Acórdão nº 133/22 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO 133/2022

Processo n.º 180/2022

Plenário

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. O partido político Volt Portugal (VP) veio, ao abrigo do disposto nos artigos 117.º e 118.º, da Lei n.º 14/79, de 16 maio, na redação que lhe foi dada pela Lei Orgânica n.º 4/2020, de 11 de novembro (Lei Eleitoral para a Assembleia da República, adiante designada pela sigla «LEAR»), interpor recurso contencioso para o Tribunal Constitucional de uma deliberação da Mesa de Apuramento Geral do Círculo da Europa no âmbito das eleições legislativas de 30 de janeiro de 2022. Tal deliberação, tomada na sequência de protesto apresentado pelo Partido Social Democrata (PPD/PSD), veio declarar a nulidade de votos em cento e cinquenta e uma mesas de voto do círculo eleitoral, por não terem os boletins de voto sido acompanhados de uma cópia do documento de identificação do eleitor. Pede o recorrente que o Tribunal Constitucional revogue tal decisão e, em consequência, julgue válidos todos os boletins de voto.

2. O recurso vem fundamentado do seguinte modo:

«O partido político Volt Portugal, de sigla VP, inscrito junto do Tribunal Constitucional desde 25 de Junho de 2020 e candidato no acto eleitoral de Eleições Legislativas à Assembleia da República em 30 de janeiro de 2022, vem, ao abrigo do disposto no artigo 118.°, n.° 1 da Lei n.° 14/79, de 16 de maio (Lei Eleitoral da Assembleia da República), e com os fundamentos constantes do articulado anexo, impugnar judicialmente a deliberação afixada no edital no dia 10 de fevereiro de 2022, referente ao apuramento geral eleitoral no círculo eleitoral da Europa, desta forma apresentando

RECURSO DE IMPUGNAÇÃO

Requerimento para Apreciação de Recurso à Deliberação de Impugnação por parte da Mesa de Assembleia de Apuramento Geral do Círculo Eleitoral da Europa

1.°

O partido político de denominação Volt Portugal, sigla VP, com sede na Avenida Estados Unidos da América n.° 12, 2º Esquerdo, Lisboa, que participou no acto eleitoral das Eleições Legislativas à Assembleia da República em 19 círculos eleitorais, incluindo os círculos da Europa e Fora da Europa, vem requerer aos Exmos. Juízes do Tribunal Constitucional, instância de recurso das deliberações de Mesas de Apuramento Geral (n.° 1, artigo 118.° da Lei Eleitoral da Assembleia da República (LEAR)), a apreciação do presente recurso de impugnação da deliberação da Mesa de Apuramento Geral do Círculo da Europa, com Edital afixado a 10 de fevereiro de 2022, que impugna o apuramento eleitoral de 151 mesas de voto deste círculo eleitoral, em resultado do protesto/reclamação apresentado pela Mandatária do Partido Social Democrata (PSD).

2.°

O argumento apresentado pelo PSD, ao qual a Mesa de Apuramento Geral deste círculo eleitoral veio a dar razão, consiste na inadmissibilidade de boletins de voto que não sejam acompanhados de cópia do documento de identificação (Cartão de Cidadão, Bilhete de Identidade ou outro documento válido e admissível), de acordo com o n.° 6 do artigo 79.°- G da Lei Eleitoral da Assembleia da República (LEAR ou Lei n.° 14/79, de 16 de maio), que citamos: "6 — O envelope de cor verde, devidamente fechado, e' introduzido no envelope branco, juntamente com uma fotocópia do cartão de cidadão ou do bilhete de identidade, que o eleitor remete, igualmente fechado, antes do dia da eleição."

3.°

Numa primeira exposição, o Volt Portugal vem refutar o Protesto/Reclamação apresentado pelo Partido Social Democrata, no que diz respeito à inadmissibilidade de boletins de voto que não sejam acompanhados de cópia do documento de identificação.

1) Acrescentando às disposições legais da Lei Eleitoral para a Assembleia da República (LEAR) as seguintes considerações:

a) A deliberação do Conselho Nacional de Eleições de 2019, [em] que lê:

«Nota: Relativamente à descarga e procedimentos da mesa chama-se a atenção para a Deliberação da Comissão Nacional de Eleições, de 15 de outubro de 2019, tomada por ocasião da Eleição da Assembleia da República de 2019, e com o pedido de divulgação aos membros das mesas das assembleias de recolha e contagem dos votos dos residentes no estrangeiro:

"Descarga dos eleitores - situações de ausência de cópia do documento de identificação «O artigo 106.º-I, no seu n..º 4, determina que o presidente da assembleia (deve ler-se, mesa) entrega os "envelopes brancos aos escrutinadores, que descarregam o voto", contando-se em seguida as descargas (n.º 5) e, só depois, os envelopes brancos são contados e "imediatamente destruídos" (n.º 6).

De onde resulta que se procede à descarga com os envelopes brancos fechados, se fazem prova e contraprova das contagens e, só depois, são abertos para verificação e separação do seu conteúdo.

