Acórdão nº 02438/08.8BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução08 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* * I – RELATÓRIO J., LDA, devidamente identificada nos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que, em 16.11.2020, julgou a presente ação totalmente improcedente, e, em consequência, absolveu o Réu ESTADO PORTUGUÊS, aqui Recorrido, do pedido.

Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões:“(…) 1. Vem a Autora recorrer da sentença de fls... que considerou totalmente improcedente a ação interposta por esta contra o Estado Português por violação do direito a uma decisão em prazo razoável ou sem dilações indevidas, devidamente previsto na Lei 67/2007, de 31 de dezembro.

  1. O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão por ter considerado como não provado o facto de a Autora ter visto afetado o seu nome e reputação durante os anos em que durou o processo de impugnação judicial, e, como tal, não provada a existência de dano e nexo de causalidade adequado.

  2. Ora, tal facto deveria ter sido julgado provado, atendendo à prova testemunhal apresentada, nomeadamente da testemunha M. e P., bem como das declarações da Autora através do Sócio-gerente, J., conforme o transcrito nas Alegações, pelo que, por brevidade, para lá se remete e dão aqui por reproduzidas.

  3. Provado que foi tal facto, encontram-se preenchidos todos os requisitos referentes à responsabilidade civil extracontratual do Estado por violação do direito à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável ou em dilações indevidas.

  4. No que à ilicitude diz respeito, relativamente ao processo judicial tributário, o artigo 96.°, n.°2, do CPPT estatui que este não deve ter duração acumulada superior a dois anos contados entre a data da respectiva instauração e a da decisão proferida em 1.a instância.

  5. No caso em apreço, o processo judicial tributário, em 1.a instancia, teve uma duração aproximada de 7 anos, o que consubstancia uma ultrapassagem do prazo razoável de duração média do processo, o que se afigura excessivo, face às legítimas expectativas das pessoas que recorrem a tribunal.

  6. Para além disso, como se disse e se reitera, fora detetada uma delonga processual de 3 anos e 4 meses, desde 15.01.2013 até 13.05.2016.

  7. Nessa medida, e mesmo que se atenda às circunstâncias concretas do caso, à sua complexidade e ao comportamento das partes, impõe-se concluir que o processo de impugnação judicial, não fora decidido num prazo razoável ou inaceitável para os critérios e expectativas do homem comum.

  8. Como tal, entende-se verificado o pressuposto da ilicitude e da culpa, não apenas numa estrita análise global da duração do processo, mas atendendo ao não cumprimento de determinados prazos processuais, por culpa leve, que se presume ou, quanto mais não seja, por «funcionamento anormal do serviço».

  9. Ocorreu um atraso injustificado que afetou o andamento do processo, contribuindo para a duração do processo; não relevando a existência de um número elevado de processos pendentes no tribunal para isentar o Estado de responsabilidade por atrasos na administração da justiça.” 11. Quanto à culpa, esta resulta da ilicitude e do próprio facto de o serviço não funcionar de acordo com os standards de qualidade e eficiência que são esperados e constituem uma obrigação do Estado de Direito perante os cidadãos.

  10. Quanto aos danos, como se retira das declarações prestadas pelas testemunhas acima referidas, a existência da garantia bancária atingiu a imagem da Recorrente pelo tempo em que se encontrou inscrita no Relatório Anual de Contas da Recorrente.

  11. Não procede o argumento do Tribunal de que os danos alegados referentes à existência de uma garantia bancária nada se relacionam com danos provocados pela delonga do processo.

  12. Em boa verdade, e como se retira do depoimento prestado pela testemunha M. e das declarações do sócio-gerente da Recorrente, para o qual, por brevidade, se remete, a garantia bancária foi prestada para suspender a execução fiscal, sendo certo que nunca seria expectativa de que o processo demorasse tanto tempo.

  13. Assim, dúvidas não há de que o facto de se ter violado a obtenção de decisão em tempo útil acarretou consequências para a imagem e reputação da Recorrente perante as instituições bancárias e Clientes e, como tal, gerou um dano merecedor de tutela, ainda que um dano não patrimonial.

  14. O juiz, desde que se contenha na causa de pedir invocada, é livre de qualificar os danos como patrimoniais ou não patrimoniais.

  15. A ofensa ao bom nome e reputação das sociedades comerciais não releva apenas como dano patrimonial indireto, podendo também relevar como dano não patrimonial.

  16. Quanto ao nexo de causalidade, caso o processo não se tivesse prolongado por tanto tempo, a aqui Recorrente não teria a sua imagem, bom nome e crédito afetado, pelo menos não na proporção em que o teve.

  17. Pelo que, também se encontra preenchido o derradeiro requisito.

  18. Termos em que deverá ser substituída a sentença recorrida por outra que condene o Recorrido pelos danos causados por violação do Direito de obtenção de uma decisão em prazo razoável (…)”.

