Acórdão nº 6816/18.4T8GMR.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelTIBÉRIO NUNES DA SILVA
Data da Resolução20 de Janeiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I AA, BB, CC e DD instauraram a presente acção declarativa contra EE, pedindo: a) que seja declarado que os Autores são proprietários, na proporção de um quarto para cada um deles, do prédio identificado nos itens 1º e 4º da petição inicial; b) a condenação do Réu a reconhecer aos Autores aquele direito de compropriedade e a restituir-lhes o referido prédio, completamente livre e devoluto de pessoas e bens; c) a condenação do Réu, como possuidor de má-fé, no pagamento aos Autores da quantia de 5.200,00 Euros pela ocupação respeitante aos meses de Novembro e Dezembro de 2017 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro e Novembro de 2018, assim como na quantia de 400,00 Euros mensais enquanto durar a ocupação abusiva e de má fé.

Alegaram os AA., em resumo, que: São comproprietários, na proporção de um quarto para cada um, do prédio urbano constituído por casa de habitação de rés-do-chão, com 5 divisões, sito na Rua..., ..., também conhecida por lugar ..., ..., concelho ....

A aquisição do direito de propriedade plena do imóvel adveio aos Autores por sucessão testamentária, em que foi testadora FF.

Alegaram também que, há mais de 20 anos, quer por eles, quer por antepossuidores, sem interrupção, estão na posse desse imóvel, exercendo sobre ele todos os actos próprios do direito de propriedade, sem oposição de ninguém, à vista de toda a gente e na convicção de dele serem donos.

Sucede que o Réu habita, sem título e contra a vontade dos AA., o dito prédio, tendo já sido interpelado para desocupá-lo.

O imóvel tem um valor locativo mensal e, se os Autores o arrendassem, como é sua vontade, o que já poderia ter acontecido a partir, pelo menos, de Novembro de 2017, poderiam auferir de uma renda mensal nunca inferior a €400,00.

O Réu contestou, defendendo-se por excepção (ilegitimidade activa e passiva) e por impugnação.

Alegou, entre o mais que aqui se dá por reproduzido, que: O prédio em causa nunca foi propriedade da testadora FF.

A 31 de Agosto de 1977, GG vendeu a HH, por declaração de compra e venda, esse prédio, pelo preço de 145 000$00.

HH faleceu a 3 de Julho de 1995, no estado de casado com II, que faleceu a 2 de Novembro, sendo pais do Réu e de JJ.

HH e II não deixaram testamento ou qualquer outra disposição de última vontade.

O prédio identificado na petição inicial pertence ao acervo hereditário por óbito dos pais e transmitiu-se, por sucessão hereditária, aos filhos do casal: o Réu e seu irmão JJ.

De qualquer modo, quer por si, conjuntamente com seu irmão JJ, quer por antepossuidores, estão na posse do imóvel, praticando os actos próprios de proprietário, que o R. enuncia, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, na convicção de exercerem um direito próprio e em tudo se comportando como donos e, por todos, como tal sendo considerados.

O contrato de compra e venda celebrado entre GG (como vendedor) e FF (como compradora) está afectado de simulação, já que houve um acordo entre os outorgantes no sentido de ser FF, que tinha estatuto de emigrante, a aparecer como compradora, em vez de HH, a fim de que, desse modo, este (verdadeiro comprador) viesse a retirar a vantagem de deixar de pagar a correspondente sisa pela transmissão do imóvel (parcela de terreno).

HH, que, desde 31 de Agosto de 1977, detinha a posse da parcela de terreno que foi objecto da compra e venda em causa, também acordou com o vendedor e a sua cunhada FF que aparecesse como compradora, porque, entretanto, havia negociado com esta que o terreno seria dividido em duas partes iguais (HH ficaria com a metade Nascente e FF ficaria com a metade Poente), como veio a acontecer mais tarde.

Alegou ainda, a título subsidiário, a aquisição da propriedade do prédio por acessão industrial imobiliária, em virtude das obras que aí foram realizadas pelo seu pai.

Concluiu nos seguintes termos: «a) devem ser julgadas procedentes por provadas as excepções deduzidas e, em consequência, o R. absolvido do pedido; b) se assim não for, devem as excepções deduzidas serem julgadas procedentes por provadas e, em consequência, ser o R. absolvido da instância; c) de qualquer modo, deve a presente acção ser julgada improcedente por não provada e, em consequência ser o R. absolvido do pedido; d) e cumulativamente, deve ser declarado que os únicos herdeiros de HH e esposa II são seus filhos: JJ e EE (aqui R.), não havendo quem com eles possa concorrer; e) cumulativamente deve o pedido reconvencional ser julgado procedente por provado e, em consequência, i) ser declarado que o R. (conjuntamente com seu irmão, co-herdeiro JJ) são donos, senhores, legítimos possuidores e proprietários do prédio identificado e descrito nos n.ºs 1 e 4 da petição inicial e nos documentos n.º 2 e 3 com a mesma juntos e identificados, ainda, na Parte III (n.º 37 a 42-inclusivé) e documentos n.º 6, 7, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56 e 57 juntos com esta contestação-reconvenção; ii) Serem os AA. reconvindos condenados a reconhecer que o R. EE (e seu irmão JJ) são os únicos donos, senhores, legítimos possuidores e proprietários do prédio referido e identificado na anterior al. i), por virtude de o haverem adquirido por prescrição aquisitiva ou usucapião nos termos narrados nesta contestação-reconvenção; f) serem os AA. condenados a reconhecerem que teriam de devolver ao R.-reconvinte (e a seu irmão JJ) o prédio identificado livre de pessoas, animais e bens (se alguma vez tivesse estado por si ou antecessores ou antepassados, na posse do mesmo); g) cumulativamente, ser o contrato de compra e venda de 29/12/1977 (conf. doc. n.º 7) ser declarado simulado (simulação relativa) já que o verdadeiro comprador foi o HH (conf. doc. n.º 6) e, em consequência ser considerado que o contrato de compra e venda dissimulado (escondido) é o verdadeiro contrato que vem a consubstanciar a "declaração" que corresponde ao doc. n.º 6 junto com esta contestação-reconvenção; h) de qualquer modo e em qualquer circunstância deve ser declarado nulo o legado da testadora FF, constante do seu testamento de 16/04/1998, pois que lega (o prédio em causa) bem esse que lhe não pertence e, por conseguinte, não faz parte do seu acervo hereditário; i) subsidiariamente aos anteriores pedidos ser declarado que o pai do R., HH adquiriu a propriedade do prédio em causa por virtude de acessão industrial imobiliária, devendo pagar aos AA. a quantia de €15.000,00 (quinze mil euros) valor atribuído ao terreno onde estão implantadas as construções (casa de habitação, garagem e anexos-com os respectivos apetrechamentos) já que o valor trazido pelas obras do HH no montante superior a € 150.000,00 foi maior do que o valor que o prédio (parcela de terreno com 745 m2 de superfície) tinha à data da incorporação (de 1978 a 1985 data das várias incorporações) narradas nesta contestação-reconvenção; j) em consequência dos pedidos elaborados nas alíneas anteriores requer-se a V.Ex.ª que se digne a ordenar o cancelamento de todos os registos ocorridos a partir do registo de propriedade em nome dos seus proprietários GG e mulher KK e, em consequência, todos e quaisquer registos que porventura hajam sido feitos a partir de 29/12/1977 (inclusive)».

Os Autores replicaram, defendendo a improcedência da reconvenção e deduzindo o incidente de intervenção principal provocada dos cônjuges dos Autores, LL, MM, NN e OO, intervenção que foi admitida por despacho de 20-03-2019.

Por seu lado, o R. veio pedir a intervenção principal provocada de JJ e mulher, PP, que foi admitida por despacho de 01-04-2019.

Os chamados não apresentaram articulado próprio.

Foi proferido despacho saneador, no qual se consideraram supridas as invocadas ilegitimidades, em face das intervenções provocadas.

Julgou-se improcedente a deduzida (pelos AA., na réplica) ineptidão da reconvenção.

Não se admitiu a pretendida (pelo R.) ampliação do pedido reconvencional.

Definiu-se o objecto do litígio e elencaram-se os temas de prova.

Prosseguindo os autos, veio a realizar-se a audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença, com o seguinte resultado: «Pelo exposto decido: a). julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, declaro que os Autores são proprietários, na proporção de um quarto para cada um deles, do prédio supra identificado em I.3 e I.5, e condeno o Réu EE a reconhecer tal direito e a restituir aos Autores o referido prédio, completamente livre e devoluto de pessoas e bens, absolvendo-o do mais que vinha peticionado; b). declarar que os únicos os herdeiros de HH e esposa II são seus filhos JJ e o Réu EE, absolvendo os Autores de tudo o que vinha pedido em sede reconvencional.» Inconformado, recorreu o R. para a Relação ....

Os AA. contra-alegaram e requereram a ampliação do âmbito do recurso (o que foi convolado para recurso subordinado, por despacho de 02-11-2020), relativamente à atribuição de uma indemnização pela ocupação do imóvel por parte do Recorrente.

O Tribunal da Relação proferiu acórdão, no qual se julgou improcedente o recurso interposto pelo Réu e parcialmente procedente o recuso subordinado, pelo que se condenou o Réu a pagar aos Autores, pela ocupação do imóvel identificado nos factos 3 e 5 dos factos provados, uma indemnização de € 300,00 por cada mês, de Novembro de 2017 até cessar tal ocupação.

Julgou-se, na restante parte, improcedente o recurso subordinado e manteve-se, no mais, a decisão recorrida.

Novamente irresignado, o R. interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, referindo que «se necessário, deverá ser considerada excepcional-conf. art.º 672.º do Cód. Proc. Civil), abrangendo a globalidade da decisão recorrida (o, aliás douto, acórdão do Tribunal da Relação ...) (conf. art.º 671.º e seguintes do Cód. Proc. Civil)».

O Exmº Juiz Desembargador Relator proferiu despacho, no qual considerou o seguinte: «No recurso que agora interpõe, o réu sintetiza as suas pretensões na conclusão 37.ª, onde afirma que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT