Acórdão nº 00103/13.1BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Julho de 2021

Data02 Julho 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* A AEDL, S.A.

veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 11.12.2020, pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção para a efectivação de responsabilidade civil extracontratual intentada por J.

contra a ora Recorrente e o Estado Português e em que foi pedida a condenação da primeira Ré no pagamento do montante de 430.000€00, acrescido de juros de mora vincendos desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, ou, subsidiariamente, ser o segundo Réu condenado no pedido.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida errou na apreciação da matéria de facto, quanto aos factos provados 21 e 22, assim como no enquadramento jurídico quer porque não se verificam os pressupostos da especial relevância e anormalidade dos danos exigidas pelo artigo 16º da Lei nº 67/2007, de 31.12, para o caso, como o presente, de responsabilidade civil por facto ilícito, quer porque se fez errada determinação do valor de desvalorização do prédio do Autor quer, porque, em todo o caso, a haver responsabilidade, cabe ao Réu Estado Português e não à ora Recorrente, ao contrário do decidido.

O Autor, por um lado, e o Estado Português, por outro, apresentaram contra-alegações a defenderem, ambos, a improcedência do recurso.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* Questão prévia suscitada pelo Autor, ora Recorrido, da falta de síntese nas conclusões, como motivo de rejeição do recurso.

Desde logo a falta de síntese nas conclusões não é motivo de rejeição do recurso mas de convite ao aperfeiçoamento – n.º3 do artigo 639º do Código de Processo Civil, e alínea b) do n.º 2 do artigo 145º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a contrario.

E, em todo o caso, não se justifica o convite ao aperfeiçoamento dado que pelas conclusões apresentadas é possível delinear com simplicidade e precisão quais os fundamentos do recurso, tal como fez, de resto, o Autor, aqui Recorrido.

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: A. O presente recurso tem por objeto quer a impugnação da matéria de facto dada como assente na sentença ora sindicada, quer, também, a reapreciação da subsunção dos factos ao Direito ali levada a cabo, em termos tais que conduziram a uma decisão a todos os títulos ilegal e injusta.

B. O Tribunal a quo fez uma errada valoração dos factos dados por provados e, bem assim, uma errada interpretação e subsunção dos factos e do direito que se estende à sua própria qualificação afetando e viciando a decisão proferida, julgou parcialmente procedente o pedido aduzido quanto aos danos patrimoniais, condenando a Recorrente AEDL a atribuir uma compensação ao Autor/Recorrido no valor de € 86.059,38.

C. A douta sentença considerou que esse pagamento cabe à primeira Ré, AEDL, e não ao segundo Réu, Estado Português, absolvendo-o, com que também não se concorda atendendo à desacertada aplicação do direito produzida pela sentença em crise.

D. O Tribunal a quo elevou à condição de facto provado o conteúdo do relatório de perícia (facto provado 21) e os esclarecimentos dos Peritos (facto provado 22). Fê-lo acriticamente, sem uma apreciação valorativa, porquanto os peritos formularam opiniões empíricas, juízos de probabilidade ou meramente opinativos, pelo que se impunha não considerar por provadas as meras opiniões dos peritos desprovidas de fundamento cientifico ou contraditórias em si mesmas.

E. Não se aferiu que o ruído, a poluição atmosférica ou a trepidação fossem objectivamente causa adequada de um impacte na desvalorização da propriedade do Recorrido e, portanto, suscetível de causar dano patrimonial na esfera do Recorrido.

F. Os peritos consideraram que há fatores de valorização e de depreciação do prédio, sendo inegável a valorização de um prédio que é servido por uma via estruturante de comunicação, sendo que a percentagem de depreciação só o mercado pode aferir.

G. Não tendo realizado qualquer análise de mercado com base em método comparativo, as opiniões dos Peritos do Tribunal e do Autor sobre a depreciação do valor do imóvel a este respeito são subjetivas, sendo que não ficou provada objetivamente a existência de impactes negativos decorrentes da existência da autoestrada e do tráfego que nela circula que justifiquem a desvalorização do prédio do Autor (quesitos 14º e 15º).

H. Ou seja, os peritos não só reconheceram que a atribuição de uma percentagem de desvalorização estaria sempre dependente de uma análise de mercado, necessariamente à data do facto, ou seja, reportada ao 2010 quando a autoestrada entrou em serviço, análise essa que não fizeram.

I. Por outro lado, os Peritos omitem das respostas aos quesitos a atribuição de uma percentagem à inegável valorização do prédio decorrente da existência da autoestrada. Como também omitem a crise do subprime que afetou de forma publica e notória o mercado imobiliário em 2010.

J. O Tribunal a quo, sujeito que está ao princípio da livre apreciação da prova, o qual não exclui, antes pressupõe a observância das regras de experiência e critérios da lógica, não poderia dar como provado, sem fundamento, a resposta dos peritos do Tribunal e do Autor ao quesito 16º no que reporta às percentagens de desvalorização do imóvel e a resposta ao quesito 17º em que esses peritos materializam em euros o valor do prédio após a construção da autoestrada, ambos do Facto 21 e, bem assim, os esclarecimentos prestados ao quesito 17º do Facto 22. Deveria sim ter considerado tais factos como não provados e retirar daí a consequência de absolvição da Recorrente como se impunha.

K. Na avaliação feita pelo B. e pelo BIC e segundo a prova testemunhal produzida pelos bancários a crise do subprime de 2010 foi relevante na avaliação da moradia do Autor e no financiamento pretendido por este.

L. Ao invés, a avaliação ao imóvel realizada pelos Peritos nas respostas aos quesitos 8º e 9º do Facto Provado 21, porque não reportada à data dos factos (2010), e porque apenas baseada no método do custo, e sem recurso ao método comparativo (antes e depois da construção da autoestrada), está claramente viciada, pelo que se impugna e deveria ter sido considerado pelo Tribunal a quo como não provadas as respostas dos Peritos aos referidos quesitos respeitantes à avaliação do imóvel à data da Perícia (2017) e a partir da qual os Peritos calcularam a depreciação que o Tribunal a quo erradamente valorizou, sem levar em conta a crise do “subprime”.

M. Pelo que não poderia o Tribunal a quo, de maneira nenhuma, bastar-se com um raciocínio simples e altamente falível da atribuição de uma média aritmética entre os valores de depreciação do imóvel dados pelos peritos.

N. Em todo o caso, o Tribunal a quo errou ao imputar à Recorrente a responsabilidade pelos danos, que a existirem, deveria ser responsável apenas o Estado, que, em 30.11.2006, emitiu a Declaração de Impacte Ambiental da A32/IC2 – Oliveira de Azeméis/IP1 (S. Lourenço) favorável à Solução B+B1, antes da celebração do Contrato de Concessão. Foi o Concedente que decidiu e aprovou a localização do traçado onde o projeto da autoestrada se iria desenvolver, especificando, inclusivamente, qual a solução concreta de projeto a implementar – “Solução B+B1”.

O. A Concessionária AEDL estava assim limitada por aquela solução de traçado aprovada pelo Concedente Estado Português, de acordo com a referida Declaração de Impacte Ambiental.

P. O Autor apontou como origem dos danos patrimoniais a mera existência de uma autoestrada, naquele concreto local e com aquela solução de traçado, mas cujo projeto obedeceu à Solução imposta pela Declaração de Impacte Ambiental previamente aprovada pelo Concedente, pelo que a existir dano especial e anormal, que em qualquer caso não se concede, decorrente da existência da A32 naquela localização é ao Concedente, aqui segundo Réu, que cumpre responder.

Q. Também por este motivo o Tribunal incorreu em manifesto erro de julgamento ao decidir como decidiu, pelo que deve a sentença recorrida ser anulada e substituída por uma que absolva a Recorrente integralmente.

R. Os danos patrimoniais invocados pelo Autor, nomeadamente a desvalorização do imóvel de que é proprietário (Factos Provados 1 e 22, esclarecimento ao quesito n.º 17) não se pautam pelas características de especialidade e anormalidade, exigidas pelo artigo 16.º da Lei n.º 67/2007, de 31 dezembro, e definidas no artigo 2.º do mesmo diploma, donde não são indemnizáveis.

S. A hipotética desvalorização do imóvel do Autor não constitui um dano especial. É certo que a construção da A32 naquele local não onera todos os seus beneficiários ou utilizadores, mas, de todo o modo, não seria expectável, ou sequer razoável que assim fosse.

T. O Autor não se encontra numa situação que possa ser considerada uma “específica posição relativa”; sucede apenas que a sua propriedade é “vizinha” do lanço da A32 que passa nessa localidade e que a propriedade do Autor ficou inegavelmente valorizada por esse facto e que o próprio também é beneficiário.

U. Por mera hipótese de raciocínio, que não se concede, se considerar que a construção da infraestrutura contendeu com a propriedade do Autor, que até foi poupada à expropriação, ter-se-ia de admitir que a autoestrada contendeu também com muitos outros direitos de propriedade, mormente, naquela localidade que a autoestrada atravessa.

V. Considerar que essa afetação é especial pela simples razão de que há um desfasamento quantitativo relativamente aos beneficiários da obra pública é, salvo o devido respeito, parco.

W. Com efeito, não foi violado o princípio da igualdade de repartição dos encargos públicos.

Assim sendo, e não se verificando o pressuposto da especialidade do dano, previsto no artigo 16.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, é de concluir que os danos não são indemnizáveis, o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT