Acórdão nº 19655/15.5T8PRT.P3.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 2022
Magistrado Responsável | MARIA CLARA SOTTOMAYOR |
Data da Resolução | 18 de Janeiro de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - Relatório 1.
“Caetano-Baviera - Comércio de Automóveis, S.A.” instaurou ação declarativa, com forma de processo comum, contra AA, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de € 16.778,45, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Alega, para tanto e em resumo, que o Réu, então seu empregado como vendedor de viaturas e a quem estava distribuído o veículo de matrícula ...-MT-..., quer para serviço da Autora, quer para utilização pessoal do Réu nos dias e horas livres do seu horário de trabalho, em dia em que não se encontrava em serviço e sem que tivesse recebido instruções para a realização de qualquer serviço, foi, como condutor do referido veículo, interveniente num acidente de viação, cuja culpa lhe é imputável, tendo acusado uma taxa de alcoolemia de 0,43g/l e encontrando-se também sob o efeito de um medicamento que, conjugado com o álcool, lhe causou perturbações na atenção, nos reflexos e coordenação, suscetíveis de afetar o exercício da condução, do qual advieram danos ao ...-MT-..., cuja reparação ascendeu a €16.778,45, valor suportado pela Autora e que o Réu não pagou, apesar de interpelado a fazê-lo.
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Contestou o Réu por exceção, em que invoca a incompetência em razão da matéria do tribunal, e por impugnação, alegando que a culpa no acidente lhe não é imputável, mas a um veículo terceiro não identificado, e que o veículo da Autora não tinha o valor por ela indicado nem os danos ascenderam ao montante peticionado, mais aduzindo que nunca a Autora exigiu a qualquer dos seus vendedores a reparação das viaturas que conduzem, mesmo em caso de sinistro ocorrido fora de serviço e aquando do uso da viatura em serviço pessoal, concluindo pela improcedência da ação e pela sua absolvição do pedido.
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Tendo o Autor respondido a sustentar a improcedência da exceção invocada pelo Réu, foi proferido despacho saneador que, julgando improcedente a exceção de incompetência do tribunal em razão da matéria, afirmou a validade e regularidade da instância, fixou o valor da causa, identificou o objeto do litígio e enunciou os temas de prova.
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Iniciada, em … de maio de 2016, pelas 14 horas, a audiência final, em que foram inquiridas duas testemunhas - BB, arrolada pela Autora, e CC, comum a ambas as partes -, e em que a mandatária da Autora, face à necessidade de designação de data para a sua continuação, pediu a palavra, no uso da qual fez consignar, comoda respetiva ata consta, que “Não acedendo, por razões que são absolutamente alheias à sua agenda, com marcações de outras audiências ou diligências judiciais, vem desde já informar este Digno Tribunal que a haver data para continuação do julgamento, pode já não se encontrar disponível para o efeito, pelo que a ser assim, de imediato informará este Digno Tribunal que se releve qualquer e todo o inconveniente que tal impossibilidade acarrete”, foi para o efeito designado o dia 28 de junho de 2016 (todo o dia).
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Na data designada para a continuação da audiência - … de junho de 2016 -, que se iniciou pelas 9,30horase em que, na respetiva ata, se fez constar que “Consigna-se que o escritório da Ilustre Mandatária da Autora entrou em contacto via telefone com este Tribunal, comunicando que a Drª DD, que se encontrava doente, não podendo comparecer no dia de hoje à audiência de julgamento, tendo dado conhecimento à Srª Juiz”, tendo o mandatário do Réu deixado à consideração do Tribunal a decisão de adiar, ou não, a audiência, após prolação de despacho do seguinte teor “Nos termos do artº 603º do CPC, o adiamento só é admissível com base numa situação de justo impedimento e dentro dos pressupostos do artigo 140º do mesmo diploma. A secção diligenciou por verificar junto da central e do sistema citius se teria sido junto algum requerimento no sentido de se peticionar o adiamento ou demonstrar alguma circunstância enquadrável na figura de justo impedimento. Tendo em conta que estamos perante uma continuação de audiência e que estão convocadas inúmeras testemunhas que se encontram aqui presentes e outras que virão da parte da tarde, e dado que este julgamento foi agendado por acordo dos Ilustres Mandatários e Tribunal, e sobretudo porque não nos é requerido qualquer adiamento nem junto nenhum meio de prova conforme determina o artº 603º e 140º do CPC, o Tribunal terá que realizar a continuação da presente audiência, por não a considerar adiável nos termos do novo Código de Processo Civil”, realizou-se a audiência, com inquirição de todas as restantes testemunhas, excetuando a testemunha EE, arrolada pelo Réu, que não se encontrava presente mas foi prescindida, e tomada de declarações de parte ao Réu, e em que o Réu requereu a junção de um documento (fls. 156 a 158), que foi admitida, após o que foi proferida sentença a julgar improcedente a ação e a absolver o Réu do pedido.
