Acórdão nº 543/18.0 T8OLH-N.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 30 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS
Data da Resolução30 de Junho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 543/18.0 T8OLH-N.E1 I.

Relatório Inconformada com a decisão proferida no incidente de prestação de caução por si suscitado, que se pronunciou no sentido do seu indeferimento, a requerente Sociedade da (…), SA interpôs o presente recurso e, tendo desenvolvido nas alegações que apresentou as razões da sua discordância com o decidido, formulou a final as seguintes conclusões: “A.

O presente Recurso tem por objeto a sentença proferida no incidente de prestação de caução, a qual indeferiu, «por inadequação às circunstâncias do caso», a requerida substituição das providências cautelares de suspensão de deliberações sociais decretadas em sede recursiva (Apensos «C» e «E»), por caução.

B.

A decisão que julgou o incidente de prestação de caução, em análise, não procedeu ao correto enquadramento factual e jurídico das questões em equação e daí não extraiu as inerentes consequências decisórias.

C.

Face ao disposto no artigo 376.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, não existe qualquer obstáculo formal à substituição por caução nos vários procedimentos cautelares especificados, nomeadamente no procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais, devendo a sua possibilidade de admissão ser analisada casuisticamente.

D.

Em certas situações a caução terá efeitos preventivos e noutras situações efeitos reparadores, não tendo tais efeitos de ser cumulativos, dada a utilização do vocábulo «ou» no artigo 368.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

E.

Pelo que andou mal o Tribunal a quo ao mencionar que a caução deve ser adequada e suficiente para prevenir e para reparar integralmente o dano, cumulando tais efeitos e não os separando como deveria ter feito.

F.

A substituição das providências decretadas por caução a prestar pela Recorrente só é viável se a caução oferecida se mostrar adequada e suficiente para prevenir a lesão ou repará-la integralmente, conforme prescreve o artigo 368.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

G.

A avaliação da adequação da caução terá de ser feita pelo Tribunal atendendo às circunstâncias do procedimento cautelar em concreto, como a natureza do direito acautelado, o seu conteúdo patrimonial ou não patrimonial, as condições económicas das partes, a natureza das ações e a suscetibilidade de reparação dos eventuais danos causados.

H.

Assim, atendendo ao preceituado no artigo 368.º, n.º 3, do Código de Processo Civil cumpre perceber se a natureza dos interesses e direitos que se pretende salvaguardar com as providências cautelares impedem a sua substituição por caução.

I.

Estamos perante duas providências cautelares de suspensão de deliberações sociais, em que a primeira diz respeito à amortização das ações dos Recorridos e a segunda se subsume na execução da primeira, com a inerente redução do capital social.

J.

Ora, estando em causa a privação de ações, a natureza dos direitos e dos interesses é exclusivamente patrimonial! K.

Não poderia o Tribunal a quo ter entendido que tal natureza não é exclusivamente patrimonial, alegando erroneamente que existem direitos sociais – de participar na vida social da sociedade – que não se podem configurar como direitos patrimoniais.

L.

Como elucida o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/05/2005, disponível em www.dgsi.pt, «estando em causa participações sociais em sociedades de capitais, ou seja, em estruturas em que prevalece o interesse económico, a adequação da garantia oferecida não sofre dúvida, sendo, em relação a esse tipo ou espécie de sociedades, claramente de rejeitar a proposição de que os “direitos sociais inerentes a uma participação societária consubstanciam direitos ao desenvolvimento da personalidade”. Não mais consubstanciando que a detenção de um valor patrimonial, não se vê que a titularidade de ações envolva efetivamente valores humanos atendíveis. (…) No valor patrimonial das ações inclui-se o de todos os direitos que lhes são inerentes. É esse o caso tanto dos direitos patrimoniais, como dos direitos sociais ou administrativos, por igual reduzíveis a dinheiro. Daí que o valor do dano resultante da privação de ações seja, na realidade correspondente ao valor das mesmas.» (sublinhado e negrito nosso) M.

Uma ação é um bem patrimonial que congrega e unifica todos os direitos inerentes às participações sociais, sejam os direitos patrimoniais puros, que habilita o acionista ao direito de exigir uma prestação em dinheiro ou outros valores, como sucede com o direito aos lucros / dividendos, ao de preferência na aquisição de ações ou de obrigações convertíveis em ações, sejam os direitos administrativos, que habilita o acionista a intervir na vida social da sociedade, como acontece com o direito de voto, o direito à informação e o direito de impugnar deliberações sociais.

N.

Não se podendo, por isso, considerar que quaisquer uns desses direitos (direitos patrimoniais puros ou direitos administrativos) possam ser dissociados da participação social em si, dado que todos eles já são tomados em conta no valor da respetiva participação social.

O.

Consequentemente, os direitos administrativos não podem em momento algum ser considerados direitos de desenvolvimento da personalidade, pois a titularidade de participações sociais de cariz totalmente patrimonial não pode integrar direitos inerentes à proteção da dignidade da pessoa humana, que, por regra, são direitos indisponíveis.

P. Assim, estando em causa a privação do exercício, por parte dos Recorridos, dos seus direitos societários, em que tal privação emerge de forma direta da deliberação de amortização das suas participações sociais (Apenso «E») e da deliberação que executa a redução do capital social em virtude dessa amortização (Apenso «C»), verifica-se que os direitos e os interesses em questão são exclusivamente patrimoniais!!! Q.

Verificando-se que a natureza dos direitos e dos interesses das providências cautelares (Apensos «C» e «E») é exclusivamente de cariz patrimonial, verifica-se a total adequação da caução.

R.

Se estiver em causa apenas a salvaguarda de interesses...

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