Acórdão nº 274/12.4BECTB de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA CARDOSO
Data da Resolução07 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO 1. B. – C., S.A.

, contribuinte fiscal n.º 500 ., veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação da taxa municipal de protecção civil, relativa ao ano de 2012, no valor de € 125.160,95, emitida pela Município da Covilhã.

  1. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «i. Vem o presente Recurso interposto da Sentença proferida, em 27 de abril de 2018, que julgou improcedente a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrente contra a liquidação da TMPC, referente ao ano de 2012, no valor de € 125.160,95.

    ii. Na petição inicial de Impugnação Judicial a ora Recorrente invocou, em síntese, i) a inconstitucionalidade daquela taxa por esta configurar um verdadeiro imposto; ii) e a ilegalidade da mesma por violação do princípio da equivalência.

    iii. A Sentença recorrida concluiu, em síntese, que a referida taxa não se configura como um imposto, suportando a sua decisão essencialemente no acórdão proferido, em 20 de janeiro de 2010, pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.° 0731/09.

    iv. Acontece, porém, que contrariamente ao que foi decidido pelo Tribunal a quo é evidente que a TMPC não pode ser enquadrada com uma taxa, mas antes como um verdadeiro imposto que recai sobre a Recorrente.

    v. Com efeito, a taxa constitui uma prestação pecuniária e coativa exigida por um ente público em contrapartida de uma prestação administrativa efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo (cf. artigo 4.°, n.° 2 da LGT e artigo 3.° do RGTAL), a qual se materializa na prestação de um serviço, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico à atividade do particular.

    vi. Sucede, porém, que analisado o Regulamento da Câmara Municipal da Covilhã com o n.° 15/2012, através do qual a autarquia introduziu a TMPC, conclui-se que o facto gerador da obrigação de pagamento da TMPC não é constituído por uma prestação concreta e individualizada à ora Recorrente relacionada com a proteção civil, mas antes por um facto distinto a partir do qual a Câmara Municipal da Covilhã, ora Recorrida, parece presumir a realização ou aproveitamento duma prestação administrativa ligada àquele desiderato.

    vii. De facto, o que se retira do artigo 3.°, n.° 3 daquele Regulamento e da fundamentação económico- financeira anexa ao mesmo é que a obrigação de pagamento da TMPC não nasce com a prestação ao particular de um qualquer serviço da Câmara Municipal da Covilhã relacionado com a proteção civil, como se impunha, mas sim com a propriedade ou gestão de infraestruturas instaladas no concelho.

    viii. Com efeito, o artigo 2.°, n.° 2 do Regulamento a Câmara Municipal da Covilhã elenca um conjunto de atividades que não correspondem a quaisquer prestações concretas e individualmente dirigidas à ora Recorrente, mas antes a prestações difusas que visam dar cumprimento ao disposto Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada pela Lei n.° 27/2006, de 3 de junho, e na Lei n.° 65/2007, de 12 de novembro.

    ix. Não poderia, pois, a douta Sentença recorrida ter desconsiderado, como fez, que o regulamento qualifica como sendo contrapartida da TMPC não são prestações administrativas concretas, efetivas e individualizadas relacionadas com a proteção civil, como seria próprio da estrutura comutativa de uma designada TMPC, mas meros objetivos genéricos no domínio da proteção civil municipal que se encontram previstos na Lei de Bases da Proteção Civil e na Lei n.° 65/2007.

    x. Facto este que é evidenciado, desde logo, pelo preâmbulo do regulamento para constatar que a base de incidência da TMPC assenta nas alíneas do n.° 2 do artigo 2° da Lei de Bases da Proteção Civil, que nada mais é do que uma enumeração dos domínios em que a atividade de proteção civil pode ser exercida.

    xi. Sendo que, como demonstrado em primeira instância e se reitera através do presente recurso, é por mera referência a esses objetivos fundamentais com contornos genéricos que se constrói a base de incidência objetiva da TMPC.

    xii. Fica, pois, inequivocamente demonstrado que a TMPC não constitui a contrapartida de uma prestação administrativa da autarquia efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo por referência à atividade da proteção civil, materializada v.g. num verdadeiro e próprio ato administrativo, num ato instrumental ou numa operação material do município.

    xiii. É, pois, impossível estabelecer qualquer correlação entre a referida TMPC - que, sublinhe-se, teria, alegadamente, com contrapartida uma prestação administrativa concreta do Município da Covilhã no domínio da Proteção Civil - e a forma de apuramento da mesma, uma vez que a mesma foi calculada tem por base a multiplicação das medições da rede de gás natural instalada no Município da Covilhã.

    xiv. O que significa que a Câmara Municipal da Covilhã instituiu uma TMPC, taxa que não teve qualquer contrapartida individualizada para a ora Recorrente no domínio da Proteção Civil, tendo depois liquidado esta mesma taxa por referência a uma outra realidade completamente distinta - a ocupação do subsolo com base na extensão da rede de gás ocupada pela ora Recorrente.