    * *Notificado que foi para o efeito, o Recorrido produziu contra-alegações, tendo defendido a improcedência do presente recurso jurisdicional.

    *O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

    *Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

    * *II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

    Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir são as de saber se a decisão judicial recorrida incorreu em erro[s] de julgamento de (i) facto e de (ii) direito.

    Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.

    * * III – FUNDAMENTAÇÃO III.1 – DE FACTO O quadro fáctico [e respetiva motivação] apurado na decisão judicial recorrida foi o seguinte: “(…) A. A J.

    , Lda. é uma sociedade por quotas que tem por objeto a importação, exportação, representação e comércio de eletrodomésticos, motociclos, peças e acessórios, máquinas e equipamentos para a indústria e comércio, constituída em 22.06.1982 (cf. certidão permanente junta aos autos com a petição inicial constante de fls. 40 a 43 do SITAF, que se dá aqui por integralmente reproduzido).

    1. Em 30.11.2009, deu entrada no Tribunal Tributário de Braga de petição inicial que originou o processo n.° 1769/09.2BEBRG e através do qual a “J.

      , Lda.” impugnou judicialmente as liquidações dos anos de: 2004 (n.° Liquidação n.° 08053121, de imposto sobre o valor acrescentado (IVA), do mês de dezembro, no valor de € 39.115,92 e Liquidação n.° 08053122, de juros compensatórios, do mês de dezembro, no valor de € 4.316,68), 2005 (Liquidação n.° 08084639, de imposto sobre o valor acrescentado, do mês de junho, no valor de € 24.444,25, Liquidação n.° 08084640, de juros compensatórios, do mês de junho, no valor de € 2.212,71, Liquidação n.° 08053127 de imposto sobre o valor acrescentado, do mês de dezembro, no valor de € 26.559,78, e Liquidação n.° 08053128, de juros compensatórios, do mês de dezembro, no valor de € 1.868,64), peticionando a anulação das sobreditas liquidações (cf. fls. 1 e seguintes do processo n.° 1769/09.2BEBRG do SITAF que se dão aqui por integralmente reproduzidas).

    2. A petição inicial que deu origem ao processo n.° 1769/09.2BEBRG tem o teor que se dá aqui por integralmente reproduzido e do qual consta, designadamente, o seguinte (cf. fls. 1 e seguintes do processo n.° 1769/09.2BEBRG do SITAF que se dão aqui por integralmente reproduzidas): «(... J., LDA., sociedade comercial por quotas, pessoa coletiva número (…), e sede social sita na Rua (…), nos termos dos artigos 99° e 102°, n.° 2 do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), apresenta contra as seguintes liquidações: Do ano de 2004: Liquidação n.° 08053121, de imposto sobre o valor acrescentado, do mês de dezembro, no valor de € 39.115,92, conforme doc. 1, fls. 1, apenas quanto ao valor de € 33.000,34; Liquidação n.° 08053122, de juros compensatórios, do mês de dezembro, no valor de € 4.316,68, conforme doc. 1, fls. 2, apenas quanto ao valor de € 3.641,79; Do ano de 2005: Liquidação n.° 08084639, de imposto sobre o valor acrescentado, do mês de junho, no valor de € 24.444,25, conforme doc. 1, fls. 3, apenas quanto ao valor de € 20.987,74; Liquidação n.° 08084640, de juros compensatórios, do mês de junho, no valor de € 2.212,71, conforme doc. 1, fls. 4, apenas quanto ao valor de € 1.899.83; Liquidação n.° 08053127 de imposto sobre o valor acrescentado, do mês de dezembro, no valor de € 26.559,78, conforme doc. 1, fls. 5, apenas quanto ao valor de € 23.350,61; Liquidação n.° 08053128, de juros compensatórios, do mês de dezembro, no valor de € 1.868,64, conforme doc. 1, fls. 6, apenas quanto ao valor de € 1.642,86; (...) III. DO REENVIO PREJUDICIAL 106. Na presente impugnação judicial suscitam-se questões de interpretação das normas comunitárias, mais concretamente o disposto no art.° 2°, n.° 1 e no n.° 6 do art.° 5° da Sexta Diretiva, com interesse relevante na solução do caso submetido a julgamento.

  19. O art.° 234° do Tratado CE, permite a qualquer jurisdição nacional interrogar o Tribunal de Justiça sobre a interpretação a dar a determinadas normas comunitárias de que depende a solução do litígio de forma a garantir uma aplicação uniforme do direito comunitário, através do mecanismo do reenvio prejudicial.

  20. Sendo assim, e se se vier a considerar que não estão reunidas as condições que permitam excecionar aquele reenvio, designadamente por se considerar a manifesta ilegalidade do critério fornecido pela circular...

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