Acórdão nº 12/22 de Tribunal Constitucional (Port, 06 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. António José da Ascensão Ramos
Data da Resolução06 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 12/2022

Processo n.º 968/21

2.ª Secção

Relator: Conselheiro António José da Ascensão Ramos

Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Por acórdão de 03.02.2021, o Supremo Tribunal Administrativo concedeu total provimento ao recurso interposto, revogando a sentença proferida, julgando a oposição à execução fiscal totalmente procedente e declarando extinta a execução fiscal n.º 3182-2003/100286.4 (fls. 503-516).

A Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, AT) reclamou contra o sobredito acórdão, arguindo a sua nulidade por falta de fundamentação, ex vi artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil (CPC) (fls. 523-532).

Por acórdão de 13.07.2021 o Supremo Tribunal Administrativo indeferiu a reclamação de nulidade (fls. 553-554).

1.1. A AT veio então apresentar requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão de 13.07.2021 (fls. 555-556).

Pela decisão sumária n.º 658/2021, este Tribunal decidiu não conhecer do mérito do recurso com fundamento em inidoneidade. Os fundamentos são os seguintes, para o que ora importa:

No essencial, a recorrente entende que a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 615º do C.P.C., ex vi artigo 2º, alínea e) do Código de Processo Tributário, assim violando o dever de fundamentação das decisões judiciais imposto pelo artigo 205.º, n.º 1 da CRP onde se impõe « (...) a explicitação por parte do julgador acerca dos motivos pelos quais decidiu em determinado sentido e não noutro determinado litígio que lhe foi colocado, de forma a que os destinatários possam entender as razões da decisão proferida para que, caso o entendam, sindicá-la e reagir contra a mesma.»

Do teor desta formulação decorre que a recorrente não pretende a apreciação da constitucionalidade de nenhuma norma que tenha sido aplicada pelo Tribunal recorrido, mas sim do próprio conteúdo da decisão recorrida, que considera ser nula por falta de fundamentação. Em suma, a recorrente pretende assumidamente sindicar a própria decisão judicial, imputando-lhe – e não a qualquer norma pela mesma aplicada – a violação dos preceitos e princípios constitucionais que identifica. Porém, aquela não constitui objeto idóneo de recurso para o Tribunal Constitucional. Como se escreveu no Acórdão n.º 695/2016: «o sistema português de controlo da constitucionalidade normativa assenta na ideia de que a jurisdição constitucional deve ser o juiz das normas e não o juiz dos juízes. O papel do Tribunal Constitucional na arquitetura da nossa democracia constitucional é o de controlar a atuação do legislador e dos seus sucedâneos; os erros judiciais são corrigidos através do regime de recursos próprio da ordem jurisdicional a que as decisões pertencem».

Ou seja, a recorrente não equaciona uma verdadeira questão de inconstitucionalidade normativa, antes pretendendo que o Tribunal Constitucional sindique a conformidade constitucional da decisão recorrida, por considerar que o conteúdo da decisão judicial é violador do princípio constitucional que invoca.

E se dúvidas existissem elas facilmente seriam elucidadas ao lermos atentamente a motivação de recurso onde se exara:

«3. Concretizando, a questão que vimos pedir que seja apreciada prende-se com a constatação da contradição não explicada entre os fundamentos da decisão da primeira instância da Oposição aqui em causa, que, em termos sintéticos, se pronunciou pela sua improcedência, por se ter considerado que foi por responsabilidade própria queque as liquidações de IVA que estavam na base das dívidas aqui em causa não lhe tivessem sido notificadas.

4. E a decisão em sentido contrário do acórdão do STA de 03.02.2021 que não explicita as razões pelas quais assim entendeu. O tribunal superior decidir de maneira divergente é normal e legítimo. O problema neste caso concreto é que apenas se considerou relevante a circunstância de efetivamente as liquidações de imposto não tivessem sido notificadas e, sem mais considerações, se decidiu pela procedência da presente Oposição.

5. O que nos leva a reagir é que a decisão foi tomada sem qualquer análise, referência, o que quer que seja, sobre as circunstancias e o contexto em se verificou a falta de notificação das liquidações de imposto, justamente o elemento central da decisão da primeira instância que considerou que a responsabilidade pela falta das notificações era imputável à Oponente e, por consequência, se decidiu pela improcedência da presente Oposição.

6. É esta omissão completa que se estranha uma vez que ficou por conhecer qual a posição do tribunal superior sobre a matéria, sendo até perfeitamente possível, à luz da do texto da decisão, que não se tenha procedido a qualquer análise desta matéria.

7. Neste quadro, a Fazenda Pública não se podia conformar com a decisão do STA que revoga a decisão anterior ignorando completamente o seu fundamento principal, ainda por cima quando estamos em presença de um montante muito elevado, de €737 415,28, que põe em causa o interesse público de uma forma evidente e que em processo paralelo a este (o processo de Oposição n.º 1707/05.1 BEPRT respeitante à mesma matéria mas de um outro exercício) se decidiu definitivamente a favor da F.P. por acórdão d o T.C.A. Norte.

8. Esta omissão na análise, na nossa opinião, inquina completamente a decisão.»

Ora, dessa matéria não cuida o Tribunal Constitucional no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade, que tem por objeto normas e não decisões judiciais.

Não incidindo o presente recurso sobre um objeto idóneo, não pode o mesmo ser admitido , justificando-se a prolação da presente decisão sumária, segundo o previsto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.

1.2. A recorrente reclamou para a conferência...

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