Acórdão nº 4294.20.7T8SNT.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelMANUEL RODRIGUES
Data da Resolução06 de Janeiro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em Conferência, na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: I)–Relatório 1.1.–No âmbito do processo comum de declaração n.º 4.294/20.7T8SNT.L1, a correr termos no Juízo Central Cível de Sintra - Juiz 4, que AA… intentou, em 10/03/2020, contra Lusitânia, Companhia de Seguros, S.A., veio esta apresentar recurso de apelação do saneador-sentença proferido em 08/06/2021 [ref.ª Citius 130996051], que julgou procedente a excepção peremptória de prescrição e, em consequência, absolveu a Ré dos pedidos contra si formulados.

1.2.–Tendo a Apelante rematado as alegações de recurso com as seguintes conclusões: «I.–O Direito não está prescrito, pois o prazo de prescrição é de 5 anos atento estarmos face a factos que constituem uma ofensa corporal negligente.

II.–Assim, o direito só iria prescrever em 14-07-2021 (14-07-2016 mais 5 anos).

III.–Assim, interrompendo-se o prazo, o mesmo reiniciar-se-ia e só em 2021 ocorreria a prescrição.

IV.–Como tem sido sustentada na jurisprudência publicada a propósito de casos semelhantes, a aplicação do prazo de prescrição estabelecido na lei criminal não está dependente da efectiva punição do autor do crime. O prazo de prescrição do direito à indemnização decorrente do artigo 498.º n.º 3 do Código Civil também tem aplicação, apurada que seja a conduta tipicamente descrita como crime, nos casos de extinção do procedimento criminal por morte do agente ou em resultado de o facto ilícito ser abrangido por amnistia, assim como quando o facto qualificado como crime for praticado por inimputável ou ocorrer qualquer causa justificativa da culpa do agente que determine a sua absolvição penal.

V.–Nos termos do art.º 326.º do Código Civil, “a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo”, mas conforme o n.º 1 do art.º 327.º do mesmo Código, “se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado (...) o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo”.

VI.–O Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 6.07.1993, in CJSTJ, II, p. 180-181, decidiu que: “O prazo de prescrição havendo processo crime contra o condutor do veículo só começa a contar-se, em relação aos civilmente responsáveis, a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória”. No mesmo acórdão foi decidido que essa regra não é aplicável apenas ao responsável pelo ilícito que constitui crime, mas também aos responsáveis meramente civis (designadamente a Seguradora) por virtude do mesmo facto ilícito. Aliás, a entender-se que os prazos de prescrição são diferentes para o ilícito do criminal e para os responsáveis meramente civis quebrar-se-ia o elo de solidariedade entre os responsáveis, expresso nomeadamente nos art.ºs 487.º, 499.º, 500.º, 501.º, 502.º, 507.º e 512.º do Código Civil.

VII.–No mesmo sentido, decidiu a Relação de Coimbra (Ac. de 05.11.1996, CJ, V, p. 5), segundo o qual, é o apuramento do facto e a sua qualificação como criminoso - e não a circunstancia de ser ou não possível o exercício da acção penal - que determina o prazo mais longo de prescrição previsto no n.º 3 do artigo 498.º do Código Civil. Assim, o falecimento do culpado no embate não obsta (em virtude da inerente extinção da acção penal) a que, após a instrução do processo, se conclua pela natureza criminal do seu facto e, em consequência, pela não aplicação da prescrição trienal estabelecida no n.º 1 do artigo 498º do Código Civil.

VIII.– Enquanto estiver pendente o processo penal, não começa a correr o prazo da prescrição do direito à indemnização civil. A pendência do processo crime (inquérito) representa uma interrupção contínua (ex vi art.º 323.º n.os 2 e 4 do Código Civil), quer para o lesante, quer para aqueles que, como as seguradoras, com ele estão solidários na responsabilidade de reparação dos danos; interrupção esta que cessa, começando o prazo a correr, quando o lesado for notificado do arquivamento do processo crime.

IX.– Por isso, além do maior prazo de prescrição, correspondente ao prazo de prescrição do crime (5 anos), este prazo ainda é passível de interrupção, com nova contagem do mesmo (5 anos), sendo que durante esse novo prazo o lesado pode fazer valer o seu direito de indemnização.

Por isso não está prescrito o Direito, sem conceder a lide deveria continuar, só se devendo e podendo conhecer da prescrição a final, depois de o Tribunal decidir os factos e qualificar os mesmos.

Termos nos quais deve ser revogada a presente Sentença» 1.3.–A Ré não apresentou contra-alegações.

1.4.–Por Decisão Singular do presente Relator, proferida em 26/10/2021 [ref.ª Citius 17562056 ] foi decidido “julgar a apelação procedente e, consequentemente, revogar a sentença recorrida na parte em que julgou verificada a excepção de prescrição e absolveu a Ré dos pedidos conta si formulados, substituindo-a por esta decisão que julga improcedente a referida excepção de prescrição e determina o normal prosseguimento do processo”.

1.5.–Desta Decisão Singular veio a Ré/Recorrida reclamar para a Conferência, nos termos do art.º 652.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPC, com os seguintes fundamentos (conclusões): «1- A presente Reclamação para a Conferência é interposta nos termos do art.º 652.º, n.º 3 e nº 4 do Cód. Processo Civil.

2-Nos termos do disposto pelo art.º 671º nº 2 al. b) do Cód. Processo Civil, esta Decisão...

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