Acórdão nº 00947/15.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Dezembro de 2021
Magistrado Responsável | Antero Pires Salvador |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 .
A ORDEM dos ENFERMEIROS, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Coimbra, de 15 de Outubro de 2018, que julgando procedente a acção administrativa, intentada pela A./recorrida D.
, residente na Rua (…), por um lado, anulou a sanção disciplinar impugnada – repreensão escrita - e, por outro, a condenou a pagar uma indemnização de 1.000,00 €, pelos danos morais causados pelos factos ilícitos e culposos pela instauração do procedimento disciplinar, dedução de acusação, da notificação edital e ainda da decisão final de condenação na pena de repreensão escrita.
* 2 .
No final das suas alegações, a recorrente Ordem dos Enfermeiros formulou as seguintes proposições conclusivas:
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Não se encontrando, em consequência, em situação de erro sobre os pressupostos de direito, pois que os pressupostos de direito de permanência da inscrição nesta ordem profissional, encontravam-se preenchidos.
b) Existindo procedimentos a cumprir por parte dos membros da ordem dos enfermeiros para que fosse aos mesmos cancelada a sua inscrição, não poderia a Ré aceitar que a mera informação tivesse carácter vinculativo para aquele fim, uma vez a Autora não ter devolvido a sua cédula profissional, o que lhe permitia exercer a profissão.
c) Não tendo a Autora feito prova de qualquer dano e não havendo facto ilícito passível de gerar os mesmos, não se mostram preenchidos os elementos do Regime Jurídico da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado, ou do art.º 483° do Código Civil.
d) A decisão recorrida viola os comandos legais acima assinalados e enferma de erro de julgamento.
* 3 .
Notificadas as alegações de recurso, supra sumariadas nas suas conclusões, não foram apresentadas contra alegações.
* 4 .
O Digno Magistrado do M.º P.º neste TCA, notificado nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, não emitiu Parecer.
* 5 .
Sem vistos, mas com envio prévio do projecto às Exmas. Juízas Desembargadoras-Adjuntas, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
* 6 .
Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.
II FUNDAMENTAÇÃO 1 . MATÉRIA de FACTO São os seguintes os factos fixados na decisão recorrida cuja completude, fidelidade e suficiência não vêm questionados: 1 .
Em dia ignoto de 2003, anterior a Setembro de 2003, a Autora, sendo então enfermeira graduada ao serviço dos então Hospitais da Universidade de Coimbra – actualmente Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra – foi desligada do serviço por aposentação. - Cfr. doc. 3 junto com a PI, artigo 35 da PI, em que a Autora alega que está aposentada desde 2003, facto que o Réu não impugna, e artigo 14º da contestação, em que o Réu reconhece que em 8/9/2003 a Autora comunicou a sua vontade de se desvincular da Ordem, o que só poderia fazer se nesse momento já estivesse aposentada.
2 .
Desde a aposentação a Autora deixou de exercer, por contra própria ou de outrem, a actividade profissional de enfermeira - Cfr. documentos 5 e 6 da PI, onde a Autoridade Tributária e a Segurança Social atestam que a Autora nunca constou, até à respectiva data (11/11/2015), com actividade aberta e com registo de quaisquer remunerações, de onde é legítimo concluir que à aposentação não sucedeu o exercício da profissão por conta de outrem ou própria.
3 .
Em 8/9/2003, a Autora comunicou à Ordem a sua vontade de se desvincular da mesma - Cfr. confissão do Réu no artigo 14 da contestação – sublinhado nosso.
4 .
Em 25 de Maio de 2011, a Ré enviou à Autora e esta recebeu, na sua morada de então, na Urbanização (…) a carta registada com AR cujo teor a fls. 1 do processo disciplinar aqui se dá por reproduzido, destacando o seguinte: "Assunto: Quotas em dívida à Ordem dos Enfermeiros.
A Ordem dos Enfermeiros constatou que até à presente data, não foi efectuado, por parte de V. Ex.ª, o pagamento de 98 quotas, no valor total de € 733.56 Com o objectivo de regularizarmos esta situação, solicitamos a V. EX.ª que proceda ao pagamento do montante acima mencionado, no prazo máximo de 10 dias úteis, a partir da data de recepção do aviso, o que poderá ser feito presencialmente ou por envio de cheque ou vale correio, dirigido a: Ordem dos Enfermeiros (…) Aproveitamos ainda para informar que findo este prazo de 10 dias e se não tiver sido, entretanto, efectuado o pagamento, será instaurado o competente procedimento disciplinar, por incumprimento do disposto na alínea m) do nº 1 do artº 76° do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, bem como do processo de execução previsto na alínea f) do nº 1 do artº 25 do mesmo Estatuto, com vista ao pagamento coercivo do montante em dívida".
5 .
Por carta de 28/8/2011, a Ré enviou à Autora, e esta recebeu na morada supra, a factura nº 5619037/2011 atinente a quotas ditas em atraso no valor de 789,56 € - Cfr. doc. 6 da PI.
6 .