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A Autora, que requereu a anulação do processado até à realização da audiência de 28/6/2016, com fundamento em irregularidade processual decorrente do não adiamento da audiência, e arguiu também a irregularidade por falta de notificação do documento nela junto pelo Réu, interpôs recurso de apelação da sentença oferecendo as respetivas alegações e pugnando pela sua revogação, relativamente ao qual o Réu respondeu a sustentar a improcedência da apelação.
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Sem que o tribunal de 1.ª instância se tenha pronunciado sobre o requerimento da Autora a arguir as ditas irregularidades, foram os autos remetidos ao Tribunal da Relação para apreciação do recurso de apelação interposto da sentença, tendo o relator proferido despacho a ordenar a baixa dos autos ao tribunal de 1ª instância a fim de ser emitida pronúncia sobre tal requerimento.
8.
Proferida decisão a indeferir as irregularidades por ela invocadas, apelou a Autora e, remetidos os autos de novo ao Tribunal da Relação, foi proferido acórdão que, conhecendo em primeiro lugar do recurso interposto do despacho que indeferiu as irregularidades, julgou improcedente a arguição da nulidade consistente na realização do julgamento sem a presença da mandatária da Autora e procedente a decorrente da falta de notificação à Autora do documento, cuja junção foi requerida pelo Réu e admitida na audiência de julgamento que teve lugar em 28/6/2016, ordenando a notificação do documento à Autora e a posterior reabertura da audiência para alegações e prolação de nova sentença e considerou prejudicado o conhecimento do recurso interposto da sentença final.
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Na sequência da notificação do documento junto pelo Réu em 28/6/2016, requereu a Autora, que impugnou o teor do documento, contradita às testemunhas FF e GG, arroladas pelo Réu, relativamente aos factos provados de 14, e que sobre eles o Réu, que prestou declarações de parte, fosse confrontado ou que fosse determinado o seu depoimento de parte quanto a tais factos, o que mereceu a oposição do Réu e foi indeferido por decisão transitada, já que a apelação dela interposta pela Autora foi julgada improcedente.
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Reaberta a audiência em que as partes produziram alegações orais, veio posteriormente a ser proferida nova sentença que, declarando os factos provados e os não provados, com a respetiva motivação, julgou improcedente a ação e absolveu o Réu do pedido.
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Inconformada, a Autora interpôs recurso para o Tribunal da Relação ....
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O Tribunal da Relação proferiu acórdão, em 23-01-2020, objeto de retificação, que, depois de enunciar como questões suscitadas a omissão do poder/dever do inquisitório, a violação do disposto no artigo 607º, nº 4, do Código de Processo Civil, a alteração da matéria de facto, a errada subsunção jurídica dos factos e responsabilidade pelo acidente e contradição entre a motivação e a decisão da matéria de facto, julgando procedente a primeira questão que enunciou e declarando prejudicadas as demais questões, revogou a sentença recorrida para que fossem reinquiridas duas testemunhas que haviam sido arroladas pela Autora à matéria dos factos por ela alegados nos artigos 6º e 7º da petição inicial, com posterior prolação de nova sentença.
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Inconformado, o réu interpõe recurso de revista, em que invocou a ofensa do caso julgado, tendo este Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão proferido em 17-12-2020, concedido a revista, considerando que o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, em 23-01-2020, ao ordenar a reinquirição de duas testemunhas, violou o caso julgado formal do acórdão proferido nos autos em 29-6-2017, e ordenou a remessa dos autos ao Tribunal da Relação para que conhecesse das restantes questões do recurso de apelação.
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Nesta sequência, o Tribunal da Relação ... proferiu acórdão, m 17-06-2021, em que conheceu as seguintes questões que tinham ficado prejudicadas - Violação do disposto no artº 607º, nº 4, do Código de Processo Civil; Alteração da matéria de facto e contradição entre a motivação e a decisão da matéria de facto; Errada subsunção jurídica dos factos e responsabilidade pelo acidente – decidindo julgar procedente a apelação, e, consequentemente, revogado a sentença recorrida, condenando o apelado a pagar à apelante a quantia de € 16.778,45, acrescida de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento.
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Inconformado, o Réu recorreu para este Supremo Tribunal, com base no artigo 629.º, n.º 2, al. a), do CPC; formulando na sua alegação de recurso, as seguintes conclusões: «1ª – Ao julgar não provados os factos constantes da matéria de facto julgada provada nos pontos 22, 23, 24, 25, 28, 29, 31 e 32 da sentença, em contrário do decidido neste processo pelo acórdão (1º) da Relação prolatado na apelação da primeira sentença, em 29/06/2017, transitado em julgado, e, em consequência, vindo condenar o R. no pedido, revogando a sentença recorrida, o douto acórdão ora recorrido violou caso julgado, em face do disposto nos arts. 580º, 581º, 620º e 621º do CPC.
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– Neste processo, foi proferida sentença (1ª) em 07/07/2016, que julgou a ação integralmente...
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