Acórdão nº 639/13.4TBPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Outubro de 2021
Magistrado Responsável | V |
Data da Resolução | 12 de Outubro de 2021 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório “M..., LDA”, com os sinais dos autos, intentou a presente ação declarativa de condenação, com a forma de processo comum, contra J...
e mulher, M...
, também com os sinais dos autos, pedindo a procedência da ação, de molde a: «
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Serem os Réus condenados (n)a quantia de 196.821,57 (cento e noventa e seis mil oitocentos e vinte e um euros e cinquenta e sete cêntimos); b) Serem os Réus condenados a pagar todos os custos que a Autora tenha que suportar com a desmontagem e remoção da cozinha provisória, assim que a mesma puder voltar a ter a situação anterior ao Procedimento Cautelar supra referido, completamente reposta.
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Serem os Réus condenados a pagar a quantia de 750 Euros mensais até à efetiva entrega de todas as divisões que ficaram afetadas com a tapagem ocorrida no âmbito do procedimento cautelar supra mencionado.
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Serem os Réus condenados a pagar a quantia que se apurar em sede de liquidação de sentença das quantias gastas a título de custas e honorários por parte da Autora.
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Serem os Réus condenados a pagar a quantia de 3.750,00 Euros mensais até à efetiva entrega de todas as divisões que ficaram afectadas com a tapagem supra mencionada.
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Serem os Réus condenados a repor todos os elementos e divisões supra mencionados nos exatos termos em que os mesmos foram concebidos nos termos do projeto aprovado para a implantação do LAR.
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Serem os Réus condenados a repor os equipamentos em pleno funcionamento de modo a que possam ser plenamente usados pela Autora para o efeito a que são destinados.
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Serem os Réus condenados a pagar a quantia de 100 euros mensais até permitirem o acesso da Autora à torneira de segurança, instalarem canalização independente e requisitarem o respetivo contador independente.
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Serem os Réus condenados a pagar, a título de indemnização compulsória, a quantia de 50 Euros por cada dia de atraso após serem condenados nos termos supra peticionados.
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Serem os Réus condenados a pagar a quantia que se apurar em sede de liquidação de sentença correspondente o prejuízo decorrente da Autora não poder ter acesso ao crédito.».
Para tanto, alegou, em síntese, que: - sendo a A. locatária, no âmbito de contrato de locação financeira, de um imóvel, que identifica, destinado a «Lar» (estando atualmente ali instalado o «Lar M...»), os RR. intentaram uma providência cautelar, com vista ao encerramento de parte desse «Lar», alegando terem sido ocupadas para o mesmo divisões pertencentes à moradia desses RR., afirmações que estes sabiam serem falsas; - todavia, o Tribunal, enganado pelos RR., deferiu a providencia e ordenou a entrega da cozinha do «Lar» aos RR., o que foi cumprido no dia 30/04/2010, procedendo-se à entrega efetiva, com tapagem no local mediante a construção de uma parede, com o que ficou vedado o acesso da A. a:
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Cozinha; b) Wc; c) Dispensa; d) Hall de ligação à sala de refeições; e) Acesso ao exterior; f) Acesso ao gás; g) Acesso à distribuição da água, nomeadamente às torneiras de segurança; - tendo a A. recorrido dessa decisão cautelar, o Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) ordenou a reconstituição da situação anterior; - Porém, os RR. não entregaram as divisões cujo acesso tinha sido vedado com a referida tapagem, conduta que provocou diversos prejuízos à A., nos moldes enunciados no pedido da ação.
Os RR. contestaram e deduziram reconvenção, alegando, em síntese: - terem agido na convicção de que a «Fracção B», que prometeram vender e, depois, venderam, não englobava o rés-do-chão da sua vivenda (estavam convencidos de que os edifícios se encontravam separados, com constituição em regime de propriedade horizontal); - a A., mesmo após a realização da escritura de compra e venda, continuou a afirmar que restituiria a cozinha aos RR., facto que levou estes a instaurar a providência cautelar a que a A. alude, bem como a respetiva ação principal; - a A. tinha conhecimento de que os RR. usavam a parte restante do rés-do-chão como habitação, bem como que estavam convictos de que a mesma integrava a fração «A»; - por a providência cautelar ter sido revogada, a A. entrou de imediato na posse da referida parcela, não tendo havido obstrução ao uso e fruição de quaisquer divisões do Lar, como não foram alteradas as divisões, nem impedido o acesso ao fornecimento de água, ou a qualquer parte do imóvel; - através do seu comportamento no decurso do processo negocial, eivado de má-fé, a A. logrou comprar a referida fração por um montante muito inferior ao valor de mercado, sendo que não observou os deveres de informação, lealdade e honestidade durante a fase preparatória do contrato, com o objetivo de obter para si uma vantagem patrimonial injustificada, causando um correspondente prejuízo aos RR., superior a € 200.000,00.
Pugnam pela improcedência da ação e pela procedência do pedido reconvencional, com condenação da A./Reconvinda na quantia de € 200.000,00, a que acrescem os juros de mora vencidos, desde a data de notificação da reconvenção e até efetivo e integral pagamento.
Replicou a A., concluindo pela procedência da ação e improcedência do pedido reconvencional.
Em audiência prévia, foi admitido o pedido reconvencional, tendo ainda sido saneado o processo e enunciados o objeto do litígio e os temas da prova, após o que, tramitados os autos, se procedeu à audiência final.
Foi depois proferida sentença, julgando totalmente improcedentes a ação e a reconvenção, com decorrente absolvição dos respetivos pedidos.
Desta sentença veio a A., inconformada com o desfecho da ação, interpor o presente recurso, apresentando alegação e as seguintes Conclusões ([1]): ...
CC) A sentença recorrida encerra manifesto erro de julgamento e viola, pois a norma constante do artigo 374.º do Código de Processo Civil, cuja relevância normativa impõe, em concreto, a responsabilização dos Recorridos pelos danos causados à Recorrente.
Por todo o exposto, nestes termos e nos melhores de direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por forma a revogar a sentença no que concerne à improcedência do pedido inicial, devendo os Recorridos ser condenados ao pagamento de € 196.821,57 (cento e noventa e seis mil oitocentos e vinte e um euros e cinquenta e sete cêntimos) a título de ressarcimento dos danos patrimoniais, com todas as legais consequências.
».
Não foi junta contra-alegação de recurso.
*** O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foram mantidos o regime e o efeito fixados.
Nada obstando, na legal tramitação recursiva, ao conhecimento do mérito da apelação, cumpre apreciar e decidir.
II – Âmbito do Recurso Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais, consabidamente, definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([2]) –, importa saber: 1. - Se, a ser admissível a impugnação, ocorreu erro de julgamento quanto à decisão relativa à matéria fáctica, com a decorrente necessidade de inclusão de materialidade adicional no quadro fáctico provado [cfr. conclusão W)]; 2. - Se, por força de tal alteração fáctica e/ou por razões jurídicas, deve alterar-se a decisão de direito, condenando-se, em consequência, os RR. no pagamento da indemnização a que alude o pedido recursivo.
III – Fundamentação
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Da admissibilidade da impugnação e do erro de julgamento quanto à decisão da matéria de facto A questão que se coloca é, desde logo, a de saber se o Tribunal a quo avaliou erroneamente a prova testemunhal produzida, devendo, por isso, a matéria de facto fixada pela 1.ª instância ser alterada por esta Relação, nos segmentos invocados, que a Apelante pretende sejam julgados como provados.
Trata-se, pois, da seguinte materialidade [conclusão W) da Apelante], a que deveria caber juízo positivo/afirmativo:
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Os RR./Recorridos tinham pleno conhecimento de que as dependências do imóvel cujo acesso vedaram – a) Cozinha; b) Wc; c) Dispensa; d) Hall de ligação à sala de refeições; e) Acesso ao exterior; f) Acesso ao gás; g) Acesso à distribuição da água, nomeadamente às torneiras de segurança – são parte integrante do lar alienado aos Autores, ora Recorrentes; b) Os RR./Recorridos desrespeitaram uma decisão jurisdicional que os obrigava a restituir aquelas dependências, em manifesta violação dos seus deveres de zelo, prudência e boa-fé; c) A conduta dos RR./Recorridos provocou danos patrimoniais avultados à Recorrente, no valor de € 196.821,57.
Reforça a Recorrente que foram os próprios Recorridos quem, inicialmente, adaptou e edificou as zonas do imóvel que restaram vedadas, a fim de serem cumpridos os requisitos do licenciamento administrativo ao funcionamento do lar residencial [conclusão X)].
Pelo que não poderiam ter realizado a venda do imóvel para tal finalidade se não conhecessem perfeitamente as divisões, uma vez que foram os próprios que as adaptaram e adjudicaram a esse fim [conclusão Y)], sendo manifesto que estavam plenamente cientes de que as zonas vedadas eram essenciais para o mínimo funcionamento do lar, uma vez que foram os próprios que as adjudicaram para criar e licenciar o lar residencial, o que não os inibiu de manter, indiligente e imprudentemente, o acesso vedado à Recorrente e aos seus utentes idosos [conclusão Z)].
Por se limitar a Recorrente, no âmbito objetivo fáctico, a este arrazoado com dimensão conclusiva, deve, desde logo, colocar-se a questão da (in)admissibilidade da empreendida impugnação da decisão de facto.
Com efeito, esperava-se que a Apelante esclarecesse devidamente, não só quais os factos que, na sua ótica, foram julgados erradamente, como ainda quais as concretas provas que, uma vez criticamente analisadas/valoradas, obrigavam a uma decisão diversa da adotada, no sentido de delimitar, de forma motivada, desde logo, o âmbito factual (para além do probatório) da impugnação de facto, devendo...
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