Em 6 de Outubro de 2011, a Autora enviou à Ré a carta registada com AR cuja cópia é doc. 4 da PI, cujo teor aqui se dá por reproduzido, transcrevendo o seguinte: "Assunto: Quotas em atraso Exmos(as) Senhores(as), Em virtude da recepção da Vª Factura/Recibo Nº 5619037/2011, onde é invocado o valor de 789,56 €, referente a quotas em atraso, venho esclarecer V. Exas. que estou reformada desde 2003 e nesta altura comuniquei esta situação, junto dos V/ serviços, tendo inclusive solicitado a minha desvinculação da Ordem, por já não exercer mais a actividade, resultado e consequência da minha aposentação.
Foi com total surpresa que após tanto tempo sou notificada para liquidar quotas em atraso, quando pensava que a minha inscrição já se encontrava anulada.
Em função do exposto, solicito a V/ Exas, que procedam à minha desvinculação da Ordem e anulem o valor das quotas em atraso.
Sem mais de momento, apresento os melhores cumprimentos" --- sublinhado e negrito nosso.
7 .
Na sua reunião de 10/4/2012, o Conselho Directivo Regional do Centro da Ordem dos Enfermeiros deliberou nos seguintes termos: “O membro n.º 2-E-(...), D. se encontra com 113 quotas em atraso (desde Janeiro de 2003 até à presente data), as quais perfazem o montante global de 855,56 € e (…) apesar de regularmente notificada, por carta registada com aviso de recepção, para regularizar a situação em 10 dias úteis, nada fez.
Pelo que, o Conselho Directivo Regional da Secção Regional do Centro da Ordem dos Enfermeiros (SRC/OE), deliberou na sua reunião de 10-04-2012, remeter o respectivo processo ao Conselho Jurisdicional Regional da SRC/OE, para os devidos procedimentos com vista a instrução de processo, consubstanciada nos art. 25° alínea f), 76° alínea m) e 93° alínea b), do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros.” 8 .
Em 11/4/2012, o presidente do Conselho Jurisdicional Regional da Secção Regional do Centro da Ré enviou à Autora, para a morada vinda a referir, a carta registada com AR cuja cópia a fls. 4 do P.A. aqui se dá por reproduzida transcrevendo o essencial: "Informamos que o Conselho Directivo Regional do Centro da Ordem dos Enfermeiros participou de si por falta de pagamento de 113 quotas em atraso (desde Janeiro de 2003 até à presente data), as quais perfazem o montante global de 855,56 €, apesar de ter sido notificada para regularizar a situação em 10 dias úteis, não o fez.
Os factos acima descritos são violadores do dever previsto no art.º 76º nº 1 m) do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros.
Nesta conformidade, vimos pela presente notificá-la para proceder ao pagamento das quotas em dívida, no prazo de 10 dias úteis a contar desta notificação, de forma a obstar à abertura do respectivo processo disciplinar".
9 .
Esta carta foi devolvida ao remetente com a indicação “não atendeu” - Cfr. fls. 5 do P.A.
10 .
No dia 25 de Maio de 2012, o Conselho Jurisdicional Regional deliberou, por unanimidade e voto secreto, instaurar procedimento disciplinar contra a aqui Autora em face da participação do Conselho Directivo Regional, por incumprimento da alínea m) do nº 1 do artigo 76º do Estatuto da Ordem, e nomear instrutora a vogal Ana Garrido - Cfr. fls. 6 do P.A.
11 .
Em 3/10/2012, a instrutora solicitou, por ofício, ao presidente do Conselho de Administração (C
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HUC a entrega de uma carta à aqui Autora, cujo teor a fls. 8 do PA aqui se dá por reproduzido, dando conta da instauração do processo disciplinar e do seu motivo, bem como informando que o mesmo seria arquivado se em dez dias a Autora efectuasse o pagamento das quotas tidas por devidas - Cfr. fls. 8 do P.A.
12 .
Por carta de 31/10/2012, o enfermeiro director dos HUC devolveu o expediente à instrutora, “informando” o que a Autora já lhe informara (cf. parágrafo 6, supra): que a arguida se encontrava aposentada desde 2003 - Cfr. fls. 13 e sgs. do P.A. – sublinhado nosso.
13 .
Por carta registada com AR, recebida pelo destinatário em 19/3/2013, a Instrutora solicitou ao Enfermeiro Director dos HUC que afixasse no seu serviço, por ser último domicílio profissional conhecido da Autora, o edital cuja cópia a fs. 19 do PA aqui se dá por reproduzida - Cfr. fls. 18 a 22 dos Autos.
14 .
Nem o enfermeiro director nem os HUC responderam ou remeteram qualquer expediente confirmando a afixação do édito - Cfr. o PA.
15 .
Em 23 de Maio de 2013, a Instrutora nomeada emitiu o Relatório de instrução com proposta de acusação cujo teor, a fls. 23 do P.A., aqui se passa a transcrever: "Venho apresentar o presente relatório de instrução com proposta de acusação contra o membro n.º 2-E-(...), D. , pelos seguintes factos: 1. No dia 11-04-2012 foi remetido por correio registado com aviso de recepção ofício n.º 721, com a referência...
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