Acórdão nº 060/20.8BEPDL de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução09 de Setembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I. RELATÓRIO 1. ASSOCIAÇÃO TURISMO DOS AÇORES – CONVENTION AND VISITORS BUREAU, identificada nos autos, vem interpor recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul [TCA/S], de 08.04.2021, que concedendo provimento ao recurso de apelação interposto pela Autora A…………, LDA., revogou a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada [TAF/PDL] e, conhecendo em substituição, julgou procedente a ação administrativa de contencioso pré-contratual em que foi demandada e anulou o ato impugnado, “mais ordenado, consequentemente, a baixa dos autos ao tribunal a quo para os efeitos do disposto nos arts. 45.º e 45.º- A, ex vi art. 102.º, n.º 5, do CPTA”.

  1. Conclui assim as suas alegações de revista: “(...) B) Dos fundamentos do recurso V. A previsão de alterações quer de imagens, quer de frases tinha em vista um desenvolvimento e afinação do eventual produto final, sendo que as imagens e frases constantes da proposta serviriam apenas o propósito de maquetização e comunicação do conceito, estando igualmente previsto que as mesmas fossem retiradas do banco de imagens livres de direitos, indo a proposta da contrainteressada ao encontro da prestação contratual solicitada pela adjudicante ora Recorrente e que diz respeito a uma atividade de criação intelectual, isto é, à apresentação de um conceito criativo no qual seriam avaliados, enquanto fatores, a originalidade e estética apresentada, a que correspondia uma ponderação de 25%, e a coerência e eficácia da mensagem, com uma ponderação correspondente de 25%, tal como definido no anexo ao Caderno de Encargos, não devendo ser finalizada a campanha propriamente dita aquando da apresentação da proposta, pois tal configuraria a execução do contrato, como aliás muito bem assinala o Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada.

    1. A proposta da Contrainteressada inclui inequivocamente os atributos necessários à avaliação dos referidos fatores da originalidade e estética apresentada, bem como a coerência e eficácia da mensagem, pelo que a mera declaração de que as frases e as imagens poderiam estar sujeitas a ajustamentos em sede de execução do contrato e versão final da campanha a publicar em nada contende com a validade e com a avaliação da proposta.

    2. Contrariamente ao decidido, os atributos foram apresentados nos exatos termos em que foram pedidos, foram apresentados todos os documentos exigidos pelas peças do procedimento, sendo que aqueles continham todos os elementos submetidos à concorrência e necessários para efetuar uma avaliação da proposta nos termos previstos nas peças procedimentais, tanto assim é que o Júri faz efetivamente uma avaliação da proposta, justificando-a de forma exaustiva e com o devido detalhe, ponto por ponto, expondo o raciocínio analítico, devidamente plasmado em sede relatório preliminar, final e decisão de impugnação administrativa, não se podendo assim considerar que a proposta configurava "uma mão cheia de nada" e determinava a impossibilidade de comparabilidade das propostas.

    3. Tal é um raciocínio errado, pois "uma mão cheia de nada" equivale a dizer que a proposta não continha um conceito criativo, remete para um eventual vício de apresentação de propostas que não se subsume na alínea c) do artigo 70.º, n.º 2 do CCP, mas antes na alínea a) do mesmo artigo, isto é, não apresentação de algum dos atributos ou algum dos termos ou condições ou apresentação em direta contradição com os mesmos, não sendo então possível chamar à colação a (in)comparabilidade das propostas, mas antes saber se a mesma respeita o exigido pelas peças procedimentais, o que, salvo o devido respeito, não aconteceu; aliás, nem incomparabilidade, nem omissão ou violação dos atributos! IX. O teor da proposta apresentada continha os elementos suficientes para determinar o significado dos seus atributos, porque o Júri conseguiu inteligir o respetivo conteúdo, isto é, conseguiu comparar o ideal presente no conceito creativo que iria presidir à efetiva realização da campanha e assim atribuir a pontuação que lhe corresponde segundo o modelo de avaliação, e, mesmo que se exigisse um escrutínio mais minucioso por parte do Júri, sendo o conteúdo da proposta determinável, como é no caso, a proposta deve ser ainda avaliada, como foi no caso concreto, contrariamente à extrapolação feita pelo Tribunal Central Administrativo Sul relativo ao significado da afirmação do concorrente de que o conceito criativo e a imagem constantes da proposta poderiam ser alvo de afinação, para concluir que não é sequer possível avaliar o conceito criativo e as imagens cantantes da proposta, o que, salvo o devido respeito, é errado e ultrapassa claramente os poderes do Tribunal em matéria de sindicância dos juízos técnicos e valorativos próprios da função administrativa.

      Acresce que X. O acórdão recorrido aprecia a validade da proposta em função da concreta execução do contrato, fazendo uso, portanto, de um juízo de comparação entre a proposta apresentada pela contrainteressada e a campanha propriamente dita, isto é, a realizada no âmbito da execução do contrato.

    4. Tal apreciação não é legalmente admissível, na medida em que fundamenta a sua decisão tendo por base a análise de factos futuros, os quais ocorreram em sede de execução do contrato, o que extravasa manifestamente as suas possibilidades tendo em conta estar-se diante de uma ação de contencioso pré-contratual.

    5. Por se estar diante de um procedimento pré-contratual a monitorização e análise da conformidade na execução do contrato não são chamadas à colação nessa fase, pelo que a ação de contencioso pré-contratual, tendo por objeto a prática de atos no âmbito da formação do contrato, não pode incluir uma análise de comparabilidade da proposta com a execução do contrato propriamente dita, por forma a julgar inadmissível uma proposta.

    6. Este foi, por certo, o entendimento do TAF de Ponta Delgada, ao qual é dado, desde logo, a merecida vénia, ao abster-se de conhecer dos alegados vícios da execução do contrato, visto estar-se diante de uma ação administrativa que diz respeito à prática de atos administrativos relativos à formação dos contratos, e não à fase de execução do contrato! XIV. O Tribunal Central Administrativo Sul devia ter limitado a sua análise e apreciação ao conteúdo das peças do procedimento, propostas, relatórios, entre outros, deixando naturalmente de fora uma análise da concreta execução do contrato.

    7. O regime da modificação dos contratos previsto no artigo 313.º do CCP visa impedir a dissonância entre o proposto e o executado, é certo, mas não se pode mobilizar tal regime para apreciar da validade da própria proposta até porque essa apreciação reporta-se ao momento pré-contatual em que não existe nem pode existir qualquer execução contratual.

    8. Assim, ao invocar que a campanha de facto executada não corresponde à campanha proposta pela Contrainteressada para afirmar a invalidade desta o Tribunal a quo violou o disposto nos 56.º, 146.º n.º 1 e 313.º do CCP.

    9. Razão pela qual deve o Acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que mantenha a validade da adjudicação.

      Termos em que, com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deverá ser dado provimento ao recurso e com isso ser revogada a decisão ora recorrida, a qual deverá ser substituída por outra que mantenha a decisão de adjudicação impugnada.

      Com o que se fará a consumada JUSTIÇA! […]” 3. A Autora, aqui Recorrida, produziu contra-alegações, culminando-as deste modo: “[…] 4. A questão na qual a ora RECORRENTE sustenta a admissibilidade do recurso interposto prende-se com o que considera ser a necessidade de determinar se pode a validade de uma proposta ser apreciada através da comparação com o produto final, isto é, com o contrato já executado.

  2. Porém, tal questão apenas pode dever-se a um lapso interpretativo do teor do douto acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul.

  3. Com efeito, o que se afirma no acórdão é que a visão de que o princípio da concorrência apenas terá que ser assegurado em sede de procedimento pré-contratual e de que o contrato se trata de um assunto exclusivo das partes não é atualmente admissível.

  4. Tal questão não se revestirá, naturalmente, de especial relevância ou complexidade, tendo em conta que qualquer decisão em sentido contrário seria legalmente inadmissível, dado que o artigo 1.º-A, do CCP, determina expressamente que o princípio da concorrência, bem como os demais princípios conformadores, devem ser respeitados na formação e na execução dos contratos.

  5. O acórdão recorrido nenhum julgamento faz quanto à execução do contrato, mas antes reconhece a evidência de que as divergências que se verificaram entre a proposta apresentada e a execução do contrato decorrem da invalidade da proposta, com uma natureza vaga, não final, com aceitação expressa de alterações, quer ao nível das imagens, quer ao nível das frases.

  6. O que o douto Tribunal aprecia é, exclusivamente, a validade da proposta e não, sequer remotamente, qualquer questão atinente à execução do contrato, propriamente dita.

  7. De resto, o Tribunal não podia deixar de conhecer da divergência verificada entre a proposta apresentada e a campanha executada, dado que tais factos e respetivos meios de prova foram levados ao seu conhecimento, devendo o Tribunal tomar em consideração todas as provas produzidas, por força do disposto no artigo 413.º, do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.º, do CPTA.

  8. Sendo que a forma como a campanha foi executada contribui para a boa decisão da causa, por demonstrar, inequivocamente, a vaguidade da proposta apresentada e, como tal, a impossibilidade da sua avaliação, o que terá que determinar a sua exclusão, nos termos da alínea c), do número 2., do artigo 70.º, do CCP.

  9. A questão suscitada no presente recurso será absolutamente inócua para o destino da causa, dado que...

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