Acórdão nº 1377/20.7T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelCRISTINA NEVES
Data da Resolução09 de Novembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

SUMÁRIO ELABORADO E DA RESPONSABILIDADE DO RELATOR (ARTº 663º, Nº 7 DO C.P.C.) I- Visando o recurso a impugnação da matéria de facto é necessário, para se considerar cumprido o ónus imposto ao recorrente, que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640º do CPC, nomeadamente a especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente impunham uma solução diversa e quando em causa a reapreciação de prova gravada, a indicação das passagens da gravação em que se funda o recurso (nº 2, a) do art.º 640º do C.P.C.).

II- Não cumprindo as alegações e conclusões do recorrente este ónus, não é esta omissão passível de despacho de aperfeiçoamento, por não integrar o previsto nos nºs 2 e 3 do artº 639º do C.P.C., impondo-se a imediata rejeição do recurso nesta parte.

III- O regime da solidariedade estabelecido no domínio das relações externas entre os depositantes (credores solidários) e o banco (devedor) rege-se pelos acordos estabelecidos aquando da abertura de conta e não se confunde com a propriedade dos valores monetários depositados, que podem pertencer a todos os depositantes (em partes iguais ou em diversa proporção) ou apenas a um ou alguns dos depositantes.

IV- No domínio das relações internas entre os depositantes só se não for apurada a propriedade dos valores monetários serão aplicáveis as regras constantes dos artºs 513º e 516 do C.C, presumindo-se que os saldos nela depositados ou aplicados pertencem em partes iguais aos seus titulares.

V- Trata-se de uma presunção juris tantum, pelo que – de acordo com o disposto no artº 350º, nº 2, do C.C. - é ilidível, podendo qualquer dos seus titulares, ou respectivo1s herdeiros, provar que os valores constantes desta conta lhe pertencem por inteiro, ou em diversa proporção.

VI- Os valores despendidos com a aquisição, após o decesso do de cujus, de uma campa e com o pagamento da concessão de um terreno em cemitério municipal, não podem ser peticionados à herança, por não integrarem os bens da herança, nem constituírem encargos da mesma (artºs 2068º e 2069º do C.C.).

Proc. Nº 1377/20.7T8GRD.C1 - Apelação Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial da Comarca da Guarda – Juízo Central Cível e Criminal da Guarda – J4 Recorrentes: R...

M...

Recorrido: C...

Juiz Desembargador Relator: Cristina Neves Juízes Desembargadores Adjuntos: Jaime Ferreira Teresa Albuquerque Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: RELATÓRIO C...

intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra R...

e mulher, M..., pedindo a condenação dos réus a: - Restituir-lhe quantia de € 48.500,00 (quarenta e oito mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, contabilizados desde a data de citação até efetivo e integral pagamento; - Restituir-lhe a máquina de oxigénio portátil com bateria e respetivo carregador; ou caso não seja possível a sua restituição, seja condenado a indemnizar o autor do valor da mesma, em quantia não inferior a € 3.300,00 (três mil e trezentos euros); - Restituir-lhe os objetos em ouro descritos no artigo 21º da presente petição inicial, ou caso não seja possível a sua restituição, seja condenado a indemnizar o autor em quantia não inferior a € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros); - Restituir-lhe o computador portátil, o telemóvel de marca “Samsung”, a carteira de cabedal, com os documentos pessoais do falecido P..., fotos e demais objetos pessoais que se encontrem na posse dos réus.

Para o efeito alega ser o único e universal herdeiro de P..., filho dos RR. e falecido em 15 de abril de 2020, em Portugal, no estado de divorciado e que os RR. fizeram seus bens pertencentes ao falecido, cuja restituição aqui peticiona, bem como o saldo existente na conta bancária da C..., com o nº ..., titulada pelo falecido e que fora transferido dias antes do falecimento para conta bancária dos ora RR.

*** Citados vieram os RR. invocar o erro na forma de processo utilizado e por excepção alegaram que foi o seu filho, P..., que em 27 de fevereiro de 2020, quando se encontrava em Portugal, mandou proceder à transferência da importância de €50.000,00 para a conta da C... com o nº... do balcão de ..., conta de que era titular o falecido e seus pais, pelo que, de acordo com o disposto no artigo 516º do C.C., os titulares do depósito participam nos valores depositados em montantes iguais e, no remanescente constituiu uma doação de seu filho, que aceitaram. No que se reporta aos bens móveis cuja restituição é peticionada, alegam que uns não existem, outros encontram-se danificados e outros em poder de terceiros.

Por fim, alegam ser credores da herança no montante de € 9.771,38, em virtude de despesas suportadas com o falecido, devendo tal montante ser apurado em sede de inventário judicial.

* Realizada a audiência prévia foi apreciado e decidida , em sentido negativo, a exceção de erro na forma de processo, após o qual foi proferido despacho saneador que fixou valor à ação, indicou o objeto do litígio e os temas de prova, tendo ainda admitido a prova indicada, programado os atos a realizar na audiência final e designado data para a sua realização.

* Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, no termo da qual o tribunal a quo proferiu a seguinte decisão: “Nestes termos, atentos os fundamentos expendidos, o Tribunal decide julgar parcialmente procedente, por provada, a presente ação e, em consequência, condenar os réus, R... e mulher, M..., a restituir ao autor, C..., a quantia de €46.678,62 (quarenta e seis mil, seiscentos e setenta e oito euros e sessenta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde a citação dos réus (2020/10/30, cfr. fls. 18 e 19) até efetivo e integral pagamento, bem como a máquina de oxigénio com bateria e carregador suplente; a pulseira e o alfinete em ouro; o relógio de pulso; o computador portátil, a carteira em cabedal, com os documentos pessoais do falecido P..., fotos e demais objetos de uso pessoal pertencentes ao mesmo, que aquele deixou na residência dos réus, absolvendo-se os réus do demais peticionado.” Não conformado com esta decisão, impetraram os RR. recurso da mesma, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem: ...

Pelo A. foram interpostas contra-alegações, com as seguintes conclusões: ...

QUESTÕES A DECIDIR Nos termos do disposto nos Artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.

[1] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.

[2] Nestes termos, a única questão a decidir que delimita o objecto deste recurso, consistem em apurar se: a) Se estão reunidos os pressupostos para a reapreciação da matéria de facto; b) Da propriedade dos valores depositados em conta titulada pelos RR.

  1. se aos RR. assiste o direito de serem reembolsados das despesas feitas após o decesso do seu filho, na aquisição de um terreno e de uma campa e demais acessórios.

Corridos que se mostram os vistos aos Srs. Juízes adjuntos, cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O tribunal recorrido considerou a seguinte matéria de facto: 1.

O Autor está registado como sendo filho de P... e de M...

  1. P... está registado como sendo filho dos réus, R... e M...

  2. P... faleceu em 15 de a0bril de 2020, na freguesia e concelho de ....

  3. P... faleceu no estado de divorciado, tendo-lhe sucedido como único e universal herdeiro o seu filho, C...

  4. Há cerca de 28 anos que P... se encontrava a residir na Alemanha, tendo regressado a Portugal no inicio do mês de fevereiro de 2020, por se encontrar bastante doente, sem grandes expetativas de recuperar, tendo fixado residência em casa de...

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