Acórdão nº 145/22 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Joana Fernandes Costa
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 145/2022

Processo n.º 1145/2021

3ª Secção

Relator: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos da Comissão de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol, em que é reclamante “A. SAD e reclamado o B., foi apresentada reclamação para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do n.º 4 do artigo 76.º da Lei do Tribunal Constitucional (doravante, «LTC»), do despacho proferido em 28 de setembro de 2021, pelo Presidente daquela Comissão, que não admitiu o recurso de constitucionalidade interposto da decisão colegial proferida em 4 de maio de 2021.

2. O requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade tem o seguinte teor:

«"A., SAD, Requerida nos presentes autos, notificada do acórdão que julgou o pleito, atendendo a que a decisão é definitiva, estando assim esgotados os meios jurisdicionais, vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, com efeito suspensivo e subida nos próprios autos (art. 78º, n.º 4, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional).

1. Alínea do n.º 1 do artigo 70.º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional ao abrigo da qual o recurso é interposto: alínea b);

2. Normas cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie:

- Artigo 34º da Lei n.º 54/2017, de 14/07 (Regime Jurídico do Contrato de Trabalho do Praticante Desportivo);

- Artigos 38º, 39.º e 49º do Regulamento do Estatuto, da Categoria, da Inscrição e Transferência dos Jogadores da Federação Portuguesa de Futebol (FPF).

3. Normas que a Recorrente considera violadas: arts. 58º e 18º, n.º 2, da Constituição.

4. Peça processual em que a Recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade: a oposição que apresentou na presente ação; por lapso manifesto, na oposição a Recorrente referiu-se ao Regime Jurídico do Contrato de Trabalho do Praticante Desportivo como a Lei n.º 57/2017, quando pretendia dizer Lei n.º 54/2017; o lapso é manifesto, visto que a Recorrente identificou essa lei como o Regime Jurídico do Contrato de Trabalho do Praticante Desportivo e transcreveu o preceito legal contido na Lei n.º 54/2017, sendo isenta de dúvidas, pois, que se referia à Lei n.º 54/2017.

Requer que o presente recurso seja admitido e, a final, julgado procedente.»

3. Do despacho proferido pelo Presidente da Comissão de Arbitragem, em 28 de setembro de 2021, que não admitiu o recurso de constitucionalidade, consta a seguinte fundamentação:

«Requerente:

"B."

Requerida :

"A. SAD

RECURSO INTERPOSTO PELA REQUERIDA, acima identificada, para o Tribunal Constitucional,

A - ÂMBITO DO RECURSO :

O Clube Recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a inconstitucionalidade ou ilegalidade das seguintes normas:

1. Artº 34º da Lei 54/2017 de 14/07 (Regime Jurídico do Contrato de Trabalho do Praticante Desportivo);

2. Artºs 39º, 40º e 50º do Regulamento do Estatuto, da Categoria, Inscrição e Transferência dos Jogadores (R.E.C.I.T.J) da F.P.F.

B - EXERCÍCIO DO CONTRADITÓRIO - Foram notificados os Clubes Recorridos para se pronunciarem quanto ao Recurso ora em análise, mas nada vieram dizer aos autos.

C – DECIDINDO

Esta C.A. analisando e decidindo, a tal propósito dirá o seguinte:

1. O Clube Recorrente não alegou, nem formulou conclusões, concretizando ou justificando legalmente a sua pretensão, limitando-se a requerer que "o presente recurso seja admitido e, a final, julgado procedente com as consequências legais

2. Os Estatutos da F.P.F., no seu artº 76º nº 2 fixam o seguinte: "A F.P.F. reconhece as decisões arbitrais proferidas por Tribunal Arbitral constituído no âmbito de qualquer Contrato Coletivo de Trabalho, para a resolução de litígios de natureza laboral, bem como as proferidas pelas Comissões de Arbitragem da F.P.F. e da LPFP para a resolução de questões relacionadas com a fixação de indemnização por formação e aplicação do mecanismo de solidariedade".

3. "De acordo com o estabelecido no nº 4 do artº 44º do R.E.C.I.T.J., a Comissão de Arbitragem da F.P.F., julga, segundo o direito constituído, podendo também decidir com base na equidade em todas as questões omissas" e esta autorização para julgar segundo a equidade envolve a renúncia aos recursos.

4. Socorrer-se-á ainda a C.A. neste Proc. 69/CA-20-21 das sábias e intocáveis considerações proferidas em Processo idêntico ao presente (Proc. nº 39/CA- 20/21) com a devida vénia para com o Dr. Jerry Silva, autor das mesmas que refere entre as suas variadas explanações: "De acordo com o artº 70º, nº 2 da L.T.C., nas decisões negativas, apenas é possível recorrer ao T.C. depois de se terem esgotado todas as possibilidades do Recurso Ordinário, não deixando de se ter em linha de conta que a nova L.A. V. – artº 46º, nº 2 al. e) — sugere que a ação anulatória é um verdadeiro recurso anulatório que corre num Tribunal de 2a instância como se de um Recurso se tratasse". Porém, tal não sucedeu no caso ora em análise.

