio admitir o recurso e ordenou a notificação da recorrida para contra alegar e do Ministério Público para emissão de Parecer.
III. A recorrente, veio apresentar alegações de recurso a fls. 5 a 44 do SITAF, no sentido de demonstrar a alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões: A. O presente recurso tem como fundamento a Decisão proferida, em 27 de Abril de 2021, no âmbito do processo n.º 276/2020-T, por Tribunal Arbitral constituído no âmbito do CAAD, o qual julgou improcedente o Pedido de Pronúncia Arbitral apresentado pela ora Recorrente com vista à declaração de ilegalidade dos actos tributários identificados supra, no valor de € 410.429,68.
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A Recorrente considerou-se notificada da Decisão proferida pelo CAAD no âmbito do processo n.º 276/2020-T no passado dia 30 de Abril de 2021, tendo-se iniciado a contagem do prazo de 30 dias nesse mesmo dia, pelo que o presente recurso se afigura tempestivo.
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O recurso baseia-se na contradição, sobre a mesma questão fundamental de direito, entre a Decisão Recorrida e Decisão Arbitral de 18 de Novembro de 2019, proferida pelo CAAD no âmbito do processo n.º 11/2019-T, disponível para consulta em https://www.caad.org.pt/. D. Este recurso é interposto ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 25.º do RJAMT e do artigo 152.º do CPTA – normas que consagram os requisitos de admissibilidade do recurso, para o Supremo Tribunal Administrativo, da Decisão Arbitral que tenha conhecido do mérito da pretensão deduzida com vista à uniformização de jurisprudência.
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In casu, entende a Recorrente que, relativamente à mesma questão fundamental de direito, existe contradição entre a Decisão Arbitral recorrida e a Decisão fundamento.
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Com vista a demonstrar a existência de contradição, relativamente à mesma questão fundamental de direito, entre ambas as decisões aqui em confronto, em primeiro lugar, nota a Recorrente que se verifica uma identidade da questão de direito sobre que recaíram as decisões. De facto, em ambos os arestos aqui em confronto, a questão decidenda ou a questão colocada foi a de saber se, na aplicação do método pro rata de dedução de imposto suportado nos bens e serviços de utilização mista, devem ser considerados no numerador e no denominador da fracção de cálculo o valor total da renda e não apenas a parte correspondente aos juros, sempre que a utilização dos recursos de utilização mista da actividade de leasing tenha sido sobretudo determinada pela disponibilização das viaturas – cf. pag. 11 da Decisão recorrida e pag. 14 da Decisão fundamento.
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Adicionalmente, nota a Recorrente que se vislumbra, também, uma identidade substancial das situações fácticas subjacentes a ambas as decisões. Especificamente, ambas as decisões versaram sobre uma instituição de crédito abrangida pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, configurando um sujeito passivo misto para efeitos de IVA na medida em que na sua actividade realiza operações de locação financeira mobiliária, que são tributáveis e conferem o direito de dedução do imposto, e operações de financiamento e concessão de crédito, que são isentas do imposto, e não permitem a dedução de IVA.
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Assim, e como não podia deixar de ser, na Decisão recorrida e na Decisão fundamento, foi dado como provado que ambas as entidades Requerentes, tendo verificado que, no âmbito da sua actividade de leasing, não estavam a exercer plenamente o direito à dedução de IVA que lhes assistia, procederam ao recálculo do seu pro rata de dedução (para os anos 2017 e 2014), passando a considerar, no numerador e no denominador da fracção de cálculo, os montantes relativos à parcela de capital que integram as rendas dos contratos de leasing (em vez de apenas o valor dos correspondentes juros). E que, na sequência daquele recálculo, a Recorrente – apurou, para o ano 2017, uma percentagem de dedução (pro rata) de 13% (em vez dos anteriores 7%). Por outro lado, no acórdão fundamento, a entidade ali Requerente apurou, para o ano 2014, uma percentagem de dedução (pro rata) de 20% (em vez dos anteriores 7%). Deste modo, a aqui Recorrente considera ter direito a deduzir o montante adicional de € 410.429,68. Adicionalmente, no acórdão fundamento, a Requerente entendeu ter direito a deduzir o montante adicional de € 3.091.870,19, com referência ao ano 2014.
I. Em concreto, na Decisão Arbitral recorrida, referente ao IVA de 2017, foi dado como provado que: “(…) A percentagem definitiva de dedução apurada pela Requerente, por aplicação do coeficiente de imputação específico previsto no ponto 9 do citado Ofício circulado, foi de 7%, correspondendo a IVA deduzido de € 478.834,63” sendo que “se a Requerente tivesse aplicado o pro rata de dedução previsto no artigo 23.º, n.º 4 do Código do IVA, a percentagem de IVA dedutível ascenderia a 13% e o correspondente IVA dedutível cifrar-se-ia em € 889.264,32, sendo a diferença, face à dedução efetuada, de € 410.429,68” (…) “Inconformada com a autoliquidação, por entender ter entregue prestação tributária em excesso derivada da ilegalidade do coeficiente de imputação específica, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa (parcial) da autoliquidação de IVA referente ao ano 2017, com fundamentos idênticos aos do presente pedido arbitral(…)” – cf. pontos S, T e U da matéria de facto da Decisão recorrida (realce e sublinhado nossos).
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Em sentido idêntico, resulta da Decisão fundamento, que foi dado como provado que: “A testemunha inquirida referiu que a aquisição de viaturas aos stands automóveis pelo Banco e a concessão de crédito aos clientes para a sua aquisição constituem actividades distintas, implicando, por parte da instituição bancária, o contacto com os fornecedores dos veículos e a análise da documentação em vista à concessão de financiamento e à comunicação de entrega da viatura ao cliente. Acrescentou que existem 400 agências a que o cliente poderá dirigir-se para adquirir a viatura através de concessão de crédito, além de uma direcção de financiamento automóvel, com delegações no Porto, Golegã, Lisboa e Faro, além de um call center e bases de dados para simulação, registo da compra e venda das viaturas. A actividade de aquisição de veículos envolve a utilização de custos gerais, como seja, água, gás, eletricidade, sistema informático, telefones, fotocopiadoras e papel, que têm um peso relevante na atividade do banco. Não sendo fácil a afetação direta dos custos às diferentes atividades, sendo o exemplo paradigmático a situação os balcões” [matéria de facto da Decisão fundamento, a final].
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Adiantando o Tribunal Arbitral que “Na situação do caso, a prova produzida em audiência aponta consistentemente no sentido de que a aquisição de viaturas aos stands pelo banco e a concessão de crédito aos clientes para a disponibilização da viatura correspondem a actividades distintas. Como foi referido, o cliente negoceia com o stand a aquisição da viatura e dirige-se à agência bancária, informando as condições da transacção, podendo ser utilizados dois procedimentos distintos com diferente regime de custos consoante o grau de urgência na aquisição do veículo. O banco examina a documentação e encaminha o expediente para a direcção de financiamento automóvel, que contrata com o fornecedor a aquisição da viatura por parte do banco e o autoriza a entregá-la viatura ao cliente. Existem cerca de 400 balcões do A... a que os clientes se podem dirigir para obter o financiamento, além de quatro delegações da direcção de financiamento automóvel, com sede no Porto, Golegã, Lisboa e Faro, bem como um call center e bases de dados para simulação, registo da compra e venda das viaturas, cujo o funcionamento implica custos gerais de serviços. Os custos imputáveis aos procedimentos de negociação da aquisição da viatura aos stands e a sua venda e disponibilização ao cliente têm um peso relevante nos custos gerais do banco, não sendo fácil a afectação directa dos custos às diferentes atividades de concessão de crédito e disponibilização de viaturas”.
L. E que deste modo, ”um balcão poderá estar a realizar simultaneamente a actividade de preparação da aquisição, transmissão e disponibilização do veículo a um cliente e a actividade de preparação da concessão de crédito, não sendo possível determinar, com objectividade, o grau de utilização dos recursos em cada uma dessas actividades, e não sendo possível também recorrer, nesse condicionalismo, a um método de afectação real assente em...
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