    xv. Não restam pois, quaisquer dúvidas de que não existiu qualquer prestação concreta proporcionada à Recorrente no domínio da proteção civil da qual se pode dizer que é a efetiva causadora ou beneficiária, mas apenas uma utilidade eventual e genericamente direcionada à coletividade que resulta das competências administrativas próprias do município.

    xvi. Mas mais: o Tribunal a quo nem sequer teve em consideração que a TMPC foi já declarada inconstitucional, pelo Tribunal Constitucional, por diversas vezes, nomeadamente, e mais recentemente, no âmbito do processo n.° 848/2017, relativamente, à Taxa Municipal de Proteção Civil de Lisboa, concluindo, em síntese, nos termos seguintes: “(...) Em suma, na justificação económica da TMPC encontram-se elementos que, à semelhança do que ocorria com o tributo criado pelo município de Vila Nova de Gaia, são dificilmente compatibilizáveis com a estrutura bilateral da taxa - designadamente, a descrição muito genérica e abrangente do conjunto de atividades de proteção civil, a “identificação dos processos” que “conduzem a serviços” ligados à proteção civil como (alegada) expressão de um nexo entre prestações, a agregação indiscriminada dos custos da globalidade dos serviços de proteção civil e a distribuição praticamente arbitrária desses custos por categorias de sujeitos passivos. (...) Estes elementos estruturais do tributo - comuns às hipóteses dos presentes autos e à encarada pelo Tribunal no Acórdão n.° 418/2017 - representam o primeiro obstáculo à qualificação da TMPC como taxa.”, (cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 848/2017, proferido no processo n.° 281/2017 em 13 de dezembro de 2017).

    xvii. Ora, o entendimento que foi acolhido pelo douto Tribunal Constitucional relativamente à TMPC criada pelo Município de Lisboa vale, mutatis mutandis, para a TMPC do Município da Covilhã, uma vez que também nesta taxa falta o pressuposto de que depende a comutatividade ou sinalagmaticidade própria das taxas, o que nos leva a concluir que estamos perante um autêntico imposto.

    xviii. A prova cabal dessa ausência de correspetividade e da indivisibilidade de qualquer prestação no âmbito da proteção civil é que o regulamento define que o facto gerador da obrigação de pagamento da TMPC é constituído pela propriedade das infraestruturas que ocupam o espaço público do município (cfr. artigo 3.°, n.° 3 do regulamento e o anexo I), sendo esta taxa liquidada com base na aplicação de um valor unitário de € 1,55 por cada metro linear da rede de gás existente no concelho, nos termos do n.° 2.5 do anexo II do regulamento.

    xix. Ou seja, a cobrança desta taxa não surge como contrapartida de um serviço concreta e individualmente prestado, mas antes do facto de a ora Recorrente ter a sua rede de distribuição de gás instalada no concelho da Covilhã.

    xx. Nos casos em que as taxas assentam sobre presunções de tal modo frágeis que podemos apenas dizer que a prestação é eventual ou possível, a doutrina não hesita em afirmar que estamos perante um imposto.

    xxi. Deverá, pois, concluir-se que ao autorizar o lançamento de uma taxa que não constitui contrapartida do que quer que seja, mas antes uma resposta a prestações meramente hipotéticas, faz-se tábua rasa do princípio da equivalência e transforma-se a taxa num imposto, cuja criação pela Câmara Municipal da Covilhã viola a reserva de lei parlamentar prevista no artigo 165.°, n.° 1, alínea i) da CRP.

    xxii. Em consequência de todo o exposto, é evidente o erro de julgamento em que assenta a Sentença recorrida, devendo, em consonância com a mais recente jurisprudência do Tribunal Constitucional, concluir-se que o tributo liquidado enferma de inconstitucionalidade por violação da reserva de lei (cfr. artigos 103.°, n.° 2 e 165.°, n.° 1, alínea i) da CRP).

    xxiii. Do mesmo modo, também não pode ser desconsiderado que a TMPC viola também, de forma flagrante, o princípio da equivalência económica.

    xxiv. Como demonstrado em primeira instância e agora em sede de recurso, no presente caso não se vislumbra uma prestação efetiva e concretamente dirigida à ora Recorrente como contrapartida do pagamento da TMPC, pelo que a identificação do custo associado a essa prestação ou do seu valor perde, à partida, todo o sentido.

    xxv. Assim sendo, impõe-se a conclusão de que estamos perante um tributo público unilateral, um imposto, o qual foi ilegitimamente lançado pela Câmara Municipal da Covilhã para angariar receitas para a prossecução das suas atribuições e não para compensar uma prestação administrativa.

    xxvi. De qualquer forma, ainda que se...

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