Acórdão nº 3070/18.1T8FAR.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Julho de 2021

Data14 Julho 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Processo n.º 3070/18.1T8FAR.E1. S1 (Revista excecional) - 4ª Secção Acordam na formação a que se refere o n.º 3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA intentou ação declarativa emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra Austin & Abbasi, Ld.ª, Enquita, ambos com os demais sinais identificadores nos autos, pedindo que seja reconhecido que procedeu à resolução do contrato de trabalho com justa causa e que a Ré seja condenada a pagar-lhe € 15.690,00, a título de indemnização pela cessação do contrato, € 1.308,00 a título de férias e subsídio de férias, € 390,20 a título de formação profissional não ministrada, € 586,76 a título de diferenças salariais e € 15.000,00 a título de indemnização por danos morais sofridos.

Para o efeito, alegou, em síntese, que o contrato de trabalho que vigorava entre as partes cessou por resolução com justa causa, por sua iniciativa, uma vez que a Ré assumiu para consigo diversos comportamentos discriminatórios, que identifica, que foram altamente lesivos dos seus direitos, por consubstanciarem manifesto assédio moral, e que tornaram impossível a manutenção da relação laboral.

  1. A Ré deduziu pedido reconvencional, no âmbito do qual peticionou a condenação do Autor a pagar-lhe a quantia de € 1.215,32, a título de compensação pela denúncia do contrato de trabalho, sem observância do aviso prévio devido.

  2. O valor da causa foi fixado em € 32.975,00.

  3. Realizada a audiência final, foi proferida sentença, que decidiu:

    1. Julgar o pedido principal parcialmente procedente e, em consequência, declarar que a Ré deve ao Autor € l.709,02, a título de férias não gozadas vencidas em janeiro de 2018 e subsídio de férias, proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal de 2018 e formação profissional não ministrada; B) Absolver a Ré do restante peticionado; C) Declarar que o Autor deve à Ré € 1.215,32, a título de indemnização por aviso prévio em falta; D) Operar a compensação de créditos e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor € 543,70, acrescido de juros à taxa legal contados desde a data da cessação do contrato (20.08.2018) até integral pagamento.

  4. O Autor interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação decidido julgar o recurso improcedente e, em consequência, confirmou a decisão recorrida.

  5. O Autor veio interpor recurso de revista excecional, invocando o disposto no art.º 672.º n.º 1 alíneas a) e b) do Código de Processo Civil, tendo formulado as seguintes conclusões: «A. O presente recurso excecional de revista vem interposto da decisão ínsita no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, que confirmou integralmente a decisão de primeira instância, em que se dá por não provada e inexistente a prática de assédio moral no trabalho perpetrada pela Recorrida, empregadora, ao ora Recorrente, trabalhador e Autor nos autos, e, em consequência, absolve aquela de tudo o peticionado por este último – excecionando-se os créditos laborais que peticionou pelo fim do vínculo laboral, a que foi condenada.

    1. Mais declarou, tal decisão, declarou ilícita a resolução por justa causa do contrato de trabalho que o Recorrente efetuou, tendo por fundamento o sobredito assédio.

    2. Nesta sequência, porque inconformado com o teor de tal aresto e ao abrigo do disposto nos artigos 672.º, n.º 1, alíneas a) e b) do Código de Processo Civil, interpõe o presente recurso excecional de revista, entendendo que, no caso que levou a juízo, existem questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, levarão, necessariamente, a uma melhor aplicação do direito e, bem assim, contendem com interesses de particular relevância social.

    3. Em primeiro lugar, entende o ora recorrente que a questão de saber se a conduta da Recorrida para consigo, durante a vigência do contrato de trabalho, se assume como uma conduta assediante, que tenha subsunção ao previsto no artigo 29.º do Código do Trabalho, é uma dessas questões cuja apreciação, pela relevância jurídica que assume, levará a uma melhor aplicação do direito.

    4. Justifica tal entendimento no facto de o conceito de assédio moral no trabalho ou mobbing se afigurar como um conceito novo no ordenamento jurídico interno e, para além disso, não apresentar, ainda, uma definição doutrinal e jurisprudencial unanimemente aceite, o que poderá contribuir para a tomada de decisões, nesta matéria, contraditórias e divergentes, o que urge acautelar.

    5. Com efeito, tal conceito de assédio ou mobbing, surgido no âmbito de ciências sociais como a Sociologia, Psicologia e Medicina, nos anos 70 do século passado, só foi transposto para as ciências jurídicas mais tarde e, inclusive, só foi alvo de concretização jurídica – e, em específico, legislativa - em Portugal, com o Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto. Cfr. CORREIA, Petra (2017). “Assédio Moral no Trabalho: Breve Análise do Conceito”, Dissertação de Mestrado em Ciências Jurídico-Forenses, Coimbra.

    6. Acresce que, a própria jurisprudência do douto tribunal a que ora se recorre reconhece a complexidade de tal conceito jurídico: “(…) Na verdade, um dos grandes obstáculos inerentes ao estudo do assédio laboral, prende-se com a dificuldade em encontrar uma definição unanimemente aceite.

      Por outro lado, sendo o assédio moral um fenómeno relacionado com a cultura, a forma como acontece e a maneira como é percebido varia, ou seja, não é um fenómeno igual em todos os países e nem em todos os locais.

      Este facto faz com que cada país utilize o seu próprio termo para identificar esta realidade, que é o assédio laboral, gerando-se uma confusão terminológica, o que dificulta o encontro de uma definição unanimemente aceite. (…)” – Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11/09/2019, Relator: Ferreira Pinto, Processo N.º: 8249/16.8T8PRT.P1. S1., disponível para consulta em www.dgsi.pt.

    7. Nesta medida, porque inconformado com a análise da factualidade dada como assente e como não provada operada pelo douto tribunal da Relação de Évora e considerando que esta é uma questão de indesmentível relevância jurídica, entende o Recorrente que urge remeter a sua apreciação aos Venerandos Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça.

      I. Isto porque andaram mal, salvo o devido respeito, o douto tribunal de primeira instância e, bem assim, o douto tribunal da Relação, ao concluírem pela inexistência de assédio moral perpetrado ao Recorrente e, em consequência, pela inexistência de resolução por justa causa do contrato de trabalho que mantinha com a Recorrida.

    8. Na verdade, entendeu o douto tribunal da Relação, de cuja decisão ora se recorre, confirmando integralmente a decisão de primeira instância, que: “(…) tudo ponderado, afigura-se-nos que a proibição de transportar o recorrente na carrinha, não pode, com a necessária segurança, ser qualificada como um comportamento discriminatório, com o intuito de ofender a dignidade do...

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