Acórdão nº 1652/21.3BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 03 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelALDA NUNES
Data da Resolução03 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

* Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo, do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, em representação da sua associada A…, recorre da sentença proferida nos presentes autos cautelares, que recusou a suspensão de eficácia do despacho da Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira que, a 8.4.2021, aplicou à associada do requerente a sanção disciplinar de demissão, demandando o Ministério das Finanças.

O recorrente alega e conclui o recurso do seguinte modo:

  1. DO EFEITO DO RECURSO: Face ao disposto no artigo 143º, nº 2 do CPTA, a regra geral é a do efeito meramente devolutivo fixada para os recursos de decisões respeitantes à adoção de providências cautelares (o caso dos autos) e que só pode ser afastada no caso excecional previsto no seu nº 5.

  2. O Recorrente, atenta a matéria aqui em discussão, vem peticionar a este Venerando Tribunal (artigo 641º, nº 5 do CPC), que o presente recurso de apelação tenha efeito suspensivo, com os seguintes fundamentos: C) No caso dos autos, a não suspensão da eficácia do ato administrativo que aplicou a sanção disciplinar de demissão à representada do ora Recorrente implicará o seu afastamento do trabalho e, a consequente privação da totalidade dos seus rendimentos provenientes do trabalho, causando à representada do Recorrente um prejuízo desproporcionado, de muito difícil reparação, na medida em que a mesma não conseguirá, sem esse rendimento, prover ao seu sustento nem contribuir para o sustento do seu agregado familiar. - cfr. resulta dos documentos juntos com a petição inicial.

  3. A representada do ora recorrente é trabalhadora do mapa de pessoal da Autoridade Tributária e Aduaneira, desde 06/04/1995, com a categoria de Assistente Técnica.

  4. Na sequência de uma queixa feita à Autoridade Tributária e Aduaneira, em 30/11/2018, pelo seu próprio irmão, foi instaurado, em 13/12/2018, um processo de inquérito com o nº 1X/2018, à representada do Recorrente, e, em 06/06/2019, um processo disciplinar com o nº 1089/2019 que culminou com a aplicação da sanção disciplinar de demissão.

  5. Os factos constantes da decisão colocada em crise foram participados pela Autoridade Tributária e Aduaneira, em 17/06/2019, ao Ministério Público de Lamego e, no âmbito do Procº Nº X - DIAP - 1ª Secção de Lamego, continuam sob investigação, na fase de Inquérito, e, em abstrato, podem configurar um crime de falsidade informática, p. e p. no artº 3º, nº 1 da Lei nº 109/2009, de 15 de setembro.

  6. Nesta data, ainda não foi proferida acusação pelo que a representada do Recorrente beneficia, até prova em contrário, do princípio da presunção de inocência, que alegou no seu requerimento inicial.

  7. A representada do Recorrente reconhece que procedeu a alterações nas matrizes prediais dos prédios em causa no procedimento disciplinar, embora a conduta que perpetrou não teve repercussões, porquanto acabou por anular informaticamente as alterações que também informaticamente havia feito, não tendo havido com tais alterações informáticas nem benefício para a associada do Requerente, nem prejuízo para a Autoridade Tributária ou para terceiros.

  8. A informação com que adulterou as matrizes era verdadeira, não tendo sido utilizada nenhuma informação matricial incorreta para realizar a escritura de justificação.

  9. Em consequência do indeferimento da providência cautelar, o Despacho da entidade demandada irá produzir efeitos nefastos na esfera da representada do Recorrente que ficará a aguardar a decisão a proferir em sede de ação principal.

  10. E, é a demissão e a consequente ausência de pagamento do vencimento à representada do Recorrente que se impugna nestes autos, uma vez que ela ocorre em momento ainda anterior ao de ser proferido despacho de acusação ou de arquivamento no inquérito judicial, e impede que até ser decidida a ação (administrativa) principal e, durante todo o período que esse mesmo processo possa durar, a trabalhadora possa prover ao seu sustento, bem como possa contribuir para o sustento do seu agregado familiar.

  11. A sentença em crise assentou em duas motivações distintas para considerar não verificado o segundo critério de decisão das providências cautelares eleito pelo legislador – o “fumus boni juris” - negando assim provimento à presente providência cautelar.

  12. A primeira premissa consiste no entendimento de que a aplicação da sanção disciplinar de demissão à representada do Recorrente foi sustentada não no resultado da conduta perpetrada pela associada do Recorrente, mas sim na própria conduta praticada pela mesma.

  13. Ora, face à data da prática das alegadas infrações (praticadas entre março e julho de 2018), e tendo o Processo disciplinar nº X sido instaurado em 06-06-2019, na sequência do processo de inquérito nº X, instaurado em 13-12-2018 (factos provados 2, 4, 5, 9 e 10), verifica-se que muitas delas estão prescritas, nos termos do artº 178º, nºs. 1 e 2 da Lei nº 35/2014, de 20/06 (prescrição da infração disciplinar e do procedimento disciplinar).

  14. Assim, embora o Processo disciplinar nº X tenha sido instaurado, por despacho da Sra. Diretora-Geral de 06-06-2019, já tinham decorrido mais de seis meses quando chegaram ao conhecimento da mesma (30-11-2018) os factos que deram origem à dedução da acusação e à aplicação da sanção de demissão.

  15. E, quanto a estes factos, já havia decorrido há muito o prazo de prescrição previsto no artº 178º, nº 2 da Lei nº 35/2014 de 20-06.

  16. Bem como o prazo de prescrição previsto no artº 178º, nº 1 da LTFP.

  17. No caso dos autos, a titular do poder disciplinar teve conhecimento dos factos praticados pela representada do Recorrente, pelo menos em 13/12/2018, mas, a instauração do processo disciplinar só foi decidida por Despacho de 06-062019, pelo que dado o distanciamento entre aquelas duas datas, verifica-se a prescrição do direito de instaurar o procedimento disciplinar, nos termos do artigo 178º, nº 2 da LTFP.

    S) O fundamento da demissão (por motivo disciplinar) assentou na justificação constante do artº 297º, nº 3, al. n) da LTFP, cuja infração disciplinar inviabiliza a manutenção do vínculo, quando o comportamento do trabalhador “(n) Com intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício económico ilícito, falte aos deveres funcionais, não promovendo atempadamente os procedimentos adequados, ou lese, em negócio jurídico ou por mero ato material, designadamente por destruição, adulteração ou extravio de documentos ou por viciação de dados para tratamento informático, os interesses patrimoniais que, no todo ou em parte, lhe cumpre, em razão das suas funções, administrar, fiscalizar, defender ou realizar;” T) E, uma vez que a conduta perpetrada pela associada do Recorrente, embora tenha faltado aos seus deveres funcionais, não obteve para si ou para terceiro, benefício económico ilícito, não lesou nenhum contribuinte, não produziu nenhum documento com informação matricial incorreta, terá de concluir-se que não está justificado o motivo que a Entidade Demandada utilizou para fundamentar a inviabilização da manutenção do vínculo.

  18. Assim, não pode a representada do Recorrente conformar-se que se diga que tenha realizado a escritura de justificação com base em “informação matricial incorreta” (cfr. fls. 30 - § 3 do Parecer, junto a fls. 984 do PD nº X/2018) uma vez que esta afirmação é Falsa.

  19. A fundamentação utilizada pela Entidade Demandada é Falsa pelo que a aplicação da pena de demissão consubstancia um vício de violação de lei, por erro nos pressupostos que a nortearam, e por violação do artº 297º, nº 3, al. n) da LTFP.

  20. Donde se conclui que a decisão de aplicação da demissão padece do vício de violação de lei por violação dos arts. 187º e 297º, nºs. 1, 2 e 3, al. n) da LTFP e também do artº 178º, nºs. 1, 2 e 5 da LTFP.

  21. A segunda premissa consiste no entendimento de que a aplicação da sanção disciplinar de demissão à representada do Recorrente não se pode configurar na presente sede cautelar como desproporcionada.

    Y) Estando alguns dos atos praticados prescritos, não ter a representada do Recorrente utilizado informação matricial incorreta nem obtido proveito indevido para si ou para o seu marido, nem prejudicado nenhum contribuinte nem a Autoridade Tributária e Aduaneira, terá que se concluir que a decisão de demissão violou os PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE, ADEQUAÇÃO E SUBSIDARIEDADE DAS PENAS.

    Z) O Recorrente considera que a aplicação da sanção de demissão violou o princípio de presunção de inocência (artº 32º, nº 2 da CRP) e a decisão padece do vício de violação de lei por violação dos arts. 187º e 297º, nºs. 1, 2 e 3, al. n) da LTFP e também do artº 178º, nºs. 1, 2 e 5 da LTFP.

    A

    A) E incorre também em vício de forma por violação dos PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE, ADEQUAÇÃO E SUBSIDARIEDADE DAS PENAS, ao aplicar à representada do Recorrente, a sanção de demissão, já que, sempre que possível, a conservação do trabalho pela aplicação de sanção mais leve deve ser tida sempre em conta.

    BB) É isso o que deve ser feito: o despedimento/demissão é a sanção mais grave a que se deverá recorrer, apenas, quando outra sanção não possa eficazmente ser aplicada.

    CC) O princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso consagrado nos artigos , 18º, nº 2 e 266º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, de natureza relacional, é um princípio normativo – constitucional, que se aplica a todas as espécies de atos dos poderes públicos, no sentido de evitar cargas excessivas ou atos de ingerência desmedidos na esfera dos particulares.

    DD) O arresto em crise não se pronunciou sobre a questão da decisão suspendenda ter violado o artº 32º, nº 2 da CRP (Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.) EE) A decisão de demissão violou o artº 32º da CRP, que assegura a garantia de que todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado...

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