Acórdão nº 01073/06.8BEBRG 01133/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução30 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.- Relatório A Fazenda Pública vem interpor recurso por oposição de acórdãos, ao abrigo do disposto no artigo 284º, n.º 1 do CPPT, na redacção anterior à Lei nº 119/2019, de 17 de Setembro, do Acórdão proferido nos presentes autos pelo TCA Norte, em 30/04/2019, considerando que perfilhou decisão oposta à tomada no Acórdão proferido também pelo TCAN, datado de 26 de Março de 2015 e exarado no processo nº 01044/11.2BEBRG (Acórdão fundamento).

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Fazenda Pública as seguintes conclusões: “a) Tendo, o acórdão recorrido (datado de 30 de abril de 2019, no processo n.º 1073/06.8BEBRG) e o acórdão fundamento (de 26 de março de 2015, proferido pelo TCAN no processo n.º 01044/11.2BEBRG), decidido em sentido oposto a mesma questão fundamental de direito com base situações fácticas idênticas, vem, a FP, pugnar pela aplicação, in casu, da solução jurídica adotada no acórdão fundamento, porquanto, b) se verifica a identidade de situações de facto, nos seus contornos essenciais, já que, em ambos os arestos (recorrido e fundamento), foram emitidas procurações a um terceiro, o procurador, ao qual foram conferidos poderes para exercer determinadas tarefas, nomeadamente de gestão e administração da sociedade, sempre com vista ao exercício do objeto social da mesma.

  1. Do mesmo modo, verifica-se também a identidade da questão de direito, uma vez que, em ambos os acórdãos, foi, em concreto, decidida a mesma questão de direito, ou seja, o efeito jurídico retirado da assinatura da mencionada procuração pelos revertidos, ora sócios gerentes, no exercício da gerência da sociedade, podendo esta ser considerada como válida para a concretização da prova da gerência de facto.

  2. No acórdão recorrido, o douto tribunal considerou que mesmo havendo a procuração a outorgar poderes de gerência, devemos sempre esclarecer qual a ligação concreta da gerente que outorgou procuração a favor de terceiro com a sociedade e a partir de aí concluir se nela radicava a gerência efectiva, que conferiu por procuração, ou nela não radicava tal gerência.

  3. A assinatura da procuração não é a prova da gerência nem daí lhe advém poderes de gerente de “facto” só por força, da prática de atos de gerência do terceiro procurador.

  4. Desta maneira, não obstante a outorga de procuração, concluiu que a oponente não pode ser responsabilizada subsidiariamente pelas dívidas exequendas g) sendo que, para o acórdão fundamento, através da aplicação do art.º 252.º do CSC (n.º 1: “A sociedade é administrada e representada por um ou mais gerentes, que podem ser escolhidos entre estranhos à sociedade e devem ser pessoas singulares e com capacidade jurídica plena.”; n.º 2: “Os gerentes são designados no contrato de sociedade ou eleitos posteriormente por deliberação dos sócios, se não estiver prevista no contrato outra forma de designação.”; n.º 4: “A gerência não é transmissível por acto entre vivos ou por morte, nem isolada, nem juntamente com a quota.”) o gerente designado no contrato da sociedade não pode transmitir a sua posição na empresa.

  5. A norma pretende que seja salvaguardado um “núcleo intocável” de poderes que não nunca poderiam ser delegados, sob pena de se perder a pessoalidade da gerência que passaria para mandatários ou procuradores que passavam a gerir a sociedade à margem da vontade dos gerentes.

  6. Não podendo o gerente designado desvincular-se da sociedade através da procuração.

  7. Sendo que para se desvincular por completo da responsabilidade perante clientes, fornecedores e terceiros que lidam com as sociedades, os sócios gerentes devem transmitir a sua quota e renunciar à gerência que tiver sido atribuída.

  8. Defende o acórdão fundamento que ao conferir estes poderes através de procuração, não podem deixar de manter a gerência de facto da sociedade, ainda que por via indireta do procurador.

  9. Face ao exposto, resulta evidente a identidade de situações de facto, bem como, resulta clara a divergência na solução dada à mesma questão fundamental de direito em ambos os acórdãos, pelo que, não pode deixar de se concluir que deve ser considerado que se verifica a oposição de acórdãos aqui invocada.

  10. Assim, sendo certo que o acórdão recorrido perfilha – perante igual entendimento fáctico e jurídico – entendimento contrário ao acórdão fundamento, tal entendimento [sufragado no acórdão recorrido] não pode prevalecer.

  11. Razão pela qual deverá o presente recurso proceder, com a consequente revogação do acórdão proferido pelo TCA Norte no processo n.º 1073/06.8BEBRG.

  12. Desta forma, deve ser proferido acórdão que decida a questão controvertida no sentido sustentado pela FP no presente recurso, ou seja, de acordo com o sentido decisório do acórdão fundamento.

Termos em que, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas deve ser dado provimento ao presente recurso, devendo ser proferido acórdão que decida no sentido preconizado no acórdão fundamento, assim se fazendo, por VOSSAS EXCELÊNCIAS, serena, sã e objetiva, JUSTIÇA.” Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de o presente recurso dever ser julgado findo, no parecer que se segue: “INTRODUÇÃO A Fazenda Pública vem interpor recurso, ao abrigo do disposto no artigo 284º, nº 1, do CPPT (redacção anterior à Lei nº119/2019, de 17 de Setembro), do douto Acórdão proferido pela Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), datado de 30 de Abril de 2019, por oposição com o douto Acórdão proferido também pelo TCAN, datado de 26 de Março de 2015, proferido no processo nº 01044/11.2BEBRG, disponível em www.dgsi.pt (cf. fls. 227 a 252, do SITAF) Cumpre-nos, pois, emitir parecer, o que faremos de imediato ADMISSIBILIDADE/ PROSSEGUIMENTO DO RECURSO O presente processo iniciou-se 4 de Agosto de 2006 pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro.

Assim, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do CPTA depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.

E que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido numerosas vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA para detectar a existência de uma contradição, quais sejam: -Identidade da questão de direito...

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