Acórdão nº 2684/10.2BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelLUÍSA SOARES
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I – RELATÓRIO Vem a Fazenda Pública interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por Z.... – S...., S.A., com referência liquidação de IRC do exercício de 2004.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos: “I - A impugnante interpôs a presente impugnação judicial visa sindicar a legalidade do despacho que indeferiu o recurso hierárquico, apresentado contra a decisão que indeferiu reclamação graciosa, apresentada pela impugnante, do acto de autoliquidação de IRC, ano de 2004.

II – Conforme parecer do digníssimo magistrado do Ministério Público, a questão central a decidir nos autos é a de saber se a impugnante tem ou não direito a deduzir, em sede de IRC, os donativos concedidos à Fundação PT, no ano de 2004.

III - Em sede de reclamação graciosa, foi decidido indeferir o requerido, “por se comprovar que à data de 2004.12.21 não estavam reunidos os pressupostos para a aceitação do custo e por conseguinte da majoração”, fls. 76, do PAT, apenso.

IV - Mostram-se assentes, em termos essenciais, os seguintes factos: “A Fundação PT foi constituída em 11/3/2003. Em 12/7/2004, foi-lhe atribuída personalidade jurídica. Em 4/3/2005, foi-lhe reconhecida o estatuto de utilidade pública. Em 13/7/2007, foi notificado à Fundação PT, da isenção em sede de IRC.

A liberalidade objecto dos presentes autos foi efectuada em 2004.

Por sua vez, o despacho documentado a fls. 79, limita os seus efeitos “a partir de 04/03/2005”.

V – Assim, conforme melhor exposto em sede de alegações resulta, que a liberalidade, efectuada no ano de 2004, não é fiscalmente dedutível.

VI – O acto objecto dos autos não viola qualquer disposição legal, motivo pelo qual o mesmo deverá ser mantido na ordem jurídica, termos em que a impugnação dever ser julgada improcedente.

VII - Ora, apesar da impugnante argumentar que a AT não aceitou a dedutibilidade fiscal do donativo em causa nos autos porque o mesmo não havia sido sujeito ao reconhecimento ministerial previsto no n.º 2 do artigo 1.º do Estatuto do Mecenato, o Tribunal a quo considerou que aquele reconhecimento ministerial não é exigível quando estão em causa donativos efectuados a pessoas colectivas dotadas de utilidade pública às quais tenha sido reconhecida a isenção de IRC, conforme dispõe o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março, diploma que aprovou o Estatuto do Mecenato, na redacção conferida pela Lei n.º 160/99, de 14 de Setembro.

VIII – E no fundo a questão resume-se a saber se a isenção prevista no art.º 10.º/1-c) do CIRC retroage ou não à data da constituição da Fundação PT ou apenas à data da declaração de utilidade pública administrativa.

IX - Ora perante o supra exposto em sede de alegações surge a seguinte questão: poderia a Fundação Portugal Telecom ter obtido o reconhecimento automático da utilidade pública ao abrigo do DL 460/77, isto é, logo após o seu ato constitutivo? A resposta é negativa.

X – Tal resposta é dada pelo artigo 4.º/2 do próprio DL 460/77, na sua versão originária dado que o mesmo só foi alterado por via da Lei 40/2007, de 24 de Agosto, e do Decreto-Lei 391/2007, de 13 de Dezembro, ou seja, diplomas legais posteriores à própria concessão do estatuto de utilidade pública à Fundação Portugal Telecom: “As restantes associações ou fundações só podem ser declaradas de utilidade pública ao fim de cinco anos de efectivo e relevante funcionamento, salvo se especialmente dispensadas deste prazo em razão de circunstâncias excepcionais.” Mas sempre apenas a partir desse momento.

XI - Ora no caso subjudice verifica-se que a Fundação Portugal Telecom beneficiou de uma atenuação do prazo geral, já que entre a sua constituição em 2004-07-12 e, a data de declaração de utilidade pública 2005-03-04 não mediaram 5 anos.

Ora estamos perante dois conceitos completamente distintos o benefício de atenuação do prazo geral de 5 anos e, a declaração de entidade pública sem que isso signifique que tal declaração retroaja à data da sua constituição.

XII – E, ademais a impugnante labora em erro quanto à data da constituição da PT, indicando a data de 2003-03-11, ou seja, a data de outorga da escritura pública.

Ora tal não é exacto uma vez que a Fundação PT apenas viu reconhecida a sua personalidade jurídica em 2004-07-12.

XIII - Sendo o reconhecimento um dos elementos constitutivos da pessoa colectiva de que depende a atribuição da personalidade jurídica, não estando a autora (na acção) ainda reconhecida pela autoridade competente, não dispõe ela de personalidade jurídica nem de personalidade judiciária.

XIV - Como se conclui, de acordo com a citada jurisprudência entre 2003-03-11- data da outorga da escritura pública) e 2004/07/12 (data do reconhecimento pelo Secretário de Estado da Administração Interna), a Fundação PT não possuía personalidade jurídica.

XV - Apesar da impugnante argumentar que a AT não aceitou a dedutibilidade fiscal do donativo em causa nos autos porque o mesmo não havia sido sujeito ao reconhecimento ministerial previsto no n.º 2 do artigo 1.º do Estatuto do Mecenato, o Tribunal a quo considerou que aquele reconhecimento ministerial não é exigível quando estão em causa donativos efectuados a pessoas colectivas dotadas de utilidade pública às quais tenha sido reconhecida a isenção de IRC, conforme dispõe o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março, diploma que aprovou o Estatuto do Mecenato, na redacção conferida pela Lei n.º 160/99, de 14 de Setembro.

Termos em que a decisão recorrida não se pode manter na ordem jurídica, por padecer de erro de facto e de direito, devendo como tal ser revogada por outra que reponha a justiça.

Porém, com melhor entendimento V. EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”.

* * A Recorrida apresentou contra-alegações tendo formulado as seguintes conclusões: “A) Constitui objecto do presente Recurso, interposto pela Fazenda Pública, a Sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 20 de Fevereiro de 2019, no âmbito do processo de Impugnação Judicial n.° 2684/10.2BELRS e que considerou totalmente procedente o pedido formulado pela RECORRIDA.

B) Em discussão nos referidos autos de Impugnação Judicial esteve a pretensão da RECORRIDA em ver promovida uma correcção ao lucro tributável apurado no exercício de 2004 pelo Grupo NOS (à data dos factos, Grupo PT Multimédia), de modo a reflectir a dedutibilidade fiscal dos donativos concedidos à Fundação PT no valor de € 525.000,00 e respectiva majoração, correspondente a € 735.000,00 (140% de € 525.000,00).

C) Para o efeito, constituiu objecto dos autos de Impugnação Judicial (i) o acto de autoliquidação de IRC do exercício de 2004 e, bem assim, (ii) o Despacho de indeferimento do Recurso Hierárquico proferido ao abrigo de poderes subdelegados pela Exma. Senhora Directora de Serviços do IRC, em 27 de Julho de 2010.

D) De acordo com o entendimento da RECORRIDA - e que foi integralmente, sufragado pelo Tribunal a quo na Sentença recorrida -, o referido acto de autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2004 deveria ser alterado no sentido de incluir o custo com a doação efectuada à Fundação PT no valor de € 525.000 e a respectiva majoração, por se verificarem os pressupostos dos quais a lei faz depender a aplicação do benefício previsto na alínea d) do número 1 do artigo l.° da Lei do Mecenato.

E) Por seu turno, a Fazenda Pública entende, indevidamente, que o benefício pretendido pela RECORRIDA não é susceptível de se reportar às dotações efectuadas em momento anterior ao da obtenção, pela Fundação PT, do estatuto de utilidade pública, no ano de 2007, devendo nessa medida ser revogada a Sentença proferida pelo douto Tribunal a quo e mantido na ordem jurídica o acto de autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2004 e, bem assim, o Despacho de indeferimento do Recurso Hierárquico proferido ao abrigo de poderes subdelegados pela Exma. Senhora Directora de Serviços do IRC, em 27 de Julho de 2010.

F) Ora, conforme ficou comprovado em sede de Impugnação Judicial, a Fundação PT é uma pessoa colectiva de direito privado sem fins lucrativos, constituída por escritura pública pela ora RECORRIDA e pelas sociedades Portugal Telecom SGPS, T… - T…, S.A., Portugal Telecom, I…. S.A e pela P…. S.A., em 11 de Março de 2003, como instrumento fundamental para concretizar o compromisso. Q1 G) Em 4 de Março de 2005, foi publicado em Diário da República (2ª série, n.° 45), o Despacho n.° 46/2005 do Primeiro-Ministro, reconhecendo, ao abrigo do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 460/77, de 7 de Novembro, o estatuto de utilidade pública à Fundação PT.

H) No seguimento do reconhecimento da isenção de IRC e encontrando-se à data precludido o prazo para entrega de declarações de substituição (cfr. artigo 114.°, n.° 2, do Código do IRC), a RECORRIDA deduziu Reclamação Graciosa contra o acto de autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2004, por forma a beneficiar da dedução (e respectiva majoração) à sua matéria colectável do valor dos donativos concedidos à Fundação PT.

I) Tendo a referida Reclamação Graciosa, e o subsequente Recurso Hierárquico sido indeferidos, foi apresentada Impugnação Judicial, tendo, nesse âmbito, sido proferida a Sentença ora recorrida, cujo teor - favorável à RECORRIDA -, assentou na jurisprudência estabilizada do Supremo Tribunal Administrativo, designadamente, no Acórdão proferido em 23 de Outubro de 2013, no âmbito do processo n.° 0471/13.

J) Neste sentido, a Sentença proferida, em consonância com o que tem vindo a ser decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo e transcrevendo o entendimento perfilhado por aquele Tribunal, decidiu que: “os pressupostos substantivos do benefício fiscal previsto na alínea d) do n.° 1 do artigo 1. ° do Estatuto do Mecenato são os de que o donativo se (1) destine à dotação...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT