Acórdão nº 222/19.0GTABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | BEATRIZ MARQUES BORGES |
Data da Resolução | 22 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO 1. Da decisão No Processo Comum Singular n.º 222/19.0GTABF da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Albufeira, Juiz 2, submetido a julgamento, foi o arguido AL[1]: - Condenado pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de cinquenta dias de multa à taxa diária de 6 €, perfazendo o montante global de 300 €.
- Condenado na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria pelo período de três meses.
2. Do recurso 2.1. Das conclusões do arguido Inconformado com a decisão o arguido interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “I. O Arguido foi condenado como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292.º/1 do Código Penal, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa à taxa diária de €6,00 (seis euros), perfazendo o montante global de €300,00 (trezentos euros) Mais foi arguido condenado, por força do disposto no artigo 69.º/1, alínea a) do CP, na sanção acessória de inibição de conduzir quaisquer veículos motorizados, pelo período de 3 (três) meses.
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O recorrente não tem antecedentes criminais; III. O artigo 292.º/1 do Código Penal é inconstitucional ao socorrer-se de uma presunção iuris et de iure para tipificar o crime de condução de veículo com ou sem motor, em via pública ou equiparada, em estado de embriaguez (com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2g/l), presunção inilidível que não facultou ao arguido, no caso concreto, a possibilidade de provar que, apesar de ter no sangue uma taxa de álcool igual a 2,5g/l[2] as suas capacidades para conduzir veículos na via pública não se encontravam reduzidas.
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A ser interpretada a norma nesse sentido entende o arguido, ora recorrente, que a mesma é inconstitucional no seu todo, por violação dos princípios da proporcionalidade em sentido amplo e garantias de defesa em processo criminal, ínsitos nos artigos 18.º/2 e 30.º/1 da Constituição da República Portuguesa.
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Inconstitucionalidade no caso concreto que expressamente se invoca, atento o regime plasmado no artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa.
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Inconstitucionalidade que deve ser conhecida e decidida pela existência, no caso concreto, de um nexo incindível entre essa e a questão principal objeto do processo, condução de veículo automóvel em estado de embriaguez.
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A inconstitucionalidade pode ser suscitada em qualquer fase do processo, enquanto não estiver esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a questão em causa, mormente em sede de recurso.
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Relativamente à pena multa, a mesma fere o princípio da medida da pena, por excessiva, devendo ser reduzida para 30 ou 40 dias, atento o disposto nos artigos 40.º/2 e 71.º/1 do Código Penal e pela valoração do grau de ilicitude e intensidade do dolo provados pelo Tribunal a quo.
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Sendo certo que a apreciação da segunda questão apresentada em sede deste recurso fica prejudicada sendo dado provimento à questão de inconstitucionalidade do artigo 292.º/1 do Código Penal.
Pelos termos supra expostos, com o devido respeito e salvo melhor opinião, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 40.º/2 e 71.º/1 ambos do Código Penal e os artigos 18.º/2 e 30.º/1 da Constituição da República Portuguesa Nestes termos, e nos demais de Direito que serão objeto do douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso, com as legais consequências, designadamente a declaração de inconstitucionalidade do artigo 292.º/1 do Código Penal e, caso não proceda, a revogação parcial da decisão recorrida no que concerne à pena de multa aplicada de 50 dias e que aplique ao arguido uma pena de multa mais próximo do mínimo legal, a fixar prudentemente (…).”.
2.2. Das contra-alegações do Ministério Público Motivou o Ministério Público defendendo o acerto da decisão recorrida, concluindo nos seguintes termos (transcrição): “1. Assim, não consideramos que a norma do art. 292º, n.º 1 do Código Penal revele uma flagrante desproporcionalidade ou viole o princípio das garantias de defesa criminal, que justifiquem um juízo de inconstitucionalidade.
2. Não se vislumbra que a norma em causa seja inconstitucional.
3. No que toca ao quantum da pena de multa, considerando os factos apurados, a culpa (dolo directo) do arguido e as exigências de prevenção geral e especial, compreende-se que estamos perante um caso que justifica a fixação da pena concreta abaixo do seu ponto intermédio.
4. Afigurando-se-nos justa, adequada e proporcional a pena de 50 dias de multa, aplicada ao arguido, quanto ao seu quantum.
Pelo exposto, deverá ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a douta decisão recorrida, nos seus precisos termos, por ser totalmente conforme à lei,(…)”.
2.3. Do Parecer do MP em 2.ª instância Na Relação o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer no sentido de ser julgada a improcedência total do recurso interposto pelo arguido.
2.4. Da tramitação subsequente Foi observado o disposto no n.º 2 do artigo 417.º do CPP.
Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos teve lugar a conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO 1. Objeto do recurso De acordo com o disposto no artigo 412.º do CPP e atenta a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no DR I-A de 28/12/95 o objeto do recurso define-se pelas conclusões apresentadas pelo recorrente na respetiva motivação, sem prejuízo de serem apreciadas as questões de conhecimento oficioso.
2. Questões a examinar Analisadas as conclusões de recurso as questões a conhecer são: 2.1.
Inconstitucionalidade do artigo 292.º/1 do Código Penal; 2.2.
Erro de julgamento quanto à matéria de direito (artigo 412.º, n.º 2 do CPP) por errada dosimetria da pena de multa.
3. Apreciação 3.1. Da decisão recorrida Definidas as questões a tratar, importa considerar o que se mostra decidido pela instância recorrida.
3.1.1.
Factos provados na 1.ª instância O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos (transcrição): “1) No dia 11 de Junho de 2019, pelas 18h45, o arguido conduzia o motociclo de matrícula (…), na EN 125, Km 67,5, em … e submetido ao teste de pesquisa de álcool no sangue apurou-se uma T.A.S. igual 1,47 g/l, que deduzido o E.M.A. corresponde a uma taxa não inferior a 1,397 g/l.
2)O arguido sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas em quantidades susceptíveis de ultrapassar o limite legal de teor de álcool de 1,20 g/l e ainda assim quis conduzir veículo ligeiro em causa, na via pública, com a mencionada taxa de álcool no sangue, apesar de saber que tal facto era proibido e punido por lei, mas apesar de o saber quis actuar da forma descrita, e conduzir o mesmo nas condições em que o fez.
3) O arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente.
mais se provou que: 4) O arguido confessou a prática dos factos.
5) O arguido encontra-se no estado civil de casado e vive com a esposa e três filhos de 17, 16 e 9 anos.
6) O arguido vive em casa própria pela qual paga mensalmente a quantia de … a título de...
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