Acórdão nº 659/17.0T8SNT-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelCONCEI
Data da Resolução25 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 659/17.0T8SNT-A.E1 (2ª Secção Cível) ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA (…), (…), (…) e (…) vieram deduzir oposição à execução que lhes move (…), SARL (sucessora habilitada da primitiva exequente, Caixa Geral de Depósitos, SA) a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém (Juízo de Execução do Entroncamento – Juiz 3), em que apresenta como título executivo uma livrança, e um contrato de mútuo mediante abertura de crédito em conta corrente, pedindo que sejam absolvidos da instância executiva.

Alegam, para o efeito, em síntese, a falta de interpelação para o pagamento da livrança; o abuso de preenchimento da livrança; a falta de junção do original da livrança; a prescrição da livrança; o incorreto valor indicado na livrança; a prescrição dos juros incluídos na livrança; o abuso de direito; o imposto de selo reclamado não é devido; a falta de título quanto à abertura de crédito em conta corrente; a prescrição da abertura de crédito em conta corrente; a prescrição dos juros exigidos no âmbito da abertura de crédito em conta corrente e a existência de uma cláusula penal abusiva no contrato de abertura de crédito.

A exequente veio contestar pugnando pela improcedência dos embargos.

Foi proferido saneador sentença que no seu dispositivo reza: “Julgam-se os embargos de executado parcialmente procedentes, determinando a redução da quantia exequenda, devendo subtrair-se da mesma o crédito reclamado quanto ao contrato de abertura de crédito, no mais absolvendo o exequente”.

+ Por não se conformarem com o decidido, vieram os embargantes, bem como a embargada, interpor recurso de apelação e apresentar as respetivas alegações, rematando com as seguintes conclusões, que se transcrevem: - Os embargantes - “1. Face aos elementos documentais juntos aos autos nos embargos (docs. 1 a 6), para a boa decisão da causa afigura-se-nos que à matéria de facto provada deveriam ser adicionados os factos indicados em D (n.º 1 a 11), cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.

Interpelação 2. O Tribunal começa por referir que a interpelação, ainda que não antes, teve lugar com a citação para a ação executiva e por isso os embargos são improcedentes.

  1. Salvo melhor opinião é contraditório asseverar que a interpelação é considerada efetuada com a citação ocorrida em 2017 e admitir que sejam cobrados juros desde 30/06/2015.

  2. Porquanto, salvo melhor opinião, afigura-se-nos que, nesta parte, a sentença é contraditória (artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC), nulidade que se invoca expressamente, devendo por isso a sentença ser reformulada e admitidos os embargos, no que diz respeito aos juros exigidos entre a data aposta na livrança e a data da citação.

    Abuso de preenchimento quanto à data de vencimento 5. A livrança trazida à execução data de 18-10-1995, tem data de vencimento de 30-06-2015 e o valor facial de € 254.146,76.

  3. É verdade que de acordo com pacto de preenchimento a data de vencimento será fixada pela Caixa.

  4. Contudo, a mesma cláusula indica que tal ocorrerá em caso de incumprimento pela devedora.

  5. A própria exequente em dois momentos distintos alegou judicialmente que o incumprimento ocorreu em outubro de 2007 (pedido de declaração de insolvência da “…”, apresentado a Juízo em 20-09-2010 (Doc. 2) e a reclamação e créditos na execução movida pelo Banco (…), datada de 07.06.2013 (Doc. 4).

  6. No próprio requerimento executivo a exequente alega que o incumprimento data de outubro de 2007.

  7. Não é aceitável admitir que a exequente, acerca da obrigação subjacente à livrança, em sede judicial alegue em dois processos distintos que o incumprimento é de Outubro de 2007 e agora, para efeitos de preenchimento da livrança, o Tribunal desconsidere estes factos pessoais da exequente e admita que a data de vencimento é 30.06.2015, data aposta na livrança.

  8. Incorre a exequente em abuso de preenchimento ao colocar na livrança uma data de vencimento que é grosseiramente contrária à realidade dos factos e, assim, contrária: a) às regras estipuladas no pacto de preenchimento, o qual impõe o seu preenchimento em caso de incumprimento da livrança; b) ao alegado em dois momentos pela exequente, em sede judicial, quanto à data de incumprimento.

  9. Acresce que, não está em causa a inexistência de um limite temporal imposto pela lei para o preenchimento da livrança, mas sim, o facto de se permitir que a exequente atue judicialmente em venire contra factum proprium o que é contrário aos ditames da boa fé (artigo 239.º do Código Civil).

  10. Deste modo, verifica-se o preenchimento abusivo da livrança, tendo como consequência a perda de executoriedade do título de crédito, por desaparecimento do substrato que lhe confere o carácter de certeza, exigibilidade e liquidez exigidos por Lei, que deve conduzir à absolvição dos embargantes da instância (artigos 576.º, nºs 1 e 2, 577.º, 278.º, n.º 1, alínea e), todos do CPC).

    Abuso de preenchimento quanto ao valor 14. Em sede de pedido de declaração de insolvência da “…” (que se anexou enquanto Doc. 2) a exequente havia contabilizado o montante da dívida relativa ao contrato por detrás da livrança ora em execução (a quantia de € 140.957,39, sendo € 120.866,93 de capital, € 17.830,33 de juros e € 2.260,13) – (Os juros de mora estão calculados à taxa de 15,40%).