Acresce, por um lado, que não releva para o exercício do direito de voto a identificação através de documento apropriado, uma vez que ela é, em primeira mão, assegurada pela receção da correspondência eleitoral sob registo pelo destinatário ou pessoa próxima. A remessa pelo eleitor de cópia de documento de identificação serve, afinal e apenas, como reforço das, de si fracas, garantias do exercício pessoal do voto.

Por fim, se o voto nestas condições se há de ter por nulo deve para o efeito considerar-se exercido e, logo, ser previamente descarregado.»

b) Todos os Membros das Mesas de Voto do Círculo da Europa, nos dias 8 e 9 de fevereiro, receberam previamente, por via dos delegados dos partidos políticos ou coligações partidárias, o Manual dos Membros das Mesas Eleitorais - Assembleias de Recolha e Contagem de Votos dos Eleitores residentes no Estrangeiro (Anexo A), onde a citação supramencionada no n.° 1, alínea a) estava presente nas páginas 7 e 8 deste Manual;

c) Todas as Mesas de Voto do Círculo da Europa, nos dias 8 e 9 de fevereiro, tinham recebido, por parte da organização logística das Mesas de Voto, o Manual dos Membros das Mesas Eleitorais - Assembleias de Recolha e Contagem de Votos dos Eleitores residentes no Estrangeiro (Anexo A), onde a citação supramencionada no n.° 1, alínea a) estava presente nas páginas 7 e 8 deste Manual;

d) A dezoito de janeiro de 2022 (18/jan/2022) houve uma reunião pelas dez horas e trinta minutos, nas instalações da SIGMAI-AE, sitas na Praça do Comércio, Ala Oriental, em Lisboa, com os delegados e/ou mandatários dos partidos políticos (enumerados pelas suas siglas) IL, PSD, PS, A, BE, L, VP e CDU, "para procederem à escolha dos membros das mesas da Assembleia de Recolha e Contagem dos Votos dos Residentes no Estrangeiro" e para análise de outros assuntos. Na supramencionada reunião foi decidido por unanimidade dos delegados e mandatários presentes, incluindo do PSD, que:

"1. Escrutínio dos envelopes brancos

[.. .]

3.2 Aceitar como válidos todos os boletins cujos envelopes permitam a identificação clara do eleitor e descarga nos cadernos eleitores desmaterializados, mesmo que o envelope não contenha cópia do cartão de cidadão ou bilhete de identidade, já que a "remessa pelo eleitor de cópia de documento de identificação serve, afinal e apenas, como reforço das garantias do exercício pessoal do voto" (CNE, 2019)."

A ata assinada correspondente a esta reunião segue em anexo, como Anexo B.

4.°

O Volt Portugal vem desta forma requerer aos Exmos. Juízes do Tribunal Constitucional a revogação da deliberação de impugnação por parte da Mesa de Assembleia de Apuramento Geral do Círculo da Europa, que impugna aproximadamente cento e cinquenta e sete mil votos, dado as alíneas a), b) e c) acima descritas, que estabelecem e comunicam a clara "deliberação da Comissão Nacional de Eleições" aos Membros das Mesas de voto que "A remessa pelo eleitor de cópia de documento de identificação serve, afinal e apenas, como reforço das, de si fracas, garantias do exercício pessoal do voto." e que, como tal, a cópia do documento de identificação não é um elemento obrigatório para a validade do boletim de voto poder ser considerada. Acrescenta-se a decisão a 18 de janeiro de 2022, tomada por unanimidade de todos os delegados e mandatários presentes, incluindo do PSD (partido que apresentou o protesto/reclamação), de que todos os boletins de voto "cujos envelopes permitam a identificação clara do eleitor e descarga nos cadernos eleitorais desmaterializados, mesmo que o envelope não contenha cópia do cartão de cidadão ou bilhete de identidade" devem ser considerados válidos.

5.º

Numa segunda exposição, considerando o artigo 5.°, n.° 2, da Lei n.°7/2007, de 5 de fevereiro, número este inalterado pelos diplomas de alteração desta lei que lhe seguiram, onde se lê:

"2 - É igualmente interdita a reprodução do cartão de cidadão em fotocópia ou qualquer outro meio sem consentimento do titular, salvo nos casos expressamente previstos na lei ou mediante decisão de autoridade judiciária."

Ora, é do entendimento do Volt Portugal que o cidadão eleitor é coagido a reproduzir o seu documento de identificação (por exemplo, o Cartão de Cidadão) por parte da SGMAI-AE, órgão que organiza o processo do voto por correspondência aos eleitores no estrangeiro, quando lhe é colocado a condicionante de entrega de cópia deste (ou outro) documento de identificação para que o voto seja considerado válido. Desta forma, esta obrigatoriedade da qual dependeria a validade do seu voto constitui não só um incumprimento do estabelecido pelo n.° 2 do artigo 5.° da Lei n.°7/2007, de 5 de fevereiro, (forçando o cidadão eleitor a ceder a reprodução do seu documento de identificação) como também limitaria o pleno exercício de um direito constitucional elementar como o direito ao voto. Por esta segunda exposição, o Volt Portugal reitera o pedido de impugnação da deliberação da Mesa de Apuramento Geral do Círculo da Europa.

6.°

Acresce de que o procedimento é ainda incoerente com a...

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