Acórdão nº 0128/20.0BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 927/2019-T Recorrente: “Banco A……………, S.A.” Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, para uniformização de jurisprudência, da decisão arbitral proferida em 21 de Setembro de 2020 pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) no processo n.º 927/2019-T (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listOrder=Sorter_data&listDir=DESC&id=4950.

), por oposição com a decisão arbitral proferida em 18 de Novembro de 2019 pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) no processo n.º 11/2019-T (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listOrder=Sorter_data&listDir=DESC&listPage=2&id=4408.

), tendo apresentado alegações, com conclusões do seguinte teor: «A. O presente recurso tem como fundamento a Decisão proferida, em 21 de Setembro de 2020, no âmbito do processo n.º 927/2019-T, por Tribunal Arbitral constituído no âmbito do CAAD, o qual julgou improcedente o Pedido de Pronúncia Arbitral apresentado pelo ora Recorrente com vista à declaração de ilegalidade dos actos tributários identificados supra, no valor de € 6.457.008,39.

  1. O Recorrente considerou-se notificado da Decisão proferida pelo CAAD no âmbito do processo n.º 927/2019-T no passado dia 9 de Outubro de 2020. Na medida em que aquele dia foi um dia Sábado, a contagem do prazo de 30 dias para interposição do presente Recurso iniciou-se no dia 12 de Outubro de 2020 (a segunda-feira seguinte), pelo que o mesmo é tempestivo.

  2. O recurso baseia-se na contradição, sobre a mesma questão fundamental de direito, entre a Decisão Recorrida e Decisão Arbitral de 18 de Novembro de 2019, proferida pelo CAAD no âmbito do processo n.º 11/2019-T, disponível para consulta em https://www.caad.org.pt/.

  3. Este recurso é interposto ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 25.º do RJAMT e do artigo 152.º do CPTA – normas que consagram os requisitos de admissibilidade do recurso, para o Supremo Tribunal Administrativo, da Decisão Arbitral que tenha conhecido do mérito da pretensão deduzida com vista à uniformização de jurisprudência.

    E.

    In casu, entende o Recorrente que, relativamente à mesma questão fundamental de direito, existe contradição entre a Decisão Arbitral recorrida e a Decisão fundamento.

  4. Com vista a demonstrar a existência de contradição, relativamente à mesma questão fundamental de direito, entre ambas as decisões aqui em confronto, em primeiro lugar, nota o Recorrente que se verifica uma identidade da questão de direito sobre que recaíram as decisões. De facto, em ambos os arestos aqui em confronto, a questão decidenda ou a questão colocada foi a de saber se, na aplicação do método pro rata de dedução de imposto suportado nos bens e serviços de utilização mista, devem ser considerados no numerador e no denominador da fracção de cálculo o valor total da renda e não apenas a parte correspondente aos juros [pag. 7 Decisão Arbitral recorrida; pag. 10 Decisão Arbitral fundamento].

  5. Adicionalmente, nota o Recorrente que se vislumbra, também, uma identidade substancial das situações fácticas subjacentes a ambas as decisões. Especificamente, ambas as decisões versaram sobre “(…) uma instituição de crédito abrangida pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro”, configurando“(…) [um] sujeito passivo misto para efeitos de IVA na medida em que na sua actividade realiza operações de locação financeira mobiliária, que são tributáveis e conferem o direito de dedução do imposto, e operações de financiamento e concessão de crédito, que são isentas do imposto, que não permitem a dedução de IVA”.

  6. Na Decisão recorrida e na Decisão fundamento, o ali Requerente – aqui Recorrente –, tendo verificado que, no âmbito da sua actividade de leasing, não estava a exercer plenamente o direito à dedução de IVA que lhe assistia, procedeu ao recálculo do seu pro rata de dedução (para os anos 2007 e 2014), passando a considerar, no numerador e no denominador da fracção de cálculo, os montantes relativos à parcela de capital que integram as rendas dos contratos de leasing (em vez de apenas o valor dos correspondentes juros). Na sequência daquele recálculo, o Requerente – aqui Recorrente – apurou, para o ano 2007, uma percentagem de dedução (pro rata) de 21% (em vez dos anteriores 7%) e, para o ano 2014, uma percentagem de dedução (pro rata) de 20% (em vez dos anteriores 7%), tendo procedido à regularização, a seu favor, dos montantes de imposto que não havia deduzido anteriormente – i.e.

    € 6.457.008,39, para o ano 2007 e € 3.091.870,19, para o ano 2014.

