Acórdão nº 4150/14.8TBVNG-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelJOÃO CURA MARIANO
Data da Resolução28 de Outubro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - Relatório A Exequente instaurou ação executiva para prestação de facto contra BB e EE, esta entretanto falecida, tendo sido habilitados na sua posição os Executados, requerendo o cumprimento do determinado na sentença exequenda.

Os primitivos Executados virem deduzir embargos, alegando já terem cumprido o que lhes foi ordenado pela sentença exequenda.

A Exequente contestou os embargos, reafirmando o incumprimento alegado na execução.

Realizada audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou improcedentes os embargos.

Os Executados interpuseram recurso desta sentença para o Tribunal da Relação, o qual proferiu acórdão em 08.06.2021 que julgou parcialmente procedente a presente apelação, em razão do que, alterando a decisão recorrida, a substituem por outra que, confirmando a decisão recorrida na parte em que afirmou que a execução deve prosseguir, por não se mostrar integralmente cumprida a obrigação exequenda, a alteram na parte em que declarou que, para esse efeito, necessário se tornava, também, desenvolver os trabalhos necessários à reposição do prédio da exequente a uma cota superior à do prédio dos executados/embargantes, pois que se declara que a conclusão do cumprimento da obrigação exequenda se bastará com a eliminação do aterro realizado na parte poente do prédio da própria exequente, que os embargantes ali efetuaram, e com a realização dos trabalhos adequados a garantir o escoamento da água de rega e lima que flui nos topos norte e sul do prédio da exequente, por forma a que escoe naturalmente para o prédio dos embargantes.

A Exequente interpôs recurso de revista desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo: ...

  1. O Tribunal da Relação entende que se verificam os requisitos exigíveis, não se devendo rejeitar o recurso da decisão sobre a matéria de facto, referindo-se no douto acórdão aqui em crise que se é certo que os apelantes não individualizam os meios de prova que invocam como justificativos de uma outra decisão em sede de conclusões, isso não é assim no corpo das alegações de recurso.

  2. Avança-se ainda que, apesar de se reconhecer que os Recorrentes não cumprem estritamente os requisitos previstos no artigo 640º, n.º 2, alínea a) do CPC, ainda assim, permitem a perceção dos excertos em que se baseiam.

  3. Por outro lado, entende que, tem que ser excluída, de entre o juízo probatório sobre a matéria controvertida, a afirmação negativa nos termos da qual se deve ter por não provado que “os embargantes procederam ao cumprimento total da obrigação constantes da condenação da sentença referida em 1) e 2. a)”, porque, se considera ter uma natureza conclusiva e que, portanto, afronta com o plasmado no artigo 607º, n.ºs 3 e 4 do CPC.

  4. Ora, compreende-se, desde já, que a questão que é aqui trazida, e que está subjacente ao caso dos autos, é, pois, uma discordância quanto à interpretação e aplicação do Direito, sendo que o Acórdão do TR....... objeto do presente recurso traduz, evidentemente, uma situação de violação de lei substantiva e processual, tal como exigido pelo n.º 1 do artigo 674º do CPC.

  5. Por tal motivo, não pode a Recorrente concordar com o teor e com sentido do Acórdão recorrido, nem com os fundamentos em que a mesma se louva, porquanto enferma de erro de julgamento de direito, por errónea interpretação e aplicação dos artigos 640º, n.º 2, alínea a) do CPC e 607º, n.ºs 3 e 4 do CPC, tendo os recorrentes cumprido o ónus de especificação relativamente à impugnação da matéria de facto, impunha-se concluir que o recurso não tinha por objeto e na verdade a reapreciação da prova gravada, devendo ser considerado, salvo melhor opinião, intempestivo- neste sentido vide AC. STJ de 10-12-2020, proferido no âmbito do proc. n.º 3782/18.0T8VCT.G1, AC. TRG de 22-10-2020, proferido no âmbito do proc. n.º 5397/18.3T8BRG.G1, AC. STJ de 15-11-2017, proferido no âmbito do proc. n.º 461/14.0T8VFR.P1.S1, AC. TRE de 10-03-2016, proferido no âmbito do proc. n.º 114/13.7TBTMR-B.E1, e Acórdão STJ de 06-06-2018, proferido no âmbito do proc. n.º 4691/16.2T8LSB.L1.S1.

  6. Quanto à admissibilidade do recurso interposto sobre a decisão proferida quanto a matéria de facto diga-se que os Recorrentes apresentaram recurso da douta sentença proferida em 1ª instância, veiculando que este abrangia quer a matéria de direito, quer a matéria de facto.

  7. Os apelantes peticionam, nessa sede, a reapreciação da prova produzida no que concerne ao facto dado como não provado - cumprimento da obrigação que sobre si recaia, defendendo que cumpriram a obrigação que sobre si recaia e ao mesmo tempo referindo que sempre caberia ao Exequente liquidar tal obrigação e que o Tribunal não poderia dar efeitos retroativos à sentença à data de 1998 - o que com o devido respeito já resulta contraditório por si só.

  8. Contudo e na verdade, não existia por parte dos Recorrentes uma verdadeira discordância quanto à matéria de facto dada como provada e não provada, mas tão só quanto à matéria de direito, conforme a aí Recorrida veio a fazer notar nas suas contra-alegações.

  9. A Recorrida, por sua vez, nas suas contra-alegações alegara, entre outros, que, na matéria de facto, impunha-se concluir que o recurso não tinha por objeto e na verdade a reapreciação da prova gravada, devendo ser considerado, salvo melhor opinião, intempestivo - neste sentido vide AC. STJ de 10-12-2020, proferido no âmbito do proc. n.º 3782/18.0T8VCT.G1, AC. TRG de 22-10-2020, proferido no âmbito do proc. n.º 5397/18.3T8BRG.G1, AC. STJ de 15-11-2017, proferido no âmbito do proc. n.º 461/14.0T8VFR.P1.S1, AC. TRE de 10-03-2016, proferido no âmbito do proc. n.º 114/13.7TBTMR-B.E1, e Acórdão STJ de 06-06-2018, proferido no âmbito do proc. n.º 4691/16.2T8LSB.L1.S1.

  10. Ora, para que o recorrente possa gozar da faculdade excecional de apresentar o recurso num prazo alargado, é necessário que efetivamente impugne a matéria de facto, pois o que justifica a concessão daquele prazo mais alargado, não é a declaração de intenção de se ver reapreciada a prova gravada, mas antes a sua efetiva concretização.

  11. No caso, os recorrentes limitaram-se a aludir aos depoimentos transcritos na douta sentença, sem cuidar de detalhar as concretas provas que, no seu entendimento, impõem decisão diversa da recorrida, sem balizar com rigor as passagens dos depoimentos gravados em que funda a sua impugnação e sem indicar as provas que devem ser renovadas, antes tecendo considerações acerca da forma como foram interpretados.

  12. Mais, os recorrentes pretenderam fazer uma “revisão” da convicção obtida pelo tribunal a quo por via de argumentos que permitam concluir que uma outra convicção “era possível”, mas para tal, não demonstraram que a convicção obtida pelo Tribunal recorrido é uma impossibilidade lógica, uma impossibilidade probatória, uma violação de regras de experiência comum, uma patentemente errada utilização de presunções naturais y) Acontece que, o Tribunal da Relação veio a decidir pela tempestividade do Recurso apresentado, ainda que considere que não se cumpre estritamente os requisitos previstos no artigo 640º, n.º 2, alínea) CPC.

  13. Ora, outra conclusão, proveniente de uma correta interpretação e aplicação da lei se impunha ao recurso de apelação interposto pelos Executados/Embargantes não deveria ser admitido.

    a

  14. Quanto ao facto alegadamente conclusivo que não se poderia dar por provado e se quer eliminado, o Tribunal da Relação vem a avançar que não se pode dar por provado, como se de um facto se tratasse, nem que “os embargantes procederam ao cumprimento total da obrigação constante da condenação da sentença” nem tão pouco que a deixaram por cumprir, sendo a eliminação do mesmo a única solução consentida para o problema, à luz do disposto no art. 607º, nºs 3 e 4 do CPC.

    bb) No entender do mesmo, "(…) haverá de dissecar-se tal dispositivo da sentença exequenda e ver em que medida o mesmo se mostra preenchido, ou não, pelas operações materiais levadas a cabo pelos executados, que foram alvo de alegação, instrução e decisão. E então, como conclusão, é que se poderá declarar se a obrigação imposta pela sentença foi cumprida ou não”.

    cc) Com tal necessidade de se eliminar dos factos não provados não podemos, desde logo, concordar, uma vez que se trata de matéria controvertida, sobre a qual teve que se produzir prova e que, portanto, não assume natureza meramente conclusiva ou de direito.

    dd) Na verdade, os embargantes alegaram ter procedido ao cumprimento total da obrigação constante da condenação da sentença, sendo que no caso era o que realmente era contraditório e competia apurar de forma a saber-se do fundamento do prosseguimento da execução da sentença ee) Ora, o tribunal a quo não concluiu sem mais pelo não cumprimento, nem se limitara a integrar tal facto negativo nos factos não provados, antes seguiu um raciocínio lógico, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.

    ff) Antes de dar como assente o não cumprimento total da obrigação constante da condenação da sentença pelos embargantes, que era no fundo a defesa apresentada pela Executada e o que se propunha provar, a Exma. Juíza cuidou de decompor tal obrigação, não dispensado a averiguação de qualquer factualidade.

    gg) A operação que o Tribunal da Relação considera agora como necessária, a de dissecar o dispositivo da sentença exequenda, interpretando-a no seu contexto, com o devido respeito, foi levada a cabo com todo o cuidado na sentença de que se viera a recorrer.

    hh) O Tribunal a quo formou a sua convicção através da ponderação crítica dos elementos constantes dos autos e do conjunto da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, tendo ainda em consideração as regras da experiência e do normal acontecer quanto à realidade dos factos, detalhadamente, para cada um os meios de prova, que determinaram a fixação por...

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