Acórdão nº 00438/15.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: L..

(Rua (…)) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Viseu, em acção administrativa intentada contra Instituto Politécnico de Viseu (Av.ª (…)), em que é contra-interessado P..., julgada improcedente.

Conclui: 1ª O aresto em recurso incorreu em flagrante erro de julgamento ao considerar que os critérios avaliativos utilizados pelo júri eram compatíveis com a lei e com os princípios constitucionais da igualdade, mérito, justiça e proibição do arbítrio, uma vez que a discricionariedade técnica não se confunde com arbitrariedade e, portanto, é claramente contrário à lei - ao DL nº 74/2006 e à hierarquia dos graus académicos por ela fixada - e aos princípios da igualdade, mérito, justiça e prossecução do interesse público que a simples licenciatura na área para que é aberto o concurso valha mais do que o doutoramento nessa mesma área científica ou que uma licenciatura valha tanto como o mestrado e o doutoramento juntos.

  1. Contra o exposto não procede o argumento de que o júri tem o poder discricionário de fixar os critérios avaliativos, pois não só a discricionariedade não significa arbitrariedade como, em qualquer dos casos, também o exercício do poder discricionário conhece limites internos, dados justamente pela obrigatoriedade do exercício de tal poder respeitar os princípios constitucionais da justiça, imparcialidade, igualdade, legalidade e mérito (v. por todos, ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Vol. I, págs. 253 e segs.).

  2. Consequentemente, resultando claramente das actas do júri que a licenciatura na área científica vale mais do que o doutoramento nessa mesma área científica, - pois enquanto a licenciatura vale 100 pontos, já o doutoramento vale 80 pontos, podendo-se mesmo dizer que a licenciatura em Biologia vale tanto como o mestrado e o doutoramento juntos, pois só quem tiver ambos estes graus na área científica é que conseguirá obter os 100 pontos que são concedidos a quem for apenas licenciado em biologia -, é por demais inquestionável que os critérios fixados pelo júri eram não só arbitrários como totalmente incompatíveis com a hierarquia dos graus académicos estipulada no DL nº 74/2006 e com as mais elementares exigências decorrentes dos princípios da justiça, prossecução do interesse público, igualdade e mérito.

  3. O erro de julgamento em que incorreu o aresto em recurso ao considerar legais os critérios fixados pelo júri decorre ainda do facto de se ter atribuído à parte escolar de um mestrado – que nenhum título outorga e que não revela outro mérito que não a assistência a umas quantas aulas ou palestras – um valor muito superior à obtenção do mestrado ou do doutoramento numa outra área científica e de se terem imposto formulas limitativas do mérito dos candidatos, procurando-se nivelar pela mediania e não diferenciar pela excelência, como impõe o princípio constitucional do acesso à função pública através de concurso.

    Para além disso, 5ª O aresto em recurso incorreu em flagrante erro de julgamento ao considerar improcedente o vício de violação do princípio da audiência dos interessados com o argumento de a ele não haver lugar no presente procedimento concursal, pois não só aquele princípio é aplicável no âmbito dos procedimentos especiais (v., neste sentido, FREITAS DO AMARAL, O Novo Código do Procedimento Administrativo, INA, 1992, p. 26, Esteves de Oliveira e Outros, CPA Comentado, p. 523, J. Figueiredo Dias, “Enquadramento do Procedimento Disciplinar na Ordem Jurídica Portuguesa”, BFDUC, Vol. LXXIII, Separata, 1997, p. 208), como não ocorria no caso sub judicie qualquer uma das situações em que o artº 103º do CPA previa a inexistência ou dispensa da realização de tal audiência.

  4. O aresto em recurso também enferma de erro de julgamento ao considerar suficientemente fundamentada a deliberação impugnada, uma vez que não se pode considerar fundamentado um acto (que ainda por cima envolve o exercício de poderes discricionários) quando não se sabe o que é que o júri considerou e avaliou no curriculum de cada candidato, quando não se sabe sequer quantos votos recolheu cada candidato e quando a pouca justificação aduzida passa pelo emprego de fórmulas passe-partout, tais como “com deficiência de rigor” ou “com incorrecções”.

    Por fim, 7ª A sentença a quo incorreu ainda em erro de julgamento ao não anular o acto impugnado por violação de lei por erro os pressupostos, seja por ter deixado de considerar mais valias constantes do curriculum vitae do Autor, seja por uma simples comparação entre ambos os currículos permitir concluir pela superioridade do curriculum do Autor nas componentes pedagógica e científica.

    Contra-alegou o recorrido Instituto Politécnico de Viseu, concluindo: A - Os argumentos alegados pelo aqui Recorrente foram sobejamente contraditados pelo Réu e pelo contra-interessado e, depois, na douta e bem fundamentada sentença recorrida à qual não é de imputar qualquer erro de julgamento. Efetivamente, B - Não lhe pode ser imputado erro no julgamento por violação dos princípios constitucionais de mérito e proibição de arbítrio, pois que, por um lado, foi no uso da sua liberdade/discricionariedade técnica que o júri do concurso, atendendo à concreta área científica para a qual o concurso foi aberto, - Ciências Biológicas, especialidade Biologia Molecular - e às capacidades profissionais necessárias ao exercício das funções ao concurso, cujo apuramento e apreensão só a si lhe cabem, entendeu valorar mais a formação de base dos candidatos (licenciatura) em detrimento da formação pós-graduada". E, por outro, C - A definição de limites máximos e mínimos de pontuação, no âmbito também dessa liberdade, é usual para garantir a uniformidade na classificação e o respeito pela escala de o a 20, sendo que os limites fixados pelo júri são absolutamente razoáveis, tendo em consideração o facto de a categoria para a qual o concurso é aberto não ser uma categoria de topo da carreira.

    D Também o invocado erro de julgamento por violação do princípio da audiência prévia não procede pois que, de acordo com jurisprudência invocada e consolidada, "a formalidade da audiência prévia dos interessados prevista nos artigos 101 e 103 do CPA e no Decreto-lei 402/98 de 11 de julho não é aplicável aos concursos de provas públicas para professor coordenador do Ensino Superior Politécnico, objeto de procedimento especial regulado no Decreto Lei n° 185/81 de 1 de julho" sendo que, por serem os mesmos os pressupostos, a mesma jurisprudência é aplicável ao concurso de provas públicas para professores adjuntos (TCANorte, Acordão de 06.11.2014 Proc. ° n.° 01 833/07.2BEPRT) E - Quanto ao alegado erro de julgamento por falta de fundamentação, recorde-se que a deliberação, aqui impugnada, foi tomada pelo júri em cumprimento de despacho do Presidente do IPV em sede de execução de sentença, no sentido de "apresentar fundamentação mais detalhada relativamente aos pareceres relativos ao currículo científico e técnico e profissional, ao estudo apresentado pelos candidatos e à discussão dos temas", assim sanando o vício que, naquela sentença, tinha sido invocado como causa de anulação do ato.

    F - E, assim, essa fundamentação foi completada e clarificada, nos termos que agora são exaustivamente descritos na sentença recorrida e por ela reconhecidos como suficientes. E, efetivamente, reproduzindo a douta sentença recorrida, G - "o iter cognoscitivo - valorativo percorrido pelo júri na classificação dos vários sub critérios do currículo de cada candidato resulta mesmo de forma evidente da fundamentação do júri - como é obvio tratando-se de apreciação de currículos não se pode apreender cabalmente essa fundamentação sem olhar para os currículos..." H - " a fundamentação aduzida pelo júri quanto ao estudo apresentado pelos candidatos mostra-se suficiente, até porque, entramos do domínio puramente avalialivo (e insindicável,)" 1 - Além disso, o A. sabe bem a que se refere o júri quando fula em fàlta de reférências bibliográficas, material e métodos com incorreções e análise dos resultados com deficiência de rigor (...) - Por outro lado, a votação, que o Recorrente alega não saber, sequer, se existiu encontra-se plasmada na ata do júri do concurso datada de 02.02.2015.

    L - Só poderia pois concluir-se, como se concluiu na sentença recorrida, que "a fundamentação precisa resulta da ata do júri de 02.02.2015 percecionando-se claramente, como se alcançou o resultado final" M - Ainda quanto ao alegado erro de julgamento por violação de lei por erro nos pressupostos, o júri fez uma correta apreciação dos currículos dos candidatos, classificando e atribuindo as respetivas pontuações, designadamente quanto aos projetos realizados, publicações e comunicações técnico- cientificas e quanto ao tempo de serviço, de acordo com os critérios previamente fixados e no âmbito da "denominada discricionariedade técnica", enquanto "exercício de um poder/dever conferido pela lei para configurar os pressupostos da sua atuação decidindo/aplicando de entre os vários meios possíveis aquele que, em seu /uízo, lhe parecer mais adequado à consecução do fim prosseguido ".

    N - Resulta pois, claramente, não haver qualquer arbitrariedade ou parcialidade na atuação do júri bem como não poderem ser-lhe imputados erros grosseiros na definição e aplicação de critérios pelo que o ato impugnado não padece dos vícios que lhe são assacados.

    O - Assim, bem andou, pois, a sentença recorrida ao decidir pela total improcedência de ação, absolvendo a entidade demandada do pedido formulado pelo A.

    O contra-interessado P…. também contra-alegou, concluindo: 1) O legislador confere à Administração uma margem de liberdade para apreciar o currículo técnico e profissional dos candidatos e, assim, nos termos da lei (cfr. arts. 3°, n.° 4, 7°, n.° 2, 15.°, n.° 1 e 18.° do DL 185/81, alterado pelo DL 69/88) e, mormente, do princípio da prossecução...

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