Acórdão nº 0836/18.6BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução09 de Dezembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO 1. RELATÓRIO 1.1. A…………, na sequência de notificação realizada à sociedade “B............., Lda.”, a 6 de Junho de 2018, para que procedesse à desocupação e entrega das chaves do imóvel objecto de venda no processo executivo n.º 1457200801007084 e aps., veio deduzir os presentes Embargos de Terceiro.

1.2.

Por despacho de 10 de Setembro de 2018 do Tribunal Administrativo de Leiria, a petição inicial dos referidos Embargos foi liminarmente indeferida.

1.3.

Inconformado, o Embargante (doravante Recorrente), interpôs recurso jurisdicional, concluindo nas alegações oportunamente apresentadas nos seguintes termos: «1 - Determina o art.º 237º nº 1 do CPPT, a propósito da função do incidente dos embargos de terceiro, que “Quando o arresto, a penhora ou qualquer outro acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular um terceiro, pode este fazê-lo valer por meio de embargos de terceiro” 2 - Por sua vez, o art.º 1285º do CC preceitua que “O possuidor cuja posse for ofendida por penhora ou diligência ordenada judicialmente pode defender a sua posse mediante embargos de terceiro, nos termos definidos na lei de processo” 3 - O art.º 1251º do mesmo Código vem esclarecer que “Posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real”.

4 – Sendo pois necessária uma posse real e efectiva, com o seu elemento material ou corpus e o elemento intencional ou “animus sibi possidendi”.

5 - No caso presente, o ora Embargante invoca a sua titularidade no capital da sociedade “B............., Lda” possuidora do prédio penhorado e vendido no processo de execução fiscal, com base num contrato de arrendamento válido e em vigor, isto é de uma sociedade que possui com “animus sibi possidendi” 12 – E como tal, não tendo intervindo de qualquer forma no processo executivo, nem tendo sido notificado de qualquer despacho ou ordem no âmbito do mesmo, designadamente da ordem de desocupação, além de terceiro, quer nos termos do art.º 351.º n.º 1 do CPC, quer do n.º 1 do art.º 237.º do CPPT, tem, quer nos termos do art.º 26.º do CPC, quer do n.º 1 do art.º 9.º, 55.º e 237.º do CPPT, legitimidade para deduzir os presentes incidentes, 13 – E assim sendo, porque a decisão sobre indeferimento liminar se fundou na ilegitimidade do embargante e no facto de o mesmo não ter invocado o seu “animus possidendi” sobre o imóvel arrendado e da petição, face ao supra aduzido, que o procedimento não é manifestamente inviável ou extemporâneo, no entendimento do já sufragado no Ac STA 0995/11. De 12-02-2012 consultável em ww.dgsi.pt/jsta, e nos termos do n.º 3 do art.º 3.º do CPC, devia o incidente ser liminarmente admitido.

1.3.

A Autoridade Tributária e Aduaneira, notificada da admissão do recurso e citada para os termos deste e para os da causa, não contra-alegou.

1.4.

Para o Excelentíssimo Procurador-Geral-Adjunto o despacho recorrido deve ser mantido na ordem jurídica, extraindo-se, com particular relevo, do seu douto parecer os seguintes trechos da sua fundamentação: «Os embargos de terceiro devem ser liminarmente indeferidos por intempestividade, manifesta improcedência e a ocorrência de exceções dilatórias insupríveis de que o juiz deva conhecer oficiosamente (artigos 345.º, 577.º e 590.º/1 do CPC)», o que no caso sucede porque (…) o embargante deduz os embargos em nome individual e não em nome da sociedade arrendatária, alega não ter poderes de gerência e ser alheio à sua gestão. Ou seja, os presentes embargos não assentam na alegação da posse ou outro direito incompatível com a providência ordenada ou de por ela ser ofendido de que seja titular o embargante, pelo que o embargante, é, manifestamente parte ilegítima na acção», sendo «a construção jurídica ensaiada nas alegações de recurso, para a economia da questão em análise, de que a providência embargada diminui o ativo contabilístico da sociedade e, logo, o valor contabilístico da sua quota e, consequentemente o valor do património pessoal, ofendendo o seu direito de propriedade, é, absolutamente, artificial sem a menor consistência», porque « o direito de propriedade da quota na sociedade em referência, alegadamente, arrendatária, por banda do embargante, é, inteiramente, compatível com a ordenada desocupação e entrega do imóvel vendido em execução fiscal e insuscetível de por ela ser ofendido».

1.5.

Cumpre, agora, apreciar o presente recurso, o que passamos a fazer submetendo os autos a julgamento pela conferência.

  1. OBJECTO DO RECURSO 2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é o teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações que determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

    Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, numa vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte das decisões de mérito proferidas quanto a questões por si suscitadas (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), desta forma impedindo que voltem a ser reapreciadas por este Tribunal de recurso. Numa vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso directo para o Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

    2.2.

    No caso concreto, tendo por referência o que ficou dito, a única questão que há para decidir é a de saber se o despacho recorrido errou no julgamento de direito ao concluir, nos termos e ao abrigo do preceituado, conjugadamente, nos...

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