Acórdão nº 5213/18.6T8VIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Fevereiro de 2022

Data22 Fevereiro 2022
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Proc.5213/18.6T8VIS.C1.S1 6.ª Secção ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I - Relatório 1.

AA, viúva, BB, solteiro, e CC, solteiro, todos residentes na ..., ..., ..., intentaram ação declarativa, com processo comum, contra Ocidental – Companhia Portuguesa de Seguros, S.A.

, com sede em Porto Salvo, Oeiras, e contra Banco Comercial Português, S.A.

, com sede no Porto, pedindo que sejam “condena[das] a ora 1.ª e 2.º R. ao pagamento solidário do capital seguro por morte de um dos segurados, acrescido de juros de mora desde a data da citação até integral pagamento, sem prejuízo do pagamento, por parte dos ora AA., dos prémios devidos até ao sinistro, procedendo-se à compensação devida.” Alegaram, em resumo, ter a 1.ª A. e o seu marido, DD, aderido, em 14/02/2008, a um contrato de seguro de grupo contributivo (ramo vida, no quadro de um contrato de mútuo para habitação), nos termos do qual a 1.ª R. garantiu a cobertura do risco morte e invalidez total e permanente da 1.ª A. e do falecido marido; sucedendo que, entretanto, em 05/06/2018, o seu marido (e pai do 2.º e 3.º AA.), DD, veio a falecer, recusando-se a 1.ª R. a assumir o risco coberto por tal contrato, invocando estar o mesmo resolvido por falta de pagamento de um dos prémios, resolução que, segundo a 1.ª R., terá operado por via de carta registada remetida ao marido em 28/04/2018, entendendo/sustentando os AA. que tal resolução é inválida, por não ter havido uma prévia interpelação admonitória e por a resolução não ter sido comunicada à 1.ª A..

Contestaram a 1.ª R. e o 2.º R., separadamente.

O 2.º R. (BCP) alegou que, para poderem ser pagos os “prémios” à 2.ª R. (seguradora), deveriam a 1.ª A. e o marido manter devidamente provisionada a sua conta de depósitos à ordem, o que não aconteceu nos meses de Fevereiro e Março de 2018, em que o pagamento dos prémios foi debitado a descoberto, após o que o BCP contactou o marido da 1.º A. para que procedesse à regularização da conta de depósito à ordem, o que este não fez, tendo-lhe dado instruções para que procedesse à devolução de vários pagamentos anteriormente debitados a descoberto na conta à ordem, entre os quais figuravam os prémios de Fevereiro e Março de 2018, tendo sido em consequência de tais instruções que foi feito “debitado” à 1.ª R. o pagamento de tais prémios e que, depois, a 2.ª R. interpelou, em 20/03/2018, o DD para proceder ao pagamento dos valores em causa, sob pena de se produzir o cancelamento da Apólice.

Alegou ainda que não pode ser condenado a pagar o que quer que seja, atenta a sua condição de credor, e que, caso a 1.ª R./Seguradora venha a ser condenada a liquidar os montantes ainda em dívida, sempre tal montante deverá reverter, diretamente, para ele, 2.º R..

E concluiu pela improcedência da ação.

A 1.ª R. (Ocidental) alegou, identicamente, que os prémios referentes aos meses de Fevereiro e Março de 2018 não foram pagos (não obstante terem sido enviados avisos de pagamento à 1.ª A. e ao seu falecido marido); e que, por carta registada de 28/04/2018, comunicou ao DD que o contrato de seguro ficava resolvido, “com efeitos a partir de 01/02/2018”, sendo que “a resolução do contrato de seguro é automática, sem necessidade de qualquer declaração”[1].

Alegou ainda que nunca lhe foi feita qualquer participação de sinistro, sendo do seu desconhecendo, até ser citada para a ação, o óbito do DD.

E concluiu pela improcedência da ação.

Foi dispensada a audiência prévia, proferido despacho saneador – que considerou a instância totalmente regular, estado em que se mantém – e enunciados o objeto do litígio e os temas da prova.

Os AA.

vieram requerer a ampliação do pedido, em sede de audiência de julgamento, peticionando que seja declarada nula a resolução do contrato de seguro operada pela ré Ocidental, ampliação do pedido que foi admitida.

A final, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a ação, e, em consequência: “1 - Absolveu as RR, do pedido de pagamento solidário do capital seguro por morte de um dos segurados aos AA.

2- Declarou inválida, por nulidade, a resolução do contrato de seguro operada pela R. Ocidental, reconhecendo a validade do contrato de Seguro de grupo contributivo ramo vida, celebrado no quadro do contrato de mútuo para habitação, entre DD e a A. AA, ao qual veio a ser atribuída a apólice n.º ...90 e o certificado n.º ...34.” Inconformada com tal decisão, interpôs recurso de apelação a 1.ª R. (Ocidental), tendo o Tribunal da Relação ..., por acórdão de 22/09/2021, julgado parcialmente procedente o recurso, “assim se revogando parcialmente a decisão recorrida quanto ao segmento decisório 2 e, em consequência, declara-se inválida parcialmente a resolução do contrato de seguro operada pela R. Ocidental, reconhecendo a validade do contrato de Seguro de grupo contributivo ramo vida, celebrado no quadro do contrato de mútuo para habitação, apenas quanto à A. AA, ao qual veio a ser atribuída a apólice n.º ...90 e o certificado n.º ...34”.

