Acórdão nº 968/10.9BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO V. C., Lda (doravante 1.ª Recorrente ou Impugnante) e a Fazenda Pública (doravante 2.ª Recorrente ou FP) vieram apresentar: ¾ A primeira, recurso do despacho proferido no Tribunal Tributário de Lisboa (TTL) a 01.09.2011; ¾ A segunda, recurso da sentença proferida a 24.04.2019, no TTL, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada pela Impugnante, que teve por objeto as liquidações adicionais de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e as dos respetivos juros compensatórios, atinentes ao ano de 2005.

    A 1.ª Recorrente apresentou alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: “I. - A ora recorrente, então impugnante, pronunciou-se a fls. 89 e ss. dos autos recorridos sobre - expressamente - Informação Oficial aí prestada pela Divisão de Justiça Contenciosa da Direcção de Finanças de Lisboa, Informação Oficial de que foi notificada pela primeira vez juntamente com a contestação apresentada pela Exma. Representante da Fazenda Pública (RFP).

  2. - Tendo a aí impugnante se pronunciado ao abrigo do princípio do contraditório, nos termos do artigo 3.°, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.°, alínea e), do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), bem como ao abrigo do artigo 115.°, n.° 3, do CPPT.

  3. — No entanto, o tribunal a quo decidiu que a pronúncia apresentada pela impugnante deveria ser parcialmente desconsiderada uma vez que a mesma não é de admitir nos termos do artigo 113.°, n.° 2, do CPPT, devendo ser esta norma a aplicada uma vez que a RFP contestou por adesão à Informação Oficial junta aos autos.

  4. - Com tal despacho e respectivo fundamento não pode a ora recorrente deixar de discordar fortemente uma vez que considera que a circunstância de tal Informação Oficial ter dado entrada nos autos juntamente com a contestação apresentanda pela RFP não é causa suficiente para ignorar a sua específica natureza de informação oficial, nomeadamente a virtuosidade desta constituir meio de prova expressamente admitido ajuízo nos termos do artigo 115.°, do CPPT.

  5. - Com efeito, a adesão promovida pela RFP — nos termos da qual fez esta repousar a sua contestação integralmente nos exactos termos e conteúdos da Informação Oficial prestada pela Direcção de Finanças de Lisboa - não equivale a uma fusão desta (Informação Oficial) naquela (Contestação), por forma a que o tratamento a prestar tanto a uma como a outra corresponda, tão somente, ao tratamento que se encontra prescrito para as contestações em sentido próprio deduzidas pela RFP em processo de impugnação judicial.

  6. - A opção expressa da RFP de fazer sua a Informação Oficial prestada nos autos por entidade administrativa — a quem, aliás, não incumbe a representação em juízo dos interesses da entidade administrativa autora do acto impugnando - é opção da inteira responsabilidade da RFP, sendo a mesma totalmente alheia à então impugnante, razão pela qual a mesma não lhe deverá ser oponível.

  7. - Nem pode tal opção ter o alcance que lhe é implicitamente reconhecido pelo Tribunal a quo em sede do despacho sub judice, o qual aceitou sem mais que a Informação Oficial se transvestisse em Constestação mediante uma mera declaração de adesão por banda da RFP» desde logo por manifesta carência de base legal para o efeito.

    VIII.— E assim, julga a ora recorrente, que o despacho sub judice não é sustentável, desde logo porque erege como sua norma paramétrica o artigo 113.°, n.° 2, do CPPT, ao invés do artigo 115.°, do CPPT, e do artigo 3.°, do CPC, quando a pronúncia da então impugnante incidiu expressamente sobre a informação oficial trazida aos autos.

  8. — Sugrafar o entendimento expresso pelo tribunal a quo no despacho sub judice corresponde a reconhecê-lo como válido, atribuindo legitimidade a que uma mera opção estratégica da RFP — a de constestar por adesão a prévia informação oficial — equivalha à introdução em juízo de meios probatórios isentos de contraditório por uma das partes (a RFP).

  9. - Tal resultado é inadmíssivel pois além de não se encontrar previsto legalmente, viola o mesmo de forma grosseira um dos princípios basilares de uma lide judicial, como o é o princípio fundamental do contraditório e da igualdade de armas das partes no âmbito da lide.

  10. - Ocorre ainda que tal resultado também não traduz nem se coaduna com as linhas gerais e de organização de um processo judicial tributário, pois como resulta claramente dos artigos 110.° e 113.°, ambos do CPPT, a dedução de contestação bem como as demais competências de representação da Administração Tributária em juízo são da exclusiva responsabilidade da RFP, cabendo a esta e somente a esta tal tarefa, sem hipótese de as delegar em qualquer outro órgão ou departamento da Administração Tributária.

  11. - Pelo que nenhuma razão ordena ou aconselha que um documento elaborado por uma entidade meramente administrativa - como o é a Divisão de Justiça Contenciosa da Direcção de Finanças de Lisboa — deva ser tratado em juízo como uma contestação» por mais que tal acto processual se adeque formalmente a uma contestação e a ele pretenda aderir a RFP nessa qualidade, uma vez que a Informação Oficial não perde por tal a sua génese, de Informação Oficial, nos termos e para os efeitos do artigo 115.°, n.° 3, do CPPT.

  12. — Pelo que a admissibilidade da pronúncia que o despacho sub judice pretende parcialmente desconsiderar deve ser sempre aquilatada à luz do artigo 115.°, do CPPT, e não em face do artigo 113.°, do mesmo CPPT, como acabou por ser levado à prática, pese embora o flagrante e grave dano provocado nos legítimos interesses e direitos da ora recorrente.

  13. - E, atentendo agora à conformidade do despacho sub judice com o disposto no artigo 135.°, n.° 3, do CPPT, é pois claro que com tal normativo não se conforma o predito despacho, afrontando-o mesmo, acabando por colidir também com as imposições que são dirigidas ao processo judicial tributário pelo princípio do contraditório, senão vejamos: XV. - A interpretação, rectius, a desconsideração do despacho sub judice pelo disposto no artigo 115.°, n.° 3, do CPPT, a qual tem como resultado restringir o alcance do princípio do contraditório - e que foi professada pelo tribunal a quo na decisão sub judice - ao considerar que em processo tributário de impugnação judicial a junção ou primeira notificação da impugnante de uma informação oficial não admite que a aí impugnante se possa pronunciar é contrária ao sentido, conteúdo e alcance do artigo 20.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa.

  14. — Pois O âmbito deste princípio constitucional compreende “que nenhuma prova deve ser aceite na audiência, nem nenhuma decisão (mesmo interlucotória) deve ser tomada pelo juiz sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra quem é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar” (Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 434/87, de 4.11.1987, publicado em BMJ, 371.° - 160).

  15. - A referida interpretação professada pelo despacho recorrido, no sentido da inaplicabilidade ao caso do disposto no artigo 115.°, n.° 3, do CPPT, é liminarmente contrariada por avisada doutrina, nomeadamente pela afirmada pelo Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa conforme sua anotação ao artigo a que nos vimos de referir: “O teor das informações oficiais é sempre notificado ao impugnante, que poderá pronunciar-se sobre o seu teor (n.° 3 deste artigo 115.°), no prazo geral de 10 dias (art. 153.°, n.° 1, do CPC).”- “Código de Procedimento e de Processo Tributário - anotado e comentado”, edição de 2006, pp. 827 XVIII. - E não só, afrontando também o despacho sub judice jurisprudência constante do Acórdão de 29.6.2010 do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), proc. 4080/10: “as provas não serão admitidas nem produzidas sem audiência contraditória da parte a quem hajam de ser opostas, como resulta mormente, dos art. 118.°, n.° 2, do CPPT e, também, do art° 2º al. e) do CPPT.” - Acórdão do TCAS disponível em www.dgsi.nt XIX. - Afirmando-se nesse mesmo Acórdão que “III) É por respeito do principio do contraditório que o n.° 3 do art° 115° do CPPT impõe a necessidade de todas as informações oficiais juntas ao processo serem notificadas ao impugnante, necessidade também imposta pelo disposto no art° 526.° do citado Código, na medida em que tais informações oficiais constam, obviamente, de documento (relatório).” XX. — In casu, encontram-se efectivamente reunidos os pressupostos para que seja admitida na íntegra a pronúncia de fls. 89 e ss. da ora recorrente também à luz do princípio do contraditório (artigo 3.°, do Código de Processo Civil), pois tal pronúncia versa expressamente a respeito de informação oficial e foi apresentada tempestivamente.

  16. - Assim, e uma vez que a pronúncia da impugnante é legítima, válida e limitada ao teor da informação oficial junta aos autos, deve esta nestes permanecer e neles ser considerada integralmente, não podendo à impugnante ser oponível uma mera opção processual da RFP, nos termos da qual esta decide repousar a sua contestação sobre o conteúdo de prévia informação oficial.

  17. — Pelo que nenhuma razão legalmente sustentada subsiste e subjaz ao despacho sub judice — de desconsideração parcial da pronúncia de fls. 89 e ss. - e assim este despacho nada mais representa que um injustificado impedimento ao legítimo exercício do contraditório por banda da então impugnante.

  18. — O despacho sub judice desconsiderou também requerimento apresentado pela impugnante em sede de sua pronúncia de fls. 89 e ss., nos termos do qual solicitou aos autos que lhe fosse notificado o documento presente a fls. 165 e 167 do processo administrativo, o qual é indicado como suposto fundamento de alegações constantes da Informação Oficial que lhe fora notificada.

  19. - Ora, como bem se vê, ao decidir como decidiu o tribunal a quo no despacho sub judice, desconsiderou este também o aí requerido pela então impugnante quanto à sua notificação de documentos apresentados a juízo com a predita...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT