Acórdão nº 389/20.5T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Dezembro de 2021
Magistrado Responsável | VERA SOTTOMAYOR |
Data da Resolução | 02 de Dezembro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães APELANTE: SEGURADORA ...
APELADA: M. P. e OUTRO Comarca de Vila Real, Juízo do Trabalho de Vila Real – Juiz 1 I – RELATÓRIO Frustrada a tentativa de conciliação, M. P.
, residente na Rua … Montalegre e T. P., residente na Rua … Braga, instauraram a presente ação especial emergente de acidente de trabalho contra SEGURADORA ...
, com sede na Av. … Lisboa, pedindo a condenação da Ré a pagar: À 1ª Autora: a) - pensão anual vitalícia, conforme referido em d.1) da petição inicial: a.1 - no valor de € 2.339,40 (dois mil, trezentos e trinta e nove euros e quarenta cêntimos) até à idade da reforma por velhice a.2 - no valor de € 3.119,20 (três mil, cento e dezanove euros e vinte cêntimos), a partir da idade da reforma, ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho a.3 - dos juros vencidos e vincendos contados desde 13.12.2017, até efectivo pagamento b - subsídio por morte, conforme referido em d.2) desta petição inicial: b.1 - no valor de € 5.561,42 (cinco mil, quinhentos e sessenta e sessenta e um euros e quarenta e dois cêntimos) b.2 - dos juros de mora vencidos e vincendos até efetivo pagamento c - subsídio por despesas de funeral, conforme referido em d.3) desta petição inicial: c.1 - no valor de € 1.853,81 c.2 - dos juros vencidos e vincendos até efetivo pagamento d - despesas de transporte, conforme referido em d.4) desta petição inicial: d.1 - no valor de € 40,00 (quarenta euros) e - indemnização, a título de danos não patrimoniais, de valor nunca inferior a € 40.000,00 (quarenta mil euros), conforme referido em d.5) desta petição inicial f - o concreto valor devido à autora, neste âmbito, deve ser apurado a final Ao 2.º Autor: - indemnização, a título de danos não patrimoniais, em valor nunca inferior a € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) Caso assim não se entenda, condenar-se a Ré a pagar à autora M. P., as seguintes quantias, referentes a: a - pensão anual vitalícia, conforme referido em d.1) desta petição inicial: a.1 - no valor de € 2.339,40 (dois mil, trezentos e trinta e nove euros e quarenta cêntimos) até à idade da reforma por velhice a.2 - no valor de € 3.119,20 (três mil, cento e dezanove euros e vinte cêntimos), a partir da idade da reforma, ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho a.3 - dos juros vencidos e vincendos contados desde 13.12.2017, até efectivo pagamento b - subsídio por morte, conforme referido em d.2) desta petição inicial: b.1 - no valor de € 5.561,42 (cinco mil, quinhentos e sessenta e sessenta e um euros e quarenta e dois cêntimos) b.2 - dos juros de mora vencidos e vincendos até efetivo pagamento c - subsídio por despesas de funeral, conforme referido em d.3) l: c.1 - no valor de € 1.853,81 c.2 - dos juros vencidos e vincendos até efetivo pagamento d - despesas de transporte, conforme referido em d.4): d.1 - no valor de € 40,00 (quarenta euros) Tal como se alega, em síntese, na sentença recorrida, o sinistrado H. F. faleceu em -/12/2017, quando, cerca das 14h40 horas, na sua própria casa em Montalegre, se encontrava a realizar trabalhos de construção civil, sofreu uma queda de cerca de 3 metros de altura, o que lhe veio a provocar lesões que lhe determinaram a morte. Acresce ainda dizer que o sinistrado havia transferido a sua responsabilidade infortunística para a Ré seguradora mediante contrato de seguro válido e eficaz à data do sinistro pela remuneração anual de €7.798,00.
Concluem os Autores pela condenação da Ré Seguradora a pagar-lhes os montantes indemnizatórios peticionados, na medida da sua responsabilidade.
Regularmente notificada, a Ré contestou, alegando em resumo que o falecido sinistrado contratou com a própria um contrato de seguro de trabalhadores independentes, tendo o acidente ocorrido exclusivamente por violação de regras de segurança pelo próprio sinistrado, pelo que deverá ser descaracterizado. Por outro lado, uma vez que o sinistrado estava a trabalhar numa obra que levava a cabo na sua própria casa, não exercendo na altura qualquer actividade lucrativa, o acidente não se encontra coberto pelo contrato de seguro.
Conclui a Ré Seguradora no sentido de que a acção deverá ser julgada improcedente, com a sua consequente absolvição de todos os pedidos formulados pelos AA.
*Os autos prosseguiram os seus ulteriores termos tendo por fim sido proferida sentença, a qual terminou com o seguinte dispositivo: “Tudo visto e nos termos expostos, julgam-se procedentes por provados os pedidos formulados pelos aqui AA., condenando-se a R. SEGURADORA ... no pagamento de pensão anual e vitalícia à 1ª A., M. P. montante de € 2.339,40 (dois mil trezentos e trinta e nove euros e quarenta cêntimos), até à idade da sua reforma e 40% a partir daí (equivalente a € 3.119,20); acrescida da quantia de €5.561,42 (cinco mil quinhentos e sessenta e um euros e quarenta e dois cêntimos) a título de subsídio por morte; da quantia de € 1.853,81 (mil oitocentos e cinquenta e três euros e oitenta e um cêntimos) a título de indemnização pelas despesas com o funeral e as despesas com deslocações suportadas pela aqui demandante e que ascendem a € 40,00 (quarenta euros).
No mais, absolve-se a R. dos pedidos formulados pelos AA.
Custas por mabas as partes na proporção do respectivo decaimento, fixando-se o mesmo em 4/5 para a R. e 1/5 para os AA. – cfr. art. 446º do C.P.C.
Fixa-se aos autos o valor de € 41.161,10.
Registe e notifique.” Inconformada com esta decisão, dela veio a Ré Seguradora interpor recurso para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. O sinistrado sofreu um acidente quando realizava trabalho de construção civil na sua própria casa, sita na Rua ..., Montalegre; 2. O sinistrado exercia a atividade de construção civil por conta própria, tendo celebrado com a R. seguradora contrato de seguro de acidentes de trabalho, titulado pela apólice nº ........, pela remuneração anual de 7.798,00, válida e eficaz à data do sinistro; 3. O sinistrado apresentava, aquando do sinistro, uma TAS de 1,94 g/l+-0,25 g/l.; 4. O sinistrado, na data e hora do sinistro, estava a tapar com cimento e tijolo a parte superior duma janela, situada no 1º andar da sua moradia; 5. Na execução dessa tarefa o sinistrado, através de uma escada de alumínio, procedeu aos trabalhos no topo superior dessa janela, debruçando-se sobre o parapeito interior da mesma; 6. O sinistrado caiu da referida janela duma altura de cerca de três metros para o exterior, tendo embatido violentamente com a cabeça no chão; 7. O sinistrado, na data e hora do sinistro, encontrava-se na varanda do seu imóvel, a cerca de quatro metros do solo, a fim de colocar uns tijolos na parte superior dessa varanda, utilizando para o efeito uma escada de encostar; 8. O sinistrado não utilizava qualquer outro dispositivo de segurança e, quando se encontrava na parte mais alta do escadote, desequilibrou-se e caiu desamparado no solo onde bateu com a cabeça; 9. No estado de alcoolemia em que se encontrava o sinistrado, existe um estado de exagerada euforia, os reflexos são acentuadamente perturbados, o tempo de reação é prolongado e o risco de acidente aumenta mais de 16 vezes.
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Dos factos provados é de concluir que o sinistrado violou as condições de segurança estabelecidas por lei para o risco de queda em altura e que o acidente não se encontrava garantido pela apólice de seguro celebrada com a ré.
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O sinistrado exercia a atividade de construção civil por conta própria e, por isso, sabia quais as condições de segurança que deveria respeitar, nomeadamente a utilização de dispositivo ou equipamento que prevenisse o risco de queda em altura.
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E o sinistrado tinha perfeito conhecimento do perigo que poderia resultar do ato que praticou, violador das instruções de segurança (encontrando-se na varanda do seu imóvel, a cerca de quatro metros do solo, utilização de uma escada portátil ou de encostar para subir ao topo superior de uma janela e, sobre a referida escada, na sua parte mais alta, debruçando-se sobre o parapeito interior, tapar com cimento e tijolo a parte superior dessa janela, situada no primeiro andar da moradia, sem usar qualquer dispositivo ou equipamento que prevenisse o risco de queda em altura para o exterior, o que veio a acontecer).
O sinistrado se encontrava sob o efeito do álcool, com uma taxa de alcoolemia de 1,94 g/l e nessa situação, existe um estado de exagerada euforia, os reflexos são acentuadamente perturbados, o tempo de reação é prolongado e o risco de acidente aumenta mais de 16 vezes.
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Mas é de lembrar que o sinistrado, se estava nesse estado, em que podia não ter discernimento necessário para avaliar o risco, colocou-se voluntariamente nessa situação e, por isso, não só não é desculpável esse seu estado, como, bem pelo contrário, agrava a sua culpa.
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Tratou-se, pois, de um ato voluntário e consciente, com desprezo pelo risco associado, que bem conhecia, podendo até classificar-se como negligência grosseira.
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Tendo havido violação, por parte do Autor, sem causa justificativa, das condições de segurança e até atuação com negligência grosseira, o que os factos dados como provados inequivocamente confirmam, o acidente encontra-se descaracterizado, nos termos das alíneas a) e b) do nº 1 do artº 14º da Lei 98/2009, de 04/09.
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Por outro lado, o sinistrado era trabalhador por conta própria e tinha celebrado contrato de seguro de acidentes de trabalho nos termos previstos na lei (DL 159/99, de 11/05, que remete para a LAT). Ora a LAT consagra, no seu artº 81º, que a regulamentação do contrato de seguro do ramo “acidentes de trabalho” deve constar de uma apólice uniforme, a aprovar pelo ISP (atualmente designada Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões).
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A apólice uniforme do seguro obrigatório de acidentes de trabalho para trabalhadores...
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