    I. Resulta da factualidade provada da Decisão recorrida, referente ao IVA de 2007, que foi dado como provado que: “A Requerente incorreu em despesas para o apoio na disponibilização de viaturas, nomeadamente, através da sua vasta rede de balcões de atendimento, de call centers e de acesso de software de apoio ao cliente, sendo que os cerca de quinhentos balcões pertencentes à Requerente são relevantes consumidores de recursos comuns tributados em IVA” – realce nosso [ponto D da matéria de facto da Decisão recorrida] e que a “testemunha inquirida referiu que os custos gerais incorridos com a actividade de leasing eram tendencialmente repercutidos na componente financeira da renda (juro) cobrada aos clientes locatários, sendo impossível segregar e quantificar as despesas afectas à disponibilização dos veículos” [matéria de facto da Decisão recorrida, a final].

  7. Em sentido idêntico, resulta da Decisão fundamento, referente ao IVA de 2014, que foi dado como provado que: “A testemunha inquirida referiu que a aquisição de viaturas aos stands automóveis pelo Banco e a concessão de crédito aos clientes para a sua aquisição constituem actividades distintas, implicando, por parte da instituição bancária, o contacto com os fornecedores dos veículos e a análise da documentação em vista à concessão de financiamento e à comunicação de entrega da viatura ao cliente. Acrescentou que existem 400 agências a que o cliente poderá dirigir-se para adquirir a viatura através de concessão de crédito, além de uma direcção de financiamento automóvel, com delegações no Porto, Golegã, Lisboa e Faro, além de um call center e bases de dados para simulação, registo da compra e venda das viaturas. A actividade de aquisição de veículos envolve a utilização de custos gerais, como seja, água, gás, electricidade, sistema informático, telefones, fotocopiadoras e papel, que têm um peso relevante na actividade do banco. Não sendo fácil a afectação directa dos custos às diferentes actividades, sendo o exemplo paradigmático a situação os balcões” [matéria de facto da Decisão fundamento, a final].

  8. Assim, e em suma, ficaram provados os seguintes factos essenciais: § - a “aquisição de viaturas” e a “concessão de crédito aos clientes para a disponibilização da viatura” constituem actividades distintas desenvolvidas pelo Requerente; § - os custos imputáveis à actividade de “disponibilização” das viaturas aos clientes têm um peso relevante nos custos gerais do Requerente; § - no âmbito da actividade de “disponibilização” de viaturas, o Requerente incorre em múltiplas despesas, nomeadamente, através da sua rede de balcões de atendimento – relevantes consumidores de recursos comuns tributados em IVA – e através de call centers e do software de apoio aos clientes [pag. 5 Decisão Recorrida; pag. 12 e 25 Decisão fundamento]; § - não é fácil (ou, é mesmo “impossível”) a segregação e quantificação das despesas afectas ora à actividade de concessão de crédito, ora à actividade de disponibilização de viaturas (i.e.

    , a afectação directa destes custos a qualquer uma das actividades realizadas) [pag.7 Decisão Recorrida; pag.17 Decisão fundamento].

    L. Não obstante a factologia relevante ser totalmente coincidente nas Decisões Arbitrais aqui em confronto – como não podia deixar de ser, dado estar em causa, em ambos os processos, (i) o mesmo sujeito passivo e (ii) a mesma actividade de leasing e (iii) desde o ano 2007 até ao ano 2014, esta actividade não ter sofrido qualquer alteração procedimental de relevo –, os Tribunais Arbitrais alcançaram soluções totalmente antagónicas.

  9. E, conforme decorre expressamente das Decisões arbitrais aqui em confronto, o normativo legal em juízo, em ambos os processos, respeita, essencialmente, às normas comunitárias e nacionais que consagram o regime do direito à dedução do IVA – i.e.

    , artigos 167.º a 192.º da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (doravante, “Directiva IVA”) e artigos 19.º a 25.º, ambos do Código do IVA.

  10. Em paralelo, os Tribunais Arbitrais invocam (i) o Ofício-Circulado n.º 30108, que veio introduzir “o coeficiente específico que permite calcular a percentagem de dedução apenas com base no montante anual de juros”, em especial os respectivos pontos 8 e 9 [pag.13 e 14 Decisão fundamento; pag.11 Decisão recorrida] e (ii) as Decisões arbitrais em confronto assentam ainda na aplicação e interpretação da regra consagrada no artigo 74.º da LGT, a respeito do ónus da prova das “distorções significativas de tributação” alegadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, Requerida naqueles processos arbitrais e aqui Recorrida [pag. 15 Decisão fundamento; pag. 9 Decisão recorrida].

  11. Não obstante as Decisões Arbitrais aqui em confronto terem decidido a mesma questão fundamental de direito, assentando em iguais pressupostos de facto e aplicado o mesmo normativo legal, resultam das...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT