Acórdão nº 00724/18.6BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução18 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* I Relatório C.

, intentou Ação Administrativa contra o Estado Português, tendente à condenação deste a pagar-lhe a quantia de €11.758,16, a título de danos patrimoniais, e a quantia de €7.000, a título de danos não patrimoniais, no montante total de € 18.758,16, no seguimento de vicissitudes verificadas no âmbito do concurso a que se candidatou para a categoria de Técnico Especializado de Serviço Social, aberto pela Escola Secundária com 3.º Ciclo do Ensino Básico Dr. (...), inconformado com a Sentença proferida em 14 de novembro de 2020, que julgou a Ação improcedente e, em consequência, absolveu o Réu do pedido, veio em 4 de janeiro de 2021, interpor recurso jurisdicional da referida decisão, tendo formulado as seguintes conclusões: “1. A sentença recorrida baseia-se numa errada conceção dos efeitos jurídico-práticos decorrentes da anulação da decisão administrativa proferida no recurso hierárquico, que foi decretada na ação administrativa do Processo n.º 689/14.3BECBR; 2. A sentença recorrida esquece que o ato administrativo primário, traduzido na decisão de homologação da lista final dos candidatos no procedimento de candidatura, constitui a base jurídica considerada imediatamente eficaz para que tivesse sido celebrado o contrato com a candidata, erradamente classificada antes da recorrente, sendo que a decisão de contratar constitui uma mera decisão consequente da decisão de homologação da lista final de candidatos.

  1. Ora o ato primário prolatado pelo Diretor da Escola, referido no ponto 4 do probatório, e o ato consequente mencionado no ponto 5 do mesmo probatório, são atos administrativos constitutivos de direitos que inscrevem na ordem jurídica efeitos jurídico-práticos que, nela, não existiam antes de eles serem praticados.

  2. A decisão administrativa prolatada no recurso hierárquico, enquanto ato administrativo hierárquico, de segundo grau, tem o efeito jurídico primário de substituir, no plano do poder jurídico-constitucional da Administração (cfr. art.ºs 110.º, n.º 1 e 111.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, CRP), os efeitos jurídicos atribuídos ao ato primário, antes inscritos na Ordem jurídica pelos atos referidos nos pontos 4 e 5 do probatório, pelos efeitos jurídicos da graduação em primeiro lugar da ora recorrente, na lista final do procedimento de candidatura concursal de contratação e, com base neles, na decisão da sua contratação, nos termos constantes dos n.º 10 e 13 do probatório.

  3. A revogação administrativa, decorrente da decisão do recurso hierárquico, substitui a decisão de homologação antes feita e a contratação efetuada com base nela, pelo que a decisão do recurso hierárquico projeta os seus efeitos constitutivos desde o início do ato administrativo revogado, tendo este ato desaparecido da Ordem Jurídica e passando a constar dela, até à decisão proferida na referida ação administrativa especial, os efeitos constituídos pela decisão do recurso hierárquico.

  4. Deste modo, os efeitos constitutivos e conformativos da decisão do recurso hierárquico de substituição dos efeitos antes constituídos pelo ato primário operam desde a prática do ato revogado, pelo que a graduação e contratação da ora recorrente deve ser imputada relativamente a esse momento e até ao momento da anulação jurisdicional efetuada pela sentença no Proc. n.º 689/14.3BECBR.

  5. A decisão jurisdicional, que anulou a decisão administrativa de provimento do recurso hierárquico, apenas produz efeitos laborais ex tunc e não ex nunc: tal limitação dos efeitos anulatórios decorre de o vício assacado ao ato de provimento do recurso hierárquico apenas ser gerador de anulabilidade e não da nulidade e ter por fundamento apenas vícios formais, e não vícios materiais.

  6. Sendo assim, verifica-se que a ora recorrente tinha o direito de ser contratada e trabalhar e de ser paga do respetivo salário desde o momento em que foi celebrado o contrato com a concorrente A. até ao termo certo do seu contrato de trabalho, que se consumou antes da sentença proferida no Proc. 689/14.3BECBR.

  7. O não exercício da prestação do trabalho por todo o período do contrato a termo resolutivo certo por parte da A., por detrimento dos efeitos constituídos pelo ato administrativo primário que favoreceram, “de facto”, a outra concorrente, provocou à ora recorrente os danos patrimoniais e não patrimoniais alegados na sua petição.

    Termos em que, sempre contando com o douto suprimento de V.ªs Excelências, deve ser dado provimento ao recurso, assim se fazendo a devida JUSTIÇA!” O aqui Recorrido/Estado Português, representado pelo Ministério Público veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 2 de fevereiro de 2021, no qual concluiu: “1ª No caso em apreço, a questão fundamental a decidir respeita a saber se a A. Tem direito a ser indemnizada, pelo R./Estado Português, quanto aos danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos na sequência das ilegalidades verificadas no procedimento de contratação de escola para Técnico Especializado de Serviço Social, aberto pela Escola Secundária Dr. (...) para o ano letivo de 2013/2014, reconhecidas com a decisão do recurso hierárquico proferida, em maio de 2014, pelo Diretor-Geral dos Estabelecimentos Escolares, que deu provimento ao aludido recurso, e com a subsequente contratação da A., apenas nesta data, para o cargo de Técnica Especializada na Escola Secundária Dr. (...)”.

    1. - Ou dito de outra forma, nos presentes autos, está em causa o pedido de uma compensação pecuniária, tendente à reparação de alegados danos - ou seja, o pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, fundada na responsabilidade civil extracontratual do Estado, pedindo-se uma compensação pecuniária nos termos e para os efeitos da primeira parte do nº2 do art.º 11º do CPTA. Pretensão na alegada responsabilidade civil extracontratual do Estado, previsto na Lei n° 67/2007 de 31 de dezembro.

    2. - Ora, a Autora, vem fundamentar a sua pretensão, ou seja, o seu pedido de indemnização, pelo facto de ter sido concedido provimento ao seu recurso hierárquico, sendo que, em virtude desse facto, deveria ter sido ela a ficar posicionada em primeiro lugar e a ter celebrado contrato de trabalho logo no mês de outubro de 2013, e não só em maio de 2014, como sucedeu.

    3. - Significa o exposto, que a Autora baseia o seu pedido, ou seja, o seu direito a uma indemnização, no ato que concedeu provimento ao recurso hierárquico por si interposto, cuja apreciação de legalidade foi submetida a escrutínio judicial.

    4. - Ou seja, o ato, - no qual a Autora fundamenta a pretensão deduzida nos presentes autos, e, pese embora o facto de o tribunal lhe ter dado razão naquele processo - não se encontra ainda consolidado na ordem jurídica, pois em resultado da sentença que anulou os atos em causa, numa fase executiva da mesma decerto haverá a prolação de novos atos administrativos que conduzirão à abertura de novos prazos de impugnação (quer administrativa, quer contenciosa) inerente ao procedimento administrativo.

    5. - Considerando a hipótese, de anulação do ato em causa pelo tribunal, o que veio a acontecer, significa, além do demais, que a contratação da ora Autora nunca deveria ter ocorrido, pelo que, tudo quanto aduzido nos presentes autos, padece de imediato, já que naquele concurso deveria ter ficado em primeiro lugar a Autora que deu azo à ação com o n° 689/14.3BERBR, A. , acima referida, pelo que nenhum prejuízo suportou a ora Autora C., sendo tal pedido de indeminização extemporâneo, pela inexistência de ato, que veio a ser anulado por decisão judicial.

    6. - Diga-se ainda, que quanto à existência do direito à indemnização reclamado pela Autora, este dependerá sempre da verificação dos requisitos legais de que depende a existência da responsabilidade extra ou contratual do Estado por facto ilícito, nos termos da Lei n° 67/2007 de 31 de dezembro, sendo que, nos termos do preceituado no n° 1 do artigo 342° do Código Civil, "Àquele que invocar um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado".

    7. - Com efeito, nos termos do n° 1 do artigo 7° da Lei n° 67/2007 de 31 de dezembro, «O Estado e as demais pessoas coletivas de direito público são exclusivamente responsáveis pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas, cometidas com culpa leve, pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício».

    8. - E, como bem é referido na sentença recorrida os pressupostos da verificação de responsabilidade civil de acordo com o preceito legal em apreço são o facto voluntário, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante (ou seja, a culpa, a qual é apreciada nos termos do art.° 487 do CC), o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, bastando a falta de um deles para que não haja obrigação de indemnizar.

    9. - Ora, a responsabilidade emergente de danos causados no exercício da função administrativa envolve assim, um juízo de censura sobre o comportamento do causador do prejuízo que, podendo e devendo ter optado por outra conduta, escolheu aquela que era censurável e potencialmente danosa, pelo que a responsabilização assenta fundamentalmente nas ideias de ilicitude e de culpa.

      A ilicitude consiste numa ação ou omissão violadora: - de princípios e regras constitucionais, legais ou regulamentares; - de regras técnicas; - de deveres objetivos de cuidado;  ou resultante do funcionamento anormal do serviço.

      Sendo que, dessa ação ou omissão há de ter resultado a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos de alguém.

    10. - Por outro lado, a culpa decorre de um comportamento adotado com diligência ou aptidão inferiores àquelas que fosse razoável exigir, no caso, a um titular de órgão administrativo, funcionário ou agente zeloso e cumpridor, com base nos princípios e regras jurídicas relevantes.

    11. - Sendo certo, que todo a...

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