Acórdão nº 1162/16.0BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelLURDES TOSCANO
Data da Resolução09 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO M….., Lda, melhor identificada nos autos, deduziu IMPUGNAÇÃO Judicial contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), relativa ao ano de 2013, no montante de € 343.449,17.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por decisão de 11 de Fevereiro de 2019, julgou procedente a impugnação.

Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões: «A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial interposta por M….., LDA., com o NIF ….., contra o despacho de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação oficiosa de IRC e de juros compensatórios, referente ao exercício de 2013, no valor total de € 343.449,17.

B. O Tribunal a quo determinou a anulação do actos de liquidação de IRC de 2013,baseado no entendimento de que “…a impugnante, no ano de 2013, não exerceu qualquer actividade lucrativa, tendo sido declarada insolvente e estando a decorrer o processo com vista à sua liquidação e encerramento. Não estando a sua actividade cessada, a impugnante teria de submeter a declaração modelo 22 de IRC, relativa ao exercício. O incumprimento deste dever declarativo, muito embora justifique a aplicação do disposto no art.º 90.º do CIRC, não permite manter uma liquidação oficiosa, na qual se apure imposto a pagar, quando, comprovadamente, a impugnante não desenvolveu qualquer actividade lucrativa no referido exercício.” C. Não pode a Fazenda Pública, e com o devido respeito, conformar-se com a douta sentença, aqui recorrida, face ao entendimento de que a mesma procede a um desacertado julgamento da matéria de facto, incorrendo em consequente erro de julgamento de direito, com violação do disposto nos artigos 79.º e 90.º do CIRC e 74.º da LGT.

D. A recorrida foi declarada insolvente por sentença proferida, em 2010/12/29, no âmbito do processo nº ….., que correu termos no 1º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa, foi nomeada a administradora de insolvência, mas não foi apresentada a registo a dissolução e o encerramento da liquidação daquela sociedade.

E. A recorrida, foi considerada faltosa em sede de IRC relativamente ao exercício de 2013, uma vez que não apresentou a declaração Modelo 22, nos termos e prazos estabelecidos nos artigos 117.º n.º 1, al.b) e 120.º, ambos do CIRC, razão pela qual a AT submeteu, em 2014/11/30, a declaração oficiosa de rendimentos validada com o nº ….., que determinou a emissão, para aquele exercício, da liquidação de IRC nº ….., que apurou imposto a pagar no montante de € 343.449,17.

F. Inconformada com a liquidação oficiosa de IRC, referente ao exercício de 2013, a Impugnante apresentou, em 2015/07/22, reclamação graciosa que foi instruída sob o processo nº …...

G. Posteriormente, em 2015/11/04, foi submetida uma declaração de rendimentos Modelo 22, (nº …..), relativa ao exercício de 2013, onde foi declarado um prejuízo fiscal de € 80.831,67 e uma matéria colectável nula, sendo, também nulo o montante do imposto apurado, declaração que não foi liquidada face à existência de liquidação oficiosa já liquidada.

H. Assim, a questão a deslindar no caso sub judice, e que terá implicações ao nível da legalidade ou ilegalidade da liquidação de IRC impugnada, consiste, em saber se uma sociedade dissolvida, na sequência de processo de insolvência, continua ou não a existir enquanto sujeito passivo de IRC, até à data do encerramento da liquidação, mantendo-se, assim, vinculada a obrigações fiscais, nomeadamente declarativas.

I. Compulsadas as normas contidas no Código das Sociedades Comerciais (CSC), podem ser várias as causas de dissolução das sociedades, porém, qualquer que seja a causa de dissolução, ela acarreta uma fase de liquidação do património societário conducente à extinção da sociedade, pois, como decorre do disposto no art.º 160º, nº 2, do CSC, a sociedade só é considerada extinta após o registo do encerramento da liquidação, mantendo até lá a personalidade jurídica, sendo sujeito de direitos e obrigações, a quem continua a ser aplicável, embora com as necessárias adaptações e em tudo que não for incompatível com o regime processual de liquidação, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas (cfr. art.º 146º do CSC).

J. Este tem sido o entendimento unânime da jurisprudência dos Tribunais Superiores e encontra- se vertido, nos Acórdãos supra citados, Acórdão do STA, de 24/02/2011, proferido no recurso nº 01145/09; Acórdão do STA de 24/09/2008, recurso nº 0199/08; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 02/07/1996, recurso nº 423/96 e Acórdão do STJ de 12/10/2006, processo nº 06P2930.

K. Por conseguinte, em termos fiscais e designadamente para a aplicação dos mecanismos estruturais do IRC, o que é decisivo é a cessação de actividade, a qual só ocorre nas situações, expressamente, previstas no aludido nº 5, do art.º 8º do CIRC, ou seja, na data do encerramento da liquidação.

L. Isto é, inexistindo qualquer excepção prevista na lei, todas as sociedades dissolvidas, qualquer que seja a causa da dissolução, mantêm as obrigações fiscais e obrigações declarativas, sendo a sua responsabilidade do liquidatário ou do administrador da insolvência, conforme expressamente referido pelo nº 10, do art.º 117º do CIRC.

M. As sociedades em fase de liquidação mantêm a personalidade jurídica, ainda que exista a liquidação do património societário no sentido da extinção da sociedade, sendo que nos termos do nº 2 do art.º 160º do CSC, a sociedade só se considera extinta após o registo do encerramento da liquidação e até lá mantém a personalidade jurídica e continuam a ser-lhes aplicáveis, com as necessárias adaptações as disposições que regem as sociedades não dissolvidas.

N. O processo de insolvência não afasta a necessidade de as sociedades que vierem a ser declaradas insolventes possuírem contabilidade organizada, que deverá reflectir todas as operações com relevo contabilístico, e que será a base das declarações fiscais a apresentar.

O. Considerou o Tribunal a quo que a impugnante ao ter apresentado “a sua declaração de rendimentos para além do prazo legal” e aí ter declarado “uma matéria tributável nula, esta declaração ainda que não gozasse da presunção de veracidade consagrada no art.º 75.º da LGT, impunha que a AT realizasse as diligências necessárias ao correcto apuramento da matéria. Não o tendo feito, a AT violou o principio da tributação pelo rendimento real (art.º 104, n.º 2 da CRP)”.

P. Não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, porquanto considera que da prova produzida não é de extrair a conclusão que serviu de base à decisão proferida, padecendo a mesma de erro na análise da matéria de facto e na aplicação do direito.

Vejamos, Q. Refere o art. 16.º, n.º 1 do CIRC, que a matéria tributável é, em regra, determinada com base em declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu controlo pela Administração Fiscal, e o n º 2 daquele artigo que, na falta de declaração, compete à Autoridade Tributária e Aduaneira, quando for caso disso, a determinação da matéria colectável.

R. A competência atribuída pelo n.º 2 do art. 16.º, nos casos em que se aplica, é confirmada pela al. b) do art. 89.º que prevê que, quando a liquidação não seja efectuada pelo próprio contribuinte, na declaração periódica de rendimentos, a liquidação é efectuada pela Autoridade tributária e aduaneira.

S. In casu, considerando a falta da declaração periódica de rendimentos, a AT, ao abrigo do art. 90º, nº 1, al. b), do CIRC, teve por base a totalidade da matéria colectável, (€ 1.270.553,95), do exercício mais próximo que se encontrava determinada, que in casu foi o exercício de 2012, na sequência de procedimento de inspecção tributária realizado a coberto da ordem de serviço nº …...

T. Como é sabido e é doutrina e jurisprudência aceites, o sistema fiscal português consagra a declaração do contribuinte como método regra de apuramento dos rendimentos tributáveis - art. 75º da LGT, na medida em que ali se estabelece a presunção legal de que a escrita/contabilidade dos contribuintes correspondia à verdade dos factos, se organizada segundo a lei comercial ou fiscal.

U. Desenvolvendo este princípio, os n.ºs 1 e 2 do art. 59º do CPPT estabelecem que “o procedimento de liquidação instaura-se com as declarações dos contribuintes ou, na falta ou vício destas, com base em todos os elementos de que disponha ou venha a obter a entidade competente”, e que ”o apuramento da matéria tributável far-se-á com base nas declarações dos contribuintes, desde que estes as apresentem nos termos previstos na lei e forneçam à administração tributária os elementos indispensáveis à verificação da sua situação tributária” negrito nosso.

V. Assim, não tendo sido apresentada nos termos da lei a declaração com base na qual far-se-ia o...

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