Acórdão nº 31/19.7T8MDR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução14 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Relator: Des. José Cravo 1º Adjunto: Des. António Figueiredo de Almeida 2º Adjunto: Desª Maria Cristina Cerdeira Apelação (1ª espécie) *Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*1 – RELATÓRIO A. P.

e esposa M. R.

, com residência na Rua … instauraram a presente acção (1) declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra (1) M. B.

, casado com A. L.

, residentes na Rua …; (2) M. F.

, residente na Rua …; (3) M. G.

, casada com A. M.

, residentes na Rua …, Valongo; e (4) A. F.

, residente na Rua …, pedindo:

  1. Que se reconheça aos AA. o direito de preferência sobre o prédio rústico identificado no art. 2º da P.I., substituindo-se aos 1ºs RR. na escritura de compra e venda, b) Que sejam os RR. condenados a entregarem o referido prédio aos A.A., livre e desocupado.

  2. Que seja ordenado o cancelamento de todos e quaisquer registos que os 1ºs RR., compradores, hajam feito a seu favor em consequência da compra do referido prédio, e outras que estes venham a fazer, sempre com todas as demais consequências que ao caso couberem.

  3. Mais requereram alternativa e subsidiariamente, para o caso de improceder o Direito de Preferência, no que se não concebe, deve a presente ação ser julgada totalmente provada e procedente e, em consequência ser reconhecida a Servidão de Passagem constituída no prédio serviente dos 1.ºs RR.

    Para tal alegaram nos termos constantes da p.i., que aqui se dão por reproduzidos, por uma questão de economia processual.

    Os RR. foram regularmente citados.

    O R. M. B. apresentou contestação, a fls. 76 e ss., alegando, em suma, a ilegitimidade passiva, bem como que o tempo de utilização da invocada passagem se limitou ao período da construção do edifício/armazém dos AA., que o R. presume ter sido de apenas alguns meses, por mero favor.

    Mais alegou o R. que o prédio dos AA. está muito bem servido em termos de acesso, através de caminho público.

    Os Réus M. F., M. G., A. M., A. F. apresentaram contestação, a fls. 103 e ss., alegando, em suma, a falta de depósito do preço, a inexistência do direito de preferência, a inexistência de servidão de passagem e a desnecessidade da servidão de passagem.

    Foi realizada audiência prévia, tendo sido proferido despacho que saneou tabelarmente o processo, foi julgada improcedente a invocada excepção de ilegitimidade activa e passiva, julgada procedente a invocada excepção peremptória de caducidade por falta de depósito do preço no prazo legal, e consequentemente, os RR. foram absolvidos dos pedidos a) a c), tendo sido fixado o valor da causa (cfr. fls. 162 e ss.).

    Tendo, assim, os autos prosseguido quanto aos 1.ºs RR., M. B. e A. L., para apreciação do pedido subsidiário (d).

    Foi designada data para a realização da audiência de discussão e julgamento, a qual decorreu com observância de todas as formalidades legais, como consta das respectivas actas.

    No final, foi proferida sentença, tendo-se decidido nos seguintes termos: Nos termos e pelos fundamentos expostos, e atento o já decidido na audiência prévia de fls. 162 e ss., decide-se julgar a ação procedente, e, em consequência:

  4. Condenar os 1.ºs Réus a reconhecer a servidão de passagem sobre o prédio rústico dos 1.ºs Réus, de terra de cultura de centeio, sito no lugar de ...

    , Campo de ...

    , União das Freguesias de ...

    , Campo de ...

    e ...

    , concelho de ...

    , com o artigo matricial ...

    (o qual proveio da matriz rústica ...

    da extinta freguesia de Campo de ...

    ), e descrito no registo predial sob o n.º ...

    /20180903, existe uma servidão de passagem, constituída por usucapião, a favor do prédio dos Autores (prédio dominante), inscrito no artigo matricial ...

    e descrito na Conservatória do Registo Predial de ...

    sob o n.º ...

    , e destinada ao acesso de e para o prédio dominante a pé, com animais e com veículos de tração animal e mecânica, nomeadamente tratores agrícolas, desde a estrada nacional, e que passa pelo prédio rústico com o artigo matricial ...

    dos AA., atravessa o prédio rústico dos agora proprietários e 1.ºs RR com matriz ...

    , numa extensão de cerca de 30/40 metros de comprimento, desde o inicio do prédio dos 1.ºs RR com matriz ...

    até ao sobreiro existente e que se encontra junto do muro do prédio dos AA. com o artigo matricial ...

    , e entre 3 e 3,70 metros de largura na sua extensão.

    *As custas da ação serão suportadas pelos Autores em 3/4 e pelos Réus em 1/4, atento o disposto no artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

    *Registe e notifique.

    *Após trânsito, comunique à Conservatória do Registo Predial competente, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 3.º, n.º 1, alínea c), 2.º, n.º 1, alínea a), 8.º-A, n.º 1, alínea b), 8.º-B, n.º 3, alínea a), todos do Código do Registo Predial.

    * Inconformados com essa sentença, apresentaram os RR.

    A. L.

    e marido M. B.

    recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizaram com a apresentação das seguintes conclusões: 1- Não foram recolhidos (nem alegados) dados que permitissem concluir que com a utilização do terreno dos RR. os AA. pudessem alcançar a estrada a partir do armazém e/ou do prédio rústico onde aquele está implantado, porque não foi tido em consideração o terreno que separa da dita estrada o prédio inscrito na matriz sob o art.

    ...

    e registado com o n.º ...

    , mas também pela razão de se ter entendido que os AA. utilizaram o terreno dos RR. para passar desde 2003, mas somente terem adquirido o tal prédio do artigo ...

    e registo n.º ...

    em 2015. Também nada foi dito na petição inicial sobre uma eventual utilização, para passar, antes da sua aquisição pelos recorridos, do tal prédio ...

    , de modo a permitir o exercício do contraditório também sobre esse tema; 2- Ora, somente se pode falar de servidão num caso como este se através dela é alcançada a via pública, tal como dita o art. 1550.º do Código Civil e daí que, mesmo que outras razões não houvesse, a acção tinha que improceder; 3- A douta sentença é apropriada para situações de servidão a favor de prédios rústicos destinados a agricultura, reconhecendo uma servidão com largura entre 3 e 3,70 metros, que seria insuficiente para o trânsito das máquinas e alfaias cuja guarda e trânsito de e para o armazém que construíram no prédio dito dominante é, segundo as razões dos AA. (que não do pedido, que é inexpressivo) a finalidade da dita servidão. Essa realidade traduz-se em forte incoerência entre as razões do pedido e a decisão, que impõe que a servidão foi adquirida para transitar apenas com a finalidade de agricultar o terreno e não para a utilização do armazém com a finalidade pretendida pelos AA., que nem invocaram nenhuma necessidade para a normal exploração agrícola; 4- Tal incoerência impede que se possa considerar adquirida a servidão por usucapião, designadamente por ausência de animus possidendi; 5- Nada tendo dito os AA. sobre eventuais actos praticados nos dois prédios que separam o dito serviente relativamente à estrada, aqueles que tivessem sido praticados sobre o mesmo conduziriam a um nada em termos materiais e de lógica, pelo que não se pode afirmar ter havido posse e ainda menos que fosse pública, pacífica e contínua, características consabidamente imprescindíveis para adquirir por usucapião; 6- Os dados expressos na petição inicial não permitem a afirmação de que os AA. utilizaram o prédio dos RR. ignorando que com essa actuação lesavam direitos de outrem, pelo que havendo posse teria que ser qualificada de má-fé e o prazo para constituição da servidão teria que ser de 20 anos; não tendo sido preenchido esse prazo, a acção teria que improceder também por esse motivo; 7- Sem necessidade de discussão teórica sobre o conceito de prédio encravado, neste caso o prédio dito dominante está suficientemente servido pelo caminho público enquanto via de acesso para a sua exploração em termos agrícolas, como sempre estiveram cada uma das parcelas que depois o formaram. Esse caminho serve da mesma forma centenas de outros terrenos de que são donos diversos habitantes da aldeia, que transitam com tractores e outras máquinas agrícolas para a normal exploração dos terrenos. O prédio dos AA. não é encravado; 8- Foram violadas as normas dos arts. 1550.º, 1260.º, 1261.º, 1262.º, 1263.º, al. a) e 1569.º, n.º 2, do Código Civil, que deviam ter sido interpretadas e aplicadas nos termos constantes das demais alíneas destas conclusões: não foi constituída qualquer servidão e, no caso de o entendimento ser em sentido contrário, deve ser declarada extinta por desnecessidade; 9- Alterando-se a matéria de facto conforme o exposto nesta alegação e nas conclusões que seguem, as razões dos recorrentes ficam ainda mais claras no sentido de que não foi constituída nenhuma servidão sobre o seu prédio; 10- Não foi feita prova de que os AA. tenham detido o prédio dito dominante desde 2000/2001, como o próprio Autor disse nas declarações que prestou, pelo que o n.º 5 dos factos provados deve ser retirado; 11- Não foi feita prova cabal de que o A. tivesse entregue o cheque referido nos autos ao antigo dono do prédio dito serviente para o fim que foi aludido, até porque o negócio invocado como subjacente nem teria razão de ser. As afirmações daqueles que teriam visto entregar o cheque e as respectivas circunstâncias não são minimamente credíveis, como não o são todas as outras declarações que proferiram. Está fora do que é a experiência comum que o A. tivesse negociado a cedência de uma passagem dois anos antes de ter adquirido o prédio que seria o dominante e (mesmo para hipótese absurda de o fazer tendo em vista uma futura aquisição) que apenas lhe proporcionaria o trânsito até o limite nascente do terreno de M. J. (com quem nunca se deu bem) ainda longe da estrada. A única explicação plausível é a de o cheque ter subjacente um qualquer outro relacionamento que não foi apurado; 12- Não foi feita prova sólida de o armazém ter sido construído em 2003; nenhum documento foi apresentado a tal respeito e as declarações do próprio Autor e de testemunhas que referiram...

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