Acórdão nº 6692/19.0T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução17 de Março de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

O autor P. J., intentou a presente ação declarativa com processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra a ré X - COOPERATIVA DE ENSINO, CRL., pedindo que seja declarada a ilicitude do despedimento por justa causa a que a ré procedeu.

A ré apresentou articulado motivador do despedimento e juntou o processo disciplinar e os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas.

*O autor deduziu reconvenção pedindo a condenação da ré a proceder à sua reintegração no posto de trabalho, sem prejuízo da antiguidade e categoria profissional, a pagar as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão e a pagar a quantia de € 24.063,13 (vinte e quatro mil e sessenta e três euros e treze cêntimos), a título de diferenças salariais, retribuições vencidas e não pagas e indemnização por danos não patrimoniais.

Na réplica a ré respondeu às exceções e reconvenção deduzidas.

Realizado o julgamento foi proferida decisão julgando a ação improcedente.

Inconformado o autor interpôs recurso apresentado em extensas conclusões e resumidamente as seguintes questões: … 2ª. Atenta a factualidade provada, entre o apelante e a Ré não existe uma relação laboral, vigorando antes uma relação cooperativa.

3ª. Na relação cooperativa inexiste, como decorre das regras e dos princípios cooperativos, designadamente, do art. 2.º e 3.º do C. Cooperativo, subordinação jurídica, aspeto estruturante da relação laboral, como julgado, designadamente, no Acórdão da Relação do Porto, de 19.09.2011 e no Acórdão da Relação de Guimarães de 18.03.2021 4ª. Nos termos do direito cooperativo (arts. 25.º e 26.º do C. Cooperativo), a exclusão de um cooperador é da competência exclusiva da assembleia geral e deve obedecer a regras próprias, seguindo um procedimento específico, com observância do direito ao contraditório, e em que se prevê um conjunto de regras cuja inobservância conduz à nulidade de todo o procedimento.

5ª. Se se admitir a sujeição do cooperador a um procedimento disciplinar laboral, a competência para a sua instauração será do conselho de administração da cooperativa, permitindo-se que um grupo de cooperadores (os que integram a administração, em dado momento) possa perseguir e atormentar outro colega cooperador, unicamente porque este é incómodo ou coloca questões de difícil resposta.

6ª. Assim, a decisão da Ré é nula e sem qualquer efeito, como previsto no art. 25.º, nº 4, do C. Cooperativo e no art. 411.º, nº 1, al. c), do Código das Sociedades Comerciais, por remissão do art. 9.º do C. Cooperativo.

… 10ª. Ainda que assim não se considere, o que apenas de admite por mera hipótese de raciocínio, o ora apelante não pode igualmente conformar-se com douta sentença proferida na parte em que julgou a ação integralmente improcedente, declarando lícito o seu despedimento por justa causa, e julgou o pedido reconvencional igualmente improcedente.

11ª. Antes de mais, atendendo à decisão recorrida e atento o quadro fáctico por esta admitido, entende o apelante que a decisão de facto constante da douta sentença recorrida não se coaduna com a prova produzida e deve ser alterada, em vários pontos.

12ª. Na contestação, o apelante alegou que: “3º (…) o Autor é membro da Ré, sendo seu cooperador efetivo desde 14.10.2015, mediante o pagamento da joia estatuariamente prevista, conforme documento de que se junta cópia e se dá como reproduzido para todos os efeitos legais (Doc. nº 2 e nº 3), 4º Tendo inclusive sido nomeado como suplente do Conselho de Administração da Ré, no período compreendido entre 2017 e 2018. (…) 9º Com efeito, sendo o Autor cooperador, integra e participa obrigatoriamente nas suas assembleias gerais.” 13ª. A matéria atrás reproduzida não mereceu impugnação por parte da Ré que aceitou o seu teor, conforme se constata da réplica apresentada, pelo que deve ser considerada admitida por acordo, nos termos do disposto nos arts. 1.º, nº 1, al. a), 60.º e 98.º- L, nºs 4 e 5, do CPT e dos arts. 574.º e 587.º, nº 1, CPC.

14ª. Deste modo, caso se julgue necessária a referida factualidade para apreciar a natureza da relação entre o apelante e a Ré, deve ser acrescentada a seguinte factualidade aos Factos Provados: 5. A partir do dia 2 de outubro de 2015, o Autor passou a ser também cooperador da ré, mediante o pagamento da joia estatuariamente prevista.

5.1 O Autor foi nomeado como suplente do Conselho de Administração da Ré, no período compreendido entre 2017 e 2018.

5.2 O Autor integrava e participava nas assembleias gerais da Ré.

15ª. Atendendo a toda a prova produzida, existe erro de julgamento dos factos constantes dos pontos nºs 18, 19, 20 e 22 dos Factos Provados e do ponto nº 1 dos Factos Não Provados.

… 21ª. Analisados os referidos depoimentos e documentos, verifica-se, contrariamente ao que consta da douta sentença recorrida, não corresponde à realidade que o apelante não tenha ministrado as aulas a que estava obrigado, ou que, no dia 26 de abril de 2019, o apelante não tivesse ministrado vinte e cinco horas de aulas que estavam em atraso, ou que lhe seja imputável a necessidade de ministrar tempos letivos entre os dias 22 a 26 de julho de 2019.

22ª. Deste modo, tendo em atenção os elementos de prova atrás referidos, deve passar a constar dos Factos Provados o seguinte: 18. Ainda que o autor tivesse ministrado todas as aulas nos termos do horário que lhe tinha sido atribuído, as aulas não estariam terminadas até ao dia 26 de abril de 2019 e sempre teriam de ser ministradas aulas depois da formação em contexto de trabalho; (novo) 19. (Eliminado) 20. (Eliminado) 22. No mês de julho de 2019, após a formação em contexto laboral, foi necessário que o autor ministrasse aulas, o que levou a que entre os dias 22 a 26 de julho de 2019, os alunos tivessem uma semana de aulas com a disciplina de Técnicas de Multimédia; … 25ª. Atendendo à peticionada alteração da decisão relativa à matéria de facto, e ainda que se considere que entre o apelante e Ré existe um contrato de trabalho e uma relação laboral, não se verifica qualquer comportamento culposo do apelante, nem tampouco qualquer violação dos seus deveres laborais, nos termos exigidos no art. 351.º do CT, para que exista justa causa de despedimento.

26ª. Analisada a matéria de facto provada, mais concretamente, os pontos nºs 12 a 24 dos Factos Provados, não fica minimamente demonstrado que o apelante tenha violado o dever de assiduidade ou sequer de zelo, previstos no art. 128.º do CT.

27ª. Analisados os pontos nºs 25 a 29 dos Factos Provados, deles não emerge qualquer atuação ilícita, violadora de qualquer dever laboral, ou sequer menos correta do apelante, nada havendo a censurar à atuação do apelante e entendimento diferente, além de contrário às leis laborais, seria uma violação de uma garantia constitucional, mais concretamente, à norma do art. 37.º da CRP.

28ª. Os pontos nºs 33 a 36 dos Factos Provados também não configuram qualquer violação de um dever laboral, nem a ocorrência daquela factualidade gera a impossibilidade da manutenção da relação laboral e admitir qualquer tipo de punição ao apelante com base nesses factos seria, mais uma vez, negar-lhe o exercício de direitos de natureza constitucional., previstos nos arts. 25.º e 26.º da CRP.

29ª. Atendendo a toda a factualidade provada, é flagrante que o apelante não violou qualquer dever laboral, e que, ainda que existisse algum tipo de violação, não está minimamente demonstrado que essa violação tenha sido culposa, nem ficou demonstrado que da atuação do apelante tivessem resultado quaisquer prejuízos ou consequências negativas para a vida da Ré.

30ª. Atendendo à factualidade elencada, sempre a sanção de despedimento seria desproporcional e inadequada.

31ª. Deste modo, a considerar-se a existir relação laboral entre o apelante e a Ré, o deve ser proferido acórdão que revogue a douta sentença recorrida e julgue ilícito o despedimento do apelante.

… 34ª. Resulta também da matéria de facto que “O autor sentiu desgosto e perturbação pela decisão de despedimento com justa causa que foi tomada pela ré”.

35ª. Assim, deve ainda ser a Ré condenada a pagar ao apelante, nos termos do disposto no art. 396.º, nº 3, do CT, a quantia de €10.000,00, a título de indemnização pelos danos morais sofridos.

… 37ª. Na hipótese de se julgar improcedente o pedido de alteração da matéria de facto, dos factos provados na douta sentença recorrida não vislumbra o apelante qualquer atuação ou omissão culposa da sua parte que possa colocar em causa a subsistência da relação laboral com a Ré.

38ª. Nos Pontos nºs 18, 19 e 22 dos Factos Provados, não existe uma descrição circunstanciada dos factos, à imagem do que já sucedia na nota de culpa e na decisão de despedimento.

39ª. O apelante ainda hoje continua sem saber, em concreto, quais os concretos dias de aulas em que, eventualmente, terá faltado e que não foram devidamente compensados ou as concretas aulas que não foram ministradas, não existindo qualquer referência a esse respeito, na nota de culpa, na decisão de despedimento e na douta sentença recorrida a esse respeito.

40ª. Assim, qualquer despedimento baseado na referida factualidade seria ilícito, nos termos do disposto nos arts. 353, nº 1, e 382.º, nº 2, do CT.

41ª. Sem prejuízo do alegado, entende o apelante que a matéria de facto constante dos pontos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT