Acórdão nº 236/18.6IDBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA ISABEL CERQUEIRA
Data da Resolução10 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Criminal deste Tribunal: Relatório No Juízo Local Criminal de Barcelos – Juiz 1, em processo comum com intervenção do tribunal singular, foi, em 8/07/2021, proferida sentença que condenou cada um dos arguidos A. M., A. F. e P. M., pela prática em co-autoria material, de um crime de fraude fiscal p. e p. pelos art.ºs 103º n.º 1 e 104º n.º 2 alínea a) do RGIT (L. 15/2001, de 5/06), na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 anos, e condicionada ao pagamento à Administração Fiscal por cada um deles da quantia de 12.564,76 euros.

Mais foram aqueles arguidos condenados, bem como as co-arguidas X, Ldª e SARL – ... France, a pagarem, solidariamente, nos termos dos n.ºs 2 e 4 do art.º 111º do Código Penal (a partir de agora apenas referido como CP), ao Estado, a quantia de 37.694,26 euros, montante correspondente à vantagem patrimonial tida com o crime.

Desta decisão interpuseram aqueles arguidos o presente recurso, alegando, nas suas conclusões, pelas quais se afere o seu âmbito: 1 – Os recorrentes A. M. e A. F.

ser excessiva a pena aplicada, que deveria ter sido fixada, no máximo de 1 ano de prisão, suspensa por igual período de tempo (designadamente, face às circunstâncias enumeradas nas conclusões 14 a 17 do seu recurso), e sem a condição de pagamento ao Estado da quantia de 12.564,76 euros, por o art.º 14º do RGIT não ser de funcionamento automático, impondo-se a sua interpretação de harmonia com o disposto nos art.ºs 50º n.º 1, 51º, 52º e 53º do CP e com os ensinamentos do AUJ n.º 8/2012, interpretação que se tivesse sido feita implicaria a não imposição daquela condição por a mesma não ser razoável face às suas situações económicas. Sem prescindir, alegam que a manter-se aquela condição, o prazo para o pagamento não deve ser nunca inferior a 10 anos, e ser a decisão recorrida nula por falta de fundamentação no tocante à fixação da medida da pena e ao prazo de cumprimento daquela condição, nomeadamente por ter sido aplicada a mesma pena a arguidos com situações económicas diferentes. Concluem pela aplicação de uma pena de multa.

2 – O arguido P. M.

impugna as alíneas c), f), h) a k), e m) a o) da matéria de facto provada, que sustenta deverem ter sido dados como não provados, por nunca ter exercido a gerência de facto da co-arguida X, Ldª, indicando como a imporem decisão diversa da acolhida pelo tribunal a quo parte das suas declarações e das dos co-arguidos A. F. e A. M., e o depoimento das testemunhas F. J., R. M., R. C., B. A. e M. P., nas partes que referencia relativamente à gravação da audiência, além de as transcrever. Acrescenta que não deveria ter sido conferida a credibilidade que o tribunal a quo conferiu ao depoimento das testemunhas J. G. e F. S., alega como violados os princípios da livre apreciação da prova e in dúbio pro reo e c onclui pela sua absolvição.

A Magistrada do M.P. junto do tribunal recorrido respondeu aos recursos interpostos, pugnando pela sua total improcedência.

A Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta junto deste tribunal emitiu douto parecer, no qual se pronuncia no mesmo sentido da total improcedência dos recursos interpostos.

Foi cumprido o disposto no n.º 2 do art.º 417º do CPP, foram colhidos os vistos legais, e procedeu-se à conferência, cumprindo decidir.

***** *****No acórdão recorrido, foram considerados provados e não provados os seguintes factos, com a seguinte motivação (que se transcrevem integralmente) II – Fundamentação.

  1. De facto.

1.1. Factos provados.

  1. A X, Lda, é uma sociedade por quotas a que foi atribuída o número de identificação de pessoa colectiva e de identificação fiscal ………, está matriculada na Conservatória do Registo Comercial de …, sendo que para efeitos de tributação em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) declarou como actividade a construção de edifícios (residenciais e não residenciais), com o CAE ….

  2. Para efeitos de Tributação em sede de IVA, a sociedade X, Lda encontra-se enquadrada no regime de tributação normal, com periodicidade mensal.

  3. A despeito de ter sido inscrito, no respectivo Registo Comercial, como sendo gerentes da referida sociedade o arguido A. M., este desde 09/05/2014, e N. M., esta entre 24/04/2013 até 02/01/2017, certo é que, pelo menos entre meados do ano de 2014 até ao início do ano de 2015, foram os arguidos A. M., A. F. e P. M. quem administraram a sociedade arguida, tomando conjuntamente todas as decisões relativas ao seu normal funcionamento, incluindo as que se reportavam ao preenchimento das declarações fiscais, bem como ao apuramento e pagamento de todos os impostos devidos pela arguida sociedade.

  4. Os arguidos A. M. e S. H. são casados entre si.

  5. Em 09/05/2014, A. M. e N. M. outorgaram procuração no Cartório Notarial de A. A., sito em Esposende, através da qual declararam constituir da sociedade X, Lda, A. F., conferindo-lhe poderes para a representar (incluindo o de realizar quaisquer operações) junto de quaisquer bancos ou instituições bancárias, nacionais ou estrangeiras; constituir, modificar, transferir, cancelar ou retirar toda a espécie de depósitos de bens móveis, dinheiro, valores e numerário; comparecer como representante legal da sociedade perante toda a espécie de Tribunais da Jurisdição ordinária, civil ou penal; fazer, admitir toda a espécie de adjudicações e ofertas; comparecer perante o notário, autoridades ou funcionários e outorgar e subscrever perante os mesmos documentos, requerimentos ou escrituras (incluindo para compra e venda de móveis e imóveis), representar a sociedade em tudo quanto esteja relacionado com os interesses da mesma, perante o Estado, autarquias locais e organismos dependentes direta ou indiretamente daquelas; outorgar quaisquer contratos junto de qualquer entidade pública ou privada; representar a sociedade junto de clientes e fornecedores, entre outros poderes.

  6. A sociedade SARL ... France – em liquidação, é uma sociedade de direito francês, com o número de contribuinte FR ………., constituída em 08/02/2013, com sede em … Rue …., Nantes, cujo objeto social consiste na realização de todos os trabalhos de renovação, restauração, reabilitação, reparação, desenvolvimento, construção, transformação de bens móveis e imóveis.

  7. No período referido em c), ou seja, pelo menos entre meados do ano de 2014 até ao início do ano de 2015, era o arguido A. M., quem administrava a sociedade SARL ... France, tomando todas as decisões relativas ao seu normal funcionamento, incluindo as que se reportam ao preenchimento das declarações fiscais, bem como ao apuramento e pagamento de todos os impostos devidos pela arguida sociedade.

  8. Em dia não determinado do ano de 2014, situado entre o mês de Maio e o dia 31/12/2014, os arguidos, por si e em representação das sociedades arguidas que administravam, decidiram criar facturas e recibos emitidas em nome de J. M. e da sociedade SARL ... France, para obterem benefícios fiscais indevidos para a X, Lda, nos seguintes termos.

  9. Acordaram os arguidos comumente que a sociedade X, Lda inscreveria na sua contabilidade faturas emitidas pela referida sociedade SARL ... France e ainda em nome do referido J. M., referentes a transacções fictícias, forjando para o efeito o seu conteúdo, por forma a incluir ali despesas que não foram efectivamente suportadas pela sociedade arguida X, Lda, incrementando os custos, diminuindo o lucro tributável, por forma a obter, com base nas mesmas, vantagens patrimoniais em sede de IRC.

  10. Na execução de tal propósito, os arguidos elaboraram ou fizeram elaborar por alguém a seu mando, em nome da sociedade SARL ... France e de J. M., as seguintes faturas, que incluíram na contabilidade da sociedade arguida X, Lda, no ano fiscal de 2014, como se de verdadeiros custos se tratassem: k) Não obstante, as facturas supra não correspondem a serviços efetivamente prestados à sociedade X, Lda pela sociedade e/ou entidades que ali figuram como emitentes.

  11. Em virtude da emissão e inclusão das facturas supra na contabilidade da sociedade arguida e da sua inclusão na declaração anual de IRC apresentada junto da Autoridade Tributária (onde se fez constar falsamente ter sio pago, como custos de actividade, os valores referidos nas referidas faturas), a sociedade X, Lda obteve, em sede de IRC, decorrente de dedução das ditas despesas mencionadas nas indicadas facturas, vantagem patrimonial a que não tinha direito, pelo que deixou de entregar à Administração Fiscal, no ano de 2015, o valor de € 37.694,26 (trinta e sete mil, seiscentos e noventa e quatro euros e vinte e seis cêntimos) m) Os arguidos actuaram em comunhão de esforços e acordo de vontades, no interesse da sociedade X, Lda, bem sabendo que as faturas supra identificadas não correspondiam a transações reais, actuando, ao emitirem ou mandarem emitir e ao utilizarem as faturas supra, com o propósito de falsear os resultados do exercício de 2014 da arguida X, Lda apresentados à Autoridade Tributária, nos termos que sabiam não corresponderem à verdade.

  12. Agiram, ainda, com o propósito de que a sociedade arguida X, Lda obtivesse vantagens patrimoniais que sabiam não ter direito, correspondente ao valor da diminuição das receitas tributárias em sede de IRC resultante da declaração dos custos/despesas mencionados.

  13. Actuaram os arguidos em comunhão de esforços e acordo de vontades, em nome e no interesse das sociedades arguidas, de modo livre, voluntário e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

  14. O valor da quantia devida a título de imposto e referido em l) ainda não se encontra pago.

    1.1.2. Outros factos com relevo para a decisão da causa.

  15. O arguido A. M. gere uma sociedade de comércio de automóveis, auferindo um rendimento mensal de € 887,00; a sua cônjuge trabalha como administrativa na referida empresa auferindo um salário mensal de € 754,00; têm 3 filhos de 8 anos, 2 anos e 6 meses; vivem em casa arrendada, pela qual pagam uma...

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