Acórdão nº 2587/10.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO S...

    (doravante 1.ª Recorrente ou Impugnante) e a Fazenda Pública (doravante 2.ª Recorrente ou FP) vieram apresentar: ¾ A primeira, recurso da sentença proferida a 30.12.2017, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada improcedente a impugnação por si apresentada, que teve por objeto o indeferimento parcial da reclamação graciosa que versou sobre a liquidação oficiosa de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), relativa ao ano de 2003 e respetivos juros compensatórios; ¾ A segunda, recurso do despacho proferido no Tribunal Tributário de Lisboa a 14.02.2019.

    Para o efeito, a 1.ª Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “1.ª A douta sentença recorrida julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o ato tributário consubstanciado na liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) n.º 2007 5004606027, na liquidação de juros compensatórios n.º 2007 00002028116 e n.º 2007 0000208117 e demonstração de acerto de contas n.º 2007 00001344346, respeitantes ao exercício de 2005; 2.ª Salvo o devido respeito, entende a Recorrente que a sentença proferida pelo Tribunal a quo e ora recorrida incorre em erro de julgamento da matéria de facto e de direito na apreciação da legalidade da liquidação adicional de IRS emitida pela administração tributária; 3.ª No que concerne, em primeiro lugar ao erro de julgamento da matéria de facto, a Recorrente entende que de toda a prova produzida resulta evidente que todos os rendimentos de trabalho dependente auferidos pela Recorrente em 2003 foram pagos pela «C..., S.A.», não tendo a Recorrente recebido rendimentos pagos por qualquer entidade com sede na Suíça; 4.ª Se o Tribunal recorrido tivesse devidamente valorado e apreciado toda a prova carreada para os autos – designadamente, não só o documento certificado pela Autoridade Tributária Suíça como a declaração da «I...» que confirmou o não pagamento de qualquer montante à Recorrente e, bem assim, os esclarecimentos oferecidos pela entidade patronal da Recorrente quando interpelada pela administração tributária - teria alcançado conclusão diversa – qual seja, a de que a ora Recorrente auferiu, por referência ao ano de 2003, a título de rendimentos de trabalho dependente o montante de € 47.201,74, tendo os rendimentos obtidos pela Recorrente na Suíça sido sempre e unicamente pagos pela sua entidade empregadora e tendo os mesmos sido sujeitos a tributação por retenção na fonte na Suíça durante o período de destacamento; 5.ª Efetivamente, na sentença recorrida, o Tribunal a quo desconsidera a prova apresentada pela Recorrente, com exceção da referente ao documento certificado pela Autoridade Tributária Suíça através do qual dá por provado que a «I...» pagou imposto na Suíça, mas também e fundamentalmente que aquela sociedade pagou à Recorrente a quantia de € 21.444,25, a título de salários; 6.ª Neste contexto, o Tribunal de 1.ª instância deu como não provado o facto de durante Abril a 31 de Julho de 2003, a Recorrente não ter recebido rendimentos pagos por qualquer entidade com sede na Suíça, e bem assim, o facto de todos os rendimentos de trabalho dependente auferidos pela ora Recorrente em 2003 terem sido pagos pela «C…, S.A.»; 7.ª Ora, sendo esta a circunstância crucial para a decisão da causa, impunha-se ao Tribunal a quo delimitar correta e concretamente os factos para que, posteriormente, efetuasse a correta subsunção das normas jurídicas ao caso concreto da ora Recorrente; 8.ª Com efeito, da mera análise do documento emitido pela Autoridade Tributária Suíça (cf. doc. n.º 1 da petição inicial), resulta apenas que o montante de rendimentos auferidos naquele território aí foi sujeito a tributação na fonte, tendo a ora Recorrente pago imposto na Suíça, no valor de € 3.999,36; 9.ª Efetivamente, ao contrário do pugnado pelo Tribunal recorrido, daquele documento não resulta que a «I...» tenha pago qualquer montante à ora Recorrente a título de vencimento pelo trabalho desenvolvido em território Suíço, mas tão só que a retenção correspondente aos rendimentos pagos pelo destacamento da ora Recorrente na Suíça foi entregue à Autoridade Tributária Suíça pela «I...»; 10.ª Tal conclusão só pode advir não do documento apresentado em si mesmo mas sim da convicção de que quem entrega determinado imposto ao credor tributário é sempre e necessariamente o sujeito passivo desse imposto; 11.ª Incorre, assim, o Tribunal recorrido em erro, ao olvidar que o pagamento das dívidas tributárias pode ser realizado pelo devedor ou por terceiro; 12.ª Aliás, tal possibilidade é inclusivamente reconhecida à luz do Direito Português, conforme resulta do artigo 41.º da Lei Geral Tributária; 13.ª Assim, na medida em que tal possibilidade de pagamento por terceiros é uma realidade global, o facto de ter sido a «I...

    » a proceder à entrega da retenção de imposto em território Suíço, nada faz concluir quanto ao pagamento de qualquer montante a título de trabalho prestado; 14.ª Deste modo, resulta perfeitamente evidenciado que, o imposto pago na Suíça, no montante de 6.231 francos suíços (montante que, à data, correspondia a cerca de € 3.999,36) encontra correspondência com os rendimentos de trabalho dependente atribuídos pela entidade patronal da ora Recorrente, não resultando de qualquer remuneração adicional paga à ora Recorrente pela «I...»; 15.ª Neste contexto, e no entender da Recorrente, deverá ser dada como provada a seguinte factualidade, atenta a declaração da «I...» e os esclarecimentos prestados pela entidade patronal da Impugnante, quando interpelada pelos serviços da administração tributária, no âmbito do procedimento de reclamação graciosa: a. Todos os rendimentos de trabalho dependente auferidos pela ora Recorrente em 2003 foram pagos pela «C..., S.A.»; b. A Impugnante auferiu, no ano de 2003, rendimentos no montante total de € 58.677,74.

    1. Desde Abril a 31 de Julho de 2003, a Recorrente não recebeu rendimentos pagos por qualquer entidade com sede na Suíça; 16.ª É evidente, portanto, o erro de julgamento da matéria de facto em que incorreu a sentença recorrida, impondo-se a sua revogação, com as demais consequências legais; 17.ª Assim, deverá o Tribunal ad quem anular a sentença recorrida e ampliar a matéria de facto dada como provada, e, em conformidade com o exposto, ser proferida nova decisão que julgue a impugnação judicial deduzida pela Recorrente procedente; 18.ª No que concerne ao erro de julgamento de Direito, refira-se que o Tribunal a quo nele incorre ao julgar improcedente a impugnação judicial, no que se refere ao vício de falta de fundamentação do ato de liquidação em crise nos presentes autos invocado pela Recorrente; 19.ª Com efeito, recorde-se que sem apresentar a necessária fundamentação – bastando-se em emitir a liquidação adicional – a administração tributária notificou a ora Recorrente do ato tributário objeto do presente recurso;Em suma, impunha-se ao Tribunal Recorrido a constatação da inexistência de uma base justificativa mínima da notificação da liquidação adicional sub judice, devendo reconhecer-se na sentença recorrida a falta de fundamentação suficiente, clara e inequívoca, dos atos tributários em crise, a qual consubstancia manifesto vício de violação de lei, atento o disposto nos artigos 268.º, n.º 3 da CRP e 77.º da LGTCom efeito, carecendo a notificação da liquidação adicional sub judice de fundamentação suficiente, clara e inequívoca, conforme expressamente referido pelo ora Recorrente, incorre a decisão ora em crise em erro de julgamento de direito por não considerar que o ato sub judice padece de vício de violação de lei, por falta de fundamentação, atento o disposto nos artigos 268.º n.º 3 da CRP e 77.º da LGT; 20.ª Aliás, a Recorrente nem sequer alcança, mesmo a posteriori, a que se deveu a emissão da liquidação adicional de imposto, relevando um rendimento global de € 90.215,00.

      1. Não obstante, saliente-se uma vez mais que a fundamentação que subjaz à decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa, porque não contemporânea da emissão da respetiva liquidação, nunca poderá sanar o vício de falta de fundamentação do ato tributário na origem dos presentes autos.

      2. Efetivamente, deveria reconhecer-se na sentença recorrida que é de todo irrelevante para cumprimento do imperativo legal de fundamentação do ato tributário a fundamentação a posteriori, incluindo-se, manifestamente, nesse tipo de fundamentação, a fundamentação invocada na decisão da reclamação graciosa, que, como tal, é destituída de valor como complemento da fundamentação do ato tributário em crise.

      3. Inexistindo à data da emissão do ato tributário sub judice qualquer fundamentação que suportasse o mesmo, os fundamentos aduzidos a posteriori já em sede de reclamação graciosa não sanam aquela falta, mantendo-se, assim, o alegado vício de forma e a consequente ilegalidade do ato de liquidação, que deveria, por esse motivo ser, de imediato, anulado; 24.ª Deste modo, atento o dever geral de fundamentação expressamente consignado nos preceitos legais, doutrina e jurisprudência supra indicados, não poderia o Tribunal a quo deixar de concluir, em face de todo o exposto, que se verifica um vício de forma que afeta a legalidade da referida liquidação adicional, a qual, por este motivo, deve ser anulada, com fundamento no disposto no artigo 268.º, n.º 3, da CRP, nos artigos 36.º e 99.º, alínea c), ambos do CPPT, no artigo 77.º, n.º 2 e 3, da LGT e ainda no artigo 65.º do Código do IRS; 25.ª Assim, e em face de todo o exposto, resulta evidente a ilegalidade da sentença recorrida, entendendo-se na mesma pela existência de uma fundamentação clara, suficiente e completa, de facto e de direito, pelo que deverá a mesma ser revogada e, substituída por outra que a julgue integralmente procedente, com as demais consequências legais.

      4. Sem prejuízo do acima exposto, sempre a sentença ora recorrida padece do vício de erro de julgamento de direito uma vez que...

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