Acórdão nº 147/13.3JELSB.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução15 de Julho de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n. º 147/13.3JELSB.L2.S1 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.

No Tribunal Judicial da Comarca ... (Juízo Central Criminal ... — Juiz 3) foi julgado e condenado, por acórdão de 25.11.2020, o arguido AA na pena de prisão de 10 (dez) anos, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, nos termos do art. 21.º, n.º 1 e 24.º, al. c), ambos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01 (e alterações posteriores), por referência à tabela I-B.

  1. O arguido, inconformado, recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 08.04.2021, decidiu “negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA, confirmando-se integralmente a decisão recorrida”.

  2. Inconformado, o arguido interpôs agora recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo concluído a motivação nos seguintes termos: «1º - Foi requerida a realização de audiência nos termos do artº 411º-5 do CPP, não existindo razão ou justificação alguma para que a mesma não tenha acontecido, muito menos o acórdão recorrido fundamentando essa mesma omissão, à face dos preceitos legais seriados na motivação que antecede; 2º - Cumpria dar seguimento ao processo nos termos legais e nesse sentido, o que não aconteceu, antes sendo o recurso julgado em conferência; 3º - Pelo que é patente a nulidade vertida no artº 119º-a) do CPP e por via do artº 122º o aresto é nulo, devendo o processo retroagir até ao momento em que se verifica a omissão prevista no artº 421º do CPP; 4 º - Apesar de requerida a renovação da prova, a mesma não foi judicialmente avaliada em termos de exame preliminar, para que existisse reclamação nos termos do artº 417º-8 do CPP, assim se extraindo do leque de direitos do arguido precisamente o de reclamar nesse âmbito, convocando argumentos e razões que pudessem infletir esse propósito; 5º - Trata-se da supressão de diligência processual com particular acuidade e que se repercute na esfera de Defesa dos direitos mais básicos do processo penal, pelo que deve essa mesma nulidade ser reconhecida ante a ausência e inexistência do ato judicial, para que o mesmo seja praticado, inclusivamente, com a fundamentação preconizada no artº 97º-5 do CPP, para que, a ser o caso, aconteça a reclamação consignada na lei; 6º - Condenou-se um inocente ao dar por provados os factos impugnados no recurso, através do princípio da livre apreciação da prova, tendo sido feito um entendimento incorreto do mesmo, o que colide com o princípio da culpa, com um processo justo e equitativo, um processo democrático por contraposição ao processo autocrático, decidido quanto à prova por via ampla e injustificada (com preferência pela prova indireta à prova direta), com tamanha latitude que ofende, por inconstitucional, o artº 32º-1, 20º-4 da CRP e 6º da CEDH.» O arguido requereu, ao abrigo do disposto no art. 411.º, n.º 5, do CPP, a realização de audiência.

  3. O recurso foi admitido por despacho de 14.05.2021.

  4. O Senhor Procurador-Geral Adjunto no Tribunal da Relação de Lisboa respondeu ao recurso interposto tendo considerado que: - «(...) No caso vertente, constata-se que o recorrente, propondo-se impugnar a matéria de facto, também não foi capaz de concretizar os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida e, sempre que os pontos tenham sido gravadas, deve referir-se o início e o termo da gravação de cada declaração, concretizando-se o excerto ou excertos do depoimento ou depoimentos em que se suporta essa impugnação. (...) Assim, no que tange à impugnação alargada da matéria de facto, com base na prova gravada – porque o incumprimento do ónus de especificação é comum à motivação e às conclusões – impõe-se a sua rejeição. (...)» - «O que tudo vale por dizer pois, em síntese conclusiva, que a conjugação de todos os elementos probatórios recolhidos, permitem inferências suficientemente seguras no sentido da matéria de facto dada como não provada, sendo que não vislumbramos, com o devido respeito pela posição do recorrente, qualquer contra-argumento suficientemente seguro que justificasse solução diferente daquela a que chegou o tribunal.

    Não se alcança por isso, qualquer dúvida razoável que seja susceptível de infirmar a convicção do tribunal “a quo”, formulada em conformidade com o disposto no artigo 127.º do Código Processo Penal, ao valorar, como valorou, a prova produzida em audiência, bem como a documental e pericial constantes dos autos, e mais concretamente o depoimento das testemunhas arroladas, tanto mais que estão bem expressas as razões que conduziram a essa valoração.

    E o certo é que a decisão impugnada, enunciando claramente os meios de prova que foram tidos em consideração, encontrando-se devidamente fundamentada, permitindo o controlo do processo lógico-dedutivo empreendido pelo Tribunal “ a quo” e a razão de ser da decisão tomada, não traduzindo, cremos, qualquer violação das regras que norteiam a actividade do julgador neste particular, correspondendo e contendo-se nos exactos limites do estruturante princípio da apreciação da prova: o da livre convicção do julgador.(....) Realce-se, por outro lado, que a transcrição da prova produzida em 1ª Instância também não permitiria a este Tribunal de Recurso, por si só, pôr em causa esse processo de formação da (livre) convicção do Tribunal “a quo”, que só a oralidade e imediação da prova verdadeiramente autorizam.(....) Resulta bem claro do texto da decisão recorrida que o tribunal não teve quaisquer dúvidas sobre os factos dados como provados e que o recorrente impugna e explicitou, de forma perfeitamente perceptível para quem o leia, as razões dessa firme convicção.» - « Na sequência do que vem a expor-se, o Acórdão recorrido fez um aturado exame crítico da prova e procedeu a uma correcta apreciação do material probatório coligido nos autos, dessecando os fundamentos da decisão recorrida, justificando as razões de ser da sua decisão relativa à matéria de facto num raciocínio lógico, coerente e estruturado, perfeitamente alcançável e entendível.

    Foi escrupulosamente cumprido o dever de fundamentação (artigos 97.º n.º 5 e 374.º n.º 2 do Código de Processo Penal e 205.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa) e foram devidamente salvaguardados os direitos e as garantias de defesa do arguido (artigo 32.º n.º 1 e n.º 2 da Constituição da República Portuguesa) pelo que a decisão recorrida não padece de vício relativamente às regras de valoração da prova.

    Mais concretamente: Tribunal a quo não procedeu a uma aplicação ilegal e inconstitucional do artigo 127.º do Código de Processo Penal por ter decidido de forma subjectiva e intimista, não atendendo a provas concretas para formar a sua convicção quanto ao elemento subjectivo.» - «Ora, em face dos pretensos vícios alegados pelo recorrente na sua motivação e fazendo-se uma simples incursão nos factos dados como provados e não provados no douto acórdão impugnado e conjugando-os com as regras da experiência comum, afigura-se-nos ser lícito concluir que, aqueles factos, não só são suficientes para sustentar uma decisão condenatória, como, em nosso entender, uma melhor apreciação de toda a prova e a respectiva valoração, sempre à luz do princípio da livre apreciação da prova pelo julgador e no estrito respeito das regras de direito reflectidas nas normas de experiência comum, outra não poderia ser a decisão.

    Deste modo, os invocados vícios de apreciação e valoração da prova e conexos com o texto da própria decisão impugnada, e nomeadamente de erro notório na apreciação da prova, de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de falta de fundamentação, não colhem suporte legal e, por conseguinte, não podem ser atendidos.» - «Fazendo uma incursão nos autos, verifica-se que o Recorrente apenas exarou no preâmbulo da motivação de Recurso – que não no requerimento de interposição do recurso – o propósito de requerer a realização de audiência “nos termos do artigo 411.º, n.º 5 do CPP, especificando-se debater os pontos seguintes da motivação: - o Tribunal recorrido julgou incorrectamente diversos pontos de facto, os quais serão identificados, indicando-se as provas concretas que impõem decisão diversa nesse segmento factual, como se indicarão as provas que devem ser renovadas, nos termos do art.º 412º-3 do CPP; - o Tribunal recorrido julgou incorrectamente a matéria de direito, errando na determinação das normas aplicadas nos termos do n.º 2 do mesmo preceito legal”. (...) No caso vertente, o recorrente, quer na motivação do recurso interposto, quer nas respectivas conclusões, não observou as formalidades impostas pelo artigo 412.º, nºs 3 e 4, por omissão, o que impossibilitou e inviabilizou o conhecimento do recurso da matéria de facto pela via ampla, mormente por via da requerida realização de audiência.

    Deste modo, a consequência da falta de indicação, no texto da motivação, dos eventuais erros cometidos pelo Tribunal a quo, com expressa discriminação das provas que os demonstram e com referência discriminada aos segmentos dos registos magnéticos das declarações produzidas em audiência, é a não apreciação dessa matéria pelo Tribunal superior, ou seja, o não conhecimento de eventuais erros que hajam sido cometidos, conforme jurisprudência constante e uniforme do S.T.J.(...) Em suma, fenecendo os pressupostos para ser designada validamente a audiência, o recurso foi julgado em conferência nos termos do nº 3 do artigo 419º do Código de Processo Penal.» - e concluiu: «Em consonância com o exposto, e tendo presente o que vem explicitado, a propósito da temática em análise, a fls 2277 a 2279, afigura-se-nos que o Acórdão impugnado não padece de alguma nulidade/irregularidade, por preterição de formalidades legais previstas nos artigos, suscitada pelo recorrente, por violação do disposto nos artigos 379º, 411.º, nº 5, 412.º nº 3, 419.º, nº 2, alínea c), 430.º e 431º, todos dos Código de Processo Penal.» 6.

    Uma vez subidos os autos, e pese embora o...

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