Acórdão nº 249/19.2T8CBT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Setembro de 2021

Data30 Setembro 2021

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório F. M. intentou acção declarativa de condenação contra “Companhia de Seguros X, S.A.”, pedindo a condenação da ré no pagamento à autora da quantia de 5.200,00€ (valor necessário à substituição do veículo TJ), acrescida de juros moratórios calculados desde a citação até efectivo e integral pagamento, bem como a liquidação do valor diário de privação de uso, no montante que se vier a apurar e pelo período que também se apurar, em execução de sentença.

Para tanto, alegou a autora, em síntese que no dia 15 de Outubro de 2016, o seu veículo com matrícula TJ se encontrava parado na oficina denominada Auto C. M., sendo que por volta das 05h, ocorreu um incêndio nessa mesma oficina, com início no veículo Fiat Punto, matrícula MI, segurado na ré, e que, em consequência, o seu veículo no valor de €5.200,00 (cinco mil e duzentos euros), ficou totalmente destruído.

* A Ré contestou, alegando ter sido instaurado o processo n.º 449/18.2T8GMR no Juízo Central Cível de Guimarães, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, no qual foram partes C. M. e a ré, em que se discutia, além do mais, a dinâmica e a respectiva responsabilidade pela produção do incêndio, e que, nesse processo, foi proferida sentença, ainda não transitada em julgado, da qual resultou que o veículo MI se encontrava no interior da oficina, na sua parte posterior, que havia sido colocado pelo seu proprietário para tratar de um problema na bomba de água, pelo que requereu a suspensão da instância ao abrigo do disposto no artigo 272.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

Alegou, assim, que o proprietário do veículo com matrícula MI não possuía a direcção efectiva do mesmo, mais impugnando os montantes peticionados a título do valor do veículo e pela privação do uso.

*Por despacho proferido a 13.02.2020, foi determinada a suspensão do processo, ao abrigo do preceituado no artigo 272.º, n.º 1 e 3, 1.ª parte do Código de Processo Civil, até ser junta certidão do trânsito em julgado da sentença proferida no âmbito do processo n.º 449/18.2T8GMR.

*Junta a certidão do trânsito em julgado da sentença proferida no âmbito do processo n.º 449/18.2T8GMR e cessada a suspensão do processo, foi designada a realização da audiência prévia e aí considerada a desnecessidade de produção de prova e quanto aos factos alegados por se ter considerado que os que foram dados como não provados se mostram suficientes para apreciar os pedidos.

Assim, deu-se como não provado por força da exceção da autoridade do caso julgado que: a)Não foi feito qualquer trabalho no veículo com matrícula MI, que se encontrava apenas parado na oficina (Ponto 10 da petição inicial).

b)Ficando o veículo com matrícula MI (segurado na ré) a pernoitar naquelas instalações apenas por mera cortesia do garagista e a pedido do seu proprietário, apenas porque lhe facilitaria a vida deixá-lo (já que a avaria era no depósito da água e teria de ser levado a outro local para reparação) (Ponto 12).

Acrescentando-se que, ainda que resultassem provados os demais factos alegados pela autora, a pretensão da autora seria sempre improcedente, nos termos em que o explanou, julgando verificada a excepção da autoridade de caso julgado material quanto à totalidade dos pedidos formulados pela autora, por força da decisão transitada em julgado no processo n.º 449/18.2T8GMR, que correu termos no Juízo Central Cível de Guimarães – Juiz 4, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, absolvendo a ré da totalidade dos pedidos formulados pela autora.

*II-Objecto do recurso Não se conformando com a decisão proferida, veio a A. interpor recurso, juntando, para o efeito, as suas alegações, e apresentando, a final, as seguintes conclusões: 1.Não foi produzida qualquer prova testemunhal, pelo que não podia o Tribunal ter dado como não provados os factos sob as alíneas a) e b) do despacho saneador.

  1. A falta da produção de prova impede a Recorrente na impugnação da mesma.

  2. Logo, a sentença proferida pelo Tribunal à quo padece nulidade, a qual deve ser declarada e a decisão revogada.

  3. Quanto ao conhecimento da exceção de autoridade de caso julgado, julgando-a procedente, o Tribunal à quo violou a lei, nomeadamente os artigos 23.º e 6.º do DL 291/2007 de 21 de agosto.

  4. De facto, a inexistência de seguro de garagista concede à A. o direito de ser ressarcida pela seguradora contratada pelo proprietário, pois o seguro do proprietário responde sempre na falta dos demais, tal como decorre do disposto nos artigos 23.º e 6.º da Lei do Seguro Automóvel.

  5. Perante terceiros lesados (como é precisamente o caso dos autos), o seguro de responsabilidade civil emergente de circulação automóvel responde sempre na falta de seguro do garagista (artigos 23.º e 6.º da Lei do Seguro Automóvel – DL 291/2007).

  6. Por natureza, o seguro obrigatório garante inequivocamente a responsabilidade não só do tomador do seguro, como de todo e qualquer legítimo condutor do veículo.

  7. Nos termos do artigo 23.º do DL 291/2007 de 21 de agosto, havendo vários contratos de seguro com referência ao mesmo veículo, nos termos do 6.º do DL 291/2007 de 21 de agosto, prevalecerá em primeiro lugar o referido no n.º 3 (o garagista), em segundo lugar o n.º 4 (seguro de automobilista) e só se não existir qualquer daqueles o previsto no n.º 1 do citado artigo 6.º (seguro do veículo).

  8. O seguro de responsabilidade civil obrigatória do próprio veículo (contratado pelo proprietário do mesmo) manteve-se sempre em vigor.

  9. Nessa medida, mesmo que se considere provada a direção efetiva por parte da oficina, bem como a sua obrigação de segurar, a decisão proferida no processo 449/18.2T8GMR, que correu termos no Juízo Central de Guimarães – Juiz 4, do Tribunal da Comarca de Braga, não pode constituir exceção de autoridade de caso julgado, porque a lei acautela de forma inequívoca o direito à reparação dos danos produzidos pelo risco de circulação de veículo, mesmo quando este tenha sido depositado em oficina para reparação e a mesma não detenha seguro de garagista, respondendo sempre de forma residual o seguro do próprio veículo que causou o dano (cfr. artigo 23.º e 6.º do DL 291/2007 de 21 de agosto).

  10. Pelo que, concedido provimento ao presente recurso, deve a decisão proferida pelo Tribunal à quo ser revogada e os presentes autos seguir os seus termos, para apuramento dos danos e condenação da Ré na...

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