Acórdão nº 00503/11.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Novembro de 2021
Magistrado Responsável | Maria Fernanda Antunes Apar |
Data da Resolução | 05 de Novembro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Com vista à efectivação da responsabilidade civil, com base em defeito de construção, reparação e manutenção da Estrada Municipal de Fraião, “sentido EN 205/EN 306”, vieram M., M. e L., na qualidade de herdeiras de C., instaurar contra o Município (...) e Estradas de Portugal, S.A., todos melhor identificados nos autos, acção administrativa comum, visando a condenação destes no pagamento de quantias a título de indemnização pelos danos patrimoniais e morais decorrentes do acidente de viação, ocorrido em 19/03/2001, em que interveio o veículo automóvel de matrícula XX-XX-XX, pertencente ao falecido C. e por si conduzido.
Pediram a condenação dos Réus no pagamento de €132.133,71, com as seguintes referências: - € 90.000,00, a título de danos morais sofridos por C.; - € 35.000,00, a título de danos morais sofridos pela 1.ª Autora; - € 7.133,71, a título de danos patrimoniais e - respectivos juros desde a citação até efectivo pagamento.
Nos autos foi admitida a intervenção da Companhia de Seguros (...).
Por sentença proferida pelo TAF de Braga foi julgada improcedente a acção.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, as Autoras formularam as seguintes conclusões: 1. A presente acção de responsabilidade civil extracontratual tem por fundamento os danos decorrentes do acidente de viação que vitimou o condutor do veículo, pai das AA., imputável aos erros de concepção, construção/reparação e fiscalização da via que criaram uma situação de perigo; 2. O Tribunal a quo deu como provada a ocorrência do acidente, a sua dinâmica, o facto do sinistro ter ocorrido numa Estrada sob jurisdição do Município Réu, a ausência dos devidos equipamentos de segurança na via em questão, bem como ainda o nexo de causalidade entre o acidente ocorrido e os danos sofridos pelo Falecido; 3. Na verdade, e tal como resulta dos depoimentos depoimento das testemunhas e da prova documental constante dos autos, resulta claro que a Estrada Municipal (542) de Fraião, foi alvo de uma intervenção de reparação/conservação; 4. Em virtude das obras de construção/reparação da supra referida Estrada Municipal, havia sido construída uma valeta na berma do seu lado direito, com uma profundidade de cerca de 50 cm, e no fim da qual existia um declive com cerca de dois metros, com uma poça de água profunda; 5. Tal obra foi executada por conta do Município (...), mediante a execução de um contrato de empreitada, sendo este o dono da obra; 6. Cabia à Câmara Municipal (...), enquanto dona da obra, e num acto de gestão privada, verificar se as normas e medidas de segurança na construção/reparação da estrada foram cumpridas pela empresa adjudicatária; 7. As medidas de segurança existente na Estrada Municipal 542 de Fraião, no local onde se deu o acidente objecto dos autos, eram manifestamente escassas e insuficientes; 8. Foram violadas as mais elementares regras legais, regulamentares ou técnicas que devem ser observadas no planeamento, direcção ou execução de obras de construção, reparação ou modificação de vias públicas; 9. Pertencendo a estrada em causa ao património viário do Município, o qual era o dono da obra que aí se realizou, detinha este, a competência de zelar pela vigilância e conservação permanente dessa via, tomando todas as providências necessárias e adequadas a que nela se circulasse com segurança; 10. O Réu Município enquanto entidade de serviço público, na sua relação com a entidade privada que executou a obra de construção/reparação da estrada é responsável pelas situações em que não exerce convenientemente ou de forma insuficiente a sua actividade de vigilância; 11. O acidente foi assim resultado das omissões do Réu Município, por ser razoável concluir que o cumprimento dos deveres de fiscalização teria, com toda a probabilidade, impedido o resultado, porque se tivesse sido colocada uma grelha na valeta existente na berma, e uma barreira metálica de protecção junto ao declive o veículo do A. nunca teria caído na poça de água, como sucedeu; 12. Só após o acidente, o Réu Município adoptou as necessárias medidas de segurança no local do acidente; 3. O Réu Município sabia que no âmbito do seu dever de fiscalização da obra, não podiam dar a obra como concluída sem a colocação dos equipamentos de segurança; 14. Ao não providenciar pela colocação de tais equipamentos, o Réu Município violou as regras legais, regulamentares e técnicas que devem ser observadas na construção e reparação de estradas; 15. O Réu Município sabia também que, ao violar tais regras e não colocar os necessários equipamentos de segurança, seria possível a criação de um perigo para a vida ou integridade física dos utentes da via, tendo-se conformado com a possibilidade de tal consequência, agindo assim com culpa, na modalidade de dolo eventual; 16. Por outro lado, mesmo que não se prove quando se realizou a obra, seja construção ou reparação, a verdade é que esta se realizou; 17. O Réu Município recebeu a estrada em causa, com tudo quanto ela continha, sucedendo então, e desde logo, nos direitos e obrigações, de tudo quanto decorre, da circulação de trânsito automóvel na dita estrada; 18. Após o momento em que o Réu Município teve a jurisdição do troço da estrada em questão, passou a ser responsável pelo cumprimento da obrigação de a manter em perfeitas condições de segurança; 19. Como dono da via, o Município não podia desconhecer dos perigos que a estrada oferecia; 20. Ao omitir a implementação das medidas de segurança adequadas, é forçoso concluir que se demonstrou a violação dos deveres de ordem técnica ou de prudência comum que deviam ter sido tidos em consideração por parte do Município; 21. Com todo o respeito que lhe é devido, andou mal o Tribunal a quo ao considerar como não provado que o Réu Município sabia que a não colocação dos equipamentos de segurança na área adjacente à faixa de rodagem criava perigo para a vida ou integridade física dos utentes da via; 22. Se a Estrada Municipal 542 oferecia perigosidade, competia ao Réu Município, proceder às devidas alterações e à devida implementação de medidas de segurança, tais como a colocação da grelha na valeta, bem como de uma barreira metálica de protecção junto ao declive onde caiu o veículo do falecido; 23. Verificou-se, assim, a existência de um comportamento omissivo de natureza voluntária (conclusão da obra sem a colocação dos adequados equipamentos de segurança) e ilicitude, traduzida na ofensa dos direitos e interesses de terceiros ou de disposições legais destinadas a protegê-los; 24. À responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, incluindo as autarquias locais, no domínio dos actos de gestão pública, é aplicável a presunção de responsabilidade prevista no artigo 493°, n° 1 do Código Civil, e, no caso, a omissão culposa do réu deve declarar-se quer em função desta presunção, quer, mesmo, por se encontrar provada a sua culpa nos termos gerais; 25. O Réu Município estava consciente da criação do perigo para a vida ou integridade física dos utentes da via, e conformou-se com a possibilidade de tal consequência, pelo que foi dolosa a omissão culposa do Réu Município; 26. Face ao exposto, o Réu Município cometeu a prática do crime de infracção de regras de construção p. e p. pelo artigo 277°, n° 1, alínea a) do Código Penal.
27. Nos termos do disposto no artigo 498°, n° 3 do Código Civil, "se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável." 28. Desta forma, a decisão do Tribunal a quo em julgar verificada a excepção peremptória de prescrição do direito à indemnização invocada pelo Réu Município, violou o disposto no artigo 498°, n° 3 do Código Civil.
TERMOS em que deve o presente recurso ser julgado procedente como é de JUSTIÇA.
O Município juntou contra-alegações, concluindo: i. Vêm as Autoras, ora Recorrentes, interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou verificada a exceção perentória da prescrição do direito à indeminização e, em consequência, absolveu o Recorrido dos pedidos formulados.
ii. As questões essenciais que as Recorrentes pretendem ver decididas pelo Tribunal ad quem resumem-se em determinar se a sentença recorrida, ao julgar procedente a exceção perentória da prescrição, absolvendo o Recorrido dos pedidos formulados, i) incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, bem como em ii) erro de julgamento da matéria de direito.
iii. Não obstante impugnarem a matéria de facto dado como provada as Recorrentes não cumpriram o ónus processual previsto no artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, devendo, em virtude disso, o Tribunal ad quem rejeitar a sobredita impugnação da decisão de facto, mantendo a factualidade dada por provada e por não provada pela 1.ª instância, limitando-se a conhecer da questão do erro de julgamento quanto à matéria de direito.
iv. A vexata quaestio prende-se, em saber, se o alegado direito de indemnização das Recorrentes, com base no regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas no domínio dos atos de gestão pública, à data da citação do Recorrido, já se encontrava prescrito.
v. Não ficaram provados factos suscetíveis de configurar a prática de um crime para qual a lei estabelece prazo de prescrição de dez anos.
vi. Destarte, como bem entendeu o Tribunal recorrido, quando muito, o prazo de prescrição aplicável é aquele que resulta da conjugação dos artigos 498.º, n.º 3, do CC, e 148.º e 118.º, n.º 1, c), ambos do CP, ou seja, cinco anos.
vii. Assim, recorrendo a um simples cálculo aritmético verifica-se que à data em que o Recorrido foi citado, 08.03.2011, já havia decorrido o prazo de prescrição de 5 anos, aplicável por força da conjugação dos artigos 498.º, n.º 3, do CC, e 148.º e 118.º, n.º 1, viii. Pelo que...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO