Acórdão nº 765/21 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Assunção Raimundo
Data da Resolução28 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 765/2021

Plenário

Relatora: Conselheira Assunção Raimundo

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. O Partido Democrático Republicano (PDR), representado pelo seu Presidente, Bruno Alexandre Ramalho Fialho, veio, em 25 de março de 2021, na sequência da realização, em 13 de março de 2021, de reunião extraordinária do respetivo Conselho Nacional, remeter ao Presidente do Tribunal Constitucional, para os efeitos legais, “certidão de fotocópias da acta VI, da respectiva reunião do Conselho Nacional, onde se deliberou pela aprovação de novos estatutos, de regulamentos internos e pela alteração do nome do partido, bem como da convocatória dessa reunião”.

Com esta comunicação, pretende o requerente comunicar ao Tribunal Constitucional um conjunto de alterações estatutárias e solicitar a consequente anotação no registo existente neste Tribunal, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 6.º da Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis Orgânicas nºs. 2/2008, de 14 de maio, e 1/2018, de 19 de abril (Lei dos Partidos Políticos ou, abreviadamente, «LPP»).

2. O Ministério Público emitiu parecer no sentido de as alterações propostas representarem uma alteração global dos Estatutos do PDR – que passa a ser denominado “Alternativa Democrática Nacional” (ADN) –, que carecia de uma apreciação também ela global e nova, em termos semelhantes aos empregues aquando do requerimento de inscrição de um partido no registo existente no Tribunal Constitucional.

Para este efeito e analisando de forma circunstanciada os Estatutos aprovados, pronunciou-se no sentido de nada obstar à anotação das alterações propostas, no que concerne às matérias dos princípios fundamentais, da identificação e sede, das coligações e relações externas, das organizações especiais e das disposições finais e transitórias.

Já no que concerne às matérias respeitantes aos membros e simpatizantes, aos órgãos nacionais e à capacidade eleitoral, o Ministério Público manifestou a sua oposição ao deferimento da anotação das alterações estatutárias propostas, destacando os seguintes aspetos:

«(…) Com efeito, a nova versão dos Estatutos do Alternativa Democrática Nacional (ADN) determina, no n.º 2, do seu artigo 11.º, subordinado à epígrafe “Sanções”, que “[a]s infracções graves são punidas com as sanções previstas nas alíneas f) e g) do n.º 1 do presente artigo”, ou seja, que tais infracções são punidas com a suspensão da qualidade de filiado do Partido até dois anos ou mesmo com a expulsão.

Acontece que tais Estatutos não definem, em nenhum dos seus passos, o que são infracções graves, não se verificando qualquer contributo para a necessária tipificação dos factos susceptíveis de integrar aquele conceito e de conduzirem à aplicação das descritas sanções disciplinares.

Mais do que isto, aditemo-lo, os Estatutos revelam-se, mais abrangentemente, omissos quanto à determinação dos factos passíveis de integrarem as infracções susceptíveis de serem punidas com as sanções elencadas no n.º 1, do artigo 11.º, da versão alterada dos Estatutos do Alternativa Democrática Nacional (ADN).

Ou seja, verifica-se uma total falta de determinabilidade da factualidade susceptível de integrar as infracções às quais poderão ser aplicadas as sanções disciplinares elencadas no n.º 1, do artigo 11.º, designadamente da integrante do conceito de infracção grave plasmado no n.º 2 do mesmo normativo estatutário.

Consequentemente, regista-se, em nosso entender, uma violação do princípio da legalidade sancionatória consagrado no n.º 3, do artigo 29.º, da Constituição da República Portuguesa, incontestavelmente aplicável em matéria de direito disciplinar.

Relembrando o anteriormente decidido pelo Tribunal Constitucional, designadamente no já citado Acórdão n.º 369/09:

“Como este Tribunal já salientou, embora as exigências de tipicidade, enquanto corolários do princípio da legalidade (artigo 29.º, n.º 1, da Constituição), só valham qua tale no domínio do direito penal, não deixam de se fazer sentir em menor grau nos demais ramos do direito sancionatório. O que significa que as normas sancionatórias têm de conter um mínimo de determinabilidade, em termos de não haver um encurtamento de direitos fundamentais, sob pena de, não se cumprindo esta exigência, os cidadãos ficarem à mercê de puros actos de poder (cfr. Acórdãos n.ºs 666/94 e 730/95).

Na situação vertente, nem sequer há uma enunciação genérica dos comportamentos que podem constituir infracções à disciplina do partido (nem se pode retirar tal enunciação da listagem de deveres dos filiados, que também se apresenta vaga e genérica – cfr. artigo 7.º do projecto de Estatutos). Mas tais infracções, não enunciadas, podem dar origem a sanções (…)” .

Por tal razão, afigura-se-nos que, ao menos nesta parte, não deverá a requerida anotação da alteração aos Estatutos do Alternativa Democrática Nacional (ADN) ser deferida, para já, pelo Tribunal Constitucional.

A par desta violação constitucional, uma outra, corporizada no n.º 5, do seu artigo 23.º, se nos afigura emergir do texto da versão aprovada dos Estatutos do Alternativa Democrática Nacional (ADN).

Com efeito, resulta deste preceito estatutário que “[c]onstitui inelegibilidade para qualquer cargo do partido, qualquer condenação a pena de prisão igual ou superior a três anos, pelo dobro do período correspondente à pena, a contar desde a data da prolação da respectiva decisão”.

Ou seja, se atentarmos na conformação da infracção disciplinar nele descrita, constatamos que a sanção disciplinar prescrita resulta na perda automática, ainda que temporária, de um direito de natureza política, a saber, do direito a ser eleito para qualquer cargo partidário.

Ora, tal perda automática de um direito político resultante da condenação numa sanção criminal é configurável como um efeito disciplinar necessário da aplicação de tal pena e, consequentemente, como violadora do disposto no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.

Ou seja, também por este motivo se nos afigura que não deverá o Tribunal Constitucional deferir a anotação das alterações estatutárias requeridas.

Acresce, por fim, no que concerne à norma contida no artigo 24.º, n.º 3, dos Estatutos aprovados do Alternativa Democrática Nacional (ADN), que se nos afigura que a mesma, ao estabelecer como prazo de trânsito em julgado das decisões das quais não seja interposto recurso, um “prazo de 8 dias úteis a contar da sua notificação ao interessado”, parece colidir, nomeadamente no domínio do procedimento eleitoral partidário, com o prescrito no n.º 4 do artigo 103.º-C, da Lei do Tribunal Constitucional, ao derrogar, implicitamente, o prazo de interposição de recurso nele plasmado.

Atento o explanado, também por esta via se nos afigura que não deverá este Tribunal Constitucional deferir a anotação das mencionadas alterações estatutárias.

Sem prejuízo do acabado de expor, mais se nos afigura que os aprovados Estatutos do Alternativa Democrática Nacional (ADN) revelam ainda - em linha com o teor da jurisprudência expendida no douto Acórdão n.º 81/2020 que, sem subscrever, convocamos - imperfeições que deveremos apontar, por susceptíveis de causar incertezas normativas...

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