  11. Isto é, à data de 20-09-2010, a “(…)” está em incumprimento definitivo e o valor total em dívida por força deste contrato era de € 140.957,39.

  12. Uma taxa de juro de mora 15,4%, aplicável ao capital em dívida e € 120.866,93 entre 20/09/2010 e 30/06/2015 não permite chegar à quantia de € 254.146,76, sendo por isso o preenchimento abusivo e devendo conduzir à absolvição dos embargantes da instância, (artigos 576.º, nºs 1 e 2, 577.º, 278.º, n.º 1, alínea e), todos do CPC).

  13. Mais, sempre se dirá que, o valor colocado na livrança, atendendo a que o montante de capital da dívida que lhe está subjacente é de € 120.866,93, só poderá ter sido alcançado por via de contabilização de juros sobre juros de mora.

  14. A sentença de que se recorre invoca a aplicação do artigo 5.º, n.º 6, do D.L. n.º 344/78, de 17 de Novembro, para justificar e admitir a capitalização dos juros.

  15. Sucede que o mesmo diploma citado não afasta as regras gerais do anatocismo fixadas no n.º 1 do artigo 560.º do Código Civil, nomeadamente da exigência de convenção posterior ao vencimento (neste sentido cfr. Ac. do STJ de 31/3/2004, proc. 04B514).

  16. Para que o anatocismo seja válido tem de existir entre as partes uma convenção posterior ao vencimento dos juros, o que nunca houve – artigo 560.º, n.º 1, do CC, tendo, por isso, a exequente abusivamente preenchido a livrança.

  17. Mais, o diploma legal citado pelo Tribunal (D.L. n.º 344/78, de 17.11) foi revogado pelo D.L. n.º 58/2013, de 08.05.

  18. De acordo com este diploma, a capitalização de juros de mora depende de acordo das partes, reduzido a escrito, e apenas no âmbito de reestruturação ou consolidação de contrato de crédito (artigo 7.º, n.º 5).

  19. No caso em julgamento, os executados não anuíram na capitalização e ela não ocorreu no âmbito de reestruturação ou consolidação de contrato de crédito, sendo por isso a capitalização efetuada contrária à Lei.

  20. Nem se assevere, como parece interpretar o Tribunal a quo, que eventualmente a capitalização dos juros é dos juros remuneratórios, a qual é permitida pelo artigo 7.º, n.º 1, do D.L. n.º 58/2013.

  21. Tal conclusão é, salvo o devido respeito, errada porque os juros remuneratórios constituem a contraprestação onerosa pela disponibilidade do capital durante a vigência do contrato nos seus termos acordados, pelo que só com o decurso do tempo em que esse capital foi sendo disponibilizado vão nascendo e se vão vencendo como preço de tal disponibilização.

  22. É manifesto que desde 2010 não foi mutuado qualquer valor adicional. Pelo que os juros supostamente calculados desde 2010 são juros de mora e não juros remuneratórios.

  23. Portanto, também por este motivo, deve a sentença recorrida ser revogada e reconhecida a exceção dilatória inominada, que deve conduzir à absolvição dos embargantes da instância, o que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos, nomeadamente os previstos nos artigos 576.º, nºs 1 e 2, 577.º e 278.º, n.º 1, alínea e), todos do CPC.

    Prescrição 28. Se a exequente tivesse cumprido o pacto de preenchimento, teria colocado como data de vencimento na livrança a data de 30-10-2007, situação em que a mesma estaria hoje prescrita por força da aplicação dos artigos 70.º e 77.º da LULL.

  24. Acresce que o valor colocado na livrança incorporará por um lado o capital dito em dívida pela “…” (€ 120.866,93), sendo o resto respeitante, na sua maioria, a juros de mora.

  25. Como a exequente alegou na PI do pedido de declaração de insolvência da “(…)”, o incumprimento desta data de Outubro de 2007 e se à data de 04-03-2010 (artigo 15.º da PI) já estavam contabilizados juros de € 17.830,33, esses juros estão hoje prescritos por força do que estatui o artigo 310.º, alínea d), do CC.

  26. Por fim, importa ter presente o que dispõe o artigo 91.º do CIRE, uma vez que a sociedade subscritora da livrança foi declarada insolvente em 02-03-2011.

  27. Nessa data, por força do preceito legal acima citado, venceram-se todos os créditos sobre a insolvente, entre os quais os decorrentes do contrato de conta corrente que está por detrás da livrança trazida à execução.

  28. De onde, a data de vencimento da livrança nunca poderia ser posterior à data da declaração de insolvência.

  29. Tendo a ação executiva a que ora se deduz oposição mediante embargos de executados dado entrada em Juízo apenas em 2017, a livrança está prescrita desde, pelo menos, 02-03-2014 – artigo 70.º da LULL –, que deve conduzir à absolvição dos embargantes da instância (artigos 576.º, nºs 1 e 2, 577.º e 278.º, n.º 1, alínea e), todos do CPC).

    Abuso de direito 35. A sentença carece de fundamentação no caso concreto, sendo por tal a mesma violadora do disposto no...

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