Acórdão nº 3239/20.9T8CBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelCRISTINA NEVES
Data da Resolução26 de Outubro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

SUMÁRIO ELABORADO E DA RESPONSABILIDADE DO RELATOR (ARTº 667º, Nº 3 DO C.P.C.) I-A competência internacional dos Tribunais Portugueses afere-se pelo quid disputatum, isto é, pelos termos em que o autor configura a relação jurídica controvertida, pressupondo que o litígio apresenta um ou mais elementos de conexão com uma ou várias ordens jurídicas distintas do ordenamento do foro.

II-A competência em função do critério da causalidade, pressupõe que, de acordo com a alegação do A., se tenha verificado em território nacional o facto ou algum dos factos integradores da causa de pedir (complexa) por este invocada (cfr. artº 62º, b) do C.P.C.).

III-Invocando o A., jogador profissional, a utilização pela R., sociedade com sede nos EUA, sem o seu consentimento, do seu nome e imagem em jogos FIFA por esta criados e desenvolvidos nos EUA, a competência internacional dos Tribunais nacionais dependeria da alegação da prática em território português do facto ou de algum dos factos que integram a causa de pedir: o facto ilícito, o nexo de causalidade e o dano.

IV-Sendo os referidos jogos FIFA produzidos e divulgados pela R. nos Estados Unidos da América, Canadá e Japão e consistindo o dano nessa utilização e divulgação abusiva, os Tribunais Portugueses são internacionalmente incompetentes para o conhecimento da causa, por, quer o facto ilícito quer o dano decorrente da própria utilização da imagem e sua divulgação se terem praticado naquele território, sendo irrelevante, para o efeito, os locais da posterior divulgação, visualização ou aquisição pelo consumidor final do referido jogo.

Proc. Nº 3239/20.9T8CBR-A.C1 Apelação Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra-Juízo Central Cível de Coimbra-J2 Recorrente: E...

Recorrido: D...

Juiz Desembargador Relator: Cristina Neves Juízes Desembargadores Adjuntos: Jaime Ferreira Teresa Albuquerque Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação De COIMBRA: RELATÓRIO D...

, jogador de futebol profissional, de nacionalidade portuguesa e com residência indicada em Portugal, interpôs acção declarativa na forma comum contra E...

, sociedade com sede os EUA, peticionando a condenação da R. a pagar-lhe uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais em montante que computa em €115.302,14 (nela incluído juros de mora), pela utilização indevida da sua imagem e do seu nome nos jogos FIFA, produzidos e comercializados pela R. nos EUA, Canadá e Japão, jogos igualmente comercializados em Portugal por uma sua subsidiária, dessa atuação resultando os danos que computa nos acima quantificados.

* Citada, veio a R. apresentar contestação suscitando, no que ao caso importa, a incompetência internacional do presente Tribunal para apreciação da presente ação, por não se verificar qualquer dos factores de atribuição de competência internacional previstos nos arts. 62.º e 63.º do CPC., tendo em conta que o A. alega na p.i. que: reside e trabalha na Roménia; a ré é uma sociedade norte-americana, com sede no Estado da Califórnia, nos Estados Unidos da América, e dedica-se à exploração, distribuição e venda de jogos nos Estados Unidos da América, Canadá e Japão; a R. não ré vendendora, em Portugal, os jogos FIFA e FIFA MANAGER; não são alegados danos decorrentes de acto praticado pela R. que se produzam em Portugal.

* Notificada para o efeito, veio a Autora pronunciar-se pela competência dos tribunais portugueses para decidir a presente ação, alegando a aplicabilidade do critério de competência territorial constante do artº 82º do C.P.C. para efeitos da alínea a) do artº 62º do C.P.C. e, mais alegando, que os danos se verificaram também em território nacional, por referidos os jogos serem aqui vendidos e divulgados, integrando-se a causa no disposto no artº 62º, b) do C.P.C.

* Após o que pelo tribunal recorrido foi proferida decisão que julgou este tribunal internacionalmente competente, afastando a aplicabilidade do disposto nas alíneas a) e c) do artº 62º do C.P.C., por considerar verificado o factor de conexão constante da alínea b) do C.P.C. decorrente de “Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação ou algum dos factos que a integram (à causa de pedir). Consabidamente a causa de pedir nas acções fundadas na responsabilidade civil extracontratual é complexa, integra todos os pressupostos, a saber, o facto ilícito, a culpa, o nexo de causalidade e os danos, o que implica, "segundo as circunstâncias, a alegação da matéria de facto relacionada com o evento, a ilicitude, a conduta culposa, ou uma situação coberta pela responsabilidade objectiva, os prejuízos e o nexo de causalidade adequado entre o evento e os danos". [Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. I, 3.ª Reimpressão, pág. 205].

A obrigação de reparação decorre de um uso indevido de um direito pessoalíssimo, não sendo de exigir- ao menos na componente de dano não patrimonial - a prova da alegação da existência de prejuízo ou dano, porquanto o dano é a própria utilização não autorizada e indevida da imagem. Se em regra o dano é uma consequência meramente eventual do ilícito, - o dano é requisito indispensável para a configuração da obrigação ressarcitória, mas não para a constituição do ilícito." (Luiz Guilherme MARINONI e Sérgio Cruz ARENHART, p. 454 do seu Manual do processo de conhecimento. São Paulo: RT, 2001), no caso, na sua dimensão pessoalíssima, reside nessa utilização abusiva de imagem.

O dano moral tem como causa a injusta violação de uma situação jurídica subjetiva existencial protegida pelo ordenamento jurídico por meio da cláusula geral de tutela da pessoa humana e para a configuração do dano moral não é necessário provar que a vítima sofreu algo negativo, como vexame ou humilhação, fobia ou sofrimento psicológico pela sua exposição…. Ora, o dano ocorre globalmente, assim também no lugar do domicilio do autor- sito em Portugal.

Nesta medida, concorda-se com o autor quando refere: o próprio dano/facto danoso resultante dessa exploração indevida mostra-se, também, consumado em Portugal. E tal está efectivamente alegado no 16.º da petição inicial onde é expressamente referido que os jogos da Ré se tornaram mundialmente conhecidos, pelo que “…a repercussão da imagem do Autor não se insere apenas ao âmbito nacional, mas é utilizada pela Ré a nível global.” (sublinhado e negrito nossos); …na verdade, “ os jogos propriedade da Ré são comercializados, distribuídos, jogados e a sua imagem, nome e demais caraterísticas são utilizadas, mundialmente, pelo que, logicamente, também em Portugal” * Não se conformando com esta decisão, dela apelou a R. ora recorrente, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem: ...

Pelo A., ora recorrido, foram interpostas contra-alegações, contendo as seguintes conclusões: ...

TERMOS EM QUE deve ser negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida.

QUESTÕES A DECIDIR Nos termos do disposto nos Artigos 635º, nº 4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.

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