Acórdão nº 682/19.0T8GMR.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Julho de 2021

Data07 Julho 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Proc. 682/19.0T8GMR.G1.S1 6.ª Secção ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I - Relatório Banco Comercial Português, S.A.

, com sede no Porto, instaurou ação de reivindicação, sob a forma de processo comum, contra AA, com os sinais dos autos, pedindo que se: - a) Declare que o prédio identificado em 1.º é propriedade do A.; - b) Condene o R. a reconhecer ao A. o direito de propriedade sobre o bem imóvel em causa; - c) Condene o R. a restituir ao A. a parte do imóvel supra descrito que ilicitamente detém, entregando-o devoluto de pessoas e bens.

Alegou, em síntese, que o R. ocupa, contra a sua vontade, uma parcela de 143 m2 de um prédio de sua propriedade, pretendendo a sua restituição.

O R. contestou, alegando, em resumo, que, quando adquiriu o prédio contíguo ao do A., já aquela parcela se encontrava ocupada pela anterior proprietária.

Em sede de audiência prévia, foi o A. convidado a corrigir a PI com a alegação de factos conducentes à aquisição originária da parcela em causa.

Convite a que o A. acedeu, vindo alegar que a área em discussão nos autos está na posse dos anteriores donos do seu prédio (o descrito sob o nº. …..20), desde pelo menos 19 de Maio de 1999, sem oposição de ninguém, nomeadamente da irmã da anterior dona do prédio ….20º, a qual era dona do prédio contíguo (o …..51º), atualmente pertencente ao R.; o que o R. impugnou, alegando que a parcela reivindicada sempre teve ligação física ao prédio/casa que agora lhe pertence.

Foi proferido despacho saneador – que considerou a instância totalmente regular, estado em que se mantém – e enunciados o objeto do litígio e os temas da prova.

Instruído o processo e realizada a audiência de julgamento (no local do litígio), o Exmo. Juiz proferiu sentença, em que julgou a ação totalmente procedente e, em consequência: “a). declarou que o prédio e a parcela identificados de I.1 a I.4 são propriedade da Autora; b). condenou o R. AA a reconhecer referido direito de propriedade sobre os referidos prédio e parcela; c). condenou o R. AA a restituir ao Autor a parcela de 143 m2 referida em I.4, entregando-a devoluta de pessoas e bens”.

Inconformado com tal decisão, interpôs o R. recurso de apelação, tendo-se, por Acórdão da Relação …., proferido em 08/10/2020, negado provimento ao recurso, confirmando-se consequentemente a sentença recorrida.

Ainda inconformado, interpõe agora o R. o presente recurso de revista, visando a revogação do Acórdão da Relação e a sua substituição por decisão que, invertendo o decidido, julgue a ação totalmente improcedente.

Terminou a sua alegação com conclusões em que, inter alia, refere: (…) “93. Quanto aos requisitos formais para admissão da apelação, requer seja reconhecido o cumprimento dos mesmos - na medida em que era possível o fazer pelo recorrente - o que levará a reapreciação da matéria de fato incorretamente julgada, nos termos das conclusões da apelação e tudo conforme já fundamentado alhures.” (…)” O A. respondeu, sustentando, em síntese e no que aqui interessa, que o Acórdão recorrido não violou as normas processuais referidas pela recorrente, pelo que deve ser mantido nos seus precisos termos.

Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

* II – Fundamentação Como consta do despacho que admitiu a presente revista, esta, em termos de revista “normal”, só foi admitida quanto à questão, também suscitada na revista, da aplicação das normas de direito adjetivo relacionadas com a impugnação da decisão da matéria de facto, uma vez que, quanto ao mais, a situação de dupla conformidade que se verifica (cfr. 671.º/3 do CPC) obstou à admissibilidade da revista enquanto revista “normal” (razão pela qual, a propósito doutros segmentos do acórdão da Relação, se encontra interposta pelo R. “revista excecional” – tendo sido invocado para o efeito o preceituado no art. 672.º/1/a) e c) do CPC – cuja verificação dos pressupostos compete à “Formação” a que alude o art. 672.º/3 do CPC, para onde os autos serão, após o prolação do presente acórdão, remetidos).

Temos pois que o objeto do presente acórdão se circunscreve à apreciação do segmento do acórdão da Relação que, com fundamento em o R./apelante não haver cumprido devidamente os ónus impostos pelo art. 640.º do CPC, rejeitou a impugnação da decisão de facto.

Vejamos, então: Na sentença de 1.ª Instância, deu-se como provado e não provado o seguinte: “(…) I. Factos Provados: 1. O Autor adquiriu por compra e venda, em processo de insolvência, o prédio urbano sito em …., freguesia ….., concelho ….., descrito na Conservatória do Registo Predial desse concelho sob o n.º ….20. e inscrito na respetiva matriz 2. A aquisição desse prédio está registada a favor do Autor pela Ap…. de 2016/01/15.

3. O referido prédio tem, na realidade, uma área coberta de 252,45 m2 e descoberta de 531,55 m2.

4. Dessa área descoberta faz parte uma parcela de terreno com a área de 143 m2, visível na planta anexa com sombreado assinalado com Área = 143 m2 (cfr. documento de fls.7, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).

5. O Autor, por si e antecessores, está na detenção daquela parcela de 143 m2, agindo como se dono dela fosse, com conhecimento de toda a gente, desde há mais de vinte anos consecutivos.

6. E sem oposição de ninguém.

7. À revelia e sem a autorização do Autor, o Réu colocou uma “chapa de metal” no topo noroeste da referida área de 143 m2.

8. Passando a ocupar essa parcela de 143 m2 desde 27 de Novembro de 2017.

(…) 11. Em 1998, o prédio rústico nº …20, então de propriedade de BB, com área total de 2.510m², segundo contava na descrição predial, foi objeto de um destaque de 1.050m², dando origem ao prédio nº. ….51, onde em 1999, foi finalizada a construção de uma vivenda unifamiliar que, em 2017, veio a ser adquirida pelo réu.

12. Em 1999, o referido prédio descrito sob o nº. ….20 foi vendido à CC que, em 2005, construiu lá uma vivenda unifamiliar.

13. A então proprietária do prédio nº. ….20 era irmã da então proprietária do prédio nº. …...51 14. Na altura da sua compra, o Réu verificou que o terreno era inferior à metragem que constava na respetiva descrição predial.

15. A área total constante na descrição do imóvel e também na matriz, em 2005, não existia.

16. Na parcela referida em 4., há um portão de acesso ao terreno do Réu.

  1. Factos não provados: Não se provou que: 1.Quando o Réu comprou o prédio referido em I.10 foi-lhe apresentada toda a área de terreno que o compunha, inclusive a parcela de 143 m2, a qual possuía uma cerca com hastes de madeira, delimitada por fios de arame, em mau estado.

2. A área do terreno de propriedade do Autor era, na verdade de cerca de 400 m2, onde a área demarcada em vermelho no documento junto como nº. 7 a fls.36 verso corresponde ao terreno do Réu, a área em amarelo corresponde ao terreno do Autor e a marcação na cor verde indica onde efetivamente está a delimitação do terreno do Réu.

3. Na planta de implantação do referido prédio, o Réu verificou que o terreno, originalmente, era mais extenso para norte, justamente onde estava o prédio do Autor.

4. Foi feita uma sobreposição da planta do imóvel do prédio nº. … sobre a planta do imóvel do Réu, provavelmente para viabilizar a construção de uma casa de dimensões superiores a que seria permitida construir no terreno com as medidas verdadeiras, que já não seriam aqueles tais 1.400m² que constavam da descrição predial, mas apenas 400m², na realidade.

5. Os terrenos permaneceram sem uma definição precisa, in loco.

6. Até que, em Janeiro de 2016, foi feita uma delimitação dos terrenos, exatamente da forma que em 2017 o prédio foi vendido ao réu e que está representada no documento de fls.36 verso.

(…)” Ao que, no corpo da sua alegação recursiva, o R./apelante manifestou a seguinte discordância: “ (…) Do recurso quanto a matéria de facto: 17. O tribunal deu como provados, dentre outros, os seguintes fatos: Em I-3, que o prédio de propriedade do autor teria uma área coberta de 252,42m² e descoberta de 531,55m², fazendo parte dessa área (fatos provados I-4), a área de 143m² ocupada pelo réu.

Nos fatos provados 5, o juízo entendeu que o autor e seus antecessores estariam na posse da referida parcela de terreno “há mais de vinte anos consecutivos.” 18. Ora excelências, basta uma análise superficial dos documentos acostados aos autos para se verificar que o prédio de propriedade do autor foi construído apenas em 2005, sendo, portanto, impossível que em 2017, quando o réu delimitou a referida área definitivamente e passou a exercer posse inequívoca sobre ela, houvesse posse há mais de vinte anos por parte do autor ou de seus antecessores.

19. Ao contrário, pelo que depreende do depoimento das testemunhas CC e de sua irmã DD, (Lado A da fita Cassete), anteriores proprietárias dos prédios do autor e réu, respetivamente, apenas tempos depois da construção do prédio …, a parcela de terreno passou a ser ocupada pela então proprietária do prédio do autor, mas com autorização da proprietária, apenas para uso.

20. Vejam ilustres julgadores que sequer foi possível determinar quando tal a posse direta passou a ser exercida pela então proprietária do prédio do autor, sabendo-se apenas que foi muito depois de finais 2005, quando terminou a construção da casa no prédio ……, de propriedade do apelado.

21. Mister ressaltar que ambas as testemunhas confirmaram em seus depoimentos que depois de construída a casa pela Sra. CC (prédio 220), em razão de o prédio do réu ter um quintal muito maior, as irmãs acordaram que o pai das mesmas, que residia com a filha no prédio …., ficaria a cultivar a leira de cima, justamente objeto da presente lide.

22. Portanto, se pode...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT