Acórdão nº 2030/13.3BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução30 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

AcórdãoI- Relatório F............... – Empresa …………………………, S.A. intentou acção administrativa contra o Ministério das Finanças, tendo em vista a anulação do despacho do Sub-Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, de 08.07.2013, que indeferiu o pedido de isenção de IMT, bem assim como a condenação deste último na prática do acto de deferimento devido. Está em causa requerimento, de 04.06.2010, mediante o qual a autora solicitou a isenção de pagamento de IMT incidente sobre a transmissão do direito de propriedade sobre o prédio misto sito em ………….., “prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de A............., sob o nº 3938, da freguesia de T............, inscrito na matriz sob o artigo matricial urbano nº 1372 e sob o artigo rústico nº 5391”, ao abrigo dos artigos 8.º e 10.º do Código daquele imposto.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença, datada de 14 de Dezembro de 2016, julgou improcedente a acção administrativa e, em consequência, absolveu o réu do pedido de condenação à prática de acto devido formulado pela autora. Mais considerou prejudicado o conhecimento dos demais pedidos que, sendo acessórios, daquele dependem.

A autora interpôs recurso jurisdicional contra a sentença. Alega em síntese nos termos seguintes: «

  1. A questão decidenda objecto do recurso consiste na análise do direito à isenção de IMT previsto no artigo 8.º, n.º 3, do CIMT, atentas a relação de domínio plasmada neste preceito legal e a natureza jurídica do BANCO DE PORTUGAL.

  2. Entende o Douto Tribunal a quo que a referida isenção de IMT só poderá ter lugar se entre as sociedades cedente e cessionária existir uma relação de domínio na acepção dos artigos 486.º do CSC e 13.º, n.º 2, do RGICSF, o que na situação em presença não se verifica por força da participação de 44,442% detida pelo BANCO ……….. no capital social da Recorrente.

  3. Ademais, questiona o Douto Tribunal a quo, sem, no entanto, tomar posição, a qualificação do BANCO ………………… enquanto instituição de crédito à luz do artigo 4.º do RGICSF.

  4. Diversamente, considera a Recorrente que a relação de domínio prevista no artigo 8.º, n.º 3, do CIMT não deve ser balizada pelo disposto nos artigos 486.º do CSC e 13.º do RGICSF, exorbitando o thema decidendum objecto dos presentes autos a questão relativa à natureza jurídica do BANCO ……………..

  5. O conceito de domínio previsto no artigo 8.º do CIMT não coincide necessariamente com o conceito utilizado no Título VI do CSC no contexto da coligação de sociedades, sendo certo que o escopo de aplicação deste último se cinge à regulação das relações que entre si estabelecem as sociedades comerciais.

  6. O conceito de domínio previsto no CSC serve o propósito de definir o enquadramento jurídico especial decorrente da relação entre duas sociedades: a sociedade dominante e a sociedade dominada.

  7. Diferentemente, o artigo 8.º do CIMT não restringe o conceito de domínio a uma relação entre duas sociedades, abrangendo claramente situações em que nenhuma relação de domínio na acepção do CSC possa existir.

  8. A letra do artigo 8.º do CIMT é clara ao exigir apenas que o capital da sociedade adquirente seja directa ou indirectamente dominado por instituições de crédito, permitindo assim que sociedades como a Recorrente, integradas no sistema financeiro português por serem sociedades financeiras exclusivamente detidas por instituições de crédito, beneficiem da isenção em causa sem que para tal tenham que ser detidas em mais de 50º/o por uma única instituição de crédito.

  9. É também este entendimento o que melhor se enquadra na ratio da isenção em referência, a qual serve o propósito de garantir a neutralidade em sede de IMT de aquisições que, pela natureza dos seus intervenientes e pelo contexto em que ocorrem, não traduzem qualquer manifestação de riqueza.

  10. Assim sendo, sempre que a aquisição de imóveis não constitua uma manifestação de riqueza patrimonial do respectivo adquirente designadamente por resultar da normal prossecução da sua actividade económica -, carece de fundamento a tributação dessa aquisição imobiliária em sede de IMT, sob pena de violação do disposto no artigo 103.º, n.º 2, da CRP.

  11. No que especificamente respeita à isenção de IMT prevista no artigo 8.º do CIMT, quer no seu n.º 1 (regra geral) quer nos seus n.ºs 2 e 3 (regras especiais), importa referir pressupor a mesma a aquisição do imóvel, não como meio de aumentar o respectivo património, mas apenas como meio de liquidação de uma dívida no âmbito da actividade financeira.

  12. Com efeito, ao receber o bem, o seu adquirente - instituição de crédito ou sociedade dominada, directa ou indirectamente, por instituições de crédito - colocá-lo-á de imediato no mercado com o intuito de realizar o montante que permita a amortização do respectivo crédito - se não o fizer, não concretizando a alienação do bem no prazo máximo de 5 anos, a isenção em causa caduca nos termos do artigo 11.º, n.º 6, do CIMT.

  13. Acresce não se coadunar a actividade das instituições de crédito com a gestão de património imobiliário, sendo o seu exercício inclusive limitado pelo regime ínsito no artigo 112.º, n.º 1, do RGICSF.

  14. Na verdade, os bens adquiridos por tais sociedades não são tidos como efectivas aquisições para efeitos de IMT, uma vez que o seu destinatário final não é a instituição de crédito (ou a sociedade, directa ou indirectamente, dominada por instituições de crédito), ocorrendo tais aquisições tão-somente no contexto de prossecução da respectiva actividade financeira e com vista à recuperação dos respectivos créditos.

  15. Do exposto resulta não pressupor a operação subjacente à isenção de IMT em apreço a criação de qualquer riqueza, apenas visando, no contexto do sistema financeiro, a recuperação de créditos por instituições de crédito (ou por sociedades, directa ou indirectamente, dominadas por instituições de crédito) através da aquisição (e posterior alienação) de imóveis resultantes de incumprimentos contratuais.

  16. Perante o fim inequivocamente visado pela isenção em referência, a posição assumida pelo Douto Tribunal a quo na sentença recorrida revela-se totalmente desenquadrada do âmbito do artigo 8.º do CIMT e do seu papel no contexto da actividade do sector financeiro.

  17. Esse desenquadramento é manifesto quando se constata que conduz directamente à exclusão da Recorrente do campo de aplicação da norma, o que se mostra inaceitável, na medida em que a Recorrente foi constituída por acto legislativo precisamente para desenvolver a actividade de recuperação e aquisição de créditos cuja protecção constitui o escopo inequívoco do artigo 8.º do CIMT.

  18. Com efeito, a Recorrente foi criada enquanto empresa pública pelo Decreto n.º 10/78, de 19 de Janeiro - tendo sido transformada em sociedade anónima pelo Decreto-Lei n.º 250/82, de 26 de Junho -, com o intuito de dotar o sistema financeiro português de uma entidade detida pelas várias instituições de crédito que se dedicasse exclusivamente à aquisição e recuperação de créditos das suas accionistas, como igualmente transparecia do artigo 4.º dos seus estatutos sociais.

  19. Nestes termos, a Recorrente, na qualidade de sociedade financeira - como tal expressamente feita constar do artigo 6.º, n.º 2, do RGCSF -, adquiriu, desde a sua criação, o crédito malparado dos bancos que nela participavam e, subsequentemente, através de actos de dação em cumprimento, os imóveis oferecidos pelos devedores a título de garantia, sempre com o intuito de maximizar a recuperação desses créditos, não tendo exercido, por conseguinte, qualquer actividade imobiliária geradora de riqueza e, consequentemente, passível de ser tributada em sede de IMT.

  20. Por outro lado, para efeitos de salvaguarda do fim visado pela isenção em presença, mostra-se desprovido de fundamento aplicar um tratamento diferenciado às sociedades adquirentes do crédito consoante a participação dominante (superior a 50% do capital) nelas detida por instituições de crédito seja singular ou conjunta.

  21. O que se pretende com a exigência de que o capital das sociedades comerciais que beneficiam da isenção do artigo 8º do CIMT seja directa ou indirectamente dominado por instituições de crédito é garantir a inclusão de tais sociedades, em substância, no âmbito do sector financeiro, uma vez que é apenas nele que encontra justificação a isenção.

  22. Por outras palavras, inexiste razão válida que justifique a aplicação da isenção de IMT prevista no artigo 8.º do CIMT quando aquela sociedade seja dominada por uma única instituição de crédito e, em simultâneo, que permita pugnar pelo seu afastamento quando a relação de domínio derive de uma detenção conjunta por instituições de crédito do capital da sociedade.

  23. Por outro lado, o regime do artigo 101.º, nº 1, do RGICSF, concorre muito claramente para a existência de situações de domínio partilhado, reforçando a conclusão de que o campo de aplicação do artigo 8.º do CIMT pode abranger situações em que instituições de crédito detêm em conjunto a maioria do capital das sociedades adquirentes dos imóveis.

  24. Perante o acima exposto, entende a Recorrente não ser admissível a aplicação do disposto no artigo 8.º, n.ºs 2, alínea b), e 3, do CIMT à luz dos artigos 486.º do CSC e 13.º do RGICSF.

  25. Por outro lado, no âmbito da sentença recorrida, questiona o Douto Tribunal a quo, sem, no entanto, tomar posição, a qualificação do BANCO ……………… enquanto instituição de crédito à luz do artigo 4.º do RGICSF.

  26. Perante esta falta de tomada de posição por parte do Douto Tribunal a quo, entende a Recorrente não ter tal questão concorrido para o sentido decisório adoptado, não sendo por isso susceptível de motivar o erro de julgamento de que a sentença recorrida enferma.

    A

  27. Contudo, caso o Douto Tribunal ad quem perfilhe entendimento distinto, a sentença recorrida enfermará de erro de julgamento por preterição do disposto no artigo 95.º, n.º 1, do CPTA.

    BB) Com efeito, ocupou-se o Douto Tribunal a quo de questão não suscitada pelas partes, conduta totalmente...

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