Acórdão nº 431/19.2T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Julho de 2021
Magistrado Responsável | ALDA MARTINS |
Data da Resolução | 01 de Julho de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
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Relatório L. M.
, patrocinada pelo Ministério Público, intentou acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, contra X, Companhia de Seguros, S.A.
, alegando, em síntese, que em 10/01/2019 foi vítima dum acidente ao serviço de CENTRO SOCIAL E PAROQUIAL DE ...
, enquanto ajudante de acção directa, quando, ao descer as escadas exteriores da sua residência, para se deslocar para o seu posto de trabalho, escorregou e caiu, sofrendo lesões que lhe determinaram incapacidades temporária e permanente.
Conclui, pedindo a condenação da seguradora no pagamento das indemnizações decorrentes da caracterização deste acidente como sendo de trabalho.
A seguradora veio apresentar contestação, pedindo a sua absolvição do pedido, alegando, em síntese, que na data e hora do acidente a sinistrada encontrava-se ainda no logradouro da sua residência, pelo que o mesmo não deverá ser caracterizado como sendo de trabalho, recaindo o risco sobre a sinistrada.
Ordenada a intervenção processual do empregador, este veio contestar, arguindo a sua ilegitimidade, em virtude de à data do sinistro vigorar contrato de seguro celebrado com a co-R. seguradora, mediante o qual havia transferido para esta a sua responsabilidade por acidentes de trabalho que a A. sofresse ao seu serviço, como sucedeu no caso dos autos.
Tendo os autos prosseguido, foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Tudo visto e nos termos expostos, julga-se a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência, absolve-se o R. CENTRO SOCIAL E PAROQUIAL DE ... dos pedidos formulados pela A. e condena-se a aqui demandada seguradora X, Companhia de Seguros, S.A. a pagar à mesma demandante a título de indemnização devida pelo período de ITA (de 162 dias – de 11/01/2019 a 21/06/2019) a quantia de € 3.131,08 (três mil cento e trinta e um euros e oito cêntimos), e a pensão anual e vitalícia de € 211,64 (duzentos e onze euros e sessenta e quatro cêntimos), acrescidas ambas as quantias dos respectivos juros de mora vencidos nos termos do art. 135º do C.P.T., desde o dia seguinte ao da alta clínica – 22/06/2019.
Mais se condena a demandada seguradora a pagar à A. a quantia de € 25,00 (vinte e cinco euros), acrescida igualmente dos respectivos juros de mora, vencidos à taxa legal desde o auto de não conciliação de fls. 84 – 08/07/2020.
Custas pela R. seguradora.
Fixa-se à acção o valor de € 5.899,78 – cfr. art. 120º do C.P.T.» A R. seguradora interpôs recurso da sentença e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: «I. O cerne da questão de direito ora em discussão situa-se em saber se o sinistro em apreço integra o conceito de acidente de trabalho in itinere, de acordo com o disposto nos artigos 8º e 9º da Lei 98/2009, de 4 de Setembro.
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Resultou da factualidade dada como provada que a queda em apreço nestes autos - causadora das lesões na sinistrada eventualmente carecidas de ressarcimento pela ré – ocorreu nas escadas, mais especificamente no terceiro degrau após a porta da habitação da autora, de acesso ao logradouro pertencente à moradia onde a mesma habitava, espaço esse necessariamente privado e afecto à residência da autora, aqui apelada, e atenta a sua natureza, sob o âmbito de domínio e controlo da própria sinistrada, relativamente ao qual não se verifica o risco de autoridade do empregador.
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Sendo certo que, para o preenchimento do conceito de acidente de trabalho in itinere, segundo as referidas disposições legais, não pode deixar-se de considerar que a responsabilidade por acidentes de percurso não abrange situações em que o trabalhador se encontra num espaço por ele controlado, em particular na sua vida privada.
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Os acidentes ocorridos na residência do trabalhador não encontram tutela neste regime por se situarem numa esfera de risco do próprio trabalhador, num espaço por este controlado e a cujos perigos sempre se exporia, mesmo sem trabalho.
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Assim sendo, como resulta de tudo o exposto, qualquer acidente ocorrido dentro de espaço privado do trabalhador e pelo mesmo controlado não pode ser considerado, nos termos da Lei nº 98/2009, de 04 de Setembro, como de trabalho.
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Não podendo ser a apelante responsabilizada, nessa medida, pela reparação do mesmo.
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Não se poderá, como tal, concluir, de direito, como o fez o tribunal a quo, que a apelada sofreu um acidente de trabalho, nos termos do disposto no artigo 8º, nº 1 e 9º, nº 1 e nº 2, ambos da Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro, atenta a falta de verificação dos pressupostos legais para o efeito, pelo que, aplicou o tribunal a quo, salvo o devido respeito, erradamente as citadas normas, devendo, nessa medida, alterar-se, em conformidade, a sentença recorrida, absolvendo-se a recorrente do pedido formulado pela recorrida.» A A. apresentou resposta ao recurso da R. seguradora, pugnando pela sua improcedência.
O recurso foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo.
Vistos os autos pelas Exmas. Adjuntas, cumpre decidir.
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Objecto do recurso Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, a única questão que se coloca a este tribunal é a de saber se o acidente que a A. sofreu deve ser caracterizado como sendo de trabalho, na modalidade de in itinere.
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Fundamentação de facto Os factos provados são os seguintes: 1. Em Janeiro de 2019, a A. prestava actividade de ajudante de acção directa sob as ordens, direcção e fiscalização da sua entidade empregadora Centro Social Paroquial de ..., com sede em ....
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À data do acidente em apreço nestes autos, a A. auferia a remuneração anual de € 10.078,00.
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Na mesma data, a entidade empregadora tinha transferido a totalidade da sua responsabilidade infortunística para a R. seguradora pelo contrato de seguro titulado pela apólice n.º 0012-……….2.
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A R. seguradora não pagou à A...
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