Acórdão nº 4278/15.7T8CBR-F.1.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução07 de Setembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I - RELATÓRIO A…, S.A., instaura a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra a Massa Insolvente de B…, S.A., por apenso ao processo de insolvência onde esta foi declarada, Pedindo: A condenação da Massa Insolvente, Ré, a pagar à Autora, nos termos do artigo 172.º do CIRE, as seguintes quantias: 1) 4.890,55 €, correspondente aos alugueres vencidos desde 01/07/2015 a 27/03/2020 [alugueres de julho de 2015 a março de 2020] e custos de aviso; 2) 1.829,45 €, a título de juros de mora vencidos desde 01/07/2015 até 27/03/2020, calculados à taxa convencionada nos contratos de locação, de 8% acima da taxa de juros para operações comerciais, atualmente correspondente à taxa de 15,00%; 3) as quantias vincendas a liquidar a final, a título de: a) alugueres vincendos, desde 01/04/2020 até à cessação do contrato e restituição dos bens locados; e b) juros de mora vincendos, desde 28/03/2020 até integral pagamento, sobre a quantia do pedido 1), à taxa convencionada no contrato de locação, de 8% acima da taxa de juros para operações comerciais, atualmente correspondente à taxa de 15,00%.

A Ré, Massa Insolvente, apresenta contestação, alegando, em síntese, ter o administrador de Insolvência (AI) sido informado de que os bens locados teriam sido levantados na sequência da denuncia do contrato por parte da insolvente operada no período posterior à aprovação do plano de revitalização e antes da declaração de insolvência, sendo que, de qualquer modo, ainda que assim não fosse, poderia a locadora ter, ela própria, denunciado o contrato face ao conhecimento da insolvência da devedora, incorrendo num abuso de direito ao manter uma relação contatual que bem sabia não ser correspetiva, concluindo pela improcedência da ação e pela sua absolvição da instância.

Realizada audiência de julgamento, pelo juiz a quo foi proferida Sentença, de que agora se recorre, a julgar a ação procedente, por provada, condenando, em consequência, a Massa Insolvente, ora Ré, a pagar à Autora, nos termos do art. 172.º do CIRE, as seguintes quantias: 1) 4.890,55 €, correspondente aos alugueres vencidos desde 01/07/2015 a 27/03/2020 [alugueres de julho de 2015 a março de 2020] e custos de aviso; 2) 1.829,45 €, a título de juros de mora vencidos desde 01/07/2015 até 27/03/2020, calculados à taxa convencionada nos contratos de locação, de 8% acima da taxa de juros para operações comerciais, atualmente correspondente à taxa de 15,00%; 3) as quantias vincendas a liquidar a final, a título de: a) alugueres vincendos, desde 01/04/2020 até à cessação do contrato e restituição dos bens locados, que se entende com a própria entrega dos bens ocorrida em17/12/2020; e b) juros de mora vincendos, desde 28/03/2020 até integral pagamento, sobre a quantia do pedido 1), à taxa convencionada no contrato de locação, de 8% acima da taxa de juros para operações comerciais, atualmente correspondente à taxa de 15,00%.

* Inconformado com tal decisão, a Ré, Massa Insolvente, dela interpôs recurso de Apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões: I. Por sentença entendeu a Mm.ª Juiz do Juízo de Comércio de Coimbra – Juiz 1 condenar a Recorrente ao pagamento das seguintes quantias: (…).

II. Mais considerou a douta sentença que tais quantias constituem dívidas da Massa Insolvente, ordenando o seu pagamento nos termos do artigo 172.º do CIRE, isto é, antes do pagamento dos créditos da insolvente.

III. A Mm.ª Juiz a quo determinou que tais quantias vencidas constituem dívidas da Massa Insolvente por aplicação do artigo 108.º do CIRE.

IV. No entanto, a Recorrente entende que este normativo apenas tem aplicabilidade quando estamos perante típicos contratos de locação em que o interesse primordial é o valor económico do bem, sem que intervenham outro tipo de encargos suportados pelo Locador V. E não a locações em que objeto contratual se funda no pagamento das prestações, sem que exista interesse no retorno do gozo do bem VI. Pelo que entende a Recorrente estarmos perante um contrato atípico, no qual se deve aplicar o regime geral instituído no artigo 102.º do CIRE, do qual resulta que o “(…) cumprimento do contrato fica suspenso até que o administrador de insolvência declare optar pela execução ou recusar o cumprimento.”.

VII. Pelo que, tais quantias não se constituem dívidas da massa insolvente, mas sim de créditos sobre a insolvência, VIII. A opção por tal entendimento não frustra as legitimas expetativas das partes que tem sempre direito a serem ressarcidas dos prejuízos causados pelo incumprimento contratual, conforme prevê a alínea c) do n.º 3 do artigo 102.º do CIRE, IX. Nomeadamente o direito a exigirem, como crédito sobre a insolvência, isto é, o valor da prestação do devedor, na parte incumprida.

X. No entanto, tal obrigava a que a parte reclamasse o seu crédito junto do Sr. Administrador de Insolvência, nos termos do artigo 128.º do CIRE, XI. Ou, decorrido tal prazo, por ação de verificação ulterior de créditos a ser proposta contra a Massa Insolvente, conforme prevê o artigo 146.º do CIRE.

XII.O que a Recorrente não logrou fazer.

XIII. Pelo que, salvo melhor opinião, a douta sentença proferida pela Mm.ª Juiz do Juízo de Comércio de Coimbra, viola os artigos 50.º e 102.º do CIRE devendo esta ser alterada por douto Acórdão que julgue a ação improcedente e, consequentemente, absolva a Massa Insolvente nos pedidos formulados.

* Pela Autora foram apresentadas contra-alegações no sentido da improcedência do recurso.

Dispensados os vistos legais ao abrigo do nº4 do artigo 657º CPC, cumpre decidir do objeto do recurso. *II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Código de Processo Civil –, as questões que se colocam a este tribunal são as seguintes: 1. Se o contrato em apreço se encontra sujeito ao regime contido no artigo 102º ou ao contido no artigo 108º, do CIRE – natureza do contrato em apreço*A. Matéria de Facto São os seguintes os factos dados como provados na sentença recorrida com interesse para as decisões a proferir no presente recurso: 1.º A Autora – A…, S.A. é uma sociedade comercial que, iniciou a sua atividade em Portugal, no segundo trimestre de 2008, tendo por objecto social “aluguer de equipamento de escritório, de máquinas e de equipamento informático, incluindo software e hardware, actividades relacionadas e revenda de equipamentos usados. Aquisição de equipamentos informáticos, software e outros bens para aluguer e aluguer dos mesmos, prestação de consultoria de serviços relativos a manutenção e reparação de equipamentos informáticos, software e outros bens, tanto novos como usados. Aquisição e venda de imóveis.” (conforme certidão permanente do registo comercial, site do Portal da Empresa (www.portaldaempresa.pt), com o código de acesso n.º 3714-5148-1860).

  1. Encontra-se junto a fls. 13 a 14 documento denominado “Contrato de Locação” –“Locação Clássica-Contrato de Locação para Clientes Empresariais-Corporate Clients” – entre a sociedade Insolvente, na qualidade de Locatária e a autora A…, S.A., na qualidade de Locadora, do qual fazem parte as Condições Gerais de Locação e os Termos e Condições Gerais Relativas ao Seguro de Propriedade da A… e cuja data de confirmação de aceitação é de 28.02.2014, e que aqui se dá integralmente por reproduzido.

  2. O referido contrato tinha como “Fim: A locação tem como fim o exercício da actividade comercial/profissão acima identificada que eu/nós temos vindo a exercer desde” (Cfr. doc. nº 1 junto a fls. 13 a 14).

  3. O mencionado contrato de locação identifica o vendedor/fornecedor dos equipamentos: C…, Lda., Estrada …. (Cfr. doc. nº 1 junto a fls. 13 a 14).

  4. A identificação dos equipamentos objetos de locação: ES 7470 MFP, ES 7170 MFP e Brother Scanner ADS 2600W (Cfr. doc. nº 1 junto a fls. 13 a 14 da petição inicial).

  5. O denominado Contrato de Locação foi celebrado por 60 (sessenta) meses, tendo “o início da locação/termo da locação/renovação: O termo inicial começará no primeiro dia de calendário do calendário do mês caso tenha sido acordado o pagamento mensal posterior à aceitação. Caso a aceitação tenha lugar antes do início do termo inicial, deverá ser pago o valor correspondente a 1/30 do aluguer mensal por cada dia decorrido nesse período. O presente contrato de locação será igualmente aplicável aos referidos períodos de tempo. O contrato de locação será renovado por um período subsequente de seis meses excepto se a não renovação for notificada com uma antecedência de pelo menos três meses relativamente à data de não renovação (confrontar a Secção 18 das Condições Gerais de Locação). O Contrato de locação não poderá cessar antecipadamente durante o termo inicial base sem fundamento contratual.

    ” (Cfr. doc. nº 1 junto a fls. 13 a 14 da petição inicial).

  6. O valor do aluguer mensal ajustado foi de 69,58 € (acrescido de IVA à taxa legal aplicável), a pagar trimestralmente por débito direto (Cfr. doc. nº 1 junto a fls. 13 a 15), sendo que “Caso o locatário esteja em mora com o pagamento de quaisquer montantes devidos de acordo com o contrato serão devidos juros à taxa legal para operações comerciais acrescidos de 8% pelos alugueres em dívida e juros à taxa legal para operações comerciais acrescidos de 5% por quaisquer outros montantes em dívida (taxa de serviço, prémio de seguros despesas administrativas)” e o “Locador poderá avisar o Locatário . Os custos de aviso e gestão de cobrança poderão variar entre os EUR 10.00 e EUR 120.00 (acrescidos de IVA), consoante sejam efetuado pelo Locador ou também por...

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