Agora inconformados os AA., interpõem o presente recurso de revista, visando a revogação do Acórdão da Relação e a sua substituição por decisão que repristine o decidido na sentença da 1.ª Instância.

Terminaram a sua alegação com as seguintes conclusões: (…) I - O Acórdão posto em crise padece de nulidade, que expressamente se argui, por violação do disposto no artigo 615º nº1 d) do CPC porquanto o Tribunal da Relação se pronuncia sobre questão que não lhe foi colocada.

II - O pedido decorrente de ampliação formulado era de que “seja declarada nula a resolução do contrato de seguro operado pela Ré Ocidental”.

III – Foi este pedido com esta concreta formulação que os Réus contraditaram nas instâncias e foi este que os AA sustentaram também nas instâncias IV – Só há um contrato de Seguro, com duas pessoas seguras, só há um pagamento de prémio, um capital, uma apólice e um certificado individual da apólice.

V – O Tribunal da Relação ao “cindir” as obrigações suportadas no contrato de seguro ou cria 2 contratos ou responde a pedido diverso do formulado.

VI - Em qualquer dos casos não responde a nada que lhe tenha sido posto a juízo pelas partes.

Sem prescindir, VII - Respiga-se da decisão posta em crise “Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso, assim se revogando parcialmente a decisão recorrida quanto ao segmento decisório 2-, e, em consequência, declara-se inválida parcialmente a resolução do contrato de seguro operada pela R. Ocidental, reconhecendo a validade do contrato de seguro de grupo contributivo ramo vida, celebrada no quadro do contrato de mútuo para habitação, apenas quanto à A. AA, ao qual veio a ser atribuída a apólice nº ...90 e o certificado nº ...34”.

VIII – Os recorrentes estão bem cientes de que não podem sindicar a matéria de fato apurada, mas cabe ao STJ fazer juízo crítico sobre o que resulta dessa matéria de facto fixada, levando em conta todo acervo probatório que o consentiu, a fim de fazerem adequada aplicação do direito a tais fatos.

IX – Na verdade um facto é um facto o que dele resulta já não é um facto e interfere na subsunção do mesmo à norma e isso é já aplicação do direito.

X - Na génese do contrato de Seguro em mérito nos autos está a celebração de um contrato de mútuo para habitação onde se lê “os MUTUÁRIOS obrigam-se a contratar um SEGURO DE VIDA cujas condições, constantes da respetivaapólice, serão as indicadas pelo BANCO, em sociedade de seguros de reconhecido crédito e da confiança do Banco, a pagar atempadamente os respectivos prémios, a fazer inserir na respetiva apólice que o banco é credor hipotecário e que, em consequência, as indemnizações que sejam devidas em caso de sinistro reverterão para o Banco. 3 As apólices e actas adicionais dos seguros acima referidos ficarão em poder do Banco mutuante como interessado nos mesmos, na qualidade de credor hipotecário. Só por intermédio do Banco e com o seu acordo por escrito os seguros poderão ser anulados e alterados. 4 O Banco poderá acordar com os mutuários alterações as obrigações constantes no número anterior”.

XI – Tal contrato de seguro foi contratado junto do próprio Banco em seguradora do Grupo a aqui Ré Ocidental.

XII - Presume-se que sendo o próprio Banco mutuário o Tomador do Seguro nele refletiu as exigências que impôs aos mutuários e a si mesmo no contrato de mútuo.

XIII – De tal sorte que tal contrato e o contrato de Seguro celebrado em sua decorrência gera não só obrigações para as partes, mas também lhes confere legitimas expectativas.

XIV - Entre essas expectativas e dignas de tutela jurídica, está a daqui Recorrente em ver-se desonerada da obrigação de pagar o mútuo contratado se sobrevier a morte do seu marido e co-obrigado no mesmo e também pessoa Segura, tal como esta, na apólice de Seguro Vida do ramo contributivo.

XV - É que o interesse na celebração de um contrato de seguro de vida para garantir um mútuo, longe ser um interesse egoísta da instituição mutuária (por obter por esta via uma garantia adicional e essencial à solvabilidade da operação creditícia), é também, e sobretudo acrescentamos nós, uma garantia para as pessoas seguras, não só na medida em que asseguram o risco próprio da sua vida em caso de morte, mas (e sobretudo) porque asseguram o risco de vida do seu co-mutuário e assim a sua capacidade de liquidar o mútuo se ficarem sozinhos como mutuários.

XVI – Esta leitura e interesse em contratar é do conhecimento da Ré e faz parte da economia do contrato, razão pela qual e de forma pressurosa procurou, em vão, demonstrar nas instâncias que comunicou à aqui autora recorrente a resolução do contrato de seguro cumprindo as suas obrigações.

XVII - Daqui resulta claro que, a interpretação que haja de fazer-se do cumprimento do dever de interpelar admonitoriamente ou não todas as pessoas seguras é afirmativa e é a que melhor corresponde aos interesses estabelecidos pelas partes e a tanto quanto estes verteram nos contratos firmados.

XVIII - Concorda-se inteiramente com o que nas...

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