5. Além do mais, não existe qualquer inconstitucionalidade nas normas previstas no R.E.C.I.T.J. e aqui postas em causa pela Recorrente, porquanto não limitam o princípio constitucional da liberdade contratual, nem interferem na liberdade de trabalho dos jogadores, como, aliás, resulta do nº 2 do artº 42º do R.E.C.I.T.J.

D-EM CONCLUSÃO

Não se admite o presente Recurso da Recorrente "A., S.A.D.", que vai indeferido porquanto, além do mais, nos termos do nº 2 do artº 76 da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (Lei 28/82 de 15 de novembro) se trata de Recurso "manifestamente infundado".

E até porque contraria a prática seguida desde sempre pelas C.A. da F.P.F. estabelecida no nº 4 do artº 44 do R.E.C.I.T J., bem como o disposto no nº 2 al. b) do artº 641 do C.P.C..»

4. Por despacho proferido em 8 de outubro de 2021, o Presidente da Comissão Arbitral retificou a decisão anteriormente proferido, através de despacho com o seguinte teor:

«Requerente:

"B."

Requerida :

"A. SAD

RECURSO INTERPOSTO PELA REQUERIDA, acima identificada, para o

Tribunal Constitucional,

RECTIFICAÇÃO

No acima mencionado Proc. nº 35/CA-2020/2021, foi proferido Despacho pelo ora signatário, sendo que, após leitura atenta, se verifica haver duas irregularidades, ainda que sem influência na substancia, mas que, de todo o modo, importa retificar por se tratar de lapsos notórios.

Com efeito

1. Na alínea b) daquele mencionado Despacho sob o título "Exercício do Contraditório" refere-se: "Foram notificados os Clubes Recorridos para se pronunciarem quanto ao Recurso ora em análise, mas nada vieram dizer aos autos".

Porém, assim não é.

Com efeito, não se deveria ter escrito "Clubes Recorridos", pois efetivamente só há um Clube Recorrido, mais exatamente, o "B.".

Por outro lado, e porque é de justiça, deverá acrescentar-se que onde se diz: "mas nada vieram dizer aos autos”, em boa verdade deverá dizer-se: "O Clube Recorrido apresentou a sua resposta ao requerimento de Recurso, aliás transmitida ao signatário, em 14 de setembro de 2021, a qual foi devidamente apreciada e valorizada.

Assim,

Deverá constar na mencionada alínea B) do meu Despacho, tão somente o seguinte: " ... o qual se pronunciou no sentido de "O Recurso da Recorrente não deve ser admitido nos termos e para os efeitos do nº 2 do artº 76, in fine da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional".

2. O Segundo lapso que importa retificar é o que se encontra erradamente plasmado no nº 4 da al. c) - Decidindo - do meu Despacho anterior e que se pretende agora corrigir.

Na verdade,

onde se diz "Socorrer-se-á ainda a C.A. neste Processo 69/CA- 2020/2021" dever-se-ia ter escrito, como agora se faz "Socorrer-se- á ainda a C.A. neste Processo nº 35/CA-2020/2021 "... pois é óbvio que não se está a analisar este Processo nº 69/CA-2020/2021, por lapso referenciado, mas sim o Proc. nº 35/CA-2020/2021. Assim,

Deverá proceder-se à renovação da totalidade do texto do Despacho proferido no Proc. nº 35/CA-2020/2021 já integrando as retificações acabadas de fazer.»

5. Na reclamação do despacho de não admissão do recurso foram invocados os seguintes fundamentos:

«Na sua oposição, a Requerida, ora Reclamante, arguiu a inconstitucionalidade do artigo 34.º da Lei n.º 54/2017, de 14/07 (Regime Jurídico do Contrato de Trabalho do Praticante Desportivo) e dos artigos 38.º, 39.º e 49.º do Regulamento do Estatuto, da Categoria, da Inscrição e Transferência dos Jogadores da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) - cfr. oposição, que aqui se considera integralmente reproduzida.

Notificada do acórdão arbitral, a Reclamante interpôs recurso do acórdão arbitral para o Tribunal Constitucional, reiterando a inconstitucionalidade das referidas normas por violação do disposto nos arts. 58.º e 18.º, n.º 2, da Constituição.

Pela decisão reclamada, a Comissão Arbitral não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional, com fundamentos espúrios, os quais, aliás, como se evidenciará no final desta reclamação, confirmam o corporativismo das normas cuja inconstitucionalidade é arguida pela ora Reclamante e do sistema de direitos de formação instituído na indústria do futebol português.

Vale a pena enunciar os fundamentos da decisão reclamada para não admitir o recurso de constitucionalidade.

1) O Clube Recorrente não alegou, nem formulou conclusões [no seu requerimento de interposição de recurso], concretizando ou justificando legalmente a sua pretensão, limitando-se a requerer que "o presente recurso seja admitido e, a final, julgado procedente com as consequências legais”;

2) De acordo com o estabelecido no n.º 4 do artº 44º do R.E.C.I.T.J., a Comissão de Arbitragem da F.P.F., julga, segundo o direito constituído, podendo também decidir com base na equidade em todas as questões omissas" e esta autorização para julgar segundo a...

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