Acórdão nº 1646/15.8PCCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelELISA SALES
Data da Resolução27 de Outubro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5ª secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO O Ministério Público veio interpor recurso da decisão, proferida a 3-3-2021, que ordenou a notificação da condenada por contacto pessoal, da conversão da pena de multa em 166 dias de prisão subsidiária.

* A razão da sua discordância encontra‑se expressa nas conclusões da motivação de recurso onde se refere que: A. Por sentença proferida em 18/05/2017, já transitada em julgado, foi a arguida S. condenada pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. b), do Código Penal (doravante CP), na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa à razão diária de 5,00 € (cinco euros), o que perfaz o total de 1.250,00 € (mil duzentos e cinquenta euros).

  1. Vem o presente recurso interposto da decisão proferida a 03/03/2021 que ordenou a notificação da condenada por contacto pessoal da conversão da pena de multa em 166 (cento e sessenta e seis) dias de prisão subsidiária.

  2. No âmbito dos presentes autos, a condenada prestou TIR no dia 04/05/2016, tendo ficado a constar do mesmo a morada para a qual pretendia que as futuras notificações dos actos processuais fossem remetidas e as consequências advenientes do não cumprimento da comunicação de alteração de morada.

  3. Ora, não está previsto nenhum preceito legal que fixe a notificação da aludida decisão à condenada por contacto pessoal.

  4. Por sua vez, a condenada prestou TIR, mantendo-se todas as obrigações e consequências do mesmo decorrentes até à extinção da pena, de entre as quais a circunstância de as notificações passarem a ser legitimamente feitas por via postal simples (artigos 196.º, n.ºs 1 e 3, als. c), d) e e) e 214.º, n.º 1, al. e) ambos do CPP) F. Pelo que, não se vê como, existindo TIR validamente prestado e operante, a notificação da decisão tenha que ser feita por contacto pessoal e não pela forma para que a condenada foi expressamente advertida.

  5. Além do mais, não se encontra razão subjacente para uma maior exigência ao nível de notificação da decisão de conversão da pena de multa em prisão subsidiária do que da decisão de revogação da suspensão da pena de prisão.

  6. Ora, se por acórdão de uniformização da jurisprudência n.º 6/2010, publicado no Diário da República, Iª Série, de 21/05/2010, se fixou jurisprudência no sentido de que admite a notificação por via postal na morada indicada no TIR da decisão de revogação da suspensão da pena de prisão, uma vez que se entende que o condenado continua afecto às obrigações decorrentes do TIR, até ao trânsito em julgado da revogação de pena substitutiva ou à sua extinção, não obstante o artigo 214.º, n.º 1, al. e) com a redacção dada pela Rectificação n.º 105/2007, de 09/11, estatuir que o TIR se extingue com o trânsito em julgado da sentença condenatória e a decisão de revogação da suspensão da pena de prisão ter um regime mais gravoso que a decisão de conversão em prisão subsidiária, I. Com maior razão deverá ser sufragado tal entendimento quando o legislador processual penal consagra expressamente no texto legal, através das alterações introduzidas com a Lei n.º 20/2013, de 21/02, nos artigos 196.º, n.º 3, al. e) e 214.º, n.º 1, al. e) do CPP, que a validade do TIR, das obrigações e das consequências do mesmo decorrentes apenas se extinguindo “com a extinção da pena”.

  7. Caso assim não se entenda, para além de violação da lei, haverá uma quebra na coerência e unidade do sistema jurídico, uma vez que as duas decisões são substancialmente equiparáveis, ainda que a natureza das penas seja diferente.

    Neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04/06/2014, processo n.º 618/08.3GCSTS-A.P1, Relator: Pedro Vaz Pato e acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 12/01/2021, processo n.º 144/18.2GABT.E1, Relator: José Simão, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.

  8. Acresce que, a pena de prisão subsidiária está para a pena de multa numa relação de subsidiariedade, uma vez que só se procederá à conversão após esgotados todos os outros meios de cumprimento da pena de multa e impeditivos do cumprimento da prisão previstos nos artigos 489.º a 491.º do CPP.

    L. A pena de multa convertida em prisão subsidiária não altera a natureza da pena principal, porquanto o que se executa é a pena principal fixada na sentença, sendo certo que a decisão de conversão não restringe de forma automática a liberdade do arguido, podendo o condenado evitar a execução efectuando o pagamento da multa (artigo 49.º, n.º 2 do CP e cfr. ensinamentos de Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, Parte Geral II - As Consequência Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2.ª Edição, 2009, págs. 145 a 147).

  9. Assim, a aludida decisão ao não constituir uma modificação superveniente do conteúdo da sentença não tem de ser notificada pessoalmente ao arguido.

  10. A notificação da decisão por via postal simples, com prova de depósito, não viola os direitos de defesa da arguida, porquanto a condenada, a par do defensor oficioso, tem sido notificada de todas as decisões que a afectem, nomeadamente foi dada a possibilidade à condenada de esclarecer as razões do não pagamento voluntário da multa, com a advertência de que se não o fizesse ou nada dissesse, aquela pena poderia ser convertida em prisão subsidiária, não o tendo feito.

  11. Face ao exposto, não existindo preceito legal que determine a forma de notificação à condenada da decisão de conversão da pena de multa em prisão subsidiária, nos termos do artigo 49.º, n.º 1 do CP, mas existindo TIR validamente prestado e operante e tendo a condenada sido devidamente advertida das consequências advenientes do não cumprimento da comunicação de alteração de morada, a notificação da aludida decisão deve ser efectuada mediante via postal simples, com prova de depósito, para a morada indicada pela própria para o efeito.

  12. Assim sendo, a decisão de conversão da pena de multa em prisão subsidiária proferida a 03/03/2021, ao determinar a notificação da condenada por contacto pessoal, violou o disposto nos artigos 49.º, n.º 1 do CP e 113.º, n.º 1, al. c), 196.º, n.ºs 2 e 3, als. c)...

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