Acórdão nº 03086/18.8BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Junho de 2021
Magistrado Responsável | Lu |
Data da Resolução | 02 de Junho de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:* A.
(Praça (…)), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, que julgou improcedente acção administrativa intentada contra o Fundo de Garantia Salarial (Av.ª (…)).
Remata o seu recurso com seguintes conclusões: 1. O Recorrente pediu na ação e aqui reitera a declaração de nulidade do despacho do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, proferido em 01/08/2018, que indeferiu o seu requerimento de pagamento de créditos salariais, bem como a condenação a praticar o ato administrativo para tal pagamento.
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Já na petição inicial foi invocada a inconstitucionalidade da interpretação da norma do n.º 8 do artigo 2.º do NRFGS com a interpretação que acabou por ser partilhada na sentença.
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Está em causa na pressente ação a licitude ou não do referido despacho proferido pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial.
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O único fundamento do indeferimento de tal despacho é o de que o requerimento não foi apresentado no prazo de um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, com base no art. 2/8 DL 59/2015, de 21.04.
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Os créditos laborais do Autor não prescreveram.
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A sentença reconhece que o Tribunal Constitucional já julgou inconstitucional a norma contida no n. 8 do art. 2º do citado DL 59/2015, na interpretação, “segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão” e invoca outras decisões jurisprudenciais no mesmo sentido.
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Porém, a sentença defende erradamente que, no presente caso, não foi o próprio processo judicial de insolvência que constituiu a causa da preclusão do direito do Autor a acionar o Fundo de Garantia Salarial, declarando que bastaria a simples reclamação de créditos laborais no processo de insolvência para justificar e instruir o exercício de tal direito.
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E uma vez que o ora Recorrente não exerceu esse direito no prazo de um ano após essa reclamação de créditos na insolvência, entendeu (mal) a sentença que tinha caducado há muito esse direito.
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Com o devido respeito, a sentença não fez a correta interpretação das normas legais citadas e da realidade factual dada como assente.
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Aquele entendimento da sentença é errado porque, além do mais, ao contrário do perfilhado, é condição sine qua non que tenha havido a declaração da insolvência (ou então a declaração de “situação económica difícil”) do empregador para que o trabalhador possa recorrer ao Fundo de Garantia Salarial.
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É o que está prescrito, com toda a clareza, no art. 336 do Código do Trabalho e também no citado DL 59/2015, no art. 1º, n. 1.
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A declaração de insolvência constitui um pressuposto necessário para que o trabalhador possa recorrer ao Fundo de Garantia Salarial e, neste sentido, o direito do trabalhador face ao recorrido Fundo de Garantia Salarial emerge da declaração da insolvência, sendo certo que, aquele pressuposto não é suficiente.
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Ao contrário do que também defende a sentença, não basta a simples reclamação de créditos no processo de insolvência para, com essa reclamação, se instruir o requerimento junto do Fundo de Garantia Salarial.
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Tal não faria qualquer sentido, desde logo porque poderia suceder que o reclamante não tivesse o direito aos créditos laborais reclamados na insolvência, sendo ainda indispensável que os créditos sejam devidos, que sejam reconhecidos e que o administrador da insolvência emita a correspondente declaração, como resulta, além do mais, do art. 336 do Código do Trabalho e das normas do DL 59/2015.
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O art. 5º, nº 2, alínea a) do DL 59/2015, impõe que o requerimento ao Fundo de Garantia Salarial tem de ser apresentado com a declaração ou cópia autenticada de documento comprovativo dos créditos reclamados, emitida pelo Administrador de Insolvência ou pelo Administrador Judicial Provisório.
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O Tribunal recorrido aparentemente fez equivaler aquela expressão “documento comprovativo dos créditos reclamados” à expressão “documento comprovativo de apresentação de reclamação de créditos”, que são coisas completamente diferentes: uma coisa é um documento comprovativo dos créditos, outra, bem diferente, é um documento comprovativo da reclamação dos créditos.
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O trabalhador para ver deferido o seu pedido ao Fundo de Garantia Salarial tem de ter a declaração do reconhecimento dos créditos pela empresa ou pelo Administrador da Insolvência ou Administrador Judicial.
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Nos presentes autos, resultou provado que os créditos reclamados na insolvência não foram reconhecidos, a não ser por força da decisão judicial proferida no processo de insolvência em 06.02.2018.
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Essa decisão judicial de 06.02.3018 não mereceu qualquer impugnação pelo Fundo de Garantia Salarial ou por qualquer outrem e, por isso, transitou em julgado.
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Essa decisão judicial declara inequivocamente que só nessa data de 06.02.2018 foi possível reconhecer os créditos laborais reclamados e determina que, para os devidos efeitos de compensação junto do Fundo de Garantia Salarial, deve a Sra. Administradora de Insolvência, proceder à entrega ao trabalhador do documento necessário para que o mesmo possa requerer o valor a que tem direito.
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A sentença ora impugnada ofende aquela outra decisão judicial transitada em julgado.
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Acresce que o Fundo de Garantia Salarial não suscitou qualquer dúvida sobre a matéria no Tribunal a quo e, por isso, o ora Recorrente não teve necessidade nem lhe foi dada oportunidade de produzir qualquer prova adicional para demonstrar que esteve realmente impedido de exercer o direito junto do Fundo de Garantia Salarial.
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Foi apenas na sequência daquela decisão proferida no Tribunal de Comércio em 06.02.2018, que a Administradora de Insolvência, cumprindo-a, emitiu e enviou ao ora Recorrente o tão esperado documento do Modelo GS 1/2015-DGSS e a declaração complementar, que o Recorrente recebeu em 22.02.2018.
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Alguns dias depois (em 01.03.2018), o Recorrente entregou no Instituto de Segurança Social o requerimento dos créditos laborais a que tinha direito.
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O trabalhador exerceu o direito de requerer o pagamento de salários ao Fundo de Garantia Salarial escassos dias após estarem verificadas as condições do exercício de tal direito, não perdendo tempo nenhum a recorrer aos Tribunais e o longo tempo decorrido até poder apresentar o requerimento no Fundo de Garantia Salarial deveu-se tão só à enorme morosidade da justiça, não lhe podendo ser imputada qualquer responsabilidade pelo tempo decorrido desde o despedimento até à apresentação do pedido ao Fundo de Garantia Salarial.
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Julgar improcedente a pressente ação, seria aplicar ao ora Recorrente nova sanção adicional àquela que já cumpriu dolorosamente, na longa espera e no não recebimento atempado dos créditos laborais, no momento em que tanta falta lhe fazia.
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Não pode agora a Justiça agravar essa penosidade que o ora Recorrente sofreu, contrariado.
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Como a jurisprudência já vem entendendo em casos semelhantes, só a partir daquela data de 22.02.2018 começou a contar o prazo de um ano previsto na norma do n. 8 do art. 2º, do DL 59/2015.
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Interpretando-se de modo diferente as normas legais aplicáveis ao presente caso, representaria clara ofensa às citadas normas dos artigos 2º, 13º e 59ª, nº 1 e 3 da Constituição da República, inconstitucionalidade que aqui se argui expressamente.
O requerido contra-alegou, concluindo: A. O requerimento do A foi apresentado ao FGS em 01.03.2018, altura em que se encontrava em vigor o novo diploma legal regulador do FGS, DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015.
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Assim, o referido requerimento do A foi apreciado à luz deste diploma legal.
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Este diploma previa um prazo de 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho para que seja apresentado junto dos serviços da Segurança Social o requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho.
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O requerimento do Autor, não podia ter acolhimento, uma vez que, tendo o Autor apresentado o requerimento em 01/03/2018, nunca se poderia entender, que a apresentação de tal requerimento foi tempestiva.
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Deveria, pois, o A, ter reclamado os créditos emergentes do contrato de trabalho dentro do prazo de 1 ano estabelecido pelo novo regime jurídico do Fundo de Garantia Salarial, pois estava em condições de o fazer.
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Nesse sentido decidiu a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.
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é a declaração de insolvência que faz nascer o direito ao acionamento do Fundo de Garantia Salarial e, in casu, a declaração de insolvência ocorreu antes da cessação do contrato de trabalho, não resultando da factualidade assente e do que vem alegado pelo Autor, por conseguinte, que a demora do processo judicial foi a causa de preclusão do direito, pelo que, no caso concreto, não ocorreu qualquer por violação dos artigos 2.º, 13.º e 59.º, n.ºs 1 e 3 da CRP H. Sendo aplicável o novo regime, temos de considerar como estando ultrapassado o prazo para a apresentação dos requerimentos ao FGS, à luz do diploma DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015, O Exmº Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal foi notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º do CPTA, não tendo emitido parecer.
*Dispensando vistos, vêm os autos a conferência, cumprindo decidir.
*Os factos, fixados pelo tribunal “a quo”: 1) O Autor foi admitido ao serviço da empresa “H., S.A.”, NIPC (…), em 01/07/1997, e aí passou a trabalhar sob as ordens e direcção desta – facto não controvertido.
2) O Autor auferia uma retribuição mensal ilíquida de EUR 1.618,71 – facto não controvertido.
3) Em 15/01/2012, o Autor intentou acção declarativa de condenação emergente de contrato individual de trabalho, que correu termos na 2.ª Secção do extinto Tribunal do Trabalho...
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