Acórdão nº 062/21.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Novembro de 2021
Magistrado Responsável | ANÍBAL FERRAZ |
Data da Resolução | 24 de Novembro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.
A…………, S.A. – Sucursal em Portugal, …, ao abrigo do disposto, entre outros, no artigo (art.) 692.º n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), reclama, para a conferência, da decisão de exame preliminar, emitida pelo relator (pág. 851 segs. (SITAF)), em que decidiu rejeitar este recurso para uniformização de jurisprudência.
Sustenta a reclamação, nas seguintes conclusões: « Do recurso para uniformização de jurisprudência apresentado pela ora Reclamante 1.º A aqui Reclamante interpôs recurso, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, da decisão arbitral proferida no processo n.º 278/2020-T do CAAD – “decisão recorrida” –, invocando a sua oposição, quanto à mesma questão fundamental de Direito, com a decisão arbitral proferida no processo n.º 11/2019-T – “decisão fundamento” (cf. Documento 2).
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A decisão recorrida julgou improcedente o Pedido de Pronúncia Arbitral apresentado pela ora Reclamante visando a declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada com vista à contestação do acto tributário de (auto)liquidação de IVA, referente ao ano 2018.
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O recurso foi apresentado nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 25.º do RJAMT, seguindo assim o regime do recurso para uniformização de jurisprudência, conforme consagrado no artigo 152.º do CPTA.
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In casu, verifica-se, relativamente à mesma questão fundamental de direito, uma evidente contradição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão fundamento.
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Desde logo, resulta evidente que, em ambos os arestos em confronto, a questão decidenda foi exactamente a mesma, i.e. saber se, na aplicação do método pro rata de dedução de imposto suportado nos “bens e serviços de utilização mista”, deve ser considerado no numerador e no denominador da fracção de cálculo, o valor total da renda e não apenas a parte correspondente aos juros, sempre que os gastos sejam incorridos sobretudo para a disponibilização das viaturas – cf. pag. 11 da decisão recorrida e pag. 14 da decisão fundamento.
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Existe, igualmente, uma identidade substancial das situações fácticas subjacentes a ambas as decisões. De facto, ambas as decisões versaram sobre a actividade de instituições de crédito abrangidas pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, configurando sujeitos passivos mistos para efeitos de IVA, na medida em que adquirem recursos que são afectos simultaneamente a operações de locação financeira mobiliária (tributadas e que conferem o direito de dedução do imposto) e operações de financiamento e concessão de crédito (isentas do imposto e que não permitem a dedução).
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E, e como não podia deixar de ser, na decisão recorrida e na decisão fundamento, foi dado como provado que ambas as entidades Requerentes, tendo verificado que, no âmbito da sua actividade de leasing, não estavam a exercer plenamente o direito à dedução de IVA que lhes assistia, procederam ao recálculo do seu pro rata de dedução (para os anos 2018 e 2014), passando a considerar, no numerador e no denominador da fracção de cálculo, os montantes relativos à parcela de capital que integram as rendas dos contratos de leasing (em vez de apenas o valor dos correspondentes juros). E que, na sequência daquele recálculo, ambas as entidades apuraram percentagens de dedução superiores às anteriormente apuradas, determinando a dedução de montantes adicionais de IVA.
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Em concreto, na decisão recorrida foi dado como provado que: “(…) A percentagem definitiva de dedução apurada pela Requerente, por aplicação do coeficiente de imputação específico previsto no ponto 9 do citado Ofício circulado, foi de 9%, correspondendo a IVA deduzido de € 551.413,85” sendo que “se a Requerente tivesse aplicado o pro rata de dedução previsto no artigo 23.º, n.º 4 do Código do IVA, a percentagem de IVA dedutível ascenderia a 16% e o correspondente IVA dedutível cifrar-se-ia em € 980.291,30, sendo a diferença, face à dedução efetuada, de € 428.877,44” (…) “Inconformada com a autoliquidação, por entender ter entregue prestação tributária em excesso derivada da ilegalidade do coeficiente de imputação específica, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa (parcial) da autoliquidação de IVA referente ao ano 2018, com fundamentos idênticos aos do presente pedido arbitral(…)” – cf. pontos S, T e U da matéria de facto da decisão recorrida.
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Na decisão recorrida, referente ao IVA de 2018, foi dado como provado que a maioria dos gastos respeitam à disponibilização das viaturas, tendo sido ali salientado que “[e]specificamente no que se refere à atividade de leasing, as rendas cobradas contêm duas componentes distintas, uma respeitante à amortização/reembolso do capital utilizado para adquirir o bem dado em locação e outra relativa à taxa de juro aplicada a esse capital adicionada de outros encargos que a Requerente estima incorrer na execução do contrato”.
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E ademais que “[a] Requerente, como proprietária da viatura locada, participa no processo de legalização da mesma, mas a viatura é diretamente entregue pelo fornecedor do bem ao locatário, que procede ao seu levantamento – provado pelo depoimento da segunda testemunha inquirida”.
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E “[n]a vigência dos contratos de locação financeira, a Requerente monitoriza os seguros das viaturas, nomeadamente a atualização do capital seguro e o cancelamento dos seguros por vicissitudes diversas – provado pelo depoimento da segunda testemunha inquirida”.
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Acrescentou-se ainda que “[a]s notificações para pagamento do IUC das viaturas financiadas em leasing antes de 2018 eram enviadas pela AT à Requerente ou, em 2018, esta última retirava as guias de pagamento do Portal das Finanças. Em ambos os casos, o IUC era debitado aos locatários, sendo-lhes remetida a certidão comprovativa do pagamento – provado pelo depoimento da segunda testemunha inquirida”.
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Assim, atenta a prova testemunhal produzida, considerou-se provado que “[n]o caso de infrações rodoviárias que envolvam viaturas locadas, a Requerente remete aos clientes as notificações das autoridades para identificação do condutor e uma carta à entidade autuante com a identificação do locatário. Este serviço prestado pela Requerente é remunerado por uma comissão específica – provado pelo depoimento da segunda testemunha inquirida e pelo preçário da Requerente”.
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E que “[a]s alterações dos contratos de locação financeira, situações de incumprimento, e/ou o termo desses contratos implicam interações entre diversas áreas/departamentos da Requerente”.
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Ademais, ficou provado que “[a] atividade do departamento específico do leasing, que é integrado por três colaboradores da Requerente, desenvolve-se com maior incidência, no sentido de que consome mais recursos, ao longo da vida dos contratos de leasing e não na fase de originação dos contratos até à disponibilização do bem ao locatário – provado pelo depoimento da segunda testemunha inquirida”.
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Neste âmbito, as “duas testemunhas inquiridas, ………………………., responsável da área de Contencioso e Grandes Riscos da Requerente, manifestaram conhecimento direto dos factos respeitantes à sua área de intervenção e responderam de forma objetiva e credível” [matéria de facto da Decisão recorrida, a final].
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E conclui-se que “(…) resultou claro que o principal consumo de recursos ocorre após a disponibilização da viatura, na fase de “gestão da carteira”, sendo de igual modo nessa fase que surge o incumprimento dos contratos que conduz à intervenção da área de contencioso”. [matéria de facto da Decisão recorrida, a final].
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Em suma, resulta que, na decisão recorrida o Tribunal Arbitral concluiu que, no contexto da actividade de leasing, a maioria dos recursos de utilização mista são alocados à fase de disponibilização de viaturas, i.e., após a entrega propriamente dita das viaturas, nos termos utilizados pelo Tribunal Arbitral.
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Em sentido idêntico, resulta da decisão fundamento que foi dado como provado que: “A testemunha inquirida referiu que a aquisição de viaturas aos stands automóveis pelo Banco e a concessão de crédito aos clientes para a sua aquisição constituem actividades distintas, implicando, por parte da instituição bancária, o contacto com os fornecedores dos veículos e a análise da documentação em vista à concessão de financiamento e à comunicação de entrega da viatura ao cliente. Acrescentou que existem 400 agências a que o cliente poderá dirigir-se para adquirir a viatura através de concessão de crédito, além de uma direcção de financiamento automóvel, com delegações no Porto, Golegã, Lisboa e Faro, além de um call center e bases de dados para simulação, registo da compra e venda das viaturas. A actividade de aquisição de veículos envolve a utilização de custos gerais, como seja, água, gás, eletricidade, sistema informático, telefones, fotocopiadoras e papel, que têm um peso relevante na atividade do banco. Não sendo fácil a afetação direta dos custos às diferentes atividades, sendo o exemplo paradigmático a situação os balcões” [matéria de facto da decisão fundamento, a final].
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Adiantando o Tribunal Arbitral que “Na situação do caso, a prova produzida em audiência aponta consistentemente no sentido de que a aquisição de viaturas aos stands pelo banco e a concessão de crédito aos clientes para a disponibilização da viatura correspondem a actividades distintas. Como foi referido, o cliente negoceia com o stand a aquisição da viatura e dirige-se à agência bancária, informando as condições da transacção, podendo ser utilizados dois procedimentos distintos com diferente regime de custos consoante o...
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