Acórdão nº 237/19.9T8MFR.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Janeiro de 2022
Magistrado Responsável | ANA DE AZEREDO COELHO |
Data da Resolução | 06 de Janeiro de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM na 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I)–RELATÓRIO[1] I… LDA., com os sinais dos autos, instaurou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra A…, também com os sinais dos autos, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de € 8.000,00, acrescida de juros moratórios calculados à taxa legal e contabilizados desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Alegou para tal, em resumida síntese, ter celebrado com o Réu, na sua qualidade de mediadora imobiliária, contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade, tendo o Réu procedido à venda do imóvel a terceiros, na vigência do contrato e sem a sua intervenção, pelo que lhe é devido o montante pedido, a título de remuneração.
O Réu apresentou contestação, por impugnação e por excepção, alegando que a Autora não cumpriu o contrato, por não ter promovido a venda de forma eficaz tendo mesmo cessado de angariar compradores, sendo certo que a venda que veio a ser realizada nada teve a ver com a sua mediação nem envolveu outra mediadora, devendo-se exclusivamente a actividade do vendedor, ora Réu.
Alegou ainda que comunicou à Autora, telefonicamente, a intenção de fazer cessar o contrato, em data anterior à dita venda, ao que a Autora nada disse, devendo ter-se tal como anuência tácita à revogação.
Notificada para se pronunciar quanto à matéria das excepções, a Autora alegou que não pode proceder a uma publicitação mais efectiva do imóvel em virtude de o Réu ter persistido em não obter o respectivo certificado energético, sendo fantasiosa a argumentação quanto à revogação do contrato.
O Tribunal notificou as partes de projecto de decisão de mérito, para exercício do contraditório.
A Autora pronunciou-se no sentido de existir matéria controvertida com interesse para a decisão, sendo ela a de ter sido estabelecido que o Réu não poderia promover, publicitar ou angariar a venda do imóvel, matéria que alegou na inicial e que considera impugnada na contestação.
O Réu anuiu ao projecto de decisão.
Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.
Dessa sentença vem interposto o presente recurso pela Autora que, tendo alegado, concluiu como segue as suas alegações: 1- O presente recurso versa sobre a nulidade da sentença pois o tribunal a quo precipitou-se ao proferir saneador-sentença pois descurou a necessária produção de prova relativa aos factos alegados pela A., ora apelante.
2- Com efeito, a A. no art. 13.º da petição inicial alegou expressamente que: “Com efeito, o R. obrigou-se a aceitar a exclusividade de promoção, publicitação e angariação da A.” 3- Tal factualidade foi expressamente impugnada pelo R. e, como tal, é matéria controvertida que carecia de produção de prova em sede de audiência de discussão e julgamento.
4- O tribunal recorrido devia ter conhecido sobre tal facto e não podia dá-lo como provado (porque impugnado) nem como não provado porque controvertido.
5- Impunha-se, pois, a realização de julgamento tal como a ora requerente sustentara já no seu requerimento de 19/04/2021 quando as partes foram chamadas a pronunciar-se sobre a solução de direito preconizada.
6- O conhecimento dos factos pelo tribunal e sua apreciação crítica dando-os como provados ou não provados são questões que o tribunal deve conhecer.
7- A sentença é, pois, nula por violação do disposto no art. 615.º, n.º 1, alínea d) do C.P. Civil.
8- Impõe-se, pois a revogação do saneador-sentença proferida, o qual deve ser substituído por um outro que efectue o saneamento do processo, fixando o objecto do processo e temas da prova.
Assim decidindo farão V. Exas. a mais lídima JUSTIÇA! O Réu não apresentou contra-alegações.
O recurso foi admitido para subir nos próprios autos e com efeito devolutivo, pronunciando-se o tribunal recorrido no sentido de inexistir a arguida nulidade da sentença.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II)–OBJECTO DO RECURSO Tendo em atenção as conclusões da Recorrente - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC -, cumpre apreciar as seguintes questões: 1.-Se a decisão de mérito não podia ser proferida na fase processual de saneamento por subsistirem factos controvertidos e pertinentes; 2.-Se, mesmo podendo ser proferida, deve ser revogada.
III)–FUNDAMENTAÇÃO 1.–QUESTÕES PRÉVIAS 1.-A Recorrente arguiu a sentença de nula por não ser possível a sua prolação no momento processual em que o foi em razão de subsistirem factos controvertidos com influência no sentido da decisão. Louva-se no disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil.
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-No que se refere a omissão de pronúncia quanto à prova ou não prova de factos alegados, não se integra a mesma na previsão de nenhuma das alíneas do artigo 615.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, por isso que o enquadramento processual de tal omissão encontra previsão específica no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do mesmo Código.
Estabelece esta norma que a deficiência da decisão de facto determina a anulação da decisão quando não constem do processo todos os elementos que permitam a alteração da decisão.
A questão coloca-se assim em sede de reapreciação da decisão de facto, nomeadamente na vertente da disponibilidade de todos os meios de prova necessários à fixação da matéria pertinente, não em sede de nulidade da decisão por omissão de pronúncia quanto a factos pertinentes.
Ou seja, a não pronúncia quanto a determinados factos tem a consequência que se referiu e a omissão de fundamentação a de determinação da fundamentação, procedendo a tal o tribunal de primeira instância, quando possível – artigo 662.º, n.º 2, alínea d), e n.º 3, do Código de Processo Civil.
No caso dos autos, consta da sentença a indicação de quais os factos considerados assentes e ainda da irrelevância para a decisão dos ainda controvertidos.
A discordância quanto a esta asserção e à decisão que nela se funda é objecto de recurso quanto ao mérito e/ou nos termos do artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil, não integra a previsão de nenhuma das alíneas do artigo 615.º, n.º 1, mormente da alínea d).
Improcede a arguição de nulidade.
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–FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Configuram-se do seguinte modo os factos assentes, na ausência de impugnação da decisão de facto quanto a tal (sem prejuízo da posterior apreciação da suficiência dos factos assentes): 1.-A A. é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de mediação imobiliária; 2.-O R. encontrou-se inscrito como titular do direito de propriedade na descrição n.º 832 da freguesia da Venda do Pinheiro na Conservatória...
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