Acórdão nº 164/19.0T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução14 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I – RELATÓRIO Algarjovicam, Lda.

instaurou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra Favoritevelvet, Lda.

, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 5.377,81, acrescida de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.

Para tanto alega, em síntese, que no âmbito da sua atividade e a solicitação da ré, forneceu a esta uma marmita a gás, pelo preço de € 5.377,81, não tendo a ré apresentado qualquer reclamação, mas apesar de repetidamente interpelada para efetuar o pagamento do preço, nada pagou à autora.

A ré contestou, defendendo-se por exceção, alegando que uma semana após a entrega da marmita, que ocorreu em 23.07.2018, contactou a autora informando que o isqueiro da mesma não funcionava, tendo a autora feito deslocar um funcionário para verificar o estado do equipamento, o qual confirmou aquele defeito. Com o passar do tempo, e não estando a situação do isqueiro resolvida, constatou a ré a oxidação da panela – facto este também transmitido à autora -, mas mais uma vez a assistência prestada foi nula, pelo que no dia 1 de fevereiro de 2019 procedeu à devolução do equipamento junto da loja onde o comprou.

Termina pedindo que seja «declarada a resolução do contrato de compra e venda celebrado entre as partes, com a consequência legal de não obrigação de pagamento por parte da R.” e que a autora seja «condenada em litigância de má fé com a aplicação de uma coima a determinar pelo douto Tribunal …».

Houve resposta, concluindo a autora como na petição inicial, pugnando pela improcedência da exceção invocada e do pedido de condenação como litigante de má-fé, pedindo, por sua vez, a condenação da ré como litigante de má-fé.

Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a ré do pedido[1].

Inconformada, a autora apelou do assim decidido, tendo finalizado a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem: «1-No caso vertente a recorrente entende ter existido uma errónea interpretação da prova testemunhal e documental constante nos presentes autos, o que fundamenta, em seu entender, a impuganção da matéria de facto.

2-Com efeito, a avaliar pelo testemunho de António Arvela, deveria ter sido como provado o ponto 7, vide-se súmela do depoimento onde se refere que se deveria aguardar por o gás sair e depois ligar.

3-No que se refere ao ponto 8 dos depoimentos prestados por N… e C…, em que afirmaram, sem que exista prova nos autos que o comprove, que efectuaram chamadas telefónicas para a recorrente a denunciar defeitos no equipamento.

Como se costuma dizer em direito, o que não está no processo não está no mundo, pelo que essa ponto não deveria ter sido dada como provado.

4-O mesmo se dirá relativamente aos pontos 9, 10 e 11, a testemunha P…, actualmente ex funcionário da recorrente, disse sem margem para dúvidas que e o equipamento se mostrava apto a cumprir as suas funções, donde deveriam isso pontos ser dados como não provados.

5-Igual juízo se formula relativamente aos pontos 12, 13, 14 e 15, as testemunhas N… e C…, apenas referem vagamente que telefonaram para e recorrente sem que indicassem as datas em que tal ocorreu, nos autos inexiste qualquer comprovativo desses telefonemas. Custa a crer que nos tempos que correm sequer tenham enviado um e-mail reportando á recorrente tal situação.

6-Já no que se refere ao ponto 16, o depoimento de P… provou que o equipamento se mostrava apto para o fim em vista – cozedura de marisco, pelo que deveria ter sido julgado como não provado.

7-No tocante ao ponto 17, em face do depoimento de P…, prestado de forma escorreita, deveria ter sido provado que a recorrente prestou a assistência necessária, se tal não houvesse acontecido, o representante da recorrida não deixaria de apresentar a competente reclamação, o que não fez.

8-Em referência ao ponto 20, sempre se dirá que o representante da recorrida não referiu á testemunha P… que se recusava a efectuar o pagamento enquanto o equipamento não fosse reparado. Pelo contrário disse que julgava o filho já tinha efectuado a transferência, e se este não o fizesse ele próprio o faria pelo que o ponto 20 deveria constar como não provado.

9-No tocante aos pontos 21 e 22, verificamos que a panela não foi objecto de perícia, por razões imputáveis à recorrida, deixou a panela ao abandono á porta das instalaçãoes da recorrente, quando a deveria ter guardado para a disponibilizar quando o Tribunal determinasse a perícia, até parece que não tinha interesse na sua realização.

Pelo que esses pontos deveriam ter sido dados como não provados.

10-No que se refere ao ponto 25, em momento algum foi referido ao vendedor P… que a panela se encontrava oxidada, pois a mesma não foi objecto da competente perícia, pelo que deveria ter sido como não provado.

11-Relativamente ao ponto 26, a testemunha N… refere ter tido conhecimento da carta enviada pelo mandatário da recorrente, pelo que a recorrida sabia que aquela iria avançar para Tribunal caso o equipamento lhe não fosse pago, pelo que deveria ser tido como não provado.

12-Face ao depoimento prestado por P… a materia vertida em A deveria ter sido dada como provada, a recorrida não efectuou qualquer reclamação 13-A acima referida testemunha disse quais as caracteristicas do equipamento, declarando que o mesmo não oxidava, não tendo a recorrida efectuado a prova que lhe competia fazer, pelo que o referido em B deveria ter sido dado como provado.

14-A recorrida sequer invocou, muito menos provou, em que datas contactou os serviços da recorrente, pelo que o D devia ter sido dado como provado.

15-A testemunha P… comprovou que a única fez que foi pedida a assistência a recorrente prestou-a pelo que o H deveria ter sido dado como provado.

16-Provado ficou também que o filho do representante da recorrida iria transferir o montante em débito, o que atesta o bom funcionamento do equipamento vendido, pois, como decorre da experiência da vida, se o equipamento apresentasse defeitos o legal representante da recorrida não iria proceder ao seu pagamento, pelo que o I deveria ter sido dado como provado.

17-No que se refere ao J, tal matéria só poderia ter sido respondida se a perícia se tivesse realizado, e a recorrida inviabilizou-a.

18-O depoimento prestado por N…, mãe do legal representante da recorrida, revelou-se tendencioso, a mãe dificilmente é isenta em processos em que o seu filho tem interesse directo, como sucede neste caso.

19-Não se inibiu a referida testemunha de tentar alterar a verdade dos factos, quando referiu que a panela fora devolvida antes da propositura da presente acção , o que é contrariado pelos documentos no processo existentes.

20-A recorrida, apesar de dispôr de meios fáceis e expeditos para tal, não juntou aos autos os comprovativos dos telefonemas que refere ter efectuado, nem sequer requereu ao Tribunal que providenciasse a sua obtenção junto da sua operadora telefónica.

21-Invocou matéria de natureza exceptiva sem que tivesse apresentado a respectiva prova, de harmonia com o artº 342º nº 1 do C.C., tinha o ónus da prova relativamente à matéria que alegara.

22-Ante tal quadro importaria averiguar se a recorrida deu cumprimento ao disposto no nº 3 do artº 921º do C.C., que impõe que o defeito seja denunciado ao vendedor dentro do prazo de garantia, seis meses no caso vertente, e se o fez até 30 dias após o conhecimento desse defeito.

23-Sem o registo desses telefonemas supostamente efectuados, ficamos sem saber se a denúncia dos defeitos foi tempestiva.

24-Por mera cautela de patrocínio sempre se dirá que não se vislumbra que seja aplicável ao presente processo o artº 219º do C.C., a recorrida sequer o alegou.

25-A recorrida não seu cumprimento ao iter exposto no Acórdão do TRC do Proc. nº 92/11.7T2SVV-C1, o que teria sido fundamental para operar a rescisão contratual.

26-Por outro lado, não se vislumbra que tenha cumprido o ditame que se encontra vertido no nº 1 do artº 808º, também ele imprescindível para operar a rescisão contratual, sendo que a posiçao da recorrente se encontra respaldada no Acórdão do STJ, Proc. nº 2679/13.4TBVCD.P1.S1.

27-A recorrida, não alegou a perda do interesse do negócio, nos termos dos artºs 808º, 913º e 921º todos do C.C., pelo que não se pode aplicar o artº 5º nº 3 do C.P.Civil.

28-Não se lobriga que a recorrida tenha alegado devidamente tal matéria, condição essencial para aplicar o retro referenciado normativo, vide nesse sentido Acórdão no TRL Proc. nº 7365/2006-1 relatado pelo Venerando Desembargador Folque Magalhães.

29-Percute-se, queda-se indemonstrada a data da última denúncia, determinante para averiguar se foi cumprido o prazo estabelecido no artº 921º nº 3 do C.C..

30-E era á requerida que competia efectuar tal prova, artº 342º nº 1 do C.C..

31-Inexistem nos autos qualquer referência á data em que a recorrida terá interpolado a recorrente para esta reparar o equipamento.

32-Apesar de ter sido notificada pelo Tribunal, despacho datado de 20 de Maio de 2019, para vir aos autos juntar o comprovativos dos alegados defeitos, a recorrida não o fez.

33-Ao incumprir tal despacho, caiem pela base os argumentos em que a recorrida esteou a sua defesa, pelo que inexistem fundamentos para esta resolver o contrato com a recorrente.

34-Por que assim, não se verificando tal direito, deveria a presente acção ter sido julgada procedente por provada.

» Não foram apresentadas contra-alegações.

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), são as seguintes as questões a decidir: - se deve ser alterada a...

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