Acórdão nº 77/19.5T9PRG.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARGARIDA BLASCO
Data da Resolução09 de Setembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. n.º 77/19.5T9PRG.S1 Recurso penal (arguido preso[1]) Acordam, precedendo conferência, na 5.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça I.

  1. Por acórdão proferido em 6.04.2021, no Juízo Central Criminal ………- J…/ Tribunal Judicial da Comarca ………., foi o arguido AA condenado pela comissão em autoria material, na forma consumada e em concurso real e efectivo, nos seguintes termos: a) cinco crimes de abuso sexual de crianças, previsto e punido (p. e p.) cada um deles pelo artigo 171.º, n.º 1, Código Penal (CP), na menor BB, na pena, cada um deles, de 2 (dois) anos de prisão; b) cinco crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. cada um deles pelo artigo 171.º, n.º 1, CP, na menor CC na pena, na pena, cada um deles, de 2 (dois) anos de prisão; c) Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 2 (dois) meses de prisão.

    1. O arguido foi absolvido do demais de que vinha acusado.

    2. Mais foi julgado parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela menor BB, representada pelo seu avô materno DD e, consequentemente, foi o arguido condenado a pagar-lhe a indemnização de €20.000,00 (vinte mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescido de juros de mora, calculados à taxa legal em vigor desde a data deste acórdão até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.

    3. E foi arbitrada a indemnização de €20.000,00 (vinte mil euros) à menor CC, representada pelo seu avô materno DD e, consequentemente, condenado o arguido a pagar-lhe a indemnização de €20.000,00 (vinte mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescido de juros de mora, calculados à taxa legal em vigor desde a data deste acórdão até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.

  2. O arguido veio recorrer deste acórdão per saltum para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as seguintes conclusões na sua peça recursiva, que se transcrevem: (…) 1.Com o presente recurso visa o arguido/recorrente insurgir-se contra a decisão recorrida que o condenou, em autoria material, na forma consumada e em concurso real e efetivo de 5 (cinco) crimes de abuso sexual de crianças, p.º e p.º cada um deles pelo artigo 171.º, n.º 1, C. Penal, na menor BB, na pena, cada um deles, de 2 (dois) anos de prisão; cinco crimes de abuso sexual de crianças, p.º e p.º cada um deles pelo artigo 171.º, n.º 1, C. Penal, na menor CC na pena, na pena, cada um deles, de 2 (dois) anos de prisão; em cúmulo jurídico, na pena única de 5 (cinco) anos e 2 (dois) meses de prisão e ainda o condenou no pagamento da quantia de 20.0000,00 Eur (vinte mi euros) a favor de cada uma das menores, a título de danos não patrimoniais.

  3. Esta discordância insurge-se, com o devido respeito, contra a fundamentação e critérios da escolha e da medida da pena (art. 70º; 71º 77º e 78º do CP) e ainda contra o quantum indemnizatório doutamente arbitrado às ofendidas, por se entender excessivas as penas aplicadas bem assim o valor fixado a título de indemnização civil.

  4. Conforme se retira da sentença recorrida o Tribunal deu como os provados os fatos acima elencados, essencialmente, com base nas declarações do arguido, quer prestadas em interrogatório judicial, quer em audiência de julgamento, bem assim nas declarações para memória futura prestadas pelas menores.

  5. Considerou o Tribunal Recorrido que as referidas declarações do arguido, apesar de terem sido relevantes para julgar os factos provados como se julgaram, que tal admissão parcial dos factos verifica-se, de forma relevante em primeiro interrogatório judicial de arguido detido, não valendo como “confissão” do art.º 344.º do CPP, tal como estipulado pelo art.º 357.º, n.º 2, do mesmo diploma legal, estando sujeitas à livre apreciação da prova – artigos 141.º, n.º 4, al. b), do CPP – isto é de acordo com o disposto no art.º 127.º do CPP – segundo as regras da experiência e livre convicção da entidade competente.

  6. Com o devido respeito, que muito é, não concordamos com o raciocínio seguido pelo Tribunal Recorrido, porquanto não se pode concluir, como simplesmente se concluiu, que apenas pelo fato do arguido negado parte dos fatos de que vinha indiciado ou acusado, não ocorreu confissão.

  7. Salvo melhor opinião, para assim suceder, impunha-se que os demais fatos de que o arguido vinha indiciado ou acusado - e que havia negado (conforme conclui o Tribunal Recorrido) - tivessem sido confirmados por outro meio probatório, o que de todo não aconteceu, nomeadamente com o grau de certeza exigível (tanto que foram dados por não provados).

  8. Aliás, disso mesmo deu nota o Tribunal Recorrido, ao consignar que as “declarações das menores contêm algumas incongruências, ambiguidades, contradições, e não estão suportadas na prova pericial, especificamente nos resultados da perícia de natureza sexual acima analisada e pelo menos por apelo do princípio do “in dubio pro reo”.

  9. Pelo que, em primeira linha, defende o arguido/recorrente que as declarações prestadas pelo arguido haverão ser tidas por confissão e consequente arrependimento.

  10. No tocante à escolha e medida concreta da pena, partiu o Tribunal recorrido do enquadramento jurídico-penal feito, nomeadamente que se provou, em pelo menos 5 (cinco) ocasiões distintas, no período temporal de 2015 a março de 2019 no caso da BB e de 2017 até março de 2019 no caso da CC (com resoluções ou desígnios e condutas distintas), o arguido teve comportamentos/condutas em relação às referidas duas menores, que configuram “ato sexual de relevo e que arguido agiu, sempre, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei e, consequentemente, mostram-se preenchidos os elementos objetivos e subjetivos da prática pelo arguido em autoria material e concurso real e efetivo de cinco crimes de abuso sexual de crianças, p.º e p.º um pelo art.º 171.º, n.º 1, do C. Penal.

  11. No apuramento da medida concreta da pena a aplicar ao arguido, observou o Tribunal Recorrido, além do mais, o disposto no artigo 77.º do Código Penal, o qual impõe a determinação da pena concreta de cada um dos crimes em concurso; a elaboração da moldura do concurso nos termos e com os limites estabelecidos no artigo 77.º, n.º 2 do Código Penal e a determinação da pena concreta do concurso observando o disposto na 2.ª parte do artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, ou seja, na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.

  12. Neste enquadramento e com a fundamentação exposta na sentença recorrida, o Tribunal Recorrido condenou o arguido na pena de 2 (dois) anos de prisão por cada um dos cinco crimes de abuso sexual, p. p art.º 171.º, n.º 1, na pessoa da menor BB; e condenou o arguido na pena de 2 (dois) anos por cada um dos cinco crimes que cometeu na pessoa da menor CC.

  13. Ao efetuar o cúmulo jurídico, determinou-se, em síntese, que tendo no seu limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes – 2 anos – e como limite máximo material a soma das seis penas concretamente aplicadas aos vários crimes – 20 anos (2 x 5 por cada menor), foi, a final, o arguido condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 2 (dois) meses de prisão.

  14. Ora, com o devido respeito, entende o arguido/recorrente que no quantum exato da pena ocorreu desproporção da quantificação efetuada, violando-se a regra base da escolha da pena (art. 70º CP).

  15. No caso dos autos, apurados os elementos de fato determinantes para a determinação da pena concreta (art. 71º nº. 1 e 2 do CP), que o Tribunal Recorrido concretamente faz, consignando, nomeadamente, no que tange aos fatos de pendor atenuante: que o arguido não tem antecedentes criminais, o que considera relevante atenta a sua idade; a extrema relevância pela positiva dada a sua admissão/”confissão”, ainda que parcial (mas que o arguido considera integral, pelas razões já expostas), que foi muito relevante para apurar os factos nos moldes motivados, o que não é costume neste tipo de casos; na sequência do que “confessou”, o arguido mostrou-se arrependido, ciente da gravidade daquilo que admitiu, o que, assinale-se, também é muito raro em casos análogos; a sua boa imagem comunitária, sendo considerado bom pai de família, solidário, trabalhador. Na comunidade de residência, o arguido é considerado um homem trabalhador; que a sua constituição como arguido gerou um sentimento de surpresa na localidade; que verificaram-se perturbações na relação conjugal, sendo a atitude inicial de choque e de perspetiva de separação por parte de GG, manifestando atualmente apoio incondicional ao arguido, existindo contactos telefónicos diários e visitas do cônjuge ao estabelecimento prisional; que em meio prisional, tem um comportamento adequado às normas institucionalmente vigentes, participou em agosto passado num programa de estabilização emocional constituído por palestras de gestão do stress e mantém acompanhamento psicológico no EP ……. . O arguido sente vergonha pela condição de reclusão em que se encontra.

  16. Bem assim que o considerado grau médio de gravidade e de culpa média dos fatos praticados pelo arguido, bem assim como os danos psicológicos sofridos pelas ofendidas, que são de gravidade mínima/média, deve, a nosso ver, ser aplicado ao arguido uma pena máxima de 1(um) ano pela prática de cada um dos 5 crimes de abuso sexual praticado, p. p art.º 171.º, n.º 1, na pessoa da menor BB; e condená-lona pena de 1 (um) ano por cada um dos cinco crimes que cometeu na pessoa da menor CC.

  17. Tendo em conta que a moldura material do cúmulo a ponderar tem no seu limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes – 1 anos – e como limite máximo material a soma das dez penas concretamente aplicadas aos vários crimes – 10 anos (1 x 5 por cada menor), deverá o arguido deverá ser condenado a uma pena não ser superior a 5 anos de prisão.

  18. Entende-se que esta pena de prisão (não superior a 5 anos) deverá ser suspensa na sua execução (art. 50º. e